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Apelação Cível n. 2014.071999-9, de Brusque Relator: Desembargador Tulio Pinheiro APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. SENTENÇA QUE REJEITOU OS EMBARGOS MONITÓRIOS E CONSTITUIU O VALOR REPRESENTADO NA CÁRTULA EM TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. RECURSO DA RÉ/EMBARGANTE. TESES DE AUSÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE AS PARTES E DESACORDO COMERCIAL NO NEGÓCIO QUE DEU CAUSA À EMISSÃO DO CHEQUE. IRRELEVÂNCIA. TÍTULO TRANSFERIDO À AUTORA MEDIANTE ENDOSSO. AUTONOMIA DO CHEQUE EM RELAÇÃO AO NEGÓCIO ORIGINÁRIO. INOPONIBILIDADE DE EXCEÇÕES PESSOAIS AO TERCEIRO PORTADOR. ALEGAÇÃO DE MÁ-FÉ DA REQUERENTE NÃO COMPROVADA. ÔNUS QUE INCUMBIA À DEVEDORA DEMANDADA, DADA A PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO POSSUIDOR DO TÍTULO. SENTENÇA MANTIDA. RECLAMO CONHECIDO E DESPROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2014.071999-9, da Comarca de Brusque (Vara Comercial), em que é apelante Decoração Cardeal Ltda. ME e apelada GGSimas Distribuidora de Equipamentos Eletrônicos Ltda. EPP: A Terceira Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais. Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Rodrigo Cunha (Presidente) e Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva. Florianópolis, 12 de fevereiro de 2015. Tulio Pinheiro RELATOR RELATÓRIO Perante o Juízo da Vara Comercial da Comarca de Brusque, GGSimas Distribuidora de Equipamentos Eletrônicos Ltda. EPP ajuizou ação monitória em face de Decoração Cardeal Ltda. ME, objetivando a satisfação de crédito estimado em R$ 2.000,00 (dois mil reais), representado em 1 (um) cheque emitido pela ré e recebido pela autora mediante endosso. Citada, a requerida apresentou embargos monitórios. Na peça de defesa, relatou, em síntese, que emitiu o cheque em questão como forma de pagamento ao Sr. Gabriel Moritz Pires por serviço de instalação de câmeras de segurança, sendo que este, no entanto, não realizou o serviço. Asseverou que, por conta disso, promoveu a sustação do cheque menos de 1 (um) mês após a sua emissão. Disse, ainda, que a ré, a quem foi repassado o cheque mediante endosso, agiu com má-fé ao receber a cártula e promover a cobrança, uma vez que tinha ciência do desacordo comercial havido entre a autora e o Sr. Gabriel. Com base nisso, conclui que "(...) a pendência existente é entre a autora e o Sr. Gabriel Moritz Pires, e não da Embargante com a Embargada, que de forma abusiva, pretende locupletar-se às custas daquela (...)" (fl. 49). Após impugnados os embargos (fls. 70/74), a MM.ª Juíza Bertha Steckert Rezende sentenciou o feito, julgando procedente o pedido monitório, sob o fundamento, em síntese, de que a parte embargante não logrou comprovar a suposta má-fé da autora endossatária do título. Irresignada, a embargante interpôs este recurso de apelação. Nas razões do inconformismo, reitera as teses lançadas nos embargos monitórios. Com as contrarrazões, foram os autos remetidos a esta Corte. Este é o relatório. Gabinete Desembargador Tulio Pinheiro VOTO Cuida-se de ação monitória pela qual é perseguido crédito estimado em R$ 2.000,00 (dois mil reais) e representado em cheque prescrito. Infere-se dos autos que, em um primeiro momento, a apelante emitiu e entregou o cheque objeto da demanda ao Sr. Gabriel Moritz Pires, que, posteriormente, transferiu-o à autora mediante endosso. Ou seja, figura a demandante, atual possuidora do título, na condição de terceiro de boa-fé. Segundo o art. 20 da Lei n. 7.357/85, "o endosso transmite todos os direitos resultantes do cheque". Já o art. 13 da mesma legislação preceitua que: "as obrigações contraídas no cheque são autônomas e independentes". Logo, ao receber o título mediante endosso, a autora tornou-se titular do crédito nele representado, em relação totalmente independente daquela que deu causa à emissão da cártula. A este respeito, professa Rubens Requião: (...) explicamos que o título de crédito é autônomo, não em relação a sua causa como às vezes se tem explicado, mas porque o possuidor de boa-fé exercita um direito próprio, que não pode ser restringido ou destruído em virtude das relações existentes entre anteriores possuidores e o devedor. Cada obrigação que deriva do título é autônoma em relação às demais. Existem muitos títulos que intensificam uma qualidade particular, que é a independência. São títulos de crédito regulados pela lei, de forma a se bastarem a si mesmos. Não se integram, não surgem, nem resultam de nenhum outro documento. Não se ligam ao ato originário de onde provêm. Assim é o cheque (Curso de Direito Comercial, 2º vol., 28ª edição rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 561). Destarte, tendo a requerida emitido o cheque, e sem a aposição de cláusula "não à ordem", sujeitou-se ela à circulação e, por conseguinte, a se tornar devedora solidária de quem quer que viesse a portar a cártula, a despeito da ausência de relação comercial com o portador. Por outro lado, em se tratando de direito cambiário, as exceções pessoais, tais como o desacordo comercial supostamente ocorrido entre emitente e beneficiário original da cártula, são inoponíveis aos terceiros de boa-fé. Dito de outro modo, não cabe ao sacador suscitar contra o portador do cheque eventuais defeitos jurídicos decorrentes da relação primitiva, ressalvados os casos de má-fé por parte deste. Tal premissa encontra-se sedimentada no art. 25 da Lei do Cheque, in verbis: "quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em detrimento do devedor.". Dada a presunção de boa-fé de que goza o terceiro possuidor do título, eventual alegação de má-fé deve ser comprovada por quem a suscite. Acerca do tema, colhe-se da jurisprudência desta Corte: APELÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. (...) EMBARGOS MONITÓRIOS. Gabinete Desembargador Tulio Pinheiro CHEQUE PRESCRITO. ALEGAÇÃO DE QUE O TÍTULO FOI EMITIDO COM VINCULAÇÃO A CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E DE QUE ESSES NÃO FORAM CONCLUÍDOS. TÍTULO AUTÔNOMO. DISCUSSÃO DA CAUSA DEBENDI. IMPOSSIBILIDADE. CÁRTULAS EM PODER DE TERCEIRO. INOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 25 DA LEI N. 7.357/1985. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO PORTADOR DO CHEQUE NÃO AFASTADA. ÔNUS DA EMBARGANTE. EXEGESE DO DISPOSTO NO ART. 333, II DO CPC. (...) (Apelação Cível n. 2011.050013-3, rel. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, j. em 20.06.2013). No caso dos autos, a apelante, emitente do cheque, alega ter a autora agido com má-fé, pois, no momento do recebimento da cártula, seria sabedora do desacordo comercial no negócio subjacente. Ocorre que, como bem observou a douta magistrada sentenciante, não há sequer indícios, muito menos provas, a corroborar a versão apresentada, ônus este, conforme visto, que incumbia à devedora ré. Ao contrário do que tenta fazer crer a apelante, a menção feita na peça inicial referente ao desacordo comercial diz respeito à informação passada por representante da própria loja devedora, muito provavelmente quando a autora a procurou para reaver o valor do cheque, ou seja, depois (por óbvio) do recebimento deste por endosso. Assim, porque não demonstrada a má-fé da autora, resta intacto o direito de crédito desta com relação à apelante no que toca ao título que lastreia a demanda. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS MONITÓRIOS. ALEGAÇÃO DE DESACORDO COMERCIAL A TORNAR INDEVIDA A COBRANÇA DO MONTANTE CONTIDO NO CHEQUE. (...) CAMBIAL QUE CIRCULOU MEDIANTE ENDOSSO. BOA-FÉ DO TERCEIRO ADQUIRENTE QUE SE PRESUME. AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO, ÔNUS QUE INCUMBIA À DEVEDORA DEMONSTRAR. INOPONIBILIDADE DE EXCEÇÕES PESSOAIS. Diante do princípio da abstração, não é lícito ao emitente do cheque que circulou mediante endosso, a oposição de exceçõesde caráter pessoal a terceiro portador do título de boa-fé. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 2012.023839-0, rel. Des. Altamiro de Oliveira, j. em 07.10.2014). Ante o exposto, é de ser mantida incólume a sentença. Este é o voto. Gabinete Desembargador Tulio Pinheiro
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