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Autor: Prof. Guilherme Gibran Pogibin
Colaboradores: Profa. Ghislaine Gliosce da Silva
 Profa. Leliane Maria Aparecida Gliosce Moreira
 Profa. Tânia Sandroni
Políticas Públicas 
e Psicologia
Professor conteudista: Guilherme Gibran Pogibin 
Psicólogo (2004), bacharel em Psicologia (2004) e licenciado em Psicologia (2006) pela Universidade de São Paulo. 
Possui mestrado em Psicologia Social e do Trabalho pela Universidade de São Paulo (2009). Professor de Psicologia 
em cursos de graduação e pós‑graduação desde 2009, tendo passado pelas instituições: FIO‑Ourinhos, UNIB, PUC‑SP 
e Uninove. Desde 2022, leciona na UNIP, nos campi Marquês e Alphaville, atuando, também, como coordenador do 
curso de Psicologia no campus de Alphaville. Leciona disciplinas do campo da Psicologia Social, como Psicologia 
Social, Psicologia Comunitária, Psicologia do Cotidiano, Processos Grupais, Psicologia Organizacional e do Trabalho, 
entre outras. Responsável pela supervisão do estágio curricular nas áreas de Grupos e Comunidades e Intervenção em 
Contextos de Saúde. Atua, também, com atendimento clínico e orientação profissional.
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou 
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem 
permissão escrita da Universidade Paulista.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
P746p Pogibin, Guilherme Gibran.
Políticas Públicas e Psicologia / Guilherme Gibran Pogibin. – São 
Paulo: Editora Sol, 2025.
108 p., il.
Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e 
Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517‑9230.
1. Políticas públicas. 2. Assistência social. 3. Psicologia. I. Título.
681.3
U522.23 – 25
Prof. João Carlos Di Genio
Fundador
Profa. Sandra Rejane Gomes Miessa
Reitora
Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez
Vice-Reitora de Graduação
Profa. Dra. Marina Ancona Lopez Soligo
Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa
Profa. Dra. Claudia Meucci Andreatini
Vice-Reitora de Administração e Finanças
Profa. M. Marisa Regina Paixão
Vice-Reitora de Extensão
Prof. Fábio Romeu de Carvalho
Vice-Reitor de Planejamento
Prof. Marcus Vinícius Mathias
Vice-Reitor das Unidades Universitárias
Profa. Silvia Renata Gomes Miessa
Vice-Reitora de Recursos Humanos e de Pessoal
Profa. Laura Ancona Lee
Vice-Reitora de Relações Internacionais
Profa. Melânia Dalla Torre
Vice-Reitora de Assuntos da Comunidade Universitária
UNIP EaD
Profa. Elisabete Brihy
Profa. M. Isabel Cristina Satie Yoshida Tonetto
Material Didático
Comissão editorial: 
 Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
 Profa. Dra. Ronilda Ribeiro
Apoio:
 Profa. Cláudia Regina Baptista
 Profa. M. Deise Alcantara Carreiro
 Profa. Ana Paula Tôrres de Novaes Menezes
Projeto gráfico: Revisão:
 Prof. Alexandre Ponzetto Fernanda Felix
 Vitor Andrade
Sumário
Políticas Públicas e Psicologia
APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................8
Unidade I
1 FUNDAMENTOS DAS POLÍTICAS DE ESTADO ........................................................................................ 11
1.1 Constituição do Estado moderno .................................................................................................. 11
1.2 Fundamentos dos modelos de proteção social ........................................................................ 13
2 HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL ............................................................................. 17
2.1 Panorama geral da constituição de políticas públicas no Brasil ....................................... 17
2.2 Estado brasileiro e as condições subjetivas ............................................................................... 19
3 INTRODUÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) ........................................................................ 23
3.1 Princípios e diretrizes do SUS .......................................................................................................... 23
3.2 Papel do psicólogo nas políticas públicas de saúde ............................................................... 26
4 INTRODUÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL (SUAS) ......................................... 31
4.1 Princípios e diretrizes do Suas ........................................................................................................ 31
4.2 Papel do psicólogo nas políticas públicas de assistência social ........................................ 36
Unidade II
5 PSICOLOGIA E COMPROMISSO SOCIAL .................................................................................................. 44
5.1 Compromisso social da psicologia ................................................................................................ 44
5.2 Psicologia, subjetividade e políticas públicas ........................................................................... 49
6 ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO SUS .......................................................................................................... 53
6.1 A esfera de trabalho da psicologia no campo das políticas públicas de saúde .......... 53
6.2 Desafios teóricos‑metodológicos e ético‑políticos da atuação do psicólogo 
no SUS .............................................................................................................................................................. 58
6.3 Relatos de experiência ....................................................................................................................... 63
7 ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO SUAS ....................................................................................................... 68
7.1 A esfera de trabalho da psicologia no campo das políticas públicas da 
assistência social .......................................................................................................................................... 68
7.2 Do “sujeito da caridade” ao “sujeito de direito”....................................................................... 72
7.3 Relatos de experiência ....................................................................................................................... 75
8 OUTRAS ATUAÇÕES DO PSICÓLOGO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS .................................................. 80
8.1 Psicologia e políticas públicas: violência e direitos humanos ........................................... 80
8.2 Psicologia e políticas públicas voltadas ao uso de álcool e drogas ................................. 83
8.3 Psicologia, políticas públicas e educação ................................................................................... 90
8.4 Movimentos sociais e a construção de políticas públicas: psicologia e 
diversidade sexual ........................................................................................................................................ 94
7
APRESENTAÇÃO
A presente disciplina está inserida em um contexto no qual o estudante deve relacionar o campo 
social das políticas públicas com sua atuação profissional como psicólogo. Para tal, torna‑se fundamental 
apresentar os fundamentos das políticas de Estado e fazer uma introdução sobre o campo das políticas 
públicas do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (Suas).
Para a formação profissional do futuro psicólogo, devem ser entendidas as possibilidades de atuação 
em diferentes contextos, considerando as necessidades sociais e os direitos humanos, assim como o 
exercício da cidadania, tendo em vista a promoção da qualidade de vida dos indivíduos, dos grupos, 
das organizações e das comunidades. É necessário, também, refletir sobre o papel do psicólogo nade 
1970, ganha força o discurso da democratização do acesso à saúde, impulsionado pelos debates sociais 
que destacavam as mudanças profundas necessárias para garantir um acesso mais amplo e que, mais 
tarde, refletiriam nos princípios da universalidade, equidade e integralidade. Nesse período, também 
29
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
começa a se buscar a descentralização como forma de aproximar a população local e convidá‑la a 
participar, em parceria com o poder público, da construção de intervenções adequadas às necessidades 
locais. Com a implantação do SUS, no entanto, surgiram novos questionamentos e reivindicações.
Nesse contexto, o princípio da integralidade pode direcionar recursos técnicos como tratamentos e 
ações preventivas, o que implica que a ação integral possibilita a efetivação do cuidado. Essa abordagem 
garante visibilidade a aspectos que vão além dos biológicos, uma vez que as necessidades de saúde não 
se limitam apenas ao bem‑estar físico do indivíduo. Além disso, no contexto das ações de saúde no SUS, 
a demanda pode ser acolhida e tratada para além do consultório médico e da relação médico‑paciente, 
pois todos os profissionais de saúde têm a capacidade de aplicar o princípio da integralidade (Castro, 
2021, p. 5).
A autora também aponta para a prática do cuidado, em seu sentido político. Ações que buscam 
emancipar o indivíduo por meio da conscientização sobre seus problemas, garantindo‑lhe um papel 
central nas decisões relacionadas ao seu próprio processo de saúde e doença, estão sob a lógica do 
cuidado. Portanto, a integralidade do cuidado confere à saúde pública um lugar especial nas práticas 
sociais, tendo o SUS uma visão emancipadora do sujeito, apesar das dificuldades de, na prática, se 
afastar de uma visão médica tradicional.
O princípio da integralidade não se resume apenas no cuidado ao usuário do serviço, mas, também, 
está na relação do trabalho em equipe, em que é possível orientar a organização de forma a atender 
tanto a demanda espontânea quanto as necessidades identificadas no contato com a população local, 
abrangendo tanto as questões que afetam o grupo populacional quanto as necessidades de segmentos 
específicos. Nesse contexto organizacional, é vital destacar o valor da transdisciplinaridade.
A noção de atenção integral insere nas práticas de saúde a necessidade de 
diálogo entre campos de saber, para compreender os indivíduos sob outros 
aspectos que não apenas o biológico e, assim, identificar a necessidade de 
intervenção de outros profissionais e terapêuticas na produção do cuidado. 
Indo um pouco além, a partir da integralidade, o perfil de equipe mais 
afim a essa noção é o transdisciplinar, visto que a transdisciplinaridade 
evoca uma ação construída por sujeitos que não apenas buscam o 
diálogo, mas a integração dos saberes das diferentes disciplinas envolvidas 
(Castro, 2021, p. 7).
A psicologia é uma disciplina que vai além do campo da saúde, transitando também por outras 
áreas, como as ciências humanas, o que amplia a compreensão e as possibilidades de atuação do 
psicólogo na saúde pública. No entanto, desde a década de 1980, há uma crítica significativa às práticas 
desenvolvidas pelos psicólogos no âmbito da saúde, muitas vezes baseadas na abordagem tradicional 
da clínica, como a psicoterapia ou o psicodiagnóstico. Esse problema decorre da manutenção de um 
currículo acadêmico tecnicista, que não prepara adequadamente o futuro profissional para o trabalho 
com grupos. A clínica aprendida nos cursos universitários ainda é predominantemente individual, com a 
prática com grupos sendo pouco conhecida ou desvalorizada, o que gera sérios desafios, especialmente 
na saúde pública, campo esse que necessita de novas metodologias.
30
Unidade I
No processo contínuo de construção e desconstrução de ideias, de conhecimento e de afirmação de 
si e do outro surgem novas possibilidades de atuação, com limites e áreas ainda inexploradas. A prática 
da psicologia engloba um constante refazer, não de maneira aleatória ou reativa, mas guiado pelo desejo 
genuíno de afirmar a existência, com o objetivo de promover uma ação humanizada e humanizante, ao 
passo que se manifesta o desejo de romper com uma relação sujeito‑objeto, mecanizada e repetitiva, 
que não atende às especificidades da população atendida.
A questão da identidade do profissional de Psicologia na saúde pública é 
algo que parece perpassar toda a discussão acerca do seu posicionamento 
na construção do atendimento prestado à população e mesmo do SUS. 
Ao reconhecer sua identidade – e, portanto, seu lugar no sistema –, 
posicionar‑se profissionalmente implica em reconhecer também a própria 
responsabilidade pela cogestão do SUS e, assim, um posicionamento político 
diante da realidade. Percebe‑se, assim, que a prática do psicólogo orientada 
para a transformação da realidade se articula fortemente com a atuação 
política quando apresenta o princípio ético da inseparabilidade: não há como 
se falar em cuidado sem discutir a gestão desse cuidado (Castro, 2021, p. 8).
A escolha de uma atividade clássica da psicologia parece estar também ligada a interesses de uma 
categoria que busca se afirmar diante dos outros profissionais de saúde, estabelecendo seu espaço nesse 
campo, ainda que se limite às suas próprias práticas.
Essa atitude perde de vista o princípio da transversalidade, assim como o 
da integralidade. Ao não buscar a interação com outros campos de saber, 
não só deixa de haver intervenções que melhor atendam à população, mas 
perde‑se também a oportunidade de cada vez mais construir‑se como 
um campo de saber. Da mesma forma, é uma demarcação de seu lugar 
hierárquico em relação ao usuário do SUS, uma vez que também diz respeito 
ao reconhecimento da sociedade, do seu lugar como profissional da área 
de saúde. Cabe questionar o tipo de cuidado que se produz nessa relação 
(Castro, 2021, p. 8).
Para que os profissionais de psicologia possam atuar de acordo com os princípios da transversalidade 
e integralidade no sistema de saúde pública, é necessário redefinir suas práticas dentro do dinamismo da 
realidade que lhes confere sentido. É preciso questionar os discursos prontos e reconhecer a diversidade 
dos diferentes tipos de discurso. Entende‑se que é crucial avançar nessa discussão, integrando o tema 
ao debate sobre o projeto ético‑político da profissão, refletindo sobre os limites e as possibilidades da 
atuação profissional.
31
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
4 INTRODUÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL (SUAS)
4.1 Princípios e diretrizes do Suas
Historicamente, considera‑se que a implementação de planos, programas e políticas de assistência 
social no Brasil teve seu início no período colonial, tendo sua continuação durante o Império. À época, 
as práticas que continham um sentido de “assistencialismo” podiam ser encontradas nas práticas por 
favorecimento e clientelismo entre setores sociais da elite econômica e política, assim como nos setores 
que mantinham uma base social de dominação. Valores morais e religiosos constituíam a justificativa de 
tais práticas, que passavam longe de políticas de Estado e do âmbito do direito.
Já durante a República, alguns movimentos de assistência passam a ganhar força, ainda que o 
assistencialismo clientelista continue predominando como valor social. No Estado Novo, período da 
ditadura varguista, são criados o Conselho Nacional de Serviço Social e a Legião Brasileira da Assistência, 
a LBA (Oliveira; Kahhale, 2020). A LBA era carregada por ideais assistencialistas ainda ligados às práticas 
sociais do Brasil Colônia.
Duas características da LBA merecem especial atenção: era uma organização 
da sociedade civil de finalidade não econômica, voltada para congregar as 
“organizações de boa vontade” – compreendia, portanto, a assistência social 
como um ato de vontade, e não como um direito de cidadania [...]. Além 
disso, seu estatuto assegurava a presidência da instituição à primeira dama 
da República,instituindo, assim, o chamado “primeiro‑damismo”. Em outras 
palavras, a LBA deslocou o papel direto do Estado, fazendo com que passasse 
a assumir dupla figura: uma mediada pelas organizações filantrópicas, outra 
caracterizada pela bondade da esposa do governante (Cordeiro, 2018, p. 67).
O caráter filantrópico, associado a uma imagem de boa vontade individual, é marcante até os dias 
de hoje, como será visto adiante, e que ainda se constitui como valor operante em diversas práticas 
na assistência.
A noção de uma assistência social ligada ao direito do cidadão é construída no Brasil, historicamente, 
a partir da segunda metade do século XX, ganhando mais força com a ascensão de movimentos sociais 
populares das décadas de 1970 e 1980, que se articulavam como resistência ao regime ditatorial militar (que 
durou de 1964 a 1985), aliados, ainda, a movimentos de trabalhadores e setores intelectuais progressistas.
O fim da ditadura militar se entrelaça à mobilização da sociedade civil e de movimentos 
pela democratização que culminam na formulação da Constituição Federal de 1988, a chamada 
Constituição Cidadã.
É na Constituição de 1988 que a assistência social se consolida como um direito a ser garantido 
pela responsabilidade estatal. A ideia de assistência social como caridade passa a dar lugar ao âmbito 
do direito e da política pública. Já em 1993, é instituída a Lei Orgânica de Assistência Social, a Loas, para 
regulamentar o que a Constituição já previa em seu texto.
32
Unidade I
De forma a regulamentar o artigo do texto constitucional, no ano de 1993, 
é promulgada a Lei Orgânica da Assistência Social, LOAS, que instituiu 
definitivamente a Assistência Social como um direito social não contributivo, 
estabelecendo seus princípios e diretrizes, bem como a proteção social a ser 
garantida por meio de serviços, benefícios, programas e projetos, havendo 
detalhamento posterior em três instrumentos principais: a Política Nacional 
de Assistência Social de 1998, e duas Normas Operacionais Básicas editadas 
em 1997 e 1998 (Oliveira; Kahhale, 2020, p. 121).
A Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e a Norma Operacional Básica (NOB/Suas) marcam 
o avanço do campo da assistência social como direito e política pública. A PNAS estabelece o conjunto 
de políticas nacionais a serem implementadas no âmbito do combate à fome, à pobreza e à exclusão 
social. Já a NOB fixa quais são as normas para gerir a implementação das políticas, ou seja, quem são os 
agentes sociais e políticos envolvidos na PNAS, nas esferas federal, estadual, municipal e na sociedade 
civil, organizando, inclusive, a gestão financeira da política de assistência social.
 Saiba mais
É interessante que o aluno de Psicologia se aprofunde nos textos da 
lei que estabelece o Suas, assim como os textos da PNAS e da NOB/Suas. 
A seguir, deixamos as referências para a leitura.
BRASIL. Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Brasília, 1993. Disponível 
em: https://tinyurl.com/3fe38aa6. Acesso em: 22 nov. 2024.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). 
Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004; Norma Operacional Básica – 
NOB/SuaS. Brasília, 2005. Disponível em: https://tinyurl.com/4967m5e8. Acesso 
em: 4 abr. 2025.
 
A NOB trouxe um avanço no sentido de estabelecer instrumentos de aprimoramento de gestão 
e qualificação da oferta de serviços, prevendo planejamento, monitoramento e definição dos entes 
federados (estados e municípios), participação popular na formulação e implementação das políticas, 
sendo este um princípio da Constituição Federal, além de ter objetivos como:
• Garantir a proteção social de famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade ou risco social, 
por meio de serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais.
• Garantir acesso à renda à população em situação de pobreza ou extrema pobreza, à população 
idosa e às pessoas com deficiência sem condições de manter o seu próprio sustento ou de serem 
mantidas por suas famílias.
33
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
• Oferecer apoio para prevenção e superação de situações de fragilidade em relacionamentos 
familiares, sociais e comunitários, como em casos de violações de direitos, tais como violência, 
abandono e negligência.
• Oferecer proteção em situações de extremo risco, como calamidades públicas.
• Ofertar serviços de acolhimento à população em situação de rua sem lar temporário ou permanente.
• Facilitar o acesso das pessoas atendidas no Suas aos serviços das demais políticas setoriais, 
estabelecendo parcerias e articulações.
• Atuar na mobilização e conscientização das comunidades no território.
Os objetivos da NOB/Suas estão sempre ligados à noção de que ser assistido pelo Estado e pela 
sociedade é um direito do cidadão. As condições de pobreza e vulnerabilidade não são consideradas 
pelos princípios do Suas uma responsabilidade do indivíduo, e o direito à assistência está ligado à ideia 
de que todo cidadão tem direito a condições básicas de vida e de dignidade.
Aqui cabe uma discussão importante, retomando a diferenciação entre os conceitos de “assistência” e 
“assistencialismo”: o assistencialismo está calcado em práticas clientelistas, mantendo uma relação de poder 
e desigualdade entre quem oferta alguns favores e quem recebe os favores, se comprometendo com uma 
retribuição, em forma de apoio ou mesmo trabalho; já a assistência é um dever da sociedade, representado 
pelo Estado, que garante a todo cidadão as condições básicas de vida, inclusive se pautando nos preceitos dos 
direitos humanos. Dessa forma, quem promove a assistência social não pode exigir favores em troca.
Não obstante, em uma cultura historicamente construída na base do clientelismo como forma de 
garantia de poder, o assistencialismo ainda é uma forma corrente de prática social. Ainda há confusão e 
falta de conscientização em relação ao papel da assistência social, como discorre Couto (2015, p. 673‑674):
Em primeiro lugar, o abandono do debate da universalização no campo 
da proteção social, assumindo na focalização o papel fundamental. Nesse 
aspecto, ganha também notoriedade a política gerencial. Trata‑se de aplicar 
os parcos recursos de forma eficiente. Desloca‑se do debate a luta por 
investimentos e acesso à riqueza socialmente produzida. Incorpora‑se a ideia 
de a política de assistência social ter apenas um papel residual, compensatório 
e dirigido somente a uma parcela da população incapaz de se sustentar 
por si própria. Reatualiza‑se nessa perspectiva o entendimento da política 
como resposta a incapacidades individuais que devem ser parametradas, 
com imposição de metas que demonstrem o “envolvimento” positivo tanto 
dos  sujeitos que buscam atendimento na política de assistência social 
como dos trabalhadores que executam o trabalho. A noção de que algo está 
“errado” com essas famílias e que é preciso identificar sua responsabilidade 
sustenta práticas invasivas e moralistas. O trabalho então se organiza na 
busca desses elementos, descolando o sujeito de suas relações sociais.
34
Unidade I
Segundo a autora, ainda permeia na sociedade uma ideia de que as questões relativas a direitos 
sociais são de responsabilidade do indivíduo e da família “desestruturada”, reforçando o moralismo por 
trás dessa visão, que é herdeira do assistencialismo.
Como forma de garantia dos princípios do Suas, fica estabelecida a família como foco de atenção e o 
território como base para que as ações sejam desenvolvidas com o enfoque na família. O envolvimento 
e pertencimento da família ao território se estabelece como forma de corresponsabilização da sociedade 
no sistema de assistência social.
Assim, ficam estabelecidos dois níveis de proteção social. A Proteção Social Básica (PSB) se destina 
à prevenção de riscos sociais, enquanto a Proteção Social Especial (PSE) se destina a quem já está em 
situação de risco, tendo seus direitos violados.
A Proteção Social Básica (PSB) visa a prevenir situações derisco pessoal ou 
social, por meio do desenvolvimento de potencialidades e do fortalecimento 
de vínculos familiares e comunitários. Essa modalidade de proteção é 
destinada às pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social, 
decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário/nulo acesso aos 
serviços públicos etc.) e/ou fragilização de vínculos afetivos (relacionais ou de 
pertencimento social, tais como discriminações etárias, de gênero, étnicas, por 
deficiência etc.). Seus serviços são oferecidos de forma direta nos Centros de 
Referência de Assistência Social (CRAS) e de forma indireta nas organizações 
e entidades de assistência social da área de abrangência do CRAS [...]. Já a 
Proteção Social Especial (PSE) visa a intervir em casos em que a situação 
de risco pessoal e social já está instaurada, tal como ocorre quando há 
abandono, maus‑tratos físicos e/ou psíquicos, trabalho infantil, abuso sexual, 
drogadição, cumprimento de medida socioeducativa e situação de rua (MDS, 
2005). Ela é composta por ações que requerem acompanhamento individual 
e maior flexibilidade nas soluções protetivas, implementadas pelos Centros 
de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS), pelos Centros de 
Referência Especializados para População em Situação de Rua (Centros POP) e 
pelos serviços por eles referenciados (Cordeiro, 2018, p. 72).
A PSE ainda é dividida em duas classificações: média e alta complexidade. A média complexidade 
é considerada quando, apesar dos direitos violados, ainda existem vínculos familiares e comunitários. 
Já a alta complexidade é considerada quando o indivíduo ou a família está sem laços comunitários e, 
geralmente, por alguma situação de ameaça, precisam se distanciar de seus núcleos de referência.
O equipamento destinado à PSB é o Centro de Referência de Assistência Social, o Cras. Este tem 
como função atuar junto a famílias e indivíduos de forma territorializada, tendo como foco o convívio 
sociofamiliar e comunitário, devendo, ainda, ofertar o Programa de Atenção Integral às Famílias, o Paif. 
A ideia de família a ser considerada na AB leva em consideração a diversidade de arranjos familiares, 
quebrando o paradigma moralista que considera apenas a família nuclear patriarcal. Dessa forma, a 
função básica da família é “prover a proteção e a socialização dos seus membros; constituir‑se como 
35
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
referências morais, de vínculos afetivos e sociais; de identidade grupal” (Brasil, 2005, p. 35), além de 
cumprir uma função de mediação entre seus membros e as instituições sociais, dentre elas, o Estado.
Além de ser responsável pelo desenvolvimento do Paif – com referência territorializada, que valorize 
as heterogeneidades, as particularidades de cada grupo familiar, a diversidade de culturas e que promova 
o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários –, a equipe do Cras deve fornecer informação e 
orientação para a população de sua área de abrangência, bem como se articular com a rede de proteção 
social local no que se refere aos direitos de cidadania, mantendo ativo um serviço de vigilância da 
exclusão social na produção, sistematização e divulgação de indicadores da área de abrangência do Cras 
em conexão com outros territórios.
Ainda, é de responsabilidade do Cras o desenvolvimento do Paif de forma territorializada, valorizando 
e levando em conta a multiplicidade, riqueza cultural e a forma como cada família se insere na cultura 
e na sociedade, considerando a heterogeneidade das formas de fortalecimento de vínculos.
Já o Creas tem sua atuação no momento em que os direitos sociais são ameaçados ou violados, seja por 
responsabilidade do Estado, da família ou de outro indivíduo, sendo acionado em casos de violência (seja 
física, psicológica, sexual etc.), abandono familiar, trabalho infantil ou pessoa em situação de rua, também 
podendo atuar no acompanhamento de casos de adolescentes em medida socioeducativa em meio aberto.
As situações de risco demandarão intervenções em problemas específicos e/ou 
abrangentes. Nesse sentido, é preciso desencadear estratégias de atenção 
sociofamiliar que visem a reestruturação do grupo familiar e a elaboração de 
novas referências morais e afetivas, no sentido de fortalecê‑lo para o exercício 
de suas funções de proteção básica ao lado de sua auto‑organização  e 
conquista de autonomia. Longe de significar um retorno à visão tradicional, 
e considerando a família como uma instituição em transformação,  a 
ética da atenção da proteção especial pressupõe o respeito à cidadania, 
o reconhecimento do grupo familiar como referência afetiva e moral e 
a reestruturação das redes de reciprocidade social (Brasil, 2005, p. 37).
O Cras e o Creas devem atuar em rede, considerando outros equipamentos amparados por políticas 
públicas em diferentes campos, como saúde, educação, justiça, habitação, trabalho etc. A atuação em 
rede ainda leva em conta outros serviços da assistência social, como:
• No caso de Proteção Básica: além do Paif, há o Serviço de Convivência e Fortalecimento de 
Vínculos e o Serviço de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas.
• No caso de Proteção Especial de média complexidade: o Serviço de Proteção e Atendimento 
Especializado a Famílias Indivíduos (Paefi), o Serviço Especializado em Abordagem Social, o Serviço 
de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade 
Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC), o Serviço de Proteção Social Especial 
para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias, e o Serviço Especializado para Pessoas em 
Situação de Rua.
36
Unidade I
• Nos casos de alta complexidade: o Serviço de Acolhimento Institucional, o Serviço de Acolhimento 
em República, o Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora e o Serviço de  Proteção em 
Situações de Calamidades Públicas e de Emergências.
Cabe ressaltar ainda que o serviço social é o campo de atuação profissional que visa promover 
cidadania, igualdade e justiça social, sendo o assistente social o trabalhador do serviço social. Esse 
profissional é primordial no Suas, além de outros que podem fazer parte do quadro de trabalhadores dos 
equipamentos, como pedagogos, equipe administrativa e psicólogos.
4.2 Papel do psicólogo nas políticas públicas de assistência social
Que especificidade o profissional da psicologia pode ter na assistência social? Para começar a 
destrinchar essa resposta, pode‑se remeter à subjetividade como objeto específico da ciência psicológica.
Mesmo o conceito de subjetividade abrange diferentes paradigmas para o entendimento dos 
processos psicológicos. Portanto, um entendimento de subjetividade que se aproxime do embasamento 
político e social da assistência social no Brasil, amparada pela formulação do Suas e pela ordenação 
trazida pela PNAS e pela NOB, é mais pertinente para delimitar‑se um ponto de partida.
Sendo assim, referenciais científicos e políticos que entendem a subjetividade como produzida 
socio‑historicamente e que abarcam preceitos ético‑políticos se aproximam de uma visão de assistência 
social pautada na cidadania e na promoção de direitos. Não necessariamente uma abordagem 
teórica específica da psicologia é mais adotada como base para o trabalho na assistência social, mas 
são as produções de caráter crítico que se aproximam de uma leitura da subjetividade presente nos 
fenômenos sociais ligados às necessidades e formulações de políticas públicas no campo da assistência. 
Processos sociais como pobreza, fome, violência, desemprego, constituição familiar e acesso às políticas 
assistenciais encontram respaldo em uma psicologia que entende os processos psicológicos como parte 
dos processos sociais, sem cair na dicotomia “indivíduo versus sociedade”.
Oliveira e Kahhale (2020) apontam que a própria NOB traz apontamentos para a valorização do 
trabalho do psicólogo, assim como evidenciam que a categoria profissional dos psicólogosnão entra em 
acordo em relação ao caráter complementar ou específico de seu trabalho na assistência.
O Crepop (Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas), em sua publicação de 
referência técnica para atuação do psicólogo no Cras (Conselho Federal de Psicologia, 2021, p. 40), trata 
do contexto social brasileiro ao afirmar a dinâmica de acumulação do capital, que, ao mesmo tempo 
que é capaz de produzir e acumular muita riqueza, gera a pobreza associada às formas de vida das 
pessoas e suas condições socioeconômicas, justificando esse processo pela naturalização da pobreza 
e da miséria, que, ideologicamente, seriam responsabilidade do que o indivíduo é capaz de prover em 
relação ao seu sucesso ou fracasso social. Ao mesmo tempo que se verifica a falta de investimento 
sistemático no bem‑estar das populações que sofrem com a desigualdade, cria‑se um discurso da 
culpabilização individual.
37
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
Com base nesse panorama, abrem‑se duas questões e princípios inerentes ao 
campo de atuação profissional, principalmente ao considerarmos o trabalho 
sobre/com os vínculos familiares e comunitários, atribuído a psicólogas e 
psicólogos inseridas(os) na equipe interprofissional no SUAS: 1) a comunidade 
ou o território como dispositivo das práticas profissionais no SUAS; e 
2)  a  laicidade como linha orgânica das práticas profissionais da Psicologia, 
associada à concepção da responsabilidade do Estado na promoção, proteção 
e defesa dos direitos humanos (Conselho Federal de Psicologia, 2021, p. 40).
Completam o raciocínio Oliveira e Kahhale (2020, p. 123), ao citarem a referência técnica do Crepop.
Esse manual trata da dimensão ético‑política da Assistência Social, a 
respeito da trajetória percorrida pela Assistência, sua entrada para o 
sistema de Seguridade Social brasileiro e sua construção como política 
pública. O usuário da Assistência chega a ser descrito como o que sofre 
com as desigualdades sociais. Esse material ainda ressalta que o público 
também é formado pelos que foram privados dos direitos ou tiveram seus 
vínculos quebrados. Como já mencionado acima, a assistência social deverá 
ser prestada a quem dela necessitar, sem distinções, aproximando‑se aos 
princípios e diretrizes do SUS.
O papel do psicólogo vai se delineando inserido no embate político que inclui as formulações de 
explicação para a pobreza e as condições de vulnerabilidade. É necessário tomar partido, o que demonstra 
o posicionamento do profissional em relação às condições que se configuram como necessidades de se 
recorrer à assistência social.
Se considerarmos o fortalecimento e o empoderamento do sujeito como um dos possíveis papéis do 
psicólogo, significa que é necessária a compreensão do usuário do serviço como um sujeito de direitos. 
Desenvolver autonomia e cidadania implica um trabalho de construção junto ao público atendido do 
reconhecimento de si, da família e da comunidade como agentes políticos. A busca pela construção de 
vínculos e o entendimento dos vínculos como parte do processo de assistência na busca pela garantia 
dos direitos sociais coloca o psicólogo em um lugar estratégico no Suas, na medida em que o trabalho 
desse profissional afeta o aspecto subjetivo.
Ao mesmo tempo que se constrói uma visão do que é o papel do psicólogo nesse processo, é 
necessário criticar certas práticas consolidadas profissionalmente na psicologia que não condizem com 
a visão de cidadania e de direitos sociais; uma psicologia que, em muitos momentos de sua história 
(e até hoje, em certa medida), categoriza, classifica, patologiza e objetifica o sujeito, contribui mais para 
o assistencialismo do que para a assistência. A busca por um sujeito de ação e consciência frente sua 
própria condição é um dos papéis do psicólogo na assistência.
Uma das grandes dificuldades em exercer esse papel é o reconhecimento do campo de embate de 
visões políticas diferentes. A dimensão ético‑política do sujeito é um fator a ser considerado. Não se 
trata de um “pedagogicismo”, de ensinar o que é “certo ou errado”, nem mesmo de doutrinar, pois o 
38
Unidade I
Código de Ética Profissional do Psicólogo (Conselho Federal de Psicologia, 2005) proíbe que se induza 
o usuário do serviço a qualquer convicção política. No entanto, é preciso lembrar que os processos 
psicossociais necessários para promover a cidadania e o acesso a direitos implica um sujeito consciente 
de si mesmo em relação ao seu contexto social.
Oliveira e Kahhale (2020, p. 123) ressaltam “o risco da psicologização do SUAS, ou seja, existe um 
temor de que o psicólogo atue para normatizar e culpar os usuários da política pela sua condição social”. 
A referência técnica elaborada pelo Crepop, afirmam as autoras, preconiza
que os princípios que orientam a prática do psicólogo devem seguir a lógica 
de contribuição para a efetivação das políticas públicas da assistência 
social e para a construção de um sujeito ativo, resultando na prevenção 
de situações de risco, atuando por meio do fortalecimento dos vínculos 
familiares e comunitários, também desenvolvendo as potencialidades 
pessoais e coletivas (Oliveira; Kahhale, 2020, p. 123).
 Lembrete
Existe uma diferença importante entre assistencialismo e assistência. 
Enquanto o primeiro se refere a práticas que reforçam a relação de 
dependência entre os agentes sociais, pautada na lógica do clientelismo 
político, a segunda se refere à promoção de direitos e cidadania, sendo 
que o Estado tem o dever de garantir a todos seus cidadãos o acesso a 
direitos básicos.
Buscando ações que visem à promoção de autonomia e cidadania, o trabalho do psicólogo na 
assistência social exige o entendimento de um sujeito ativo perante seu meio social. O psicólogo deve 
buscar desenvolver uma prática emancipatória, que leve o sujeito, dentro da rede de promoção de 
direitos, a romper com os ciclos de naturalização da pobreza e da violência. Trata‑se da crítica a um 
papel adaptativo do trabalho do psicólogo. Nesse sentido, Ayres (2004) propõe uma ética do cuidado 
como base para o trabalho do psicólogo.
Atribuímos, aqui, ao Cuidado o estatuto de uma categoria reconstrutiva, 
querendo com isso nos referir à aposta […] de que existe uma potencialidade 
reconciliadora entre as práticas assistenciais e a vida, ou seja, a possibilidade 
de um diálogo aberto e produtivo entre a tecnociência médica e a construção 
livre e solidária de uma vida que se quer feliz, a que estamos chamando de 
Cuidado (Ayres, 2004, p. 85).
O autor, a partir da ideia da ética do cuidado, apresenta três ferramentas que, ao serem usadas pelo 
psicólogo, que vão ao encontro aos princípios apresentados: o acolhimento, o vínculo e a responsabilização. 
O acolhimento se dá na medida em que uma escuta qualificada e atenta é proporcionada, sendo 
o interesse genuíno pelo outro uma de suas condições básicas. A  escuta atenta deve ser oferecida 
em qualquer situação, proporcionando um tempo e um espaço de afirmação do sujeito. O vínculo 
39
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
é considerado como dispositivo que possibilita uma relação de igualdade entre os profissionais e os 
usuários da saúde, permitindo que haja troca entre saberes. Dessa forma, o caráter subjetivo e o objetivo 
constroem uma terapêutica adequada para cada relação entre usuário e profissional (Oliveira; Kahhale, 
2020, p. 125).
A responsabilização (ou corresponsabilização) trata do
cuidado como um atendimento integral que respeita o protagonismo do 
atendido, assim como pressupõe a presença ativa do usuário e a interação 
entre os envolvidos. Isso pode configurar uma relação de igualdade, o que 
se aproxima de uma responsabilização do cliente e do profissional. [...] 
O dispositivo de responsabilização, ou corresponsabilização, permite que o 
cliente/usuário e o profissional se identifiquem com o trabalho realizado, 
construindo em conjunto uma resolução para o sofrimento inicial (Oliveira; 
Kahhale, 2020, p. 125).
Ainda, é importante considerarque, para o papel do psicólogo na assistência social, se leve em conta 
de maneira primordial a interdisciplinaridade, já que a ação interdisciplinar
vai envolver essa transformação dos campos de conhecimentos na medida 
em que questiona conceitos, requer a sua revisão, demanda o diálogo, 
recria modos de agir, desafia os modos instituídos de explicação dentro 
das teorias. Isto não deve ser visto como uma intercorrência negativa, uma 
ameaça, um erro ou uma depreciação das disciplinas interrelacionadas. Pelo 
contrário, precisa ser valorizado como um movimento criativo que decorre 
do diálogo vivo entre os campos de conhecimento. É essencial submeter‑se 
à metamorfose, acompanhar a própria recriação. Todavia, para que surjam 
novos saberes e práticas, deve haver um encontro entre o acaso (a questão 
que desafia) e as potencialidades existentes em dada situação (a possibilidade 
de se trabalhar na equipe, por exemplo) (Almeida; Afonso, 2020, p. 96792).
40
Unidade I
 Resumo
Vimos na primeira unidade a constituição histórica e filosófica dos 
direitos sociais e das políticas públicas, ressaltando o caráter conflituoso 
entre a promoção de direitos e o crescimento econômico.
Ao adentrarmos o tópico da constituição das políticas públicas no Brasil, 
vimos como as características marcadamente escravocratas do nosso país 
fizeram com que o auge das políticas públicas brasileiras ocorresse apenas 
a partir da década de 1980, com os movimentos pela democratização, que 
culminaram na Constituição de 1988.
A partir desses movimentos, temos o surgimento do Sistema Único de 
Saúde (SUS), que vem na esteira do movimento sanitarista, tendo influência 
na formulação da Constituição, reivindicando um sistema de saúde de 
acesso universal e de atenção integral.
Por fim, abordamos o Sistema Único de Assistência Social (Suas), que 
surgiu da necessidade de garantir os direitos sociais básicos a todo cidadão 
em situação de pobreza, risco e vulnerabilidade.
 
41
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
 Exercícios
Questão 1. Leia o trecho a seguir, extraído da obra O alienista, de Machado de Assis.
A vereança de Itaguaí, entre outros pecados de que é arguida pelos cronistas, tinha o de não fazer 
caso dos dementes. Assim é que cada louco furioso era trancado em uma alcova, na própria casa, e, não 
curado, mas descurado, até que a morte o vinha defraudar do benefício da vida; os mansos andavam 
à solta pela rua. Simão Bacamarte entendeu desde logo reformar tão ruim costume; pediu licença à 
Câmara para agasalhar e tratar no edifício que ia construir todos os loucos de Itaguaí, e das demais vilas 
e cidades, mediante um estipêndio, que a Câmara lhe daria quando a família do enfermo o não pudesse 
fazer. A proposta excitou a curiosidade de toda a vila, e encontrou grande resistência, tão certo é que 
dificilmente se desarraigam hábitos absurdos, ou ainda maus. A ideia de meter os loucos na mesma 
casa, vivendo em comum, pareceu em si mesma sintoma de demência e não faltou quem o insinuasse 
à própria mulher do médico.
ASSIS, M. O alienista. São Paulo: FTD, 1994. p. 2.
No decorrer da história, o médico Simão Bacamarte passa a internar várias pessoas da cidade por 
avaliar que os comportamentos delas não eram normais, adotando para isso critérios que considerava 
científicos. Dessa forma, a maioria dos habitantes da pequena cidade é internada até que o médico 
conclua que seu método estava errado.
Com base na leitura e nos seus conhecimentos, avalie as afirmativas.
I – O personagem Simão Bacamarte assume uma postura que se pauta pela visão cientificista, 
adotando a ciência como definidora dos padrões de normalidade.
II – A institucionalização de pessoas consideradas fora dos padrões de saúde mental, apresentada 
com ironia na obra machadiana, foi adotada como prática comum no Brasil e durou até a Reforma 
Psiquiátrica, que estipulou o fechamento gradual de hospícios e manicômios.
III – Ao longo dos anos, no Brasil, o papel do psicólogo no tratamento de casos de saúde mental 
permaneceu secundário, sem alterações significativas, uma vez que o protagonismo é, por consenso, 
exercido pelos médicos.
42
Unidade I
É correto o que se afirma em:
A) I, II e III.
B) I e II, apenas.
C) II e III, apenas.
D) I, apenas.
E) II, apenas.
Resposta correta: alternativa B.
Análise da questão
A institucionalização dos considerados doentes mentais foi a prática recorrente até a Reforma 
Psiquiátrica. Dessa maneira, o papel dos psicólogos no tratamento desses indivíduos não é secundário. 
No trecho de Machado de Assis, vemos o protagonista definindo os padrões de normalidade segundo 
critérios que ele julga como científicos e objetivos.
Questão 2. Observe os quadrinhos.
Figura 1 – Quadrinho representando o Sistema Único de Saúde (SUS)
Disponível em: https://shre.ink/MS4M. Acesso em: 19 fev. 2025.
43
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
Com base na leitura e nos seus conhecimentos, avalie as afirmativas.
I – O SUS, criado com a Constituição de 1988, tem como princípios a universalidade, a gratuidade, a 
integralidade e a organização descentralizada.
II – Os quadrinhos evidenciam a importância da humanização do sistema de saúde, em que a 
subjetividade do paciente é reconhecida.
III – No sistema de saúde, o psicólogo deve preocupar‑se exclusivamente com os desvios de conduta 
do paciente, não levando em conta as condições socioeconômicas dele.
É correto o que se afirma em:
A) I e II, apenas.
B) II e III, apenas.
C) II, apenas.
D) I, apenas.
E) I, II e III.
Resposta correta: alternativa A.
Análise da questão
A prática do psicólogo deve levar em conta tanto os aspectos sociais quanto os psicológicos 
do indivíduo.concretização das políticas públicas, a partir dos determinantes éticos e técnicos da profissão.
O objetivo geral da disciplina, portanto, é assegurar o desenvolvimento de competências que 
possibilitem intervenções nos fenômenos e processos humanos, que se caracterizam pelo estudo 
da teoria, do método e da aplicabilidade dos conhecimentos psicológicos em diferentes contextos 
institucionais e sociais, possibilitando a realização de atividades práticas de estágio que permitem uma 
visão ampla e crítica da atuação profissional do psicólogo articulada com a dimensão ética, as políticas 
públicas e o compromisso social da psicologia.
Assim, a disciplina tem o objetivo de relacionar as diretrizes das políticas públicas de saúde e de 
assistência social com os aspectos históricos, sociais, econômicos, culturais e políticos do país, assim 
como as propostas e as diretrizes dessas políticas, consideradas os determinantes éticos e técnicos da 
profissão, através de análise das resoluções do Conselho Federal de Psicologia.
Também analisaremos criticamente as fontes de dados sobre aspectos históricos e atuais, a 
situação socioeconômica, política e cultural das populações‑alvo das políticas públicas de saúde 
e de assistência  social, ao passo que levantamos informações sobre as políticas públicas de saúde e 
de assistência social por meios convencionais e eletrônicos.
Para a discussão que propomos aqui, será vital discutirmos as possibilidades de atuação em diferentes 
esferas de ação, de caráter preventivo ou terapêutico, considerando as características das situações 
e dos problemas específicos com os quais o profissional da psicologia se depara em seu cotidiano, 
apresentados na literatura científica.
Dessa forma, durante o percurso deste livro‑texto, esperamos que o profissional de psicologia possa 
desenvolver competências que o auxiliem a refletir a respeito da dimensão e do papel do Estado moderno 
na construção de propostas que afetam diretamente a subjetividade, da interdependência entre Estado e 
sociedade na formulação de políticas públicas, e do papel de destaque do psicólogo no desenvolvimento 
de ações de prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde psicológica e psicossocial, tanto 
no âmbito individual quanto coletivo, a partir das possibilidades de inserção profissional no campo 
das políticas públicas, além de pautar suas ações no conhecimento das principais diretrizes do Sistema 
Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (Suas).
Boa leitura!
8
INTRODUÇÃO
O conhecimento produzido pelas ciências psicológicas tem se apresentado para a sociedade como 
vital para entendermos o homem contemporâneo. Pesquisas sobre processos subjetivos apontam para 
a importância de entendermos as experiências humanas no nosso mundo contemporâneo. Quando 
debatemos temas fundamentais como educação, saúde, assistência social, moradia, transporte etc., 
podemos sempre nos remeter a aspectos psicológicos que estão presentes nos processos sociais.
A psicologia e suas práticas profissionais tem cada vez mais apontado para a necessidade de dar 
atenção aos aspectos subjetivos para a busca do bem‑estar individual e coletivo. Temos que entender 
os processos que levam muitas pessoas no mundo contemporâneo a ter, por exemplo, depressão. Como 
a psicologia contribui para prevenção e tratamento? O que apontam as pesquisas mais recentes? Quais 
são as possibilidades de uma pessoa ser atendida nos sistemas público e privado? A busca por saúde, 
bem‑estar e dignidade tem no conhecimento das ciências psicológicas um alicerce básico.
Como a sociedade se mobiliza (ou não se mobiliza) para pensar na saúde mental e nos processos 
psicológicos? Como se constrói politicamente o debate sobre essas questões? A fim de respondermos 
essas questões, é preciso adentrarmos a seara das políticas públicas.
A relação da psicologia com as políticas públicas tem se estreitado nas últimas décadas, tanto pela 
identificação da necessidade de a sociedade entender melhor os processos psicológicos, quanto pelo 
aumento das pesquisas e das reflexões por parte das ciências psicológicas em torno das políticas públicas.
Assim, o estudante formando em psicologia deve ter noções sobre os processos de construção 
de políticas públicas e suas relações com as teorias e práticas psicológicas para sua futura atuação 
profissional, independentemente de suas escolhas dentro do mercado de trabalho.
Dessa forma, abordaremos a questão da constituição histórica do Estado moderno, trazendo um 
panorama histórico geral sobre sua constituição, bem como o percurso que culminou na constituição 
das chamadas “políticas sociais”. Apresentaremos, então, os fundamentos teórico‑históricos e 
político‑econômicos que formam a base da constituição de alguns modelos de proteção social existentes, 
discutidos por Behring (2006).
Depois, passaremos a um histórico das políticas públicas no Brasil, através de um panorama da 
constituição das políticas públicas no Brasil, tratando especificamente dos modos como o Estado 
moderno, particularmente no caso do Estado brasileiro, cria condições para determinadas formas de 
subjetividades.
Ao introduzirmos o tópico sobre o SUS e o Suas, principalmente seus princípios e diretrizes, trataremos 
especificamente dos elementos teóricos fundamentais para a compreensão adequada do papel do 
psicólogo na articulação com as políticas públicas de saúde e das políticas públicas de assistência social.
9
As discussões concernentes às ciências e práticas psicológicas serão introduzidas, abordando o 
conceito de psicologia e compromisso social, aprofundando a discussão sobre a relação entre psicologia 
e políticas públicas.
Faremos, então, uma discussão sobre a esfera de trabalho da psicologia no campo das políticas públicas 
de saúde, especialmente no SUS, relacionando os desafios teóricos e metodológicos, mas também éticos 
e políticos colocados pela configuração do campo e das experiências de vida das pessoas que fazem 
uso dos serviços de saúde. Traremos relatos de casos (anedóticos ou verdadeiros) da prática profissional, 
favorecendo a compreensão dos desafios para a concretização de um SUS marcado pela qualidade.
É importante abordamos a discussão sobre os desafios que o campo da assistência social traz para 
a atuação profissional em psicologia, especialmente no Suas. Assim, discutiremos os aspectos históricos 
da relação da psicologia com o campo da assistência social e o modo como aspectos relacionados à 
transição de noções, como “sujeito da caridade” para a de “sujeito de direito”, são importantes marcos 
na atuação profissional dos psicólogos no campo da assistência social.
Ao curso desta disciplina, se faz necessário apresentarmos algumas discussões da psicologia em 
outros campos das políticas públicas, como o tópico de violência e direitos humanos, quando visaremos 
trazer a discussão sobre a diversidade de possibilidades e de problemáticas que compõe o universo das 
relações entre psicologia e políticas públicas, tratando especificamente dos aspectos vinculados à saúde, 
à cultura, à violência, à educação, à liberdade religiosa, à liberdade de gênero, ao direito à verdade, dentre 
outros, que podem servir de base para discussões sobre os desafios atuais que a sociedade brasileira 
enfrenta e que colocam perguntas fundamentais às elaborações teóricas e às ferramentas práticas da 
psicologia por meio dos parâmetros e das referências construídas pelo Conselho Federal de Psicologia 
frente ao tema.
Também é importante abordar a psicologia e as políticas públicas voltadas ao uso de álcool e drogas, 
debatendo o uso e concedendo especial ênfase às diretrizes do SUS e às atuais políticas voltadas ao 
tema; e a interface entre psicologia, políticas públicas e educação, ressaltando o papel do profissional 
na democratização efetiva das instituições escolares. Ambas abordagens serão articuladas junto às 
questões culturais, sociais e ao compromisso do psicólogo na construção de um modelo desociedade 
democrática e na participação popular da elaboração, monitoramento e avaliação das políticas por meio 
dos parâmetros e das referências construídas pelo Conselho Federal de Psicologia quanto ao tema.
Por fim, faremos uma discussão sobre movimentos sociais e a construção de políticas públicas no 
campo da diversidade sexual, debatendo os movimentos sociais e a construção de políticas públicas, 
valendo‑se como campo específico de reflexão o tema da diversidade sexual, ressaltando o compromisso 
do psicólogo na construção de um modelo de sociedade democrática e a participação popular na 
elaboração, no monitoramento e na e avaliação das políticas.
Os tópicos abordados no presente material darão subsídio para o estudante de psicologia se informar 
e se aprofundar no debate fundamental da relação entre psicologia e políticas públicas. O material, no 
entanto, não esgota o debate. As referências bibliográficas que devem ser estudadas e as indicações de 
material de aprofundamento deverão servir como base de apoio para toda uma carreira profissional.
11
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
Unidade I
1 FUNDAMENTOS DAS POLÍTICAS DE ESTADO
1.1 Constituição do Estado moderno
O que são políticas sociais? Para responder a essa pergunta, e posteriormente construir o entendimento 
da importância da psicologia para as políticas públicas, devemos nos remeter a uma abordagem histórica 
do desenvolvimento das políticas sociais em relação à constituição do Estado moderno.
O Estado moderno surge a partir dos processos históricos que levam gradativamente ao fim da 
sociedade feudal e ascensão da burguesia nos poderes político e econômico. O capitalismo mercantil 
(considerado a primeira fase do capitalismo) marcou o início do poderio econômico da burguesia. 
Na medida que o domínio das rotas comerciais e a acumulação de riqueza na forma de dinheiro se 
estabeleciam para o gradual domínio econômico da burguesia, a nobreza feudal buscava se manter 
pela dominação política. A defesa da formação de um Estado centralizador, em oposição ao sistema 
fragmentado de feudos, foi determinante para que a burguesia passasse a exercer domínio político, 
além de econômico. O Estado centralizador atendia aos interesses burgueses na medida que delimitava 
territórios nacionais (onde o comércio poderia ser praticado sem interferência da nobreza). Além da 
questão territorial, o controle da força militar e a unificação de uma moeda (unidade de valor) nacional 
solidificaram o poderio político da burguesia, que financiava as atividades estatais para que seus 
interesses fossem atendidos.
Tendo em vista que o Estado moderno vai se consolidando historicamente com o desenvolvimento 
do capitalismo, a questão das políticas sociais acompanha, em cada período histórico, as necessidades 
e reivindicações daqueles que, à margem da sociedade, estavam em situação desfavorecida, econômica 
ou socialmente. Com a transição do modo de produção artesanal para o industrial (segunda fase do 
capitalismo), e consequente formação de contingentes populacionais em condições de pobreza extrema 
com o surgimento das grandes cidades, coloca‑se para a sociedade a seguinte pergunta: o que fazer 
com essas pessoas?
As respostas partiam das políticas sociais, calcadas em direitos sociais e critérios ético‑políticos 
para se pensar na questão. Ao longo da história do Estado moderno, a visão sobre as políticas sociais 
variou conforme os interesses dos diferentes grupos sociais, de acordo com as características do Estado 
em cada época. A passagem do Estado absolutista para o Estado liberal democrático, e as respectivas 
crises do Estado liberal, revelam que o debate sobre as políticas sociais sempre esteve presente. Como 
veremos a seguir, diferentes correntes político‑filosóficas e os diferentes pensadores que as representam 
acentuaram argumentos significativos para fomentar a discussão. Muitos dos pontos levantados por 
essas correntes são influentes até os dias de hoje, sendo necessário contextualizar cada período da 
história para compreender como as ideias e ideologias constituem a formatação das políticas sociais.
12
Unidade I
 Observação
Considera‑se que o capitalismo tem quatro fases: capitalismo comercial 
(século XV a XVIII), capitalismo industrial (século XVIII a XIX), capitalismo 
financeiro (século XX) e capitalismo informacional (final do século XX a 
século XXI). Alguns autores consideram que o capitalismo informacional 
faz parte da fase do capitalismo financeiro.
É importante entender como cada fase compreende e pratica as 
políticas sociais, de acordo com interesses e necessidades, considerando 
as formas específicas de produção e o papel das classes sociais nos 
processos produtivos.
 
A racionalidade é vista como um valor essencial para o desenvolvimento do Estado moderno, já 
que as leis baseadas em valores religiosos ou espirituais passam a ser abandonadas com a derrocada 
do sistema feudal. Nesse sentido, Maquiavel aponta para o Estado como uma espécie de mediador 
civilizador, cuja função seria controlar as paixões humanas, ou seja, de frear os desejos de se ter vantagens 
materiais uns sobre os outros. Hobbes tem uma visão complementar, apontando que os apetites e as 
aversões são bases para ações humanas voluntárias. Para esse pensador, a renúncia individual em favor 
de um monarca soberano é uma solução racionalizada para que as paixões humanas (irracionais) sejam 
controladas. Ou seja, uma primeira versão de Estado moderno, monárquico, nacionalista e centralizador, 
teve subsídio importante na ideia de que a população só poderia ser controlada na sujeição a um poder 
único e absoluto.
A monarquia absoluta passa a ser questionada por outros pensadores modernos, como Locke e 
Rousseau, que mantinham dos supracitados a ideia da necessidade de um Estado organizado, como 
forma de se defender da barbárie e da guerra, mas trazendo a defesa de um poder compartilhado 
coletivamente. Locke propõe um poder estabelecido pelo consentimento mútuo dos indivíduos, buscando 
preservar a vida, sendo colocada a necessidade de um pacto social. A noção de propriedade como direito 
individual, e o respeito mútuo à propriedade alheia, é o alicerce para que haja uma sociedade justa 
e equitativa. Já Rousseau indica que a propriedade é a base da desigualdade, e serviria apenas para 
proteção de interesses dos mais ricos e poderosos. O que tem em comum com Locke é a defesa de um 
pacto social, mas a ideia de poder para o pensador francês está na cidadania, não na propriedade.
Rousseau foi um dos mais influentes na Revolução Francesa, ao combater o Estado absolutista e 
propor mecanismos políticos calcados na democracia para que se pudesse atingir uma condição coletiva 
de bem‑comum. Aqui vemos uma proposição de ideais democráticos de um Estado de direito. A vontade 
geral é a base para as leis e a governança, sempre voltada para o interesse coletivo. Busca‑se, dessa forma, 
o estabelecimento de justiça, acesso a direitos e promoção de bem‑estar coletivo. Vemos que as noções de 
política social e políticas públicas começam a ter seus fundamentos no período histórico de definição 
do Estado moderno. Como sabemos, entre os séculos XVIII e XIX houve uma série de revoluções importantes 
para a consolidação do Estado moderno, destacando‑se a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. 
13
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
A partir dessa era, as questões sociais referentes à defesa de direitos universais, ao combate à desigualdade 
e ao estabelecimento de garantia de condições mínimas de vida (moradia, trabalho, renda, educação, 
saúde, entre outros) se colocaram como centrais na disputa de ideias e práticas políticas. Dessa forma, a 
história das reivindicações por políticas sociais, sempre em um terreno de lutas, tensões e conflitos, tem 
influência direta para nossa experiência humana até os dias de hoje.
 Saiba mais
Pare se aprofundar nas questões sobre os fundamentos das políticas 
sociais, recomendamos os seguintes textos:BEHRING, E. R. Fundamentos de política social. In: MOTA, A. E. (org.). 
Serviço social e saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez: 
Opas/OMS/Ministério da Saúde, 2006.
BOBBIO, N. Estado, governo e sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.
CASTEL, R. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. 
Petrópolis: Vozes, 1998.
COIMBRA, M. A. et al. Política social e combate à pobreza. Rio de Janeiro: 
Zahar, 1987.
TEIXEIRA, L. G. Compreender o liberalismo: crítica a partir da utopia. 
Curitiba: CRV, 2013.
 
1.2 Fundamentos dos modelos de proteção social
Cabe aqui entrarmos em contato com a construção histórica dos diferentes argumentos e interesses 
que pautam a formulação das políticas sociais. Quais são as necessidades da população? Como são vistas 
as questões relativas a essas necessidades? Quais são os princípios que pautam a garantia de direitos 
para toda a população? Como se enxerga a desigualdade e o combate à desigualdade? As respostas para 
essas perguntas passam necessariamente pelos períodos históricos da modernidade, lançando luz sobre 
as diferentes fases econômicas do modo de produção capitalista (passando inclusive pelas propostas 
antagônicas ao capitalismo) e sobre as diferentes fases políticas na história mundial.
O liberalismo abarca uma corrente de ideias que será crucial para a compreensão proposta sobre 
os processos históricos. Ora com mais força, ora com menos, as bases liberais constituirão pontos 
fundamentais para se pensar nas políticas sociais.
Adam Smith foi um dos principais idealizadores do liberalismo, dizendo que as práticas econômicas 
deveriam ser relegadas aos indivíduos sem interferências externas, ou com o mínimo necessário. 
14
Unidade I
O mercado liberal deixaria para o Estado a função de garantir as liberdades individuais. Ao buscarem 
os ganhos materiais, os indivíduos, de acordo com o autor, seriam orientados pela moral e pelo desejo 
de ausência de guerras e conflitos prejudiciais à coletividade. Dessa forma, não haveria necessidade de 
intervenção do Estado para a busca do bem‑estar, já que este estaria garantido pela liberdade individual. 
O cidadão é, de acordo com o autor, livre para decidir como buscar sua subsistência material. Assim, 
quanto mais interferência, menor a liberdade.
A individualidade é um valor que se instaura na era moderna. Portanto, as liberdades individuais são 
fundamentais para a utopia liberal. A busca pela liberdade seria mais efetiva com um Estado mínimo, 
pois as leis do mercado “naturalmente” guiariam os homens na busca pelo bem‑estar; aí reside a ideia 
de “mão invisível”.
Atrelada à filosofia liberal, surge a ideia de um “darwinismo social”, no qual os homens seriam 
selecionados socialmente de acordo com sua adaptabilidade à sociedade. Nessa ótica, as políticas sociais 
se tornariam contrárias à “natureza” econômica da humanidade. A subsistência seria gerada pela própria 
necessidade, e leis que possam garanti‑la a partir do Estado levariam as pessoas a não produzir seus 
próprios meios de sustento.
O liberalismo vai aos poucos encontrando mais espaço na economia ao longo da Revolução 
Industrial. A ideia de que o homem se sustenta encaixa perfeitamente à necessidade de mão de obra 
fabril. O trabalhador é livre, e deve produzir seu sustento a partir das bases materiais disponíveis, gerando 
a ideia da meritocracia.
No entanto, na segunda metade do século XIX, a economia capitalista vai se esgotando a partir do 
surgimento de monopólios e oligopólios econômicos. Ao mesmo tempo, os trabalhadores passam a se 
organizar para reivindicar melhores condições de vida e de trabalho. Com as crises econômicas do início 
do século XX, a ideia de que o Estado precisa intervir na economia e gerar políticas sociais de proteção 
ao cidadão cresce com força. Encontraremos em um autor, Keynes, a ideia de que o Estado precisa 
intervir na economia para evitar crises, gerar crescimento econômico e garantir o bem‑estar e o acesso 
de direitos básicos da população.
A expressão teórica e intelectual dessa limitada autocrítica burguesa teve seu maior expoente em 
John Maynard Keynes, com o livro A teoria geral do emprego, do juro e da moeda, de 1936. Com a 
curiosidade intelectual aguçada pelos acontecimentos do final dos anos 1920, este economista inglês se 
afasta da ortodoxia em que foi formado. A situação de desemprego generalizado dos fatores de produção 
– homens, matérias primas e auxiliares, e máquinas –, no contexto da depressão, indicava que alguns 
pressupostos clássicos e neoclássicos da economia política não explicavam os acontecimentos. Keynes 
questionou alguns deles, pois via a economia como ciência moral, não natural; considerava insuficiente 
a Lei de Say (Lei dos Mercados), segundo a qual a oferta cria sua própria demanda, impossibilitando uma 
crise geral de superprodução; e, nesse sentido, colocava em questão o conceito de equilíbrio econômico, 
segundo o qual a economia capitalista é autorregulável.
O economista inglês via com crítica a lei dos mercados como uma “lei natural”, pois considerava que os 
pressupostos de uma economia totalmente liberal não explicariam um contexto de depressão econômica. 
15
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
A economia seria, para Keynes, mais uma ciência moral que natural. Assim sendo, seria esperado que um 
empresário investisse mais onde obtivesse um retorno imediato, e não onde influenciasse o conjunto 
global da economia.
Assim, a operação da mão invisível não necessariamente produz a harmonia 
entre o interesse egoísta dos agentes econômicos e o bem‑estar global. As 
escolhas individuais entre investir ou entesourar, por parte do empresariado, 
ou entre comprar ou poupar, por parte dos consumidores e assalariados 
podem gerar situações de crise, onde há insuficiência de demanda efetiva, 
e ociosidade de homens e máquinas (desemprego) (Behring, 2006, p. 8‑9).
Dessa forma, Keynes considera que o Estado tem a prerrogativa para adotar medidas econômicas que 
visem o crescimento como um todo, bem como intervir, quando necessário, em formas que protejam 
a economia de suas flutuações, como gerar demanda efetiva, disponibilizando meios de pagamento e 
garantia de retorno aos investimentos (mesmo que haja déficit público).
Segundo Keynes, cabe ao Estado o papel de restabelecer o equilíbrio 
econômico, por meio de uma política fiscal, creditícia e de gastos, realizando 
investimentos ou inversões reais que atuem nos períodos de depressão como 
estímulo à economia. Dessa política resultaria um déficit sistemático no 
orçamento. Nas fases de prosperidade, ao contrário, o Estado deve manter 
uma política tributária alta, formando um superávit, que deve ser utilizado 
para o pagamento das dívidas públicas e para a formação de um fundo de 
reserva a ser investido nos períodos de depressão (Behring, 2006, p. 9).
O pensamento de Keynes veio bem a calhar para a economia capitalista de Estado no contexto da 
Guerra Fria. No meio de uma guerra ideológica, em que a defesa do capitalismo se fazia necessária 
ante o desenvolvimento social dos países socialistas, a intervenção estatal na economia se atrelava à 
promoção de políticas sociais. Agregado ao pacto fordista (produção e consumo em massa), a defesa 
do Estado forte se colocava diante do aparente sucesso social dos países capitalistas desenvolvidos. 
Nota‑se o “American dream” (em português, “sonho americano”) como resultado de investimento do 
Estado para que o setor privado garantisse emprego e conforto para a população (ou, a maior parte dela, 
já que, por exemplo, nos Estados Unidos, a população negra estava excluída desse processo).
Outro pensador importante para citar a questão social no século XX foi Thomas Humphrey Marshall, 
sociólogo inglês que influenciou o pensamento e a formulação de políticas públicas na Inglaterra 
e em outros países. Para ele, a educação era o único direito social inquestionável, o que definiria a 
igualdade humana. Partindo do ideário liberal, esse pensamentovê a cidadania como o exercício dos 
direitos individuais, inclusive a competitividade de mercado. Assim, para Marshall, a cidadania se faz na 
combinação entre acumulação e equidade.
Para T. H. Marshall, o conceito de cidadania, em sua fase madura, comporta: 
as liberdades individuais, expressas pelos direitos civis – direito de ir e vir, 
de imprensa, de fé, de propriedade –, institucionalizados pelos tribunais de 
16
Unidade I
justiça; os direitos políticos – de votar e ser votado, diga‑se, participar do 
poder político – por meio do parlamento e do governo; e os direitos sociais, 
caracterizados como o acesso a um mínimo de bem‑estar econômico e de 
segurança, com vistas a levar a vida de um ser civilizado (Behring, 2006, p. 10).
A experiência do Estado de bem‑estar social europeu balizava seu pensamento e, a despeito 
das diferenças culturais nacionais, considerava que havia um ponto ideal a ser alcançado a partir 
desse parâmetro.
O que parecia no pensamento de Marshall um ideal foi severamente criticado, pois um elemento 
fundamental da questão social acabava sendo desconsiderado: as contradições presentes na política 
social. Ou seja, aquilo que Marshall tinha como um ponto ideal a ser alcançado (em uma tese que se 
aproxima à ideia de “fim da história”), jamais será possível, dado que uma zona de conflito é inerente às 
relações sociais. De qualquer forma, a despeito das críticas, o autor influenciou muitos de sua geração.
Os pensamentos de Keynes e Marshall foram se desfazendo na própria dinâmica social à medida 
que o capitalismo foi conhecendo suas recorrentes crises e esbarrando na saturação das formas de 
acumulação. As convulsões sociais do fim da década de 1960 que traziam as reivindicações por direitos 
civis, atreladas a um crescente desemprego, chegam à crise do petróleo de 1973, esfacelando o sonho de 
cidadania plena relacionada à proteção social. Com o crescimento da dívida pública, o papel do Estado 
passa a ser questionado enquanto financiador do bem‑estar, e o pensamento liberal passa a ganhar 
força novamente, apregoando o Estado mínimo. Dessa forma, as políticas sociais passam a ser cada vez 
mais revistas e escamoteadas.
No decorrer da década de 1980, ao se deparar com o declínio econômico e a crescente reivindicação 
pelas liberdades individuais nos países do bloco socialista, os países capitalistas passam a prescindir do 
Estado de bem‑estar social como propaganda. Com a consolidação da derrocada socialista na década 
de 1990, o liberalismo volta à crista da onda, recorrendo a um pensador que é considerado pioneiro no 
chamado neoliberalismo: Friedrich Von Hayek.
Com esse advento, as teses neoliberais ganham força, culpando os sindicatos e as políticas sociais 
estatais pelas crises econômicas, já que, em comum, os dois setores buscavam no salário a sustentação 
da visão do bem‑estar social.
A fórmula neoliberal para sair da crise pode ser resumida em algumas 
proposições básicas: 1) um Estado forte para romper o poder dos 
sindicatos e controlar a moeda; 2) um Estado parco para os gastos sociais 
e regulamentações econômicas; 3) a busca da estabilidade monetária como 
meta suprema; 4) uma forte disciplina orçamentária, diga‑se, contenção dos 
gastos sociais e restauração de uma taxa natural de desemprego; 5) uma 
reforma fiscal, diminuindo os impostos sobre os rendimentos mais altos; 
e 6) o desmonte dos direitos sociais, implicando na quebra da vinculação 
entre política social e esses direitos, que compunha o pacto político do 
período anterior (Behring, 2006, p. 12‑13).
17
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
Já nos anos 1980 os governos de Inglaterra (Thatcher), Estados Unidos (Reagan) e Alemanha 
Ocidental (Khol) implementam políticas de estrangulamento dos direitos sociais. O que se vê a partir 
da década de 1990 é, em escala global, crescimento da pobreza e do desemprego, acompanhando a 
financeirização do capitalismo e o avanço dos setores de serviço e de tecnologia. Os direitos trabalhistas 
são esmagados pelas novas políticas sociais do trabalho, em nome de uma flexibilização das relações e 
dos contratos de trabalho.
No século XXI, com o avanço das tecnologias de informação e comunicação, e do avanço tecnológico 
dos processos produtivos, temos um capitalismo globalizado que passa por crises cíclicas e que se reinventa 
a partir da criação de novas demandas. Os direitos sociais, nesse panorama, passam a se sustentar na 
zona de conflitos entre os movimentos de reivindicação (há o crescimento das pautas identitárias, como 
os movimentos negro, feministas, indígenas, LGBTQIAPN+ etc., e também das pautas ambientalistas) e o 
malabarismo dos Estados em angariar força política e amparar as elites econômicas.
Grande exemplo do novo panorama é a chamada “uberização” do trabalho, baseada nos serviços 
de transporte da Uber, na qual o trabalhador é um profissional “autônomo”, sendo responsável pelos 
seus meios de trabalho, mas que fica na dependência total da empresa, por meio de sua tecnologia 
desenvolvida no aplicativo de aparelho celular. Curiosamente, o discurso neoliberal se consolida de 
tal forma, que muitos dos trabalhadores que são “motoristas de aplicativo” são contra a adoção 
de proteção social, argumentando que a taxação dos serviços por parte do Estado, que traria benefícios 
previdenciários ao trabalhador, resultaria em perda de rendimento imediato. Ou seja, quem necessita da 
proteção social por meio de políticas públicas se volta contra elas.
2 HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL
2.1 Panorama geral da constituição de políticas públicas no Brasil
O Brasil é um país que se constitui no colonialismo escravista e, embora tenha havido intensa 
transformação social e política a partir de meados do século XIX, os valores referentes à escravização e 
à prática de clientelismo político da colônia permeiam, de alguma forma, até os dias de hoje, inclusive 
nos ataques às políticas sociais.
Após a proclamação da República em 1889, tínhamos um cenário de um Estado conservador, 
centralizador e autoritário. O desenvolvimento econômico não necessariamente promovia 
desenvolvimento social. Na primeira metade do século XX, o Estado brasileiro, sustentado pelas suas 
elites, tem um objetivo final de consolidar a industrialização.
O Estado desempenhava a função de promover a acumulação privada na esfera 
produtiva. O essencial das políticas públicas estava voltado para promover 
o crescimento econômico, acelerando o processo de industrialização, o que 
era pretendido pelo Estado brasileiro, sem a transformação das relações de 
propriedade na sociedade brasileira (Araújo, 2003, p. 1).
18
Unidade I
Tendo como principal objetivo o crescimento econômico, no campo das garantias de direitos sociais, 
o Estado brasileiro tinha uma prática muito mais voltada para o “fazer” (conforme seus interesses) do 
que regular as políticas públicas. O autoritarismo presente em duas ditaduras (Estado Novo varguista, de 
1937 a 1945, e ditadura militar, de 1964 a 1985) demonstra uma tendência centralizadora, que atende 
as demandas das elites econômicas, deixando a regulação de políticas públicas em segundo plano, 
porém ainda houve regulações nas políticas que iam de encontro ao interesse econômico – como a 
Consolidação das Leis Trabalhistas, que serviram ao desenvolvimento da industrialização.
Não havia a necessidade de legitimação das políticas sociais, dado o caráter autoritário. Não obstante 
houvesse resistência de setores populares e intelectuais, a maior parte deles eram brutalmente reprimidos, 
já que, tanto na ditadura varguista quanto na do período militar a relação com os movimentos sociais 
era pautada com violência e repressão.
Entretanto, que tipo de ação o Estado praticou? O Estado brasileiro fez de tudo para promover o projeto 
industrial: financiou, protegeu, criou alíquotas, produziu insumos básicos. As estatais, que estão sendo 
privatizadas agora, produziam insumos básicos. Nas atividades mais pesadas, de investimento expressivoe com taxa de retorno mais lento, houve participação do setor estatal produtivo. A produção de aço, a 
mineração, a produção de petróleo e de energia têm a mesma natureza: são insumo básico.
O Estado investiu em projetos grandes, onerosos, com taxas de retorno 
mais lentas, para possibilitar que o setor produtivo privado ficasse com o 
mais leve e rapidamente rentável. O que se fez de rodovias, de portos, de 
instalações de telecomunicações nesse país, nos últimos anos, é inimaginável. 
E quem foi responsável por todas essas realizações? O Estado brasileiro 
(Araújo, 2003, p. 1).
Agora, parte dessa estrutura está sendo desmontada, devido às privatizações. O Estado brasileiro 
investiu fortemente, até a consolidação da industrialização, em criar empresas estatais que produzissem 
insumos básicos, como aço, petróleo, mineração e energia.
No período da ditadura militar políticas econômicas que caracterizaram o chamado “milagre 
econômico” denotam, mais uma vez, grande investimento em infraestrutura e incentivo ao crescimento 
sob a ideia do “progresso”, ao mesmo tempo que a desigualdade social e econômica cresceu. Com a crise 
do petróleo e o início de um ciclo de crises de acumulação do capital global, o Brasil viu o “milagre” 
findar. A situação da população pobre e marginalizada piorou.
A década de 1970 viu, apesar da repressão política, um aumento da insatisfação popular, mesmo 
diante da propaganda do regime, culminando na virada para a década de 1980 no crescimento de 
movimentos populares, ligados ao trabalho (sindicatos e oposições sindicais a sindicatos ligados ao 
regime), à questão campesina, estudantil e movimentos de cidadãos insatisfeitos com as condições de 
vida, como os movimentos ligados ao combate à fome e ao direito à saúde.
Em contrapartida, a década de 1980 foi um momento crucial para a chamada transição democrática, 
no bojo dos movimentos sociais e políticos. Embora o panorama dos países desenvolvidos visse um 
19
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
aperto no investimento público e uma dinâmica rumo às privatizações e desmonte de políticas de 
bem‑estar social, como nos casos de Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha, o clima no Brasil foi propício 
para a formulação da Constituição Cidadã, já no término do regime ditatorial militar, Constituição essa 
promulgada em 1988.
Apesar de a Constituição trazer uma visão pautada nos direitos humanos e na democracia, não foi 
sem resistência das elites que a implementação das políticas públicas se deu.
A transição democrática no Brasil foi, na verdade, um pacto conservador 
interelites, com forte caráter “negociado” e “pelo alto” que acabou por gerar 
uma fissura na coalizão governista com sérios impactos nos rumos das 
políticas sociais no país. Enquanto um grupo queria a expansão dos direitos 
sociais, o outro, constituído pelos setores conservadores – com epicentro 
no Executivo federal – buscava obstruir esse processo tanto na Assembleia 
Nacional Constituinte como na regulamentação constitucional complementar. 
Nesse momento há uma primazia das ações assistencialistas‑clientelistas, 
com fragmentação e sobreposição de programas em todos os setores, que 
por muitas vezes eram geridos com inúmeras denúncias de corrupção e 
favorecimento, que mancharam tal filosofia (Pinheiro Junior, 2014, p. 9).
De qualquer modo, a implementação do SUS e do Suas são marcos importantes na história das 
políticas públicas brasileiras. O princípio da universalidade, por exemplo, denota uma legislação de 
grande avanço para o acesso do cidadão aos serviços públicos.
As décadas seguintes à Constituição são marcadas por diferentes entendimentos e princípios dos 
governos federais (e também nos estaduais e municipais) em relação ao investimento em políticas 
públicas, variando entre maior ou menor investimento público, o que tem gerado desde a virada do 
século um campo de disputa constante nos setores sociais e políticos.
Um exemplo desses embates se deu na pandemia do covid‑19, em que, logo após a aprovação de 
corte de gastos públicos significativos, que afetavam o SUS, o país vivenciou como nunca a importância 
de um sistema de saúde de acesso universal.
2.2 Estado brasileiro e as condições subjetivas
Assim, o debate sobre as políticas sociais tende a ganhar novos matizes quando se beneficia do 
conhecimento científico da psicologia, especialmente de uma vertente da psicologia que seja crítica e 
que se apoie nos preceitos da ética e dos direitos humanos.
Como se verá adiante, em termos de atuação profissional, há muito que contribuir por parte da 
psicologia. Tão importante quanto o fazer é o olhar crítico para uma análise psicossocial, e, nessa 
medida, cabe aqui entender a dimensão subjetiva que vivenciamos em termos de políticas públicas e da 
dinâmica social.
20
Unidade I
As ideias liberais têm, sem dúvida, um alcance global na maneira de constituição das subjetividades. 
Calcada em valores individualistas, o liberalismo defende que há uma liberdade inalienável para que o 
indivíduo se desenvolva plenamente. A própria ideia de indivíduo enquanto célula social é consolidada 
pelo liberalismo.
Essa liberdade individual, no entanto, tem um lugar bem definido, que é o mercado. O indivíduo é 
livre para produzir, por meio do trabalho, e consumir a mercadoria que tem possibilidade de comprar. Os 
direitos civis e políticos estão ligados diretamente à liberdade individual.
Evidentemente, essa individualidade não é qualquer uma, é aquela que se 
adequa aos limites do mercado. Tanto é assim, que outro aspecto presente 
nas políticas, as quais nesse período apresentam‑se de forma ainda difusa, 
refere‑se à obrigatoriedade do trabalho, que é imposto sob a alegação moral 
de que a vadiagem é um mal a ser combatido (Gonçalves, 2010, p. 66).
A liberdade de empreender encontra limites na configuração do mercado monopolista. Ou seja, atrás 
da ideia de que qualquer um tem o direito de constituir um empreendimento pela sua competência 
individual, está a ilusão da igualdade de oportunidades. De qualquer forma, o convencimento da 
liberdade individual se dá pela possibilidade de desejar e consumir. O Estado, além de mediar o processo 
produtivo com seu poder, funciona como disciplinador da condição de classe. Surge, respaldada pelas 
ciências médicas, sociais e até pela psicologia, a ideia de normalidade. Dessa forma, cabe à educação 
treinar os indivíduos para ser um “cidadão de bem”, adaptado ao ciclo do capital, do qual o indivíduo faz 
parte. A visão sobre as políticas sociais, dessa forma, recai na lógica privatista.
Em função disso, as políticas sociais se esvaziam de conteúdos e de direitos, 
uma vez que os direitos tinham relação com o lugar do trabalho. Também 
ocorre uma mistura dos direitos com o consumo. A privatização das 
políticas sociais e a diminuição da responsabilidade do Estado para com 
elas colocam as ações de proteção aos indivíduos e atendimento de suas 
diversas necessidades como uma questão de consumo como outra qualquer. 
Os serviços, todos eles, inclusive os anteriormente ligados a direitos (saúde, 
educação, segurança, cultura) passam, deliberadamente, a ser mercadorias 
(Gonçalves, 2010, p. 68‑69).
A racionalidade científica faz com que o pensamento moderno se consolide em busca de objetividade. 
assim, a percepção dos aspectos subjetivos fica encoberta por critérios advindos da racionalidade e 
da naturalização.
Dessa forma, a experiência subjetiva alienada do próprio sujeito tende a descolar o indivíduo 
das relações sociais. Exemplo dessa constatação é o rompimento de vínculos sociais, principalmente 
em condições de pobreza e desigualdade, em que a fragilização dos vínculos (familiar, comunitário, 
institucional) leva o indivíduo ao isolamento. Tal processo é entendido como de responsabilidade do 
indivíduo, fazendo que processos de estigmatização e preconceito reforcem a percepção alienada. 
Mesmo a diversidade cultural é absorvida pela lógica do consumo, quando incorporada ao ideário liberal.
21
POLÍTICASPÚBLICAS E PSICOLOGIA
 Observação
O Brasil foi constituído historicamente no processo de escravidão. 
Embora a escravidão tenha sido oficialmente abolida, os valores a ela 
atrelados permanecem em práticas sociais e culturais, resultando em 
preconceito e violência. O entendimento da subjetividade nas políticas 
públicas deve necessariamente passar pela análise da constituição do país 
a partir do racismo e da desigualdade.
 
No caso brasileiro, o ideário liberal se torna ainda mais complexo quando levamos em conta a 
condição da desigualdade herdada da escravidão. Ao ter a escravidão abolida, vê‑se o que o sociólogo 
Jessé Souza chama de formação da “ralé” (Souza, 2017). Os ex‑escravizados (ou “ex‑escravos”, como 
utilizado pelo autor) são lançados à própria sorte em relações sociais da lógica competitiva.
Como todo processo de escravidão pressupõe a animalização e humilhação 
do escravo e a destruição progressiva de sua humanidade, como o direito ao 
reconhecimento e à autoestima, a possibilidade de ter família, interesses próprios 
e planejar a própria vida, libertá‑lo sem ajuda equivale a uma condenação eterna.
[…] O ex‑escravo é jogado dentro de uma ordem social competitiva, como 
diz Florestan, que ele não conhecia e para qual ele não havia sido preparado. 
Para os grandes senhores de terra, a libertação foi uma dádiva: não apenas 
se viram livres de qualquer obrigação com os ex‑escravos que antes 
exploravam, mas puderam “escolher” entre a absorção dos ex‑escravos, o 
uso da mão de obra estrangeira que chegava de modo abundante ao país – 
cuja importação os senhores haviam conseguido transformar em “política 
de Estado” – e a utilização dos nacionais não escravos. Estes últimos 
haviam evitado os trabalhos manuais como símbolo de degradação quando 
monopolizados pelos escravos (Souza, 2017, p. 74‑75).
Na transição de uma economia agrária para a industrialização, a livre concorrência colocava o 
negro em competição com o imigrante europeu (seja na lavoura, seja na fábrica), que chega ao Brasil 
a partir de políticas escancaradas de “embranquecimento populacional”. A visão que se tem do branco 
europeu é de alguém que vai trazer a experiência de países que já experimentam o progresso industrial.
O negro torna‑se vítima da violência mais covarde. Tendo sido animalizado 
como “tração muscular” em serviços pesados e estigmatizado como trabalhador 
manual desqualificado – que mesmo os brancos pobres evitavam –, é exigido 
dele agora que se torne trabalhador orgulhoso de seu trabalho. O mesmo 
trabalho que pouco antes era o símbolo de sua desumanidade e condição 
inferior. Ele foi jogado em competição feroz com o italiano, para quem o 
trabalho sempre havia sido motivo principal de orgulho e de autoestima. Belo 
início da sociedade “competitiva” entre nós (Souza, 2017, p. 77).
22
Unidade I
A busca por um lugar social de reconhecimento por parte dos negros faz com que recaiam em 
valores brancos para galgarem um mínimo de possibilidade de inserção no mundo do trabalho, lutando 
arduamente com o estigma de “vagabundo e preguiçoso”. O ódio de classe se constitui sobre o racismo. 
A vivência histórica dessa posição social jamais foi superada no Brasil, denotando como, mais uma vez, 
e nesse caso específico, a subjetividade se constrói na política de Estado. Essa herança passa de geração 
para geração, sem mediação para o entendimento de tal sofrimento (ou, pelo menos, os movimentos 
coletivos reivindicatórios se constituem em possibilidade de mediação, mas ainda alcançando pequena 
parte da população, que se molda subjetivamente à lógica privatista e consumista).
É o desconhecimento da hierarquia moral, especificamente capitalista e não 
mais escravocrata, que produz de modo novo tanto a distinção que legitima 
as novas formas de privilégio quanto o preconceito que marginaliza e 
oprime em violência aberta ou muda (Souza, 2017, p. 81).
A experiência de classe e, consequentemente, racial, se dá na socialização, mediada pelas instituições 
sociais, sendo a família a instituição primária. “As classes são reproduzidas no tempo pela família e 
pela transmissão afetiva de uma dada ‘economia emocional’ pelos pais aos filhos” (Souza, 2017, p. 88). 
A classe social, fruto da estrutura social e também de políticas públicas, é, portanto, para o autor, um 
fenômeno não apenas econômico, mas sociocultural, ao que podemos complementar, psicossocial.
São os estímulos que a criança de classe média recebe em casa para o 
hábito de leitura, para a imaginação, o reforço constante de sua capacidade 
e autoestima, que fazem com que os filhos dessa classe sejam destinados ao 
sucesso escolar e depois ao sucesso profissional no mercado de trabalho. Os 
filhos dos trabalhadores precários, sem os mesmos estímulos ao espírito e 
que brincam com o carrinho de mão do pai servente de pedreiro, aprendem 
a ser afetivamente, pela identificação com quem se ama, trabalhadores 
manuais desqualificados. A dificuldade na escola é muito maior pela falta de 
exemplos em casa, condenando essa classe ao fracasso escolar e mais tarde 
ao fracasso profissional no mercado de trabalho competitivo.
Na base da nova hierarquia social moderna está a luta entre indivíduos 
e classes sociais pelo acesso a capitais, ou seja, tudo aquilo que funcione 
como facilitador na competição social de indivíduos e classes por todos 
os recursos escassos. Como, na verdade, todos os recursos são escassos e 
não apenas os recursos materiais como carros, roupas e casas, mas também 
os imateriais como prestígio, reconhecimento, respeito, charme ou beleza, 
toda a nossa vida é pré‑decidida pela posse ou ausência desses capitais 
(Souza, 2017, p. 90).
O pensamento de Jessé Souza nos mostra como a psicologia pode contribuir para o entendimento 
da subjetividade nas políticas públicas. As noções de direitos e de política, no panorama apresentado 
pelo autor, se desmancham frente à necessidade de sobrevivência pautada na lógica liberal “à brasileira”. 
Pois é a própria política pública, se pensada a partir de critérios da subjetividade, que pode ser fator 
23
POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
de transformação social e promoção de direitos. “Nesse sentido, a Psicologia pode contribuir para a 
elaboração de políticas dizendo o que constitui a dimensão subjetiva e como ela pode se configurar de 
acordo com um projeto de sociedade determinado“ (Gonçalves, 2010, p. 75).
 Lembrete
A história política e social de um país ou de determinada região geográfica 
passa, de acordo com as teorias da psicologia social, pela vivência subjetiva 
dos atores sociais. Para que se possa refletir sobre políticas públicas, o 
conhecimento científico da psicologia é importante, pois, para além dos 
resultados estatísticos, os processos subjetivos nos trazem parâmetros 
sobre as necessidades das populações.
 
3 INTRODUÇÃO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)
3.1 Princípios e diretrizes do SUS
No Brasil, os primeiros esforços de organização estatal de serviços de saúde se dão na década de 
1920 com a Lei Eloy Chaves, que aponta para a seguridade de trabalhadores de setores organizados 
específicos. As chamadas “caixas” se configuram em uma estratégia de apaziguação de conflitos com 
a classe trabalhadora, que passa a ter acesso a serviços de saúde conforme algumas reivindicações. Os 
serviços médicos eram destinados apenas a trabalhadores, ou seja, não era um sistema com o princípio 
da universalidade. Em 1966, com a criação do Instituto Nacional de Previdência e Saúde (INPS), as 
“caixas” são reorganizadas e unificadas em um modelo que une previdência (o INPS era responsável pela 
aposentadoria) e saúde.
É interessante notar que o INPS encontra nas “caixas” uma oferta insuficiente de serviços, 
encontrando como solução os convênios e terceirizações, pagando por serviços privados. Nesse sistema 
está o embrião do que hoje encontramos nos planos de saúde privados. O sistema do INPS se baseava 
em um modelo médico de assistência individualizada, ao mesmo tempo que surgia, nadécada de 1970, 
uma incipiente tentativa de implementação de saúde pública por meio do Ministério da Saúde, que 
trazia medidas médico‑sanitárias. É nesse período que se observam algumas tendências, como:
[...] a extensão da cobertura previdenciária de modo a incluir toda a 
população urbana e parte da rural; a reorientação para uma prática 
médico‑curativa individual, em detrimento de medidas de Saúde Pública 
de caráter preventivo e de interesse coletivo; a alocação preferencial de 
recursos previdenciários para a compra de serviços de prestadores privados, 
propiciando a mercantilização e empresariamento da Medicina e a expansão 
da base tecnológica da rede de serviços e de consumo de medicamentos 
(Spink; Mattel, 2010, p. 38).
24
Unidade I
No final da década de 1970, no bojo do crescimento de movimentos sociais de resistência à ditadura 
e de defesa da democratização, surge, com a participação de “profissionais de saúde, intelectuais, 
organizações populares e membros da própria burocracia estatal” (Spink; Mattel, 2010, p. 38), o Movimento 
Sanitarista, que mobiliza uma grande discussão sobre modelos de saúde no país, ao identificar que o 
modelo vigente não dava conta da demanda. Em 1976, surge o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde 
(Cebes), que fomenta pesquisas e publicações em torno do debate da saúde pública. Em 1979, foi criada 
a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), que engrossa o coro por reivindicação por um novo 
modelo de saúde, trazendo a ideia de um sistema único.
Esses debates e a crescente aceitação dos problemas do modelo vigente de 
atenção à saúde levaram a uma série de medidas intermediárias. Em 1975, 
buscando dar maior racionalidade aos serviços de saúde, foi promulgada 
a Lei 6.229, que criou o Sistema Nacional de Saúde, definindo‑o como o 
complexo de serviços (do setor público e privado) voltados às ações de 
interesse da Saúde, abrangendo ações de promoção, proteção e recuperação 
da saúde (embora mantendo a separação organizacional entre o Ministério 
da Saúde e o da Previdência e Assistência Social). Em 1983/1984 foi 
formulado o projeto de Ações Integradas de Saúde, que adotou os princípios 
de universalização, descentralização e integração dos serviços de saúde, 
estabelecendo convênios entre União, estados e municípios na perspectiva 
dos ideais da constituição de um sistema único e descentralizado. Em 
1986, foi realizada a 8ª Conferência Nacional de Saúde, resultante de longo 
processo de preparação e discussão sobre a questão da saúde envolvendo 
profissionais de saúde, intelectuais, centrais de trabalhadores, movimentos 
populares e partidos políticos. Seu relatório final serviu como subsídio para 
os deputados constituintes elaborarem o artigo 196 da Constituição Federal 
sobre a Saúde (Spink; Mattel, 2010, p. 39).
A Constituição de 1988, que muito deve ao Movimento Sanitário, reconhece a saúde como direito 
de todas as pessoas e dever do Estado. Ainda, a Constituição promove a perspectiva de organização 
descentralizada, que possibilita que os diversos municípios elaborem políticas pertinentes à realidade 
local. O texto constitucional referenda os princípios básicos do SUS: universalidade, gratuidade, 
integralidade e organização descentralizada.
• Universalidade: é a garantia de atenção à saúde por parte do sistema a todo e qualquer cidadão. 
Com a universalidade, o indivíduo passa a ter direito de acesso a todos os serviços públicos de 
saúde, assim como àqueles contratados pelo poder público, sendo a saúde direito de cidadania e 
dever do governo municipal, estadual e federal.
• Equidade: é assegurar ações e serviços de todos os níveis de acordo com a complexidade 
que cada caso requeira, independentemente de onde o indivíduo mora. Todo cidadão é igual 
perante o SUS e será atendido conforme suas necessidades até o limite do que o sistema puder 
oferecer para todos.
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POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
• Integralidade: é o reconhecimento na prática dos serviços de que cada pessoa é um todo 
indivisível e integrante de uma comunidade; as ações de promoção, proteção e recuperação da 
saúde formam também um todo indivisível e não podem ser compartimentalizadas; as unidades 
prestadoras de serviço, com seus diversos graus de complexidade, formam também um todo 
indivisível, configurando um sistema capaz de prestar assistência integral.
Com base nesse texto constitucional, foi aprovada a Lei n. 8.080, que dispõe sobre as condições 
para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos 
serviços correspondentes.
 Saiba mais
Leia a lei que estabelece o SUS.
BRASIL. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Brasília, 1990. Disponível 
em: https://tinyurl.com/ya2zrfa8. Acesso em: 22 nov. 2024.
 
Assim, segundo a Lei n. 8.080, “o homem é um ser integral, biopsicossocial, e deverá ser atendido 
com esta visão integral por um sistema de saúde também integral, voltado a promover, proteger e 
recuperar sua saúde”. Conforme a lei, os princípios que regem a organização e gestão do SUS são:
• Regionalização e hierarquização: os serviços devem ser organizados em níveis de complexidade 
tecnológica crescente, dispostos numa área geográfica delimitada e com a definição da população 
a ser atendida. Isso implica a capacidade dos serviços em oferecer a uma determinada 
população todas as modalidades de assistência, bem como o acesso a todo tipo de tecnologia 
disponível, possibilitando um ótimo grau de resolubilidade (solução de seus problemas). O acesso 
da população à rede deve se dar através dos serviços de nível primário de atenção, que devem 
estar qualificados para atender e resolver os principais problemas que demandam os serviços de 
saúde. Os demais deverão ser referenciados para os serviços de maior complexidade tecnológica. 
A rede de serviços, organizada de forma hierarquizada e regionalizada, permite um conhecimento 
maior dos problemas de saúde da população da área delimitada, favorecendo ações de vigilância 
epidemiológica, sanitária, controle de vetores, educação em saúde, além das ações de atenção 
ambulatorial e hospitalar em todos os níveis de complexidade.
• Resolubilidade: é a exigência de que, quando um indivíduo busca o atendimento ou quando 
surge um problema de impacto coletivo sobre a saúde, o serviço correspondente esteja capacitado 
para enfrentá‑lo e resolvê‑lo até o nível da sua competência.
• Descentralização: é entendida como uma redistribuição das responsabilidades quanto a ações 
e serviços de saúde entre os vários níveis de governo, a partir da ideia de que quanto mais perto 
do fato a decisão for tomada, mais chance haverá de acerto. Assim, o que é abrangência de 
um município deve ser de responsabilidade do governo municipal; o que abrange um estado 
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Unidade I
ou uma região estadual deve estar sob responsabilidade do governo estadual; e o que for 
de abrangência nacional será de responsabilidade federal. Assim, deverá haver uma profunda 
redefinição das atribuições dos vários níveis de governo com um nítido reforço do poder 
municipal sobre a saúde – é o que se chama de municipalização da saúde. Aos municípios cabe, 
portanto, a maior responsabilidade na promoção das ações de saúde diretamente voltadas aos 
seus cidadãos.
• Participação dos cidadãos: é a garantia constitucional de que a população, através de suas 
entidades representativas, participará do processo de formulação das políticas de saúde e do 
controle da sua execução, em todos os níveis, desde o federal até o local.
 Observação
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como “um estado 
de completo bem‑estar físico, mental e social, e não somente ausência de 
afecções e enfermidades”.
 
3.2 Papel do psicólogo nas políticas públicas de saúde
O papel do psicólogo no SUS envolve a compreensão dos amplos conceitos relacionados à condição 
humana, o que exige uma abordagem interdisciplinar. É fundamental que o psicólogo esteja inserido 
no contexto local, identifique recursos psicossociaistanto individuais quanto coletivos, promova um 
diálogo entre o conhecimento popular e o científico e crie oportunidades para a participação social. Os 
profissionais devem continuar a se especializar, priorizando o atendimento àqueles que enfrentam maior 
vulnerabilidade psicossocial e expandindo suas áreas de atuação para além dos ambientes convencionais. 
A prática do psicólogo deve levar em conta tanto os aspectos sociais quanto os psicológicos, tendo como 
objetivo romper o ciclo de dependência dos usuários em relação às políticas assistenciais e promover 
a autonomia.
Melo e Silva (2024) analisam que, no contexto global da saúde, e reconhecendo a importância do 
apoio em diferentes fases da vida, os psicólogos têm a responsabilidade de acompanhar os cuidados 
paliativos no SUS. Esses cuidados devem ser realizados de modo integral e multidisciplinar, envolvendo a 
interação com o usuário, seus familiares, cuidadores e a equipe de profissionais de saúde, especialmente 
em momentos que se aproximam da finitude da vida. No contexto da saúde, a atenção psicológica 
deve englobar a promoção da autonomia e da cidadania. Para tanto, as funções dos psicólogos no 
SUS (no caso da assistência primária) incluem acolhimento, discussão de casos e elaboração de planos 
terapêuticos individuais, entre outras atividades.
Na categoria do atendimento longitudinal, por sua vez, verifica‑se que 
acontece uma transferência da responsabilidade do cuidado em saúde 
mental quando o cliente é direcionado para outros serviços da saúde, o que 
traz como resultado profissionais que vivenciam pouca responsabilidade no 
atendimento das demandas de saúde mental. Nesse cenário, geralmente 
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POLÍTICAS PÚBLICAS E PSICOLOGIA
os encaminhamentos sobrecarregam a atenção secundária, assim como 
reforçando uma cultura de medicalização dos usuários. A equipe deve ser 
capaz de assegurar um espaço de trocas e fortalecimento dos elos sociais 
para que o atendimento possa ser efetivo na atenção primária a saúde 
(Melo; Silva, 2024, p. 9).
Assim, o hospital se configura como o espaço mais adequado para os processos de recuperação 
da saúde, já que o ambiente hospitalar reflete uma série de mudanças estruturais no contexto social 
e histórico, sendo carregado de significados simbólicos e culturais. Dessa forma, o psicólogo deve 
estar preparado para lidar com essa realidade, pois tal instituição também oferece o contexto para 
o surgimento de processos que vão além do reducionismo biológico ou das questões relacionadas a 
doenças, envolvendo aspectos que pertencem ao domínio da mente.
A inclusão dos psicólogos no sistema de saúde pública abre a possibilidade de explorar novas áreas 
de atuação, o que, por sua vez, exige mudanças na forma como a prática é realizada. Primeiramente, 
é fundamental entender que o psicólogo no SUS desempenha um papel essencial na rede pública de 
saúde (embora nem sempre seja reconhecido pela sociedade e pelos outros profissionais da área). Sua 
atuação, nesse contexto, envolve trabalhar em equipes interdisciplinares, em estreita colaboração com 
médicos, enfermeiros, assistentes sociais e outros profissionais de saúde. Essa abordagem colaborativa 
busca oferecer um cuidado integral aos pacientes, levando em consideração não apenas as questões 
físicas, mas também as emocionais e sociais.
Quanto às dificuldades de atuação no SUS, os psicólogos enfrentam desafios para buscar formas 
alternativas de intervenção além da psicoterapia individual, devido à sua formação predominantemente 
clínica. Nesse contexto, a formação e capacitação dos psicólogos ainda caminham na direção oposta 
às diretrizes da reforma psiquiátrica e de saúde mental, ao privilegiarem abordagens tradicionais e 
a psicopatologia, o que enfraquece o atendimento integral. Além desses aspectos, pesquisas da área 
identificaram uma demanda excessiva, dificuldades na articulação entre os serviços, desconhecimento 
dos profissionais sobre o funcionamento da rede e a insegurança, ou despreparo, dos psicólogos para 
lidar com a população infantil que necessita de atenção em saúde mental no SUS. Essa dificuldade 
foi frequentemente associada a questões pessoais, como aspectos emocionais dos profissionais, à 
dificuldade em identificar as demandas que podem ser atendidas na Atenção Básica (AB) ou aquelas 
que devem ser encaminhadas para as demais especialidades.
Uma possível solução para essas problemáticas foi mostrada por meio da promoção de intervenções 
intersetoriais, como estratégia para a construção de uma rede de atenção efetiva (Melo; Silva, 2024, 
p.  11). Além disso, propôs‑se a realização de ações e intervenções em saúde mental infantil na AB, 
com base na territorialidade, a fim de organizar as estratégias de atendimento entre os serviços de 
saúde e outras redes de cuidado e apoio, como a família e a escola, levando em consideração o contexto 
e a realidade do território. Também se ressaltou a importância da integralidade do cuidado, através 
da articulação de diferentes conhecimentos e serviços da rede, abrangendo, além da saúde mental, o 
fortalecimento do vínculo e a inserção social como fatores essenciais para a promoção da saúde.
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Unidade I
Enquanto Melo e Teo (2019) explicaram que existe a necessidade da atuação 
dos psicólogos em ressignificarem sua própria trajetória formativa, os 
psicólogos reconhecem que, ainda assim, a saúde da família é um campo 
profícuo de estudos para melhorias na prática profissional e aperfeiçoamento 
da formação na área da saúde. Em tal aspecto, os autores Oliveira e Kahhale 
(2020) apresentaram como estratégias a serem usadas pelos psicólogos a 
valorização do diálogo, assim como o reconhecimento de que é preciso 
conceber o sujeito na sua totalidade em conformidade com as práticas do 
cuidado. A reflexão no que tange às práticas do psicólogo nos equipamentos 
públicos de atenção à população é crucial, visto que uma prática direcionada 
apenas aos aspectos particulares não corresponde às demandas e bases das 
políticas públicas instituídas a fim de superar as vulnerabilidades (Melo; 
Silva, 2024, p. 12).
Dessa forma, Castro (2021) aponta que, entre os princípios do SUS, a integralidade é central tanto 
nas discussões quanto nas práticas da área da saúde, e envolve a compreensão do ser humano de forma 
holística, em contraste com uma visão fragmentada. Em outras palavras, o sistema de saúde deve estar 
preparado para ouvir ativamente o usuário, compreendendo o contexto social em que ele está inserido 
e, a partir disso, atender suas demandas e necessidades de forma adequada.
O princípio da integralidade permite pensar a implantação de ações em 
saúde que incorporam as práticas integrativas da Política Nacional de 
Humanização, as quais demandam dos profissionais da saúde pública a 
realização de atividades interdisciplinares, de modo a efetivar o princípio 
da integralidade em seu cotidiano. Em particular, a aplicação desse 
princípio procura, de modo geral, assegurar a atenção em saúde integral à 
população como estratégia de ampliação do direito e cidadania das pessoas 
(Castro, 2021, p. 2).
A iniciativa do acolhimento das demandas nas unidades de saúde exige a compreensão do contexto 
específico de cada localidade. Nesse processo, é fundamental reconhecer as narrativas individuais 
geradas nos processos de saúde/doença e, em certa medida, estabelecer uma relação horizontal com 
a comunidade.
Com base nesses princípios, o profissional de psicologia deve ajustar seu campo de atuação às 
diferentes formas de cuidado, de modo que sua atuação possa se desenvolver, a fim de propor formas de 
atuação que não se separem do aspecto político presente tanto na prática da psicologia quanto no SUS.
No campo da saúde pública, por muito tempo, os temas foram tratados de forma superficial, com 
foco na identificação e eliminação de sintomas de maneira autoritária e vertical, sem levar em conta os 
aspectos socioeconômicos que afetam as condições de vida e saúde da população. A partir da década

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