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Extras - 1ª parte

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1 
 
- As noções de causa, relação causal e lei causal dizem respeito às relações entre 
eventos (ocorrências) da realidade. Nós podemos usar (aplicar) essas noções em dois 
tipos de contexto: contextos mais determinísticos e contextos menos determinísticos. 
- Exemplos iniciais: (1) Lançamento de um dado: como concebemos a relação entre o 
evento “lançamento do dado” e o evento “parada do dado no número 5”? (2) 
Experiência de injustiça e desenvolvimento de agressividade. Como concebemos a 
relação entre a ocorrência do sentimento de ser vítima de uma injustiça e a ocorrência 
de uma atitude agressiva? (3) Uso do flúor e cárie dentária: como concebemos a 
relação entre o evento “uso do flúor” e a não ocorrência do fenômeno “cárie 
dentária”? (4) Envenenamento por arsênico e morte do ser humano. (5) Aquecimento 
da água a 100°C e ebulição da água. 
 
- A diferença entre esses dois tipos de contexto de aplicação não remete à realidade 
que se está pretendendo conhecer, mas à nossa pretensão de conhecimento: tem a 
ver com o tipo de conhecimento que nos sentimos em condições de ter e expressar, ou 
com o tipo de conhecimento que estamos pretendendo expressar. Tem a ver com os 
limites que estamos reconhecendo em nosso conhecimento da realidade. 
- Contextos mais determinísticos são aqueles nos quais temos pretensões mais 
ousadas de conhecer as relações entre os eventos da realidade. Contextos menos 
determinísticos são aqueles nos quais somos mais modestos em nossa pretensão de 
conhecer tais relações 
- Contextos mais determinísticos são aqueles nos quais acreditamos poder conhecer 
relações necessárias e determinadas entre determinados eventos individuais da 
realidade – por exemplo, o evento “aquecimento da água a 100°C” (causa) e o evento 
“ebulição da água” (efeito). 
- Se nós acreditamos poder conhecer uma relação causal necessária e determinada 
entre eventos individuais da realidade, é porque acreditamos que as relações entre os 
eventos individuais estão subordinadas a uma relação mais geral ou universal, 
igualmente necessária e determinada, entre tipos de evento. Em outras palavras, 
acreditamos que a relação entre os eventos individuais está subordinada a uma lei 
causal universal (por exemplo, “Sempre que a água atinge a temperatura de 100°C, ela 
entra em ebulição”). 
2 
 
- Contextos menos determinísticos são aqueles nos quais reconhecemos que o máximo 
que podemos conhecer são correlações probabilísticas entre eventos individuais, ou 
correlações estatísticas entre tipos de evento. Se pensarmos, por exemplo, na relação 
entre o evento “uso do flúor” e o evento “aparecimento da cárie dentária”, admitimos 
que não podemos conhecer uma relação necessária e determinada entre esses 
eventos, quer sejam tomados como eventos individuais quer como tipos de evento. 
- No plano dos eventos individuais, admitimos que a relação entre eles depende de 
uma série de circunstâncias e variáveis peculiares a cada indivíduo (disposições 
genéticas, reações endócrinas, ocorrências no plano da alimentação, etc.), algumas das 
quais talvez não sejamos capazes de conhecer ou levar em conta. 
- Entretanto, ainda que não possamos conhecer nenhuma relação necessária e 
determinada entre os eventos individualmente tomados, no plano mais geral dos tipos 
de evento talvez possamos conhecer uma relação relativamente indeterminada – a 
saber, a frequência relativa do tipo de evento “cárie dentária” num conjunto de seres 
humanos que usam flúor. Ao compararmos esta relação com a relação que se verifica 
num conjunto de seres humanos que não usam flúor, e ao verificarmos que a 
frequência da cárie no primeiro conjunto é significativamente menor do que no 
segundo, podemos dizer que o uso do flúor “causa” uma diminuição da incidência da 
cárie dentária. 
- No plano dos eventos individuais, não se pensa aqui numa relação necessária e 
determinada, mas meramente probabilística: para qualquer indivíduo, o uso do flúor 
diminui a probabilidade da ocorrência do fenômeno cárie dentária. No plano dos tipos 
de evento, não se pensa aqui numa lei causal em sentido estrito, mas numa correlação 
meramente estatística. 
- Dois esclarecimentos são importantes. 
- Em primeiro lugar, a correlação causal de caráter estatístico encontrada numa 
população como um todo não pode ser automaticamente transferida para qualquer 
indivíduo em particular, na medida em que, para qualquer indivíduo particular, a 
relação entre os eventos em questão depende de uma série de circunstâncias e 
condições peculiares à sua situação específica. Com a afirmação de uma relação causal 
de caráter estatístico não pretendemos exprimir nenhuma relação peculiar a 
determinado indivíduo. 
3 
 
- Suponhamos que a investigação centrada em certa população permita afirmar que o 
uso do flúor “causa” uma queda de 80% na frequência da cárie dentária neste 
conjunto de pessoas. Para qualquer indivíduo em particular, ou para qualquer ser 
humano tomado individualmente, esta afirmação não equivale à afirmação de que, se 
este indivíduo usar flúor, a probabilidade de ele apresentar cárie cai exatamente 80%. 
Podemos dizer que o uso do flúor produz neste indivíduo uma forte tendência à 
diminuição da incidência da cárie. Mas a relação entre “uso do flúor” e “ocorrência de 
cárie” vai depender neste caso de variáveis e circunstâncias peculiares a este indivíduo 
específico. 
- Segundo esclarecimento, que complementa o primeiro. 
- Ao admitirmos que não podemos conhecer nenhuma relação necessária e 
determinada entre os eventos em questão, não necessariamente estamos querendo 
dizer que a relação entre eles é em si mesma indeterminada. Ao contrário, é 
perfeitamente possível admitir que, para qualquer indivíduo em particular, a 
ocorrência ou não ocorrência da cárie dentária é rigorosamente determinada pela 
série de circunstâncias e condições que lhe são peculiares. O uso ou não do flúor é 
apenas uma dessas circunstâncias, insuficiente para determinar qualquer efeito 
específico. O uso do flúor cria uma tendência à não ocorrência da cárie dentária, mas 
não determina esta não ocorrência. Entretanto, se fôssemos capazes de conhecer e 
levar na devida conta toda a série de circunstâncias próprias de certo indivíduo, 
seríamos capazes de mostrar de que modo o uso do flúor se liga a todas as demais 
circunstâncias numa relação necessária e determinada com a ocorrência ou não 
ocorrência da cárie dentária. 
- Para aprimorar este segundo esclarecimento, podemos compará-lo ao exemplo do 
lançamento de um dado. Hoje em dia ainda é possível afirmar que, se pudéssemos 
conhecer toda a série de condições, variáveis e circunstâncias envolvidas num 
lançamento de dado individualmente tomado (posição inicial exata dos componentes 
materiais microscópicos, movimento exato dos dedos em relação a tais componentes, 
movimentos exatos do ar, ou coisas desse tipo), poderíamos conhecer uma relação 
necessária e determinada entre o evento “lançamento do dado” e o evento “posição 
final do dado no número 5”, ou seja, poderíamos prever sua trajetória e o número em 
que ele finalmente para. 
4 
 
- Entretanto, como não podemos conhecer todas as condições e circunstâncias 
causalmente relevantes na trajetória individual do dado, recorremos à probabilidade. 
Neste caso, é mais comum recorrermos a um cálculo a priori, ou seja, logicamente 
independente da observação de grande número de lançamentos do dado. Com base 
num cálculo a priori, dizemos que a probabilidade de cair qualquer número 
determinado, inclusive “5”, é 1/6. 
 
- Podemos agora retornar à diferença entre contextos mais determinísticos e 
contextos menos determinísticos de aplicação da noção de causa.Como sugerido 
acima, podemos afirmar que essa diferença não consiste na aceitação ou 
questionamento da tese de que as relações entre os eventos individuais da realidade 
são relações necessárias e determinadas. Podemos afirmar que em ambos os 
contextos (tanto nos mais determinísticos quanto nos menos determinísticos) esta 
tese é em princípio aceita. 
- Contextos menos determinísticos são aqueles nos quais admitimos que não somos 
capazes de abarcar e levar na devida conta todas as variáveis e circunstâncias 
constitutivas das relações necessárias e determinadas existentes entre eventos 
individuais da realidade. São aqueles nos quais somos por assim dizer menos 
confiantes no nosso poder de conhecer toda a realidade, ou a realidade em toda sua 
complexidade. Ou ainda: menos confiantes na capacidade de nossos modelos teóricos 
incluírem todas as circunstâncias e condições que são essenciais para as relações 
necessárias e determinadas entre eventos individuais da realidade. 
- Contextos mais determinísticos: aqueles nos quais acreditamos poder formular um 
modelo teórico que abranja todas as circunstâncias e condições essenciais para as 
relações necessárias e determinadas entre eventos individuais da realidade. Aqueles 
nos quais nos sentimos mais confiantes no poder de nossos modelos teóricos: por 
acreditarmos que eles incluem todas as circunstâncias e condições causalmente 
relevantes, acreditamos que eles permitem previsões exatas e determinadas da 
ocorrência ou não ocorrência de eventos específicos da realidade. 
[Contextos menos determinísticos: aqueles nos quais admitimos não conhecer (ou não 
poder levar na devida conta) todas as circunstâncias e condições constitutivas das 
relações necessárias e determinadas entre os eventos da realidade. Aqueles nos quais 
5 
 
admitimos que nossa teoria não permite uma previsão exata da ocorrência ou não 
ocorrência de eventos específicos da realidade.] 
 
- Dois âmbitos de análise que podem beneficiar-se da distinção entre contextos mais 
determinísticos e contextos menos determinísticos: análise da história da ciência e 
análise das diferentes espécies de ciências (análise, por exemplo, de certas diferenças 
entre física, biologia/medicina e ciências sociais). 
- Do ponto de vista da história da ciência, pode-se afirmar que o contexto da prática 
científica a partir da virada do século XIX ao XX é menos determinístico do que o 
contexto vigente até meados do século XIX. Isto não significa que hoje em dia se tenha 
abandonado completamente a crença de que as relações entre os eventos individuais 
da realidade sejam relações necessárias e determinadas. Significa apenas uma 
admissão de que, ainda que elas sejam necessárias e determinadas, elas envolvem um 
número de variáveis e circunstâncias significativamente maior do que aquele que era 
considerado e focalizado na prática científica da mecânica clássica. Trata-se da 
admissão de que, ainda que as relações entre os eventos da realidade sejam 
necessárias e determinadas, elas apresentam uma complexidade dificilmente 
apreensível pelos homens, ou até completamente inapreensível. 
- Trata-se da admissão de que uma enorme parte das relações (necessárias e 
determinadas) entre eventos individuais não pode ser encaixada em leis causais de 
caráter geral. 
- Do novo ponto de vista, enunciados científicos formulados em contextos mais 
determinísticos podem continuar pretendendo descrever relações necessárias e 
determinadas entre eventos da realidade. Eles podem continuar pretendendo 
identificar as variáveis e condições que são essenciais para a existência de certas 
relações necessárias e determinadas entre eventos da realidade. Mas ele não pode 
ignorar a possibilidade de que uma variável ou circunstância desconhecida ou 
negligenciada afete as relações que ele identifica e exprime. Hoje em dia, mesmo nos 
contextos da prática científica mais determinística, o bom enunciado científico não 
pode ignorar o fato de que ele é essencialmente falível. 
 
6 
 
- A falibilidade essencial do atual contexto histórico (contexto historicamente menos 
determinístico) distingue-se da falibilidade contingente admitida no contexto 
historicamente mais determinístico típico da prática científica vigente até meados do 
século XIX. A falibilidade contingente é a falibilidade referida aos erros dos cientistas, 
erros que em princípio podem ser evitados, se eles forem mais cautelosos, aplicados, 
etc. A falibilidade essencial é referida à complexidade essencial da própria realidade. O 
reconhecimento desta complexidade faz com que os cientistas abandonem a 
pretensão de poder identificar com certeza todas as variáveis, circunstâncias e 
condições envolvidas nas relações entre os eventos individuais da realidade. O 
cientista pode propor hipóteses acerca destas relações e das variáveis e condições 
nelas envolvidas, mas ele está perfeitamente ciente de que tais hipóteses são 
simplificações de uma realidade essencialmente complexa, simplificações que muitas 
vezes funcionam bem, mas que sempre podem esbarrar na complexidade da 
realidade. 
 
- Já no âmbito de análise das diferenças entre as ciências, pode-se afirmar o seguinte. 
Ao referirmos a distinção entre contextos mais determinísticos e contextos menos 
determinísticos à menor ou maior intromissão da complexidade essencial da realidade 
na confiança que depositamos no poder preditivo e cognitivo de nossos modelos 
teóricos, tornamos possível afirmar que, em comparação com as ciências biológico-
médicas e com as ciências sociais, a física teórica desenvolve-se tipicamente num 
contexto mais determinístico (cientificamente mais determinístico, em contraste com 
historicamente mais – ou menos – determinístico). Isso significa que, em comparação 
com os cientistas dessas outras áreas, os físicos ousam acreditar mais na possibilidade 
de seus modelos teóricos desde o início abrangerem, de algum modo, todas as 
condições e variáveis que são essenciais para as relações necessárias e determinadas 
existentes entre os eventos individuais da realidade. 
- Tomemos o exemplo da relação causal entre os eventos (individuais) “aquecimento 
da água a 100°C” e “ebulição da água”. No contexto cientificamente mais 
determinístico da física, acredita-se que a relação entre esses eventos individuais está 
subordinada a uma Lei causal de caráter geral, algo do tipo “sempre que a água atinge 
a temperatura de 100°C, ela entra em ebulição”. 
7 
 
- Na verdade, nós sabemos que nem sempre é assim. Em pressões atmosféricas mais 
baixas do que aquela que se dá no nível do mar, a água ferve a temperaturas inferiores 
a 100°C. No contexto cientificamente mais determinístico da física, entretanto, a 
pretensão do modelo teórico é incluir essa circunstância nas condições de aplicação 
das leis causais gerais. Não se aceita que esta circunstância seja integrada sob a forma 
de um ajuste meramente tópico, uma espécie de exceção reconhecida da regra. Ao 
contrário, a circunstância é integrada na medida em que se pensa a lei causal como 
uma lei que relaciona a ebulição não apenas á temperatura, mas também à pressão. 
- E a pretensão cientificamente determinística da física teórica é que fenômenos 
inesperados sejam integráveis a um modelo teórico capaz de incluir desde o início, e 
de forma coerente, todas as variáveis e condições que são essenciais para as relações 
necessárias e determinadas existentes entre fenômenos individuais da realidade. 
 
- Em contrapartida, em comparação com a física teórica, tanto as ciências biológico-
médicas quanto as ciências sociais desenvolvem-se tipicamente num contexto 
cientificamente menos determinístico. Os cientistas destas áreas tendema aceitar 
mais a inevitabilidade dos enunciados teóricos sofrerem ajustes e acréscimos de 
caráter tópico, referidos às peculiaridades de situações ou casos mais específicos. 
- Por exemplo: mesmo um enunciado biológico mais próximo de uma lei causal em 
sentido estrito, como o enunciado “sempre que ocorre envenenamento com uma dose 
X de arsênico, o ser humano morre”, - mesmo em relação a um enunciado deste tipo 
admite-se a possibilidade de que, no caso específico de uma pessoa em particular, não 
ocorra a morte, em virtude da influência de variáveis e condições peculiares a este 
indivíduo específico. 
- Em princípio, este enunciado é parte de um modelo teórico abrangente e coerente. A 
admissão da inevitabilidade de ajustes e acréscimos de caráter mais tópico significa 
que, em contextos cientificamente menos determinísticos, tanto a elaboração do 
modelo teórico quanto os testes e aprimoramentos do mesmo enquadram-se melhor 
no método grosso modo indutivo de aprendizado, ajuste e acréscimos continuamente 
efetuados a partir das observações de situações e casos específicos. 
 
8 
 
- Por outro lado, em contextos cientificamente mais determinísticos, tanto a 
elaboração do modelo teórico quanto o teste do mesmo enquadram-se melhor no 
método grosso modo dedutivo de derivação e subordinação dos eventos individuais 
(ou das relações entre eventos individuais) a leis causais de caráter geral, integradas 
num modelo abrangente e coerente.

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