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DA LESÃO CORPORAL (1)

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DA LESÃO CORPORAL
Professor Luiz Geraldo Gomes dos Santos
DA LESÃO CORPORAL
1 – Considerações Preliminares e Conceito
		A lesão corporal é a ação humana consistente em ofender, sem animus necandi, a integridade física ou à saúde de outrem, abrangendo qualquer ofensa à normalidade funcional do organismo humano, quer seja do ponto de vista anatômico, fisiológico ou psíquico.
		Impõe-se observar que tal conceituação encontra-se na exposição de motivos da parte especial do Código Penal, mais especificamente no item 42, constituindo-se no objeto jurídico de proteção da norma.
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		São exemplos de ofensa à integridade física (modificação anatômica prejudicial do corpo humano), as fraturas, fissuras, escoriações, queimaduras e luxações. A equimose (roxidão resultante do rompimento de pequenos vasos sanguíneos sob a pele ou sob as mucosas) e o hematoma (equimose com inchaço) caracterizam a lesão corporal, sendo que, no entanto, os eritemas (vermelhidão decorrente de uma pancada, a exemplo de um tapa na cara) não caracterizam a existência do crime de lesões corporais.
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		Observe-se, portanto, que integridade física nada mais é que um conceito que se refere à manutenção de uma situação de imutabilidade externa ou interna, das condições gerais do corpo humano, ou seja, mantém ele a sua integridade física, fisiológica e mental.
		a) Integridade Física: ausência de alteração anatômica interna ou externa do corpo humano;
		b) Integridade Fisiológica: ausência de alteração funcional do organismo;
		c) Integridade Mental: ausência de alteração de ordem psíquica.
	
		Havendo qualquer ação humana, sem animus necandi, que venha a alterar qualquer destas esferas de proteção, teremos, em tese, o crime de lesão corporal.
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2 – Da Classificação Jurídica
		O crime de lesão corporal é: crime comum; material; de dano; unilateral (em regra); comissivo ou omissivo; instantâneo; de forma livre e, plurissubsistente (em regra).
3 – Dos Sujeitos Ativo e Passivo
		O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois estamos diante de crime comum.
		Da mesma forma para o sujeito passivo, também não há qualquer exigência, salvo no que refere as figuras qualificados previstas nos §§ 1º IV, e 2º V, onde somente a mulher grávida pode ser vítima.
		Observe-se que se tivermos um inimputável que praticou as lesões corporais, por influência de terceira pessoa, estaremos diante de uma situação de autoria mediata, onde o terceiro será o autor do crime.
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4 – Da Objetividade Jurídica
		Busca-se proteger a incolumidade física em sentido amplo, o que inclui a integridade corporal e a saúde da pessoa humana.
5 – Do Objeto Material
		O objeto material nada mais é do que a pessoa sobre a qual recai a conduta delitiva.
6 – Núcleo do Tipo
		É o ofender que nada mais significa que prejudicar alguém do ponto de vista de integridade corporal (corpo humano) ou à sua saúde (funções e atividades orgânicas, físicas e mentais da pessoa).
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7 – Da Estrutura do Crime
				
Lesão 
Corporal
Dolosa
Culposa
 Leve (caput)
 Violência doméstica e
Familiar contra a mulher
 Seguida de morte (§ 3.º)
 Gravíssima (§ 2.º)
 Grave (§ 1.º)
Privilégio (§ 4.º)
Substituição da pena (§ 5.º)
Causa de aumento da 
pena (§ 7.º)
Lesão corporal 
leve (§ 9.º)
Aumento da pena em 1/3, se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência (§ 11).
(Pena: detenção, de 3 meses a 3 anos)
Lesão corporal grave, gravíssima e
seguida de morte
Aumento da pena em 1/3 (§ 10)
 Causa de Aumento (§ 7.º)
 Perdão judicial (§ 8.º)
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8 – Da Consumação.
		O crime em questão é de dano, motivo pelo qual a consumação ocorre no momento da efetiva ofensa à integridade física do ofendido, sendo o crime instantâneo, independentemente do tempo de duração da lesão.
9 – Da Materialidade
		Em virtude de se tratar de crime material, temos a necessidade de que haja a constatação da lesão mediante a realização de exame de corpo de delito, o qual terá por finalidade apurar a extensão dos danos para fins de incidência das formas qualificadas do delito, previstas no §§1º e 2º do artigo 129 do CP.
		Há que observar que se pode aceitar laudo médico ou atestado médico em substituição ao auto de exame de corpo de delito, bem como, prova testemunhal, sendo que, no entanto, o auto de exame de corpo de delito indireto (art. 167 do CPP), somente poderá ser admitido se os vestígios tiverem desaparecido, sob pena de nulidade (art. 564, III do CPP).
		No caso de prova testemunhal deverá haver a descrição detalhada das lesões, nos termos do artigo 160 do CPP.
		 
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10 – Da Tentativa
		É admissível, sendo que, se não houver como identificar a intenção do agente – se praticar lesões graves ou gravíssimas – incidirá o princípio do in dúbio pro reo.
		Observe-se ainda, que não há que confundir a lesão corporal tentada com as vias de fato (contravenção penal prevista no Decreto-Lei 3.688/41), visto que, nesta a intenção limita-se a agredir a vítima, sem no entanto lesioná-lo (empurrão, ou simples tapa na cara, que também pode ser injúria real), enquanto que naquela a intenção é lesionar.
11 – Do Elemento Subjetivo
		É o dolo, ou seja, a intenção de lesionar, havendo que assinalar que se houver outro dolo poderemos estar diante de tentativa de homicídio, maus tratos, ou ainda, o ato de causar perigo para a vida ou saúde de outrem.
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12 – Das Formas
12.1 – Da Lesão Corporal Leve: (enquadra por exclusão)
		O enquadramento aqui se dará por exclusão, sendo que tudo o que não puder ser encaixado nas formas grave e gravíssima, será considerado como lesão corporal simples, havendo que assinalar ainda, que poderemos ter a forma privilegiada e a culposa. Observe-se ainda, que há entendimento de que caso seja praticada com violência doméstica e familiar contra a mulher, não será considerada leve.
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12.2 – Da Lesão Corporal Grave - §1º do art. 129 do CP.
Incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias: é necessário para fins de constatação da incapacidade, que seja realizado exame complementar, o qual deverá ser realizado no 31º dia, após a pratica delitiva, contado da data do crime, podendo haver substituição por prova testemunhal, havendo que lembrar ainda, que tal ocupação tem de ser lícita, mesmo que imoral e que ainda, subsistirá mesmo quando a vítima puder exercer as suas ocupações habituais com dificuldade;
Perigo de Vida: é perigo concreto, motivo pelo qual tal qualificadora tem que ser clara, inequívoca, motivo pelo qual a perícia é fundamental, realizando um diagnóstico do perigo de vida. Entretanto, a jurisprudência tem admitido a substituição do laudo por prova testemunhal. Há que assinalar que referida prova testemunhal somente poderá ser admitida quando a testemunha tiver o conhecimento técnico necessário para indicar a existência de perigo de vida, em que pese algumas decisões jurisprudenciais em contrário.
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12.2 – Da Lesão Corporal Grave - §1º do art. 129 do CP.
c) Debilidade permanente de membro sentido ou função: a debilidade permanente aqui referida é aquela que leva a diminuição ou enfraquecimento da capacidade funcional e que pode ser duradoura, mesmo que possa ser revertida mediante intervenção cirúrgica ou tratamentos ortopédicos ou próteses, ou seja, não tem de ser dotada de perpetuidade.
Membros: superiores (braços, mãos, antebraços); inferiores (pernas, coxas e pés).
Sentido: são as faculdades de perceber o mundo exterior: audição, paladar, olfato, visão e tato.
Função: atividade específica de um órgão ou aparelho do corpo humano (circulatória, respiratória, secretora, reprodutora, digestiva, locomotora, etc.).
Obs. No caso de órgãos duplos a perda de um deles caracteriza a lesão grave pela debilidade permanente, enquanto a perda de ambos leva a lesão corporal gravíssima, pela perda ou inutilização de membro, sentido ou função. No que refere a dentesvai depender se haverá ou não debilidade da função mastigatória
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d) Aceleração de Parto: é na realidade uma antecipação de parto, um parto prematuro, havendo a necessidade que o feto venha a nascer e permaneça vivo, pois caso contrário teremos a lesão corporal gravíssima, sendo esta a posição majoritária. No entanto Mirabete sustenta que caso a criança nasça viva e venha a falecer depois, estaremos diante da aceleração de parto. Há que observar que o autor da lesão tem que ter ciência da gravidez da vítima, pois caso contrário responderá por lesão corporal leve.
12.3 – Da Lesão Corporal Gravíssima
Incapacidade permanente para o trabalho: aqui a incapacidade não é a referente as ocupações habituais, mas sim, aquelas ligadas ao trabalho por ele exercido. Observe-se que há posicionamento no sentido de que a mesma somente terá aplicabilidade se houver efetiva impossibilidade de que a vítima exerça atividade lucrativa, não aplicando-se a qualificadora se a lesão apenas levar a modificação da atividade desenvolvida, desde que na mesma profissão.
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Enfermidade Incurável: Aqui estamos nos referindo à situação que causa debilidade progressiva e incurável em um organismo, ou seja, que não pode ser curada pelos meios médicos disponíveis, não se exigindo que a vítima se submeta à cirurgias ou tratamentos de risco;
Perda ou inutilização de membro, sentido ou função: ao contrário da debilidade que é parcial, aqui temos situação que é total, do ponto de vista de funcionalidade do órgão, podendo ser:
Perda = extirpação (mutilação – amputação);
Inutilização = inaptidão do órgão (perda apenas funcional e não anatômica).
Obs. A correção corporal, com próteses não afasta a qualificadora. Já o reimplante afasta a sua aplicação, caso em que haverá lesão corporal grave.
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Deformidade permanente: Referida qualificadora está relacionada ao dano duradouro no corpo da vítima, mesmo que possa ser revertido com o passar dos tempos. Entretanto, a irreparabilidade tem de se dar por relevante intervalo de tempo. Segundo Damásio de Jesus, referida deformidade estaria vinculada ao aspecto estético, sendo que para existir teria que ter os seguintes requisitos:
	- permanente; visível; irreparável; que cause dano estético de certa monta; que cause impressão vexatória.
	No entanto tal posicionamento não é pacífico, visto que a lei não faz tal exigência, posição que hoje é a mais correta, mas ainda minoritária.
Aborto: observe-se que a intenção tem que ser a de lesionar (tendo ciência da gravidez) e, culposamente ocorre o aborto (crime preterdoloso), pois caso contrário poderemos ter o concurso formal impróprio entre o aborto e as lesões corporais ou ainda, o aborto qualificado em caso de lesões corporais graves.
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Obs. Em relação as lesões corporais grave e gravíssima, há entendimento de que se constitui em crimes qualificados pelo resultado, na modalidade preterdolosa, sendo que, no entanto, algumas qualificadoras são perfeitamente compatíveis com o dolo, a exemplo da prevista no inciso I, do § 1º, onde posso quebrar o braço de alguém intencionalmente. 
	Há ainda posicionamento de que, referidas qualificadoras podem ser tanto dolosas como culposas, sendo esta a posição de Esther de Figueiredo Ferraz, fundamentando seu entendimento na redação da lesão corporal seguida de morte, na qual, o legislador intencionalmente afastou o elemento dolo de referido parágrafo, o que demonstre que em relação aos demais, admite o mesmo a possibilidade de existência nas formas dolosas ou preterdolosas.
	Por fim, há que lembrar que tais qualificadoras são de natureza objetiva, motivo pelo qual comunicam-se com os demais agentes nos casos de concurso de pessoas, desde que tenham entrado na esfera de conhecimento de todos.
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13 – Da Absorção
		Há que observar que alguns tipos penais trazem em seu bojo lesões corporais, decorrentes de violência ou grave ameaça que lhes são elementares, a exemplo do constrangimento ilegal, do roubo, da extorsão, do estupro, dentre outros. Em tais casos, teremos que aplicar o Princípio da Consunção, pelo qual o crime mais grave absorverá o menos grave.
		Entretanto, referida regra não será aplicada quando o preceito secundário do tipo penal prever expressamente o concurso material obrigatório, a exemplo da injúria real (art. 140, §2º do CP), da resistência (art. 329, §2º do CP) e do exercício arbitrário das próprias razões (art. 345 do CP).
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 14 – Da Lesão Corporal Seguida de Morte
		Observe-se que estamos diante de um crime preterdoloso, visto que, o próprio parágrafo nos indica tal situação.
15 – Da Lesão Corporal Dolosa Privilegiada (art. 129 §4º)
		Referida privilegiadora é aplicável apenas aos crimes cometidos dolosamente, não tendo aplicabilidade na lesão corporal culposa, sendo que para fins de interpretação do referido dispositivo legal temos que buscar os mesmos comentários realizados quando do estudo do homicídio privilegiado.
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16 – Das Lesões Corporais Leves
		É uma espécie de privilégio, visto que o magistrado pode reduzir a pena de um sexto a um terço, conforme previsto no §4º do art. 129, ou então, substituí-la por multa.
		Em relação as lesões recíprocas, temos a situação onde duas pessoas injustamente se agridem, caso em que não há que se confundir tal postura com a legítima defesa, onde apenas a agressão de uma é injusta.
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17 – Do Aumento de Pena na Lesão Corporal Dolosa (§7º do art. 129 do CP)
		Refere-se a critério etário, onde a pena será aumentada de 1/3 se for praticado contra menor de 14 e maior de 60, havendo clara relação com a diminuição da capacidade de resistência da vítima.
18 – Da Lesão Corporal Culposa (§6º do art. 129 do CP)
		Estamos diante de um tipo penal aberto e, para o qual, o intérprete deve utilizar um juízo de valor, que será lastreado no critério do homem médio, a fim de identificar se a conduta é culposa ou não. Há que lembrar ainda, que a conduta culposa é aquela não dotada de intenção, mas de previsibilidade objetiva não prevista subjetivamente, a qual decorre de imprudência, negligência e imperícia.
		Cumpre observar ainda, que na lesão corporal culposa, não há que se falar em lesão grave ou gravíssima, havendo apenas a lesão corporal culposa, sendo que a gravidade das lesões será considerada na fixação da pena base.
		Por fim, há que mencionar que para a lesão corporal culposa aplicam-se todas as disposições da Lei 9.099/95, bem como, que se for lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, teremos a aplicação do artigo 303 da Lei 9.503/97.
		Em relação ao aumento da pena nas lesões culposas, previstas no §7º, valem todas as considerações feitas para o crime de homicídio, sendo cabível ainda o perdão judicial, nos termos do §8º.
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19 – Da Lesão Corporal e Violência Doméstica (§9º)
	Referida majorante será aplicada em relação à lesão corporal leve, sendo que se a lesão for grave, gravíssima, ou ainda, seguida de morte, haverá a incidência do disposto no §10º do art. 129 do CP.
	Saliente-se que em relação a tais crimes não há que se falar em aplicação da Lei 9.099/95, não podendo haver transação penal e composição civil de danos, sendo atualmente crime de ação penal pública incondicionada.
20 – Dos Parágrafos 10º e 11º
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21– Considerações Finais
Das Lesões Esportivas: as lesões decorrentes da prática desportiva ou de seus desdobramentos lógicos e desde que estejam dentro da previsibilidade, ou dos riscos socialmente aceitos, não configuram lesões corporais, configurando exercício regular do direito, em virtude da previsão legal autorizadora, a exemplo de lutas de boxe, vale tudo, etc.;
Das Intervenções Cirúrgicas: Não configuram crime, desde que realizadas dentro da legalidade, sendo que nesse sentido temos o transplante de órgãos (Leis 9.434/97 e 10.211/2001), a cirurgia transexual, e a esterilização cirúrgica (Lei 9.263/96).Há que observar ainda, que nestes casos que, havendo desrespeito à lei e havendo lesões, podemos ter a incidência de Lei Especial, a exemplo do que dispõe o artigo 14 da Lei 9.434/97;
Princípio da Bagatela ou Insignificância: Causa de exclusão da tipicidade.
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d) Do Consentimento do Ofendido e a Lei 9.099/95: Atualmente não há como negar que as pessoas podem dispor da sua integridade física, a exemplo das lesões decorrentes de atividades esportivas e da colocação de brincos, piercings, tatuagens, etc., condutas estas que podem se consideradas como socialmente adequadas. Da mesma forma, não pode o Estado intervir na esfera estritamente privada das pessoas, as quais, muitas vezes, optam por ter lesões corporais diversas, a exemplo das decorrentes da prática sexual.
		O próprio legislador, ciente de tais circunstâncias, transformou a lesão corporal simples em crime de ação penal pública condicionada à representação do ofendido, tal qual estabelece o artigo 88 da Lei. 9.099/95.
		Em relação ao consentimento do ofendido, o entendimento é de que se constitui em causa supralegal de exclusão da ilicitude, desde que estejam presentes os seguintes requisitos:
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Segundo Norberto Avena, os requisitos para a existência do consentimento do ofendido como causa supralegal de exclusão da ilicitude são os seguintes:
deve ser expresso, pouco importando sua forma (oral ou por escrito solene ou não);
não pode ter sido concedido em razão de coação ou ameaça, nem de paga ou promessa de recompensa, impondo –se assim que tal consentimento seja livre;
é necessário que tal consentimento seja moral e que respeito os bons costumes;
deve ser manifestado previamente à consumação da infração penal. A anuência posterior à consumação do crime não afasta a ilicitude (observar aqui que se houver posterior anuência, bastará deixar de oferecer a representação);
o ofendido deve ser capaz para consentir, ou seja, deve ter completado 18 anos de idade e não padecer de nenhuma anomalia que retire a sua campacidade de entendimento e autodeterminação.
Obs. O consentimento do ofendido somente pode ser admitido na lesão corporal leve, sendo que em relação as demais formas de lesões corporais não há que se falar em disponibilidade do bem jurídico.
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e) Do Corte de Cabelo ou Barba: aqui temos divergência doutrinária, visto que alguns entendem que podemos estar diante de lesões corporais ou injúria real (onde a intenção é a de humilhar, envergonhar – artigo 140, §2º) sendo que, no entanto, não concordo com tais posicionamentos, pois salvo situação excepcional estamos diante da necessidade de aplicação do Princípio da Bagatela, transferindo a solução para tal fato para a esfera cível e não criminal.
f) Da Autolesão: pelo Princípio da Alteridade não configura crime, salvo se houver interesse em violar outro bem jurídico, a exemplo da fraude contra seguradora.
g) Das Cirurgias Emergenciais: não configuram crime, mesmo sem o consentimento do ofendido ou de seus familiares, desde que haja urgência, havendo verdadeiro estado de necessidade. Caso contrário, deverá o médico que aguardar consentimento do paciente ou familiares, sob pena de haver o crime em questão. Entretanto, Heleno Cláudio Fragoso sustenta que não há crime em qualquer caso, pois a intenção seria a de curar e desde que a cirurgia tenha êxito, caso em que existiria causa de exclusão da tipicidade.
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Da Cirurgia de Mudança de Sexo.
		A rigor a cirurgia para mudança de sexo configura lesão corporal gravíssima, visto que, leva a perda de função reprodutora.
		Entretanto, não há como falar em crime de parte do médico que realiza tal cirurgia, visto que, tem por finalidade de corrigir uma anomalia psíquica que é a transexualidade, que é uma considerada pela OMS uma espécie de transtorno de identidade de gênero. Observe-se, portanto, que a cirurgia tem por finalidade trazer a felicidade, um aspecto de cura para alguém, havendo clara ausência de dolo de lesionar.
		Tal procedimento encontra a sua base legal na Resolução 1.652/2002, do Conselho Federal de Medicina, a qual, segundo Norberto Avena, a autoriza nos seguintes termos:
		
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o paciente transexual é portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência à automutilação e/ou autoextermínio;
a cirurgia de transformação plástico-reconstrutiva da genitália externa, interna e caracteres sexuais secundários não constitui crime de mutilação previsto no artigo 129 do Código Penal, eis que tem o propósito terapêutico específico de adequar a genitália ao sexo psíquico;
a medicina atual possui viabilidade técnica para realizá-la com segurança;
o art. 199, §4º, da Constituição Federal dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa, tratamento, e a transformação da genitália constitui a etapa mais importante no tratamento de pacientes com transexualismo;
o art. 42 do Código de Ética Médica veda os procedimentos médicos proibidos em lei, e não há lei que defina a transformação terapêutica da genitália como crime.
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Obs. Há que assinalar que referida resolução, exige ainda em seu artigo 3º, para fins de caracterização do transsexualismo a presença dos seguintes critérios:
desconforto com o sexo anatômico natural;
desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto;
permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos; e
ausência de outros transtornos mentais.
	
	Cumpre observar ainda, que a pessoa que vai se submeter à cirurgia precisa ter mais de 21 anos e consentir livremente para a realização da mesma, depois de ciente de todos os riscos e consequências.
	Da mesma forma, a cirurgia será precedida de avaliação por equipe multidisciplinar, composta de um médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente social.

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