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V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 1 1 A LIBERDADE SUBSTANTIVA E A LIBERTAÇÃO DAS MULHERES: UMA ANÁLISE NO CONTEXTO ATUAL DE ATIVAÇÃO DOS LIMITES ABSOLUTOS DO CAPITAL Gisele Kava1 Trabalho, Questão Social e Serviço Social INTRODUÇÃO Nossa sociedade encontra-se em um nível tecnológico e produtivo extremamente desenvolvido, no qual a capacidade de produção de mercadorias ultrapassa a capacidade de consumo, porém, os bens resultantes dessa produção são expropriados das mãos dos produtores e convertidos em capital para o enriquecimento de uma classe em detrimento de outra, portanto, a acumulação absurda da riqueza nas mãos de poucos ainda perpetua a carência da humanidade em contradição com a abundância existente. Para Marx (1996), o capital possui em sua essência a ocorrência de crises cíclicas de sua própria produção. De acordo com Mészáros (2002), em nosso momento histórico o capital entrou em um limite destrutivo característico da sua lógica de “valorização do valor”, essa nova crise, para o autor não é somente conjuntural, é estrutural, pelo seu caráter universal, seu alcance global, sua existência contínua e permanente e seu modo de desdobramento gradual. Para o autor o capital efetivou os seus limites absolutos, fazendo coexistir inúmeras contradições em seu limite, exaurindo e poluindo deliberadamente a natureza e matando milhares de pessoas, com o único objetivo de obter lucro, sem levar em consideração as consequências, não só para as gerações futuras, mas os atuais efeitos sofridos pela maioria das pessoas. A atual crise caminha em direção ao fim da humanidade ou à barbárie, a não ser que se efetivem mudanças fundamentais no modo de reprodução da vida humana. Nas palavras de Mészáros: “(...) como a ativação dos limites absolutos do capital, enquanto sistema de 1 gk.gisele@gmail.com (45) 9912- 0852 Acadêmica do 4° ano do Curso de Serviço Social da UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná/Campus Toledo e bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/Ações Afirmativas//Fundação Araucária/UNIOESTE, orientada pela docente, Dra. Rosana Mirales. V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 2 2 reprodução plausível surgiu em nosso horizonte histórico, já não se poderá evitar por muito mais tempo o enfrentamento da questão de como superar os pressupostos estruturais destrutivos do modo estabelecido de controle sociometabólico” (MÉSZÁROS, 2002, p. 217). Com o presente artigo pretendemos nos aproximar das questões tratadas por Mészáros em relação a ativação destes limites absolutos, bem como de seus conceitos de liberdade substantiva e principalmente em relação a libertação das mulheres no contexto atual. O trabalho é resultado das leituras, fichamentos e análises do capítulo cinco do livro de Mészáros “Para além do capital” intitulado: “A ativação dos limites absolutos do capital”. Estudo este, efetuado com orientação da docente Dra. Rosana Mirales no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/Ações Afirmativas//Fundação Araucária/UNIOESTE. 1. A ATIVAÇÃO DOS LIMITES ABSOLUTOS DO CAPITAL Mészáros organiza em quatro pontos as grandes contradições que estariam trazendo à tona a ativação dos “limites absolutos do capital”: a contradição entre a expansão transnacional do capital e os Estados nacionais; a eliminação das condições naturais da reprodução sociometabólica; o desemprego crônico e; a impossibilidade de atender à irreprimível demanda por “igualdade substantiva”, sobretudo em relação à liberação das mulheres. Não é nosso objetivo analisar profundamente todos esses pontos, apesar de estar todos imbricados um ao outro, vamos expor rapidamente cada um e em seguida (no subitem 3) focar o ponto que aqui nos interessa: em relação à liberação das mulheres. No primeiro ponto Mészáros trata da “contradição entre a tendência fundamental de desenvolvimento econômico transnacional expansionista e as restrições a ela impostas pelos Estados nacionais historicamente criados” (2002, p. 227). Ele afirma que a “estrutura totalizadora de comando político” dos Estados nacionais entrou em contradição com as “estruturas de reprodução material do capital global”. Essa contradição esta relacionada a tendência e ao mesmo tempo impossibilidade de construção de um “Estado mundial do capital” que constitua uma organização única mundial. Assim como o capital estruturalmente tem que dominar e explorar o trabalho para sua existência, os ditos “países desenvolvidos” têm que dominar e explorar as nações menores para seu desenvolvimento. Não podem, portanto, constituir-se em elementos positivos, passíveis de ser combinados na formação do V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 3 3 “Estado do capital”. Cada Estado é uma espécie de “fronteira negativa” sobre os outros Estados, eles vêm o desenvolvimento do outro como limite para o seu próprio. Sob o domínio do capital essa contradição continuará tão arraigada quanto a contradição entre capital e trabalho. Esperar que o Estado do sistema do capital se transforme numa formação positiva para adquirir a capacidade de reunir e ‘conciliar’ debaixo de si mesmo as contradições dos Estados nacionais num ‘governo mundial’ [...] é pedir o impossível. (MÉSZÁROS, 2002, p. 245) O segundo ponto, a questão da eliminação das condições naturais da reprodução sociometabólica está diretamente relacionado ao fato do capital ser “absolutamente incapaz de se impor limites, não importando as consequências, nem mesmo a eliminação total da humanidade” (MÉSZÁROS, 2002, p. 251). Essa é a lógica irrefreável do capital à acumulação, a lógica de “valorização do valor”. As “unidades de reprodução do capital” - as empresas - são obrigadas a ver todos os obstáculos da produção, como obstáculos que devem ser atravessados não importando o quanto sejam destrutivas a utilização dos recursos – humanos, naturais... - para o mesmo. Portanto, [...] o impulso expansionista necessário das empresas isoladas e do sistema em geral sem levar em conta as consequências devastadoras contradiz diretamente as ponderações elementares e literalmente vitais da restrição racional e correspondente controle racional dos recursos humanos e materiais globais. (MÉSZÁROS, 2002, p. 258) Outro fator nesse ponto é a inversão da lógica de produção e consumo a qual deveria ser constituída por produção de mercadorias de acordo com as necessidades dos indivíduos. Porém, a produção é que passa a determinar a demanda, ocorrendo a “criação e manipulação de ‘apetitesartificiais’, já que a ‘administração da demanda’ deve estar subordinada aos imperativos do valor de troca que se expande.” (MÉSZÁROS, 2002, p. 260). Assim, [...] o processo de produção dado segue suas próprias determinações, multiplicando a riqueza divorciada dos desígnios humanos conscientes, os produtos desse processo reificador e alienado devem ser impostos aos indivíduos como ‘apetites’ destes – no interesse do processo de reprodução dominante, sem se levar em conta as consequências a um prazo mais longo. (MÉSZÁROS, 2002, p. 260-261) V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 4 4 No terceiro ponto, o aumento do desemprego crônico nos países capitalistas centrais, contrariando a expectativa anteriormente anunciada de que o [...] desemprego maciço fosse algo que só afetasse as áreas mais ‘atrasadas’ e ‘subdesenvolvidas’ do planeta’ representa uma séria ameaça para o sistema capitalista. Como uma ‘grande ironia da história’, o impulso para reduzir globalmente o tempo de trabalho necessário a um valor mínimo manifesta-se como uma tendência devastadora da humanidade que transforma por toda parte a população trabalhadora numa força de trabalho crescentemente supérflua” (MÉSZÁROS, 2002, p. 341) O desemprego estrutural compromete o sistema, pois reduz o poder de compra, que pode bloquear a realização dos lucros. Mesmo produzindo abundantemente, quem consumirá, se há um desemprego estrutural crescente e a pequena parcela da população empregada tem seus salários extremamente reduzidos? O resultado desse desemprego traz uma ameaçadora instabilidade política e social no mundo todo. 3. A QUESTÃO DA IGUALDADE SUBSTANTIVA E A LIBERTAÇÃO DAS MULHERES Uma das principais características da sociedade capitalista, segundo Marx (1996), é a divisão da mesma em classes sociais opostas. Essa divisão vem da divisão do trabalho, não apenas de forma funcional/técnica, mas uma “divisão social hierárquica”, a divisão entre quem pensa o trabalho e quem o executa. Essa estrutura vem da premissa do capital em que a sociedade deve se estruturar de maneira antagônica “as funções de produção e de controle do processo de trabalho devem estar radicalmente separadas uma da outra e atribuídas a diferentes classes de indivíduos.” Além disso, é também necessário que essa estrutura seja apresentada como “justificativa ideológica absolutamente inquestionável e pilar de reforço da ordem estabelecida”, cooperando para a perpetuação dessa ordem existe a “mitologia da igualdade e liberdade”, pois não seria consensual nem racional sua perpetuação sem a crença de que “todos somos livres e iguais”, sobretudo porque uma classe trabalha para o enriquecimento da outra em seu próprio detrimento. (MÉSZÁROS, 2002, p. 99). A “mitologia da igualdade” dissemina que “todos nós nascemos com oportunidades iguais” e nesse pressuposto, cabe a cada indivíduo conquistar seu espaço, dependendo de seus dotes naturais, não das oportunidades concedidas a ele, nem das injustas instituições. Segundo Mészáros (2002), no mundo em que vivemos não existem privilégios institucionalizados. V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 5 5 Formalmente temos todos os mesmos direitos. O que existem são os “privilégios”, que não são admitidos legalmente, mas sabemos que na realidade as mesmas oportunidades não se aplicam a todos como é disseminado. Privilégios, sem aspas, existiam no modo de produção feudal, por exemplo, onde cada divisão hierárquica da sociedade era estática e se admitia que quem nascesse servo morreria servo. Atualmente, regidos por essa “mitologia”, todos nós temos as mesmas “oportunidades”, uma vez que somos protegidos pela “imparcialidade” e a “justiça”: de operário temos a oportunidade de nos tornarmos empresários, todos podem adquirir propriedade privada “sob as mesmas regras”, porém, nem todos conseguem. Esse “privilégio” é sem dúvidas, real, porém, é encoberto pelos porta-vozes do capital e os seus defensores, que afirmam que todos temos oportunidades iguais. E por isso, o entendimento de que aquele que não consegue sair da situação de pobreza em que se encontra, é porque não se esforçou como deveria. De acordo com Mészáros “o capital não é simplesmente uma ‘entidade material’ [...] mas é, em última análise, uma forma incontrolável de controle sociometabólico.” (MÉSZÁROS, 2002, p. 96). Assim, o capital é uma espécie de personificação que não pode ser controlada e que controla todos os homens, uma criação humana que dominou a humanidade. Considerando que “o sistema do capital é orientado para a expansão e movido pela acumulação” (MÉSZÁROS, 2006, p. 100) ele sobrevive extraindo trabalho excedente, fazendo a classe que vive do trabalho produzir cada vez mais para sua perpetuação. A grande contradição nessa relação é o fato de que a classe que produz as riquezas não tem acesso às mesmas, mesmo o capital chegando ao seu ápice de capacidade produtiva, ainda existem milhares de pessoas literalmente morrendo de fome. Nas últimas décadas, o capital entrou em uma crise, dessa vez estrutural, pois suas bases estão em crise. Sua incapacidade de conter sua expansão ameaça não só o sistema, mas a humanidade como um todo. Sob as condições de crise estrutural do capital, seus constituintes destrutivos avançam com força extrema, ativando o espectro da incontrolabilidade total numa forma que faz prever a autodestruição, tanto para este sistema reprodutivo social excepcional, em si, como para a humanidade em geral. (MÉSZÁROS, 2006, p. 100) V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 6 6 Está claro até para os mais fervorosos defensores do capital que vivemos sérios problemas que exigem soluções radicais. Porém, insiste-se em tentar resolver os problemas dentro dos limites do capital, pois fundamentam-se na máxima de que “não há alternativa”, que o capitalismo é o “fim da história” e que estamos submetidos à uma espécie de “essência humana” anterior a sociabilidade. Porém não há nenhuma “essência humana” que não tenha sido construída pelos próprios homens, todas as determinações da nossa sociedade são históricas e materialmente construídas pelas relações humanas, sendo assim, é possível sim os homens construírem novas formas de sociabilidade fora dos padrões capitalistas. Assistimos então a necessidade de mudanças além da igualdade formal, exigem-se mudanças em direção de uma igualdade substantiva. Mészáros entende por igualdade substantiva, uma igualdade real que difere-se da igualdade formal existente e garantida em nossa sociedade dentro dos limites estruturais do capital. Essa igualdade pressupõe o estabelecimento de uma nova estruturade sociedade e não propõe um “nivelamento por baixo”, como os defensores do capital gostam de afirmar que o socialismo pode trazer. É uma igualdade qualitativa, não meramente quantitativa. Essa igualdade Segundo Buonarroti: [...] deve ser medida pela capacidade do trabalhador e a necessidade do consumidor, não pela intensidade do trabalho e a quantidade das mercadorias consumidas. Ao levantar um peso de dez quilos, um homem dotado de certo grau de força trabalha tanto quanto um homem com força cinco vezes maior que levanta um peso de cinqüenta quilos. Quem satisfaz uma sede ardente engolindo uma jarra de água não goza prazer maior do que seu camarada que, estando com uma leve sede, engole apenas um copo. A meta em questão é a igualdade nas dores e nos prazeres, não no consumo das coisas e nas tarefas do trabalhador. (citado por MÉSZÁROS, 2006, p. 307). Essa igualdade substantiva esta de acordo com o que Marx idealizou que seria a sociedade comunista em seu pleno desenvolvimento: Na fase superior da sociedade comunista, quando houver desaparecido a subordinação escravizadora dos indivíduos à divisão do trabalho e, com ela, o contraste entre o trabalho intelectual e o trabalho manual; quando o trabalho não for somente um meio de vida, mas a primeira necessidade vital; quando, com o desenvolvimento dos indivíduos em todos os seus aspectos, crescerem também as forças produtivas e jorrarem em caudais os mananciais da riqueza coletiva, só então será possível ultrapassar-se totalmente o estreito horizonte do direito burguês e a sociedade poderá inscrever em suas bandeiras: De cada qual, segundo sua capacidade; a cada qual, segundo suas necessidades.” (MARX, 2001, p. 7-8) V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 7 7 Uma das questões colocadas pelo autor que assombram a ordem burguesa e deixam evidente essa necessidade de transição, é a questão da liberação das mulheres. O fato delas não se contentarem com “concessões formais/legais”, suas reivindicações exigem mudanças significativas na sociedade, mudanças que ultrapassam as barreiras impostas pelo capital e escancaram o fato da incompatibilidade da igualdade real com a estrutura excludente do capital. A estrutura patriarcal de nossa sociedade nas formas atuais de dominação do homem sobre a mulher se estruturaram juntamente com o surgimento da propriedade privada dos meios de produção, isso não significa que a dominação das mulheres pelos homens seja exclusivamente característica da sociedade capitalista, mas o capital se apropriou dessa forma de segregação, assim como da divisão da sociedade em classes para efetivar a sua expansão. O capital depende, portanto, da subserviência dos/as trabalhadores como classe, que se compõe por uma diversidade de sujeitos em suas relações sociais, sendo uma delas, as “relações sociais de sexo”. Tais relações se dão entre dois grupos sociais: homens e mulheres, que são grupos com interesses antagônicos, em permanente tensão, principalmente em torno da questão do trabalho. As práticas culturais pautadas no senso comum, como em determinações divinas ou biológicas, reproduzem preconceitos e levam a coexistência de formas de discriminação entre os sexos, dando sustentação ao desenvolvimento de “trabalhos femininos” e “trabalhos masculinos”, ou seja, a divisão sexual do trabalho. Na nossa sociedade, com a industrialização, a divisão sexual, inerente à divisão social do trabalho configurou-se em novas definições. Como parte do processo de trabalho, aquele considerado produtivo, passou a ser assalariado, já o trabalho reprodutivo foi definido como não trabalho. É importante destacar aqui que o problema central da divisão sexual do trabalho é que essa divisão não se da numa forma de complementariedade entre trabalhos de homens e de mulheres, mas expressa uma relação de poder, de dominação, dos homens sobre as mulheres, pois se dá numa forma segregada e hierarquizada. Mesmo com a entrada das mulheres no mercado de trabalho e no processo produtivo, aquelas atividades relacionadas aos aspectos reprodutivos continuaram sendo sua tarefa majoritariamente, principalmente nos espaços privados ou domésticos, quando passaram então a acumular duas ou mais jornadas diárias de trabalho, uma em seu lugar de trabalho fora de casa e outros em seus domicílios. Apesar do trabalho reprodutivo ser essencial para a produção, ele continua sendo subposto. As mulheres continuam submetidas a cargos menos V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 8 8 importantes ou mesmo quando ocupam os mesmos cargos dos homens seu salário é desvalorizado. Ao longo da história, demandas por igualdade sempre vieram à tona, principalmente em momentos de crise. Quando o modo de produção feudal já não serviu mais para atender às necessidades da burguesia, surgiu o capitalismo. Neste sistema, quando movimentos sociais surgiram com intensidade, a estratégia do capital foi fazer pequenas concessões, “acalmando” a população e resultando em avanços, porém, superficiais. O reformismo social-democrata pode oferecer promessas de realizações dos anseios socialistas - e o faz -, porém, a estrutura continua a mesma: o capital continua com o domínio do processo de produção e reprodução social, uma vez que a apropriação privada dos meios de produção mantém a divisão social (e sexual) do trabalho. Segundo Mészáros (2006), a emancipação das mulheres, assim como a igualdade significativa do trabalho, só pode ser firmada com o estabelecimento da igualdade substantiva. Dentre os padrões estruturantes da sociedade capitalista que perpetuam a manutenção do domínio do capital sobre a sociedade, podemos citar a família, instituição a qual perpetua e internaliza os valores que o capital os impõe, como a aceitabilidade dos mecanismos de acumulação capitalista que não abrem brecha para sua contestação. A própria estrutura da família é hierárquica, o “chefe” de família (homem) transmite uma relação de poder incontestável aos filhos - e à esposa - que mais tarde verão essa mesma figura no seu patrão. Desde crianças somos ensinados a nos adequarmos as exigências do mercado para antes de tudo sermos aceitos como “normais” e sempre visando a ascensão de classe se seguirmos as regras impostas. As atitudes questionadoras e contestadoras são recebidas como infâmias pelas outras pessoas ditas “normais”. Se a família viesse a se estruturar com base numa verdadeira igualdade estaria em direta contradição com o sistema capitalista, não podendo se tornar historicamente dominante, pois, ameaçaria toda a estrutura de dominação. Os problemas e “disfunções” cada vez mais frequentes na nossa sociedade, sobretudo os sociais, são abordados superficialmente em suas consequências e efeitos. A culpa é lançada sobre os ombros da família, se um jovem rouba, mata, usa drogas... os pais é que não o criaram direito, alega-se assim que a “desestruturação” da família é a causa desses problemas, pregando a volta aos “valores tradicionais da família”,a mulher recebe a maior parte dessa culpa, pois para o capital ela deveria cuidar das tarefas do lar, como da educação dos filhos, porém, a raiz do problema, como sabemos, está no sistema de produção vigente, pois o V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 9 9 mesmo, além de incentivar o individualismo e o preconceito, não fornece uma educação adequada nem políticas sociais eficientes que solucionem a fonte dos problemas, além disso com o advento do neoliberalismo cada vez mais o Estado empurra para a iniciativa privada a sua responsabilidade com a “Questão Social”, se excluindo e culpabilizando cada vez mais os indivíduos. Esses problemas resultantes da ausência da ação estatal são necessários para a contínua ampliação do capital, pois, elas expressam sua lógica de oposição de classes, porém, tais problemas também afetam a aceitabilidade consensual desse sistema, ou seja, “o capital depende da continuidade dessas mudanças e tende a ser por elas enfraquecido”. (MÉSZÁROS, 2006, p. 302) A vitória das mulheres em relação a sua entrada na força de trabalho em extensão tão significativa, que hoje chegam a ocupar a maioria da força de trabalho em muitos países, não significou a melhora da condição das mulheres no mercado de trabalho, pelo contrário, os homens é que tiveram que se adequar as muitas das condições às quais as mulheres já tinham que se submeter, como em relação aos salários baixos. Ao invés da mulher entrar no mercado de trabalho e passar a receber tanto quanto o homem já recebia, ela começou a receber menos, e devido às exigências por igualdade – progressivamente – o salário dos homens é que acabou se equiparando ao da mulher, e não vice-versa. [...] A diferença entre os salários de homens e mulheres diminuiu, mas a origem dessa mudança foi a queda nos salários dos homens. No entanto, apesar de mais de um ganha-pão, o poder de compra familiar caiu nos anos 80; em 1986 estava abaixo do que havia sido em 1979 e continuou a cair em 1987. (KOLKO, p. 315 citado por MÉSZÁROS, 2006, p. 273) Portanto, atualmente é necessário duas ou mais fontes de renda para ter proporcionalmente a renda que uma família tinha antigamente apenas com a renda do “pai de família”. À medida que a mulher adquire espaço na esfera produtiva vão se atribuindo à ela funções ditas femininas e com salários menores que os dos homens. Além da sua permanente discriminação no mercado de trabalho ocorre uma sobrecarga da mulher adquirindo uma dupla jornada de trabalho, o cuidado com os afazeres domésticos, com filhos e cônjuge, enfim, o trabalho reprodutivo, continuou sendo predominantemente trabalho da mulher e ainda sendo desconsiderado como um “trabalho”, pois não é assalariado. Não podemos negar que a mulher conquistou diversos avanços até os dias atuais, seja em questão de voto, trabalho, liberdade sexual... Assim como a família nuclear já não é mais a V SIMPÓSIO REGIONAL DE FORMACAO PROFISSIONAL E XXI SEMANA ACADÊMICA DE SERVIÇO SOCIAL TEMA CENTRAL: AS CONFIGURAÇÕES DA EXPLORAÇÃO DO TRABALHADOR NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO 10 10 única relação familiar existente e aceita socialmente – mas continua sendo historicamente dominante. Porém, na relação de igualdade entre homens e mulheres o avanço ocorrido até os dias atuais não ultrapassam o nível da igualdade formal. À isso Mészáros justifica como sendo próprio do capital ativar questões positivas para mais tarde cair em sua contradição eminente: “Durante o desenvolvimento histórico do capital também são ativadas algumas potencialidades positivas para a emancipação das mulheres – apenas para serem mais uma vez anuladas sob o peso das contradições do sistema.” (MÉSZÁROS, 2006, p. 304) CONSIDERAÇÕES Se não houver, portanto mudanças fundamentais no modo de produção e reprodução social, não se poderá efetivar uma verdadeira emancipação das mulheres, não ultrapassando a retórica da ideologia dominante de intenções incompatíveis e inaplicáveis. Essa emancipação, somente poderá se efetivar com a consolidação de um modo de produção baseado na verdadeira igualdade. Como Mészáros deixa claro: “Jamais se enfatizará o bastante que somente uma forma comunitária de produção e troca social pode arrancar as mulheres de sua posição subordinada e proporcionar a base material da verdadeira igualdade.” (MÉSZÁROS, 2006, p. 303). Até o presente andamento dos estudos podemos chegar a conclusão que podemos e devemos fazer nossa história pois o caminho que segue o capitalismo está exaurindo todos os nossos recursos e esta nos levando a resultados catastróficos. O presente momento histórico abre brechas para mudanças, mas somente com luta e conscientização coletiva conseguiremos alcançar uma igualdade substantiva. REFERÊNCIAS MÉSZÁROS, István. Para além do capital. Tradução: Paulo Cezar Castanheira; Sérgio Lessa. São Paulo: Boitempo, 2006. MARX, Karl. Crítica ao programa de gotha. Tradução: José Barata-Moura. Lisboa: Avante!, 2001. MARX. Karl. O Capital: Crítica da Economia Política. Tradução: Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
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