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66 1983-4209 - Volume 04 – Numero 01 – 2010 FONTES DE ALIMENTAÇÃO PARA ABELHAS NATIVAS: 1. ESTUDOS PRELIMINARES DA Cayaponia cabocla COMO PLANTA ALIMENTAR PARA Melipona scutellaris Adriana Evangelista Rodrigues1, Eduardo Silveira Lucas Farias2, Marcelo Luis Rodrigues3, Márcia de Sousa Coelho4, Glayciane Costa Góis5 , Claudete Maria da Silva5 RESUMO - As abelhas desempenham papel fundamental na manutenção da biodiversidade dos ecossistemas que dependem de polinizadores. Dessa forma, este trabalho tem como objetivo verificar a possibilidade de uso da planta vegetação típica da Caatinga, Cayaponia cabocla, conhecida popularmente como Gurdião, como fornecedora de matéria prima alimentar para as abelhas nativas Melipona scutellaris. O experimento foi desenvolvido em um Meliponário no município de Lagoa Seca – PB. As coletas dos dados foram das 13:00h as 17:30h. Ao longo dos dias observados, verificou-se que as abelhas nativas visitavam preferencialmente a C. cabocla, no período da tarde, e mesmo sendo a única espécie em floração, não houve visita da A. mellifera, com ocorrência apenas da M. scutellaris. Conclui-se que o Cayaponia cabocla é uma planta alimentar para a Melipona scutellaris, não sendo atrativa para as abelhas africanizadas. Unitermos: Bioecologia, Forrageamento, Meliponineo GUARDIAN ANALYSIS (Cayaponia cabocla) AS PLANT FOOD TO THE BEE Melipona scutellaris ABSTRACT - Bees play a fundamental role in the biodiversity maintenance of the ecosystems which depend of the pollinators. This way, this study aims to verify the possibility of using the corral native plant cayaponia cabocla known popularly as guardian, as provider of food raw material to native bees Melipona scutellaris. The experiment was carried out at a meliponary in Lagoa Seca town – Pb. The data Collection were carried out from 13:00 to 17:30. Along the observed days, It was verified that the native bees visited preferably the C. cabocla during afternoon time, being this the only one in flowering, there was not visiting of A. mellifera, with occurrence only of the M. scutellaris. It was concluded that the Cayaponia cabocla is a food plant to the Mellipona scutellaris, not attractive to Africanized bees. Uniterms: Bioecology, Foraging, Meliponineo INTRODUÇÃO As espécies de abelhas são diversas e abundantes nos neotrópicos. Cada grupo de espécies visita um pequeno número de plantas adaptadas evolutivamente à sua morfologia e comportamento, 1 Zootecnista, Professora Dr.ª do Departamento de Zootecnia. Universidade Federal da Paraíba (CCA/UFPB). Campus Universitário. CEP: 58397. Areia-PB. Brasil. e-mail: adriana@cca.ufpb.br 2 Zootecnista da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural da Paraíba. BR 230-KM 13,3 - CEP: 58.310-000 - Cabedelo-PB. 3 Biólogo, Professor Dr.º do Departamento de Zootecnia. Universidade Federal da Paraíba (CCA/UFPB). Campus Universitário. CEP: 58397. Areia-PB. Brasil. E-mail: rodrigues@cca.ufpb.br 4 Bióloga. Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Zootecnia da Universidade Federal da Paraíba (CCA/UFPB). Campus Universitário. CEP: 58397. Areia-PB. Brasil. Correspondência: marcia_coelhos@yahoo.com.br 5 Mestrandas do PPGZ/Centro de Ciências Agrárias. Universidade Federal da Paraíba (CCA/UFPB). Campus Universitário. CEP: 58397. Areia-PB. Brasil. E-mail: glayciane_gois@yahoo.com.br; klausinha_silva.06@yahoo.com.br 67 1983-4209 - Volume 04 – Numero 01 – 2010 sendo registrada a ocorrência de mais de 7000 espécies de abelhas na região neotropical (O'Toole & Raw, 1991). As interações ecológicas entre plantas e polinizadores constituem um dos principais processos para manutenção da biodiversidade, sendo a polinização a base para o sucesso reprodutivo das plantas, que abrange desde a transferência do pólen até a conseqüente formação dos frutos e sementes. Portanto, o mau funcionamento deste sistema mutualístico pode levar a distúrbios na integridade do ecossistema e a posterior perda de diversidade (Kevan & Philips, 2001). As abelhas desempenham papel fundamental na fecundação dos vegetais sendo por isso, importantes na manutenção da biodiversidade dos ecossistemas que dependem de polinizadores (Silva et al., 2008). Assim, torna-se importante a conservação das abelhas, já que são reconhecidas polinizadoras em ambientes naturais (Heard, 1999). O desaparecimento de polinizadores, resultado da degradação da fauna, pode impor prejuízos às populações de plantas (falha na reprodução, perda de diversidade genética ou decréscimo da progênie devido à depressão endogâmica) (Bawa, 1990). Muitos esquemas de conservação utilizam práticas de manejo da paisagem para conservar e realçar as comunidades florais, conseqüentemente melhorando a disponibilidade de alimento e recursos utilizados na construção dos ninhos de abelhas do grupo Meliponina (Potts et al., 2005). Os Meliponini, abelhas eussociais da subfamília Apinae, que inclui outras tribos como Euglossini (solitárias), Bombini e Apini, são popularmente chamados abelhas indígenas sem ferrão e ocorrem em grande parte das regiões de clima tropical e subtropical do planeta (região Pantropical) (Nogueira-Neto, 1997). Atualmente são descritas cerca de 600 espécies de meliponíneos, distribuídas em 56 gêneros (Cotorpassi-Laurino et al., 2006). Segundo Velthuis (1997) no Brasil concentra-se grande parte das espécies conhecidas, são mais de 300 formas descritas. Considerando que os meliponíneos são abelhas nativas, eussociais e com colônias populosas, o conhecimento da fauna de uma determinada região pode levar à seleção de espécies que sejam mais eficientes no número de visitas às plantas e no transporte de pólen; que tenham uma população relativamente grande e que apresentem uma boa adaptação ao manejo racional, objetivando o manejo auto-sustentado e/ou a exploração econômica (Malagodi-Braga & Kleinert, 2004). As abelhas encontradas no Brasil merecem destaque especial pelo fato de serem pouco estudadas e também por serem responsáveis pela reprodução da maioria das espécies vegetais nativas brasileiras. A Melipona scutellaris faz seu ninho principalmente em ocos de árvores velhas de até 80 m de altura. Os ninhos são construídos basicamente de cera pura ou cerume (cera, própolis e barro), a entrada é formada com barro e própolis moldando em forma de estrias ou sulcos (Kerr et al, 1996). Segundo Kerr et al. (2001), a M. scutellaris é um dos meliponíneos mais manipulados pelo homem americano. Neste intuito estando à produção de mel e outros produtos da colméia ligados à presença das flores, é importante que se conheça as plantas apícolas, seus períodos de florescimento e sua abundância em determinada região. Dessa forma, este trabalho tem como objetivo verificar a possibilidade de uso da planta Cayaponia cabocla, conhecida popularmente como Gurdião, como fornecedora de matéria prima alimentar para as abelhas nativas Meliopona scutellaris. MATERIAL E MÉTODOS Local do Experimento O experimento foi desenvolvido em um Meliponário situado no município de Lagoa Seca– PB, que está localizado na Mesorregião do Agreste Paraibano, que está a 634m de altitude nas coordenadas 7°10’15’’ de latitude sul e 35°51’13’’ de longitude oeste. A localização do meliponário em clima tropical quente adquire características de sub-umidade, com precipitações em torno de 800 mm anuais, com cinco meses em média de estiagem ano, temperatura média de 27ºC e umidade relativa do ar de 78%. A vegetação formada por Florestas Subcaducifólica e Caducifólica, 681983-4209 - Volume 04 – Numero 01 – 2010 próprias das áreas Agrestes com clima do tipo Tropical Chuvoso, com verão seco. A estação chuvosa se inicia em janeiro/fevereiro com término em setembro, podendo se adiantar até outubro (Mascarenhas et al. 2005). Avaliação Experimental Foram utilizadas 5 colônias nidificadas naturalmente em troncos de árvores. A composição da flora no entorno do meliponário é de vegetação típica do Agreste (Caatinga), e na época escolhida para o experimento a planta Cayaponia cabocla era a de maior intensidade de floração. Um ensaio realizado com observações feitas durante 30 dias na floração desta planta mostrou ser o período vespertino o de maior visitação das abelhas às flores. Por isso, o horário de coleta dos dados foram das 13:00h às 17:30h durante os 30 dias de floração da espécie estudada. O horário final foi determinado pela ausência completa de abelhas nas flores. Para a verificação da presença ou ausência de pólen e néctar, cinco abelhas foram capturadas manualmente na entrada da colméia. Na determinação da presença ou ausência de pólen, observavam-se as corbículas das abelhas, quando capturadas. Já para determinar a presença ou ausência de néctar, pressionava-se a região abdominal das abelhas com o intuito de promover o regurgitamento do material coletado pelas mesmas. Feito isto, os dados foram anotados em uma planilha. Para efeito de comparação, 25 abelhas foram colhidas diretamente da planta no horário de visitação. Os dados foram analisados através do teste Qui-quadrado (X2) (Siegel, 1975). RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados foram avaliados através de um teste experimental objetivando avaliar a área estudada, detectando quais plantas florescem e em que período do ano florescem. Durante o período experimental, através de observação da vegetação estudada, a espécie predominante em floração foi a C. cabocla. A C. cabocla tornou-se evidente também porque em um raio de 2 km não foi observado nenhuma outra planta florescendo, havendo em suas flores centenas de abelhas forrageando, tendo em vista que a região é uma caracterização da caatinga e, portanto poucas são as espécies que florescem em uma mesma época do ano. De acordo com Malvezzi (2007) a cobertura vegetal da caatinga no período chuvoso fica verde e florida e abriga uma das maiores biodiversidades brasileiras, inclusive de abelhas. Entretanto, no período normal de estiagem, ela hiberna, fica seca, adquire uma aparência parda, na verdade, o Semi-Árido tem apenas duas estações: a das chuvas e a sem chuvas. As espécies observadas visitando a C. cabocla a M. scutellaris foram predominantes no período estudado. A comprovação da fidelidade da M. scutellaris a C. cabocla foi feita pela análise realizada nos indivíduos das colméias que revelou a presença de pólen e néctar dessa planta. O regime semi-árido, que inclui a caatinga, exibe vegetação com diferenças sazonais de florescimento, uma estação chuvosa com alta diversidade de espécies floríferas, em contraste com a estação seca. A variação na disponibilidade de recursos gera um padrão sazonal, de intenso forrageamento pelas abelhas na estação chuvosa seguido de queda significativa na seca (Aguiar et al, 1995). A C. cabocla exerce uma atratividade sobre a M. scutellaris não visitando outra espécie vegetal e foi favorecida porque as abelhas conseguem retirar destas o suficiente para a sua alimentação naquele determinado período, ocorrendo dessa forma uma seletividade, pelo fato de ser uma espécie regional, e portanto as abelhas tem hábitos alimentares adaptados às plantas nativas. Isso aconteceu com a C. cabocla, pois ao perceberem a oferta de alimento próximo as colônias, em quantidade e qualidade e avaliando-se o custo através de uma relação de benefício, as melíponas priorizou a utilização da C. cabocla como fonte de alimento. Entende-se assim que algumas espécies vegetais podem ser classificadas como fonte alimentar específica de algumas espécies de abelhas, fato este comprovado com a C. cabocla que só foi visitado por M. scutellaris. Isso pode ser explicado por Carvalho (1999), o qual observou que existem plantas que não exercem atração sobre 69 1983-4209 - Volume 04 – Numero 01 – 2010 as abelhas. Além disso, as abelhas podem preferir determinada fonte em detrimento de outra, em vista da facilidade de coleta, da qualidade e da quantidade dos recursos tróficos fornecidos e a da interação com os competidores. Algumas espécies vegetais são mais atrativas às abelhas por possuírem um maior número de indivíduos floridos e/ou mais recursos tróficos em comparação a outras que não possuem tais características (Pazinni e Parra 1991). Com isso as abelhas apresentam uma freqüência específica em determinada planta, que segundo Paulino (1998) é uma constância ou fidelidade que são termos ecológicos que se referem ao fato de que uma abelha se limita a visitar uma determinada espécie vegetal durante uma viagem ou varias destas. A fidelidade das abelhas às plantas talvez seja o fator determinante da eficiência polinizadora. De acordo com Lorenzon et al. (2003) trabalhando com flora visitada pelas abelhas eussociais (Hymenoptera, Apidae) na Serra da Capivara, confirmou que algumas floradas foram exploradas somente por abelhas africanizadas, ou por apenas meliponíneos e muitas foram utilizadas por ambas, porque a diversidade e abundância das flores podem favorecer, também, a ocorrência de espécies dominantes diferentes, ora das africanizadas, ora de meliponíneos, em diferentes recursos e habitats e permitir ainda maior eficiência na exploração dos recursos. A C. cabocla mesmo sendo a única espécie em floração, não houve visita da A. mellifera com ocorrência somente da M. scutellaris. Este fato pode estar relacionado ao abandono da espécie A. mellifera pela escassez de reservas de alimentos, porque no período de seca, ocorre conseqüentemente a falta de alimento, refletindo em queda do crescimento das colônias, enfraquecendo-as e incentivando o enxameamento. Segundo Pereira et al., (2006) apesar da diversidade da flora apícola e da alta concentração de recursos alimentares existente no período chuvoso do Nordeste brasileiro, durante a estação seca, ocorre uma escassez de recursos alimentares para as abelhas. Dessa forma, a produção de mel da safra seguinte fica comprometida, na dependência de uma nova coleta de enxame, que necessitará se fortalecer e se desenvolver para iniciar a produção. Na africanizadas no período de estiagem como no período chuvoso cessam também as posturas pela rainha, eliminam parte dos zangões e com isso diminuem significativamente as posturas enfraquecendo rapidamente pela redução das operárias campeiras, além de aumentar a suscetibilidade a doenças. O grande número de indivíduos (milhares) da espécie M. scutellaris presente no C. cabocla demonstra a organização da colônia, visto que o período de florescimento desta planta é curto e que as operárias encontravam-se em plena atividade de coleta de matéria prima para a alimentação. Para Panizzi & Parra (1991) o fato de explorarem intensamente poucas fontes florais também determina a aleatoriedade dos valores de similaridade de coleta entre as espécies. Frequentemente o uso de uma única fonte estabelece o grau de similaridade em um período mais ou menos longo. Comparando com o trabalho atual, o que pode justificar a escolha apenas do C. cabocla como fonte de alimento, é o fato de a mesma apresentar uma grande produtividade (densidade floral), não sendo, portanto necessário realizar forrageamento em outras regiões, bem como da organização ou estruturação de uso e partilha das fontes de alimento na colônia, ou seja, ao longo dos dias observados, verificou-se que as abelhas nativas sóvisitavam o C. cabocla, no período da tarde. Esse comportamento está de acordo com Slaa et al (2000), que constataram que algumas abelhas sem ferrão preferem pastejar nas horas mais frias do dia. Nos valores apresentados é possível notar que nos intervalos observados, havia a entrada contínua de operárias com matéria prima (Tabela I). Tabela 1- Quantidade de indivíduos coletados das 5 colméias estudadas durante o período de florescimento do C. cabocla, seus horários de visita e o material coletado 70 1983-4209 - Volume 04 – Numero 01 – 2010 Recurso Alimentar Horário Total 14h30min 14h30min 14h30min 14h30min 14h30min Néctar 22 16 9 8 6 61 Néctar/ Pólen 2 8 16 12 13 51 Pólen 1 1 0 5 6 13 Total 25 25 25 25 25 125 Durante o período de observação houve diferenças no comportamento de coleta de matéria prima entre as colméias quando se compara ao horário de coletas. Neste trabalho ocorreu uma diferença em relação ao horário de visita uma vez que as flores foram visitadas no final da tarde, no momento em que o sol estava se pondo, e a temperatura estava em torno de 20º C, uma vez que a média na região nos meses de Julho e Agosto são 20º e 22ºC, respectivamente (Figura 1), mostrando que durante todo o período estudado, houve disponibilidade de néctar e pólen pela planta porque indivíduos das diferentes colônias tanto coletavam néctar ou pólen, como néctar e pólen ao mesmo tempo. O horário de coleta pode estar relacionado com a oferta dos recursos pela planta e não apenas pela disponibilidade de forrageamento das abelhas. Segundo Free (1993), os fatores mais importantes que influenciam na atratividade do néctar são a sua abundância e concentração de açúcar. No entanto, essa atratividade pode variar em diferentes horários do dia e em diferentes estágios de florescimento. Figura 1. Representação gráfica do comportamento de coleta durante o período de floração e horário de visita. CONCLUSÃO A C. cabocla pode ser utilizada como fonte alimentar para a M. scutellaris uma vez que no período de florescimento é visitada com grande intensidade, no entanto é atrativa para a M. Relação Abelha / material coletado Horário de visita 71 1983-4209 - Volume 04 – Numero 01 – 2010 scutellaris somente no período vespertino. As abelhas africanizadas não visitam a C. cabocla no período de floração, fato este que pode ser explicado pela migração das africanizadas na estação seca pela escassez de recursos alimentares. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Aguiar, C. M. L.; Martins, C. F.; Moura, A. C. DE A. (1995). Recursos florais utilizados por abelhas (Hymenoptera, Apoidea) em área de caatinga (São João do Cariri, Paraíba), Revista Brasileira de Biologia, João Pessoa, v. 10, n. 2, p. 101 – 117. Bawa, K. S. (1990). Plant-pollinator interactions in tropical rain forests. 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