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A Arte que os portugueses trouxeram Ao falar de arte brasileira no período colonial nos remetemos, diretamente, à arte sacra católica. Alguns estudiosos divergem quando se trata de identificar qual foi a primeira imagem que chegou ao território brasileiro. De acordo com as pesquisas para este artigo foi possível estabelecer três versões sobre qual teria sido, efetivamente, a primeira imagem trazida pelos colonizadores portugueses ao Brasil. Muito se falou que teria sido a imagem de Nª Sª da Graça, encontrada por Catarina Paraguaçu, cuja capela foi erguida em sua homenagem através dos esforços do seu marido Diogo Álvares Correa, o Caramuru. Este acontecimento remonta a 1535. “A princesa índia fez a doação do Santuário à Ordem de São bento em 1582(ou 1586)” BAZIN, 1983. Outra versão, muito conhecida, é que a primeira imagem foi a de Nª Sª da Conceição, trazida por Tomé de Souza, na nau capitânia que levara o mesmo nome. Ao desembarcar na praia, onde atualmente está situada a Igreja da Conceição da Praia, o primeiro governador geral ordenou a construção da primeira capela em terras brasileiras. Foi fundada pouco depois de 1549. Em 1736, no entanto, as Irmandades do Santíssimo Sacramento e da Imaculada Conceição decidiram reconstruir a igreja por uma em escala maior cujas plantas foram feitas por Manoel Cardoso de Saldanha, engenheiro militar. As pedras de lioz, principal material utilizado na reconstrução do templo foram trazidas de Lisboa. A igreja começou a ser erguida em 1739. Segundo a historiadora Antonietta Nunes, a referida capela foi elevada à categoria de paróquia no dia 8 de dezembro de 1623 por D. Marcos Teixeira, então bispo da Bahia. A representação da virgem foi escolhida como padroeira de Portugal e seus domínios em 1646 e em 1721 Nossa Senhora da Conceição foi denominada a padroeira do Brasil. Como padroeira do estado da Bahia foi declarada em 1971. A imagem de Nossa Senhora da Conceição da qual a pesquisadora teve acesso, encontra-se na sacristia da igreja. Trata-se de uma pintura em óleo sobre tela de propriedade da Arquidiocese de Salvador. Sua datação provável é que seja do século XVIII. Os documentos contidos no Inventário Nacional de Bens Móveis e Integrados, volume 90 –Minc/ IPHAN, não apontam a autoria da obra em análise ao mesmo tempo em que a identifica como estando em bom estado de conservação. Descrição da obra, segundo o Inventário: Pintura a óleo sobre tela, centrada por representação de figura feminina, de pé, frontal, cabeça raiada com raios amarelos de contorno azulado e estrelas brancas. A figura tem a sua cabeça pendente para a sua direita e para baixo; olhos na mesma direção, rosto sereno em tom claro e iluminado. Cabelos pintados de marron com mechas caídas sobre o ombro esquerdo. Braços flectidos à frente do corpo, mãos postas. Perna esquerda levemente flectida, direita apoiando o peso do corpo. Pés descalços,estando o esquerdo sobre a cabeça de uma serpente pintada de preto; a serpente trás na boca uma maçã. A figura feminina usa véu marron claro que cai sobre os ombros, túnica branca, manto azul que envolve os braços, quadril e pernas. Apoia-se em um globo azul onde vê-se um quarto nascente branco. Na lateral direita do globo existem nuvens pintadas de marron. Na lateral direita da representação feminina, cinco querubins entre nuvens e um serafim usando manto marron; suas asas na cor branca. Na lateral esquerda vê-se figura masculina, sentada sobre as nuvens, frontal, cabeça voltada para a sua direita (para Nossa Senhora). Cabelos curtos e pintados de marron claro. Braços à frente do corpo, mão esquerda em posição de abençoar, mão direita segurando um ramo de lírios. Usa túnica amarela e sobretúnica azul. Acima desta figura,cinco querubins entre nuvens . Moldura com parte inferior e laterais retas, com frisos salientes com douramentos e chacis em marron escuro. Parte superior da moldura em arco abatido com ornatos em trabalho de talha (folhas curvais) com douramento. Existem ainda alguns autores que identificam a Nª Sª da Ajuda como sendo a primeira representação artística vinda de Portugal. Relatam que foi assim chamada e que a mesma foi homenageada quando aconteceu a construção da Igreja da Ajuda. A Igreja de Nª Sª da Ajuda foi a primeira igreja construída dentro do território fortificado por Tomé de Souza; foi construída pelos jesuítas juntamente com o vigário Manoel Lourenço. Houve uma reconstrução desta igreja em materiais de pedra e cal no ano de 1579. “Expulsos os jesuítas em 1759 a igreja ficou abandonada até 1823, quando a Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos e Vera Cruz ali se instalou.” (NUNES,2013) Apesar das divergências quanto ao reconhecimento da primeira imagem sacra que chegou nas “Terras do Brasil”, é relevante destacar que Pedro Álvares Cabral ao desembarcar em Porto seguro em 1500, trazia junto aos seus pertences uma imagem representativa de Nª Sª da Esperança. Esta representação da imaginária sacra católica, segundo o Professor da Universidade Federal da Bahia, José Cláudio- especialista em Arte Sacra Cristã – participou da primeira missa ocorrida em terras brasileiras e, posteriormente, seguiu de volta a Portugal onde se encontra atualmente. Ainda através do Professor Cláudio, a imagem está situada na Quinta de Belmonte em Portugal. É importante lembrar as relevantes inovações pelas quais passaram as ordens religiosas, na Europa, após os questionamentos da Reforma Protestante. Estas inovações tinham como prioridade recuperar o prestígio da fé católica e, para tanto, a arte necessitava ser reformulada expressivamente, através dos conceitos de representatividade e persuasão. Durante o Concílio de Trento (1545-1563), a igreja católica pretendia divulgar os ideais religiosos por meio de narrativas bíblicas, valendo-se das representações das imagens sacras e de obras artísticas que despertassem interesse e fervor aos seus fieis. Pretendia- se provocar diversas emoções (e medo) e para isso, as manifestações artísticas – a música, inclusive, deveriam obedecer aos métodos de persuasão e deslumbramentos visuais e sonoros. Houve um visível enriquecimento da iconografia na arte sacra, já que seria a arte o principal veículo de comunicação entre a igreja e a sociedade, em geral, iletrada. O pensamento individual deveria ser totalmente abolido e a obediência religiosa, absoluta e inquestionável, vigiaria o cumprimento em relação aos dogmas impostos pela fé católica. A arte sacra católica do século XVI no Brasil está diretamente associada às imagens que aqui chegaram tanto com os colonizadores como as trazidas pelos padres jesuítas, estes, com o claro objetivo da catequese. Outras imagens chegaram nas bagagens dos colonos de Portugal cuja devoção fez com que fossem erguidos alguns santuários domésticos,uns elevados a condição de capelas e outros, bem mais simples porém não menos venerados. Além das imagens de devoção, os primeiros colonos inseriram as imagens de presépio cuja tradição se preserva até os nossos dias. Todas as residências possuíam os seus santos de devoção, fato que nos leva a crer que, com o crescimento das vilas e povoados, elevou-se a necessidade de se produzir objetos de culto. A pratica das criações artísticas aconteciam, de início, nos mosteiros e conventos estendendo-se às oficinas, à medida que a demanda crescia junto com a população. Um dos destaques na arte escultórica sacra foi o Frei Beneditino Agostinho da Piedade cujas criações artísticas foram consideradas de reconhecida qualidade e perfeição. “Muitos deles adquiriram formação erudita nas suas terras de origens, e aqui, além de produzirem imagens,ensinavam também aos leigos o outros colegas da ordem, às vezes já nascidos no Brasil, como foi o caso de Frei Agostinho de Jesus.”, constata o professor Luiz Freire num artigo produzido em 2009 intitulado “Imaginária e imaginário no Brasil Colonial”. Em 1560 se tem notícia de que esteve na capital da Bahia o pintor jesuíta Manoel Álvares, responsável pela pintura do frontispício da Igreja do Colégio da Bahia, e em 1574 o pintor, também jesuíta, Manuel Sanches. Ainda sobre o escultor beneditino Frei Agostinho da Piedade, sabe-se que produziu mais de duas dezenas de imagens contudo apenas quatro estão assinadas e duas delas datadas.Entre as obras assinadas e datadas destacam-se as imagens de Nossa senhora do Monserrate de 1636 pertencente ao Instituto Geográfico e Histórico da Bahia mas em exposição no Museu de Arte Sacra da Universidade da Bahia e Santana Mestra de 1642 pertencente ao Museu de Arte Sacra da Universidade Federal da Bahia. Todas as obras do monge foram produzidas em barro cozido, segundo estudiosos da arte produzida na Bahia no período colonial, visto que não existem registros de obras confeccionadas em outros materiais. Mais de duas dezenas de imagens são atribuídas ao artista pelas técnicas e características estilísticas como, por exemplo, a imagem de santa Mônica, único relicário de corpo inteiro pertencente ao Mosteiro de São Bento da Bahia. O estudioso beneditino Dom Clemente da Silva Nigra se dedicou à análise das obras do Frei artista e, graças aos seus estudos é possível conhecer as principais obras deste período cujas três fases distintas foram claramente observadas: a primeira identificada como aquela que permanece com influências renascentistas. A segunda ainda obedece o mesmo traço estilístico; as inovações estéticas só ocorrem na terceira fase cujas características apresentam significantes variações. Desta fase destacam-se as seguintes imagens: Senhora Santana Mestra, Nossa Senhora com o Menino Jesus(Mosteiro de São Bento da Bahia), São Pedro Arrependido (Mosteiro de são bento da Bahia). Algumas obras atribuídas ao Frei Agostinho da Piedade por Dom Clemente da Silva Nigra fazem parte do acervo do Mosteiro de São Bento da Bahia. Destacam-se: Séc. XVII, c. 1630: “Busto Relicário de Santa Luzia”. Chumbo fundido, policromado e prata cinzelada e parcialmente dourada. Dimensões: altura total 49 cm; 22 cm cabeça sem o resplendor, e 27 cm busto sem a peanha (que foi acrescentada em 1936) . Peso total 6.325 gramas; cabeça 4.350 gramas, busto 1.975 gramas. Atualmente sob a guarda do Museu de Arte Sacra da Bahia. c.1630:“Busto Relicário de Santa Cecília”. Barro cozido, altura 50 cm. Atualmente sob a guarda do Museu de Arte Sacra da Bahia, o resplendor na faz parte da peça. c.1630: “Busto Relicário de Santa Catarina”. Barro cozido, altura 55 cm. Atualmente sob a guarda do Museu de Arte Sacra da Bahia. c.1630: “Busto Relicário de Santa Bárbara”. Barro cozido e policromado, altura 54 cm. Atualmente sob a guarda do Museu de Arte Sacra da Bahia. c.1630: “Busto Relicário de Santa Águeda”. Em barro cozido e possui penha do mesmo material, altura 50 cm. c.1630: “Busto Relicário de Santa Escolástica”. Em barro cozido,altura 55 cm. c.1630: “Busto Relicário de Santa Margarida ou Marinha”. Em barro cozido, altura 53 cm. c.1630: “Busto Relicário de São Gregório Magno Papa”. Em barro cozido, altura 58 cm. Algumas obras documentadas Instituto Geográfico e Histórico da Bahia 1636: Imagem de Nossa Senhora de Montesserrate em barro cozido, dourado e policromado e com altura 92 cm. (Fig. 1 e 2). Atualmente sob a guarda do Museu de Arte Sacra da Bahia. Na parte posterior, uma longa inscrição informa sobre o autor e o doador: “Frei Agostinho da Piedade Religioso Sacerdote de Sam Bento Fez esta Imagem De Nossa Srã. Por mandado do muy Devoto Diogo de Sandoval e fella por sua Devoção, 1636.” Museu de Arte Sacra da Universidade Federal da Bahia 1642: Imagem de Senhora Santana Mestra, em barro cozido, dourado e policromado e com altura 77 cm. (Fig. 3 e 4). Imagem feita para a primitiva igreja do Solar do Unhão, residência urbana dos senhores do castelo de Garcia d’Avila – hoje sede do Museu de Arte Moderna da Bahia. Na base, parte inferior, há a inscrição: “1642 Frei Agostinho”. Nos estudos da historiadora Marieta Alves, o “livro das vidas e mortes dos Monges de São Bento” – o Dietário- consta que o monge artista nasceu em Portugal e se ordenou no Mosteiro da Bahia. Foi capelão da Igreja de Nossa Senhora da Graça e faleceu no ano de 1661. Existem documentos assinados pelo monge cujos registros fazem parte do “Livro Velho do Tombo do Mosteiro de São Bento da cidade de Salvador”. Com a expansão das vilas, crescia vertiginosamente o culto às imagens na capital da Bahia, e, obviamente, a demanda na produção das peças. Neste período os artífices ou artesãos, já que não eram considerados artistas, e que já haviam aprendido o ofício juntamente com os encarregados de marcenaria, oleiros, serralheiros entre outros, passaram a receber encomendas com mais frequência, principalmente das famílias mais abastadas; foi neste momento que começaram a surgir as primeiras manifestações estilísticas das quais foram evidenciadas as características de cada artífice: uma criação se diferenciava de outra através dos “traços” individuais de estilo. Na confecção das imagens os artífices utilizavam o barro cozido e a madeira pela facilidade de acesso; posteriormente passariam a usar a pedra, o metal e o marfim – este ainda um material raro na cidade da Bahia. Nas pinturas eram utilizados os óleos, a têmpera e, em raríssimos trabalhos, o afresco. Para se identificar a época e os estilos artísticos, já que as peças sacras variam de acordo com os fatores econômicos, sociais e geográficos, os especialistas tomam como referência as maneiras de se criar os cabelos, a face e o panejamento bem como os materiais e técnicas utilizados. Das imagens que possuem “atitude estática” destacam-se as mais antigas, duas que estão na antiga Igreja dos Jesuítas, hoje Catedral Basílica: São Francisco de Borja e Nossa Senhora de Guadalupe – esta pertenceu à Sé Primacial do Brasil. Outras apresentam vestes “caprichosas” e esvoaçantes em expressivas fisionomias. O trabalho nas oficinas acontecia em equipe: um “artista” esculpia a madeira ou trabalhava o barro enquanto outro pintava e, muitas vezes, a presença de um terceiro artesão que se “especializava” em douramentos ou em outros detalhes estilísticos, por exemplo, a técnica de dar tonalidade de cor de pele às imagens – a carnação. A escultura e a pintura no período colonial brasileiro sofreram influências de artistas italianos e franceses. Pouco se conhece da influência indígena e africana na arte sacra cristã do período colonial a não ser através de “trocas simbólicas do fazer artístico” na construção de retábulos nas igrejas da capital. O trabalho em conjunto e o procedimento de não assinarem as obras quando executadas, impediam que as peças fossem identificadas quanto a sua autoria, pois não havia assinatura ou outro registro de criação. Muitas peças confeccionadas no período colonial obviamente se perderam com a ação do tempo. Os autores afirmam que muitas imagens foram destruídas nos conflitos e guerras. Entre os inúmeros conflitos que por aqui ocorreram, os estudiosos se referem à invasão holandesa como sendo a principal responsável pela destruição das imagens através da doutrina protestante que se fortalecia na Holanda. Os pouquíssimos exemplares de imagens sacras que foram preservadas apesar dos conflitos, não nos permitem reconhecer com precisão os seus principaisestilos artísticos, principalmente pelas inúmeras interferências ocorridas nas peças cujos critérios técnicos não obedeciam à preservação do modelo estilístico original. Não havia conhecimento sobre as técnicas do restauro, portanto qualquer pessoa poderia se utilizar dos recursos disponíveis na intenção de “consertar” a peça, descaracterizando-a parcial ou na sua totalidade. Muitas pessoas pintavam ou colavam as imagens sem nenhum conhecimento técnico, apenas para garantir-lhe a materialidade. Segundo os estudos do professor José Cláudio, algumas imagens consideradas mais antigas e que possuem documentos de origem encontram-se na Bahia. São elas: - Imagem de São Francisco – trazida por Gonçalo Coelho (1502)- Porto Seguro; - Imagem de Nossa senhora da Graça- encontrada por Catarina Paraguaçu (1530)-Igreja da Graça- Salvador/Bahia; - Nossa Senhora das Maravilhas – trazida por D. Pero Fernandes Sardinha (1552) Museu de Arte Sacra da UFBA; - Cristo Crucificado (1580) – Museu do Carmo- Salvador/ Bahia; - Nossa Senhora de Guadalupe (1590)- venerada na Antiga Sé da Bahia – MAS /UFBA; - Nossa Senhora da Conceição (15...) – Acervo da Catedral Basílica de Salvador/ Bahia. Considerando a precariedade de documentos sobre a produção artística do período colonial brasileiro, há destaque para os seguintes artistas e seus respectivos períodos: Século XVI – João Gonçalo Fernandes e Frei Francisco dos Santos Século XVII – Frei Agostinho da Piedade, Frei Agostinho de Jesus e Frei Domingos da Conceição e Silva Século XVIII – Francisco das Chagas – o “Cabra”, Felix Pereira Guimarães, José Antonio de Araújo Lobo e Manoel Inácio da Costa A arte sacra encontra o seu apogeu no século XVIII no auge do movimento Barroco. As manifestações religiosas, neste período, deveriam comover e despertar os sentidos nos fieis, através dos sons, luzes e cores. A arquitetura religiosa do período barroco dispõe de tribunas e balaustradas que se abrem para a nave central; o altar age como um palco cuja utilização de cortinas semiabertas remetem às cenas de espetáculos teatrais, inclusive no momento eucarístico. A luz é estrategicamente direcionada, provocando uma sensação de aumento do espaço, acolhimento, mistério e veneração. Há predomínio de saliências e elementos curvilíneos e sinuosos nas fachadas monumentais das igrejas, elementos estes que dialogam com obras escultóricas que parecem “invadir” o espaço urbano num intenso movimento, até então desconhecido. O horror ao vazio ou “horror vacui” é característica primordial no barroco: nenhum espaço permanece vazio. A pintura e a escultura se integram e as imagens adotam posturas humanas, no que diz respeito à expressividade, emocional e dramática. Internamente, as igrejas são “recheadas” de materiais nobres como mármores policromadas e douramentos. A temática se renova quando rejeita a idealização renascentista e a deformação típica do maneirismo: utiliza-se os recursos realistas/dramáticos nos objetos que se pretende destacar pois o objetivo principal é torná-la acessível à compreensão de todos. Sem a preocupação com os contornos lineares, a pintura barroca transmite uma sensação de continuidade – em muitas obras a imagem parece deslocar-se para fora do quadro, técnica denominada de escorço. A pintura barroca é predominantemente ilusionista – denominação conhecida como trompe l’oeil. Este recurso foi muito usado nas pinturas de teto cujos elementos simulam um dinamismo extremamente dramático e vigoroso. Roma foi o centro mundial da arte barroca graças às inúmeras encomendas feitas pelos papas e importantes representantes católicos. Inúmeros artistas foram estudar as obras clássicas na Itália, principalmente em Roma, razão pela qual o estilo espalhou-se por vários países da Europa. Como expoentes da arte barroca destacam-se as obras arquitetônicas monumentais de Gianlorenzo Bernini (1598-1680), que “...dominou o cenário artístico em Roma com seus projetos exuberantes, dinâmicos, teatrais e orgânicos”. (FARTHING, 2011). Sua mais conhecida escultura denomina-se “ O êxtase de Santa Tereza” que se encontra atualmente na Capella Cornaro em Roma. A arquitetura barroca foi “praticada em Roma durante os papados dos pontífices Urbano VIII, Inocêncio X e Alexandre VII 91623-1667)” (BURY, 1991). No Brasil colonial, as esplendorosas edificações traziam elementos decorativos rebuscados como se podem destacar nas colunas salomônicas cujas dimensões variam em maior e menor exuberância ornamental. Na Bahia, o “drama barroco” se valeu da paisagem natural da Baía de Todos os Santos e dos projetos arquitetônicos monumentais que se consolidariam entre os séculos XVII e XIX. As inúmeras intervenções, contudo, não nos permite promover uma “releitura”da paisagem da capital colonial a não ser no Pelourinho e nos bairros adjacentes. Segundo Rodrigo Baeta, o “drama barroco” iniciou-se com as primeiras edificações na própria baía, ou seja, com os Fortes de Santo Antonio da Barra, o de Santa Maria e o Forte de São Diogo. Para ele, o percurso pelas poucas ladeiras da “acrópole” chegando à Cidade Alta, proporcionava aos ilustres visitantes uma verdadeira cena persuasiva quando se deparavam com conjuntos arquitetônicos governamentais e religiosos, embora admita a inadequação no traçado semiortogonal proposto por Luis Dias. As edificações religiosas foram responsáveis por agregarem elementos de grande influência no processo de colonização – e do apelo propagado através da estética barroca , razão pela qual o Terreiro de Jesus e o pátio da igreja de São Francisco se destacaram como símbolos de persuasão nada comparado com a arquitetura presente no centro cívico de Salvador. Este centro era constituído pela Casa de Câmara e Cadeia e pelo Palácio dos Governadores: “[...]quando o núcleo urbano era apenas um acampamento fortificado[...]” (BAETA,2012). Posteriormente viriam a Casa da Relação e a Casa da Moeda. Todos os espaços arquitetônicos da cidade faziam parte de um cenário cuja personagem principal era a deslumbrante paisagem natural da Baía de Todos os Santos. Os principais conjuntos urbanos, em princípio os religiosos, se concentravam na Praça do Terreiro de Jesus. A denominação de terreiro foi dada por se tratar de um vasto adro ou, literalmente, um terreiro. Neste local se encontravam a Igreja e o Colégio dos Jesuítas. Havia um certo “desafio de poder”, mencionado pelo autor, quando o templo jesuítico se depara com outras monumentais edificações religiosas, a partir do século XVIII, como a Ordem Terceira de São Domingos, a Capela de São Pedro dos Clérigos, a Catedral Basílica de Salvador e a Ordem Primeira de São Francisco. Tais edificações religiosas, apesar de apresentarem algumas características maneiristas, revelam no seu interior a forte presença do estilo barroco, principalmente na Ordem Primeira de São Francisco cujo interior se destaca por uma extrema dramatização e rebuscamentos exagerados com elementos decorativos variados e escassa presença de luz, numa nítida intenção de construir um ambiente capaz de hipnotizar qualquer visitante; um contraste entre a fachada, relativamente sóbria, e o interior; contraste entre o real e o imaginário. O templo barroco assume, na capital da Bahia, um papel importantíssimo no processo de colonização. As experiências sensoriais propostas pela igreja católica contribuíram enormemente para a consolidação da fé cujos desdobramentos foram notados em vários setores da sociedade. A praça cívica não se comprometera em relação a nenhuma ordem religiosa: era, intencionalmente, o centro das ideologias e assim permaneceu até 1763 quando a capital foitransferida para o Rio de Janeiro. REFERÊNCIAS ALVES, Marieta. SMITH,Robert. OTT, Carlos. Ruy, Afonso. História das artes na cidade do Salvador. Publicação da PMS comemorativa ao IV centenário da cidade.1967. ARGAN, Giulio Carlo. Imagem e persuasão: ensaios sobre o Barroco. São Paulo: Companhia das Letras. 2004. BAETA. Rodrigo Espinha. O Barroco, a arquitetura e a cidade nos séculos XVII e XVIII. Salvador: EDUFBA,2012. BAZIN, Germain. A Arquitetura religiosa barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Record. VolumesI e II,1983. BURY, John. Arquitetura e arte no Brasil colonial. São Paulo:Nobel, 1991 COSTA, Heloisa Helena Fernandes Gonçalves da. Museologia e patrimônio nas cidades contemporâneas: uma tese sobre gestão de cidades sob a ótica da preservação da cultura e da memória. IN Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi. Ciências Humanas, 2012.v. 7 n.1 Dicionário Manuel Quirino de arte na Bahia / Org. Luiz Alberto Ribeiro Freire, Maria Hermínia Oliveira Hernandez. – Salvador: EBA-UFBA, CAHL-UFRB, 2014. Acesso: www.dicionario.belasartes.ufba.br FARTHING. Stephen. Tudo sobre arte. Rio de Janeiro: Sextante, 2011. GOMBRICH. Ernest Hans. A história da arte. Rio de Janeiro: LTC, 2012. OTT, Carlos. A escola baiana de pintura- 1764-1850. Edição especial. Editor: Emanoel Araújo. TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia. São Paulo: Editora UNESP: Salvador, BA: EDUFBA, 2001. Artigo: Imaginária e imaginário no Brasil colonial. Luiz Alberto Ribeiro Freire- Universidade federal da Bahia. www.artesacracrista.blogspot.com.br