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1 Geograf ia. Disc ipl ina: Cl imatologia. Responsáv el: Prof . Dr. Car los Henr ique Jardi m _____________________________________________________________________________ AS ESCAL AS DO CLIMA1 José Bueno Conti INT RODUÇÃO Uma das maiores di f i culdades para o in ic iante na anál ise c l imát ica ou nos estudos de c l ima, geralmente se const i tu i em si tuar conc retamente a real idade em estudo; pr inc ipalmente com relação aos t ipos de dados e f ontes necessár ias, f rente aos resul tados que se pretende alcançar. Na real idade, def in idos os objet ivos ou propósi tos de um determ inado estudo (por exemplo, uma anál ise c l imát ica apl icada ao planejamento urbano de uma c idade a ser implantada em uma região do t rópico sem i -árido do Brasi l ) colocam-se os segu intes problemas na mente do pesquisador: que dados lev antar? Por onde começar? Em que escala espacial t rabalhar? Que sér ie temporal ut i l i zar? Será prec iso t rabalho de campo ou não? Há uma f rase bem conhecida que bem serv e para exempl i f i car o caso: “ t rata-se de usar o tamanho da rede de pescar, para o tamanho do peixe que se quer apanhar ” . Para o prof issional exper iente, esse problema não é grav e e não coloca mui tas di f i culdades, mas para o in ic iante é uma barrei ra di f íci l de ul t rapassar. O objet iv o pr inc ipal da presente no ta é discut i r em termos bastante simples, aqui lo que um dos nossos mestres chama, acertadamente, de “cozinha do t rabalho ou de pesquisa” , aqueles f atos ou “macetes” que ajudam a dar seqüência e achar o cam inho correto, sem dar mui tas v oltas ou percorre r um verdadei ro labi r into. DA NECESSIDADE DE HIERARQUIZ AÇÃO DO FATO CLIMÁT ICO A real idade c l imát ica pode objet iv amente ser caracter izada por unidades espaciais com grandezas escalares completamente dif erenciadas, que v ar iam desde o nív el 1 (globo- atmosfera como um todo, como aparece nas imagens de satél i te meteorológicos tomada de 30 a 40 km de al tura) até o nív el interno dos espaços urbanos (praça arbor izada, parque, cent ro comerc ial etc. ) ou agrár ios ( inter ior de uma cul tura de café, cana, algodão ou no inter ior de uma f loresta) . É como se nos aprox imássemos cada v ez mais da superf íc ie da Terra, redef in indo sempre a nossa objet iv a, ta l como se procede com uma máquina f otográf ica em termos de melhor resolução e ampl iação cada v ez maior da escala, até at ingi rmos 1:1. Ora, a cada uma dessas ampl iações, redef inimos não apenas as escalas do estudo, mas também os elementos ou f atores ou, em out ras palav ras, a l teram-se os at r ibutos e as propr iedades de cada um desses sistemas espaciai s do c l ima. É mui to comum, ainda hoje, prof issionai s das mais di f erentes categor ias ou disc ipl inas (agrônomos, geógrafos, geólogos, arqui tetos, engenhei ros etc . ) af i rmarem categor icamente “não é possív el f azer nada com as observações de tal estação ou posto meteorológico, porque a sér ie temporal ou estat í st i ca é infer ior a 30 anos” . Nada mais enganoso, pois tudo depende do objet iv o que temos em mente e da ordem de grandeza em que estamos operando. Mu i tas v ezes não prec i samos de 30 anos, mas tão somente de um dia ou até menos, no que diz respei to aos regist ros c l imáticos. Por exemplo, num estudo de c l imatologia sinót ica de chuvas de grande intensidade na f aixa equator ia l ou no t rópico úm ido, a sér ie temporal raramente ul t rapassa 2 ou 3 dias ou, mais prec isamente, necessi tamos de tão somente uma av al iação diuturna do desenv olv imento v ert i cal , geralmente acompanhada ou av al iada por imagens de satél i tes meteorológicos geoestac ionár ios, i sto é, aqueles que acompanham a Terra em seu mov imento gi ratór io, f ixando-se sempre sobre um hem isfér io como no caso do SMS 1, cujas f otos são publ icadas diar iamente pelo jornal “O Estado de São Paulo” e recebido pelo Inst i tuto de Pesquisas Espaciais de São José dos Campos. Esses documentos perm i tem a compreensão e a expl icação rac ional do f enômeno. Outro f ato que bem exempli f i ca a necessidade da hierarquização das ordens de grandeza é o seguinte: “a part i r do momento em que desdobramos as unidades de grandeza em unidades menores, o número de v ar iáveis que interv ém tornam-se signi f i cat ivamente maiores” . Em out ras palav ras, ex iste uma superposição, ou melhor, uma interação ent re f atores e elementos est ruturais de uma determ inada ordem de grandeza com out ros nov os elementos e ordem de grandeza imediatamente infer ior e assim sucessiv amente, até alcançarmos as menores unidades possív eis junto ao própr io solo. Da mesma forma, a 1 Elementos para referência bibliográfica: CONTI, José Bueno. As escalas do clima. São Paulo: Departamento de Geografia- Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas-Universidade de São Paulo, 1995. Apostila de curso. 2 medida que reduzimos nossas dimensões de espaço, a v elocidade das mudanças t emporais a nív el de processo, também se al teram, ex igindo do pesqui sador um ajuste do segmento temporal ou unidade de tempo adequada para captar as mudanças que f luem em ri tmos dif erenciados para cada unidade de grandeza espacial . A sucessão das mudanças nos t ipos de tempos (weather) , que ocorre dia a dia, mês a mês e de ano para ano na superf íc ie da Terra, é f undamentalmente o resul tado do mov imento do ar , que por sua v ez resul ta da ação de vár ias f orças sobre as part ículas de ar . A or igem pr inc ipal destas f orças é a energia recebida do Sol . Esta energia aquece a atmosfera e coloca em mov imento o que se pode chamar de máquina atmosfér ica (A). O v apor d ’água é um dos pr inc ipais meios ou v eículos para f azer c i rcular essa energia, at rav és das mudanças de estado que ora consomem, ora l iberam energia. Naturalmente, os processos que inte rv ém são complexos mas, de modo geral , a c i rculação da atmosfera é uma conseqüênci a do aquecimento di f erencial da superf íc ie da Terra e da própr ia atmosfera, f ruto das di f erenças de estações do ano e da lat i tude, assim como da rotação da Terra. O resul tado é que a energia radiante do Sol t ransforma-se em energia c inét ica do ar em mov imento ou v ento. A componente v ert i cal do vento é pequena e na maioria dos casos pode ser desprezada em comparação com os v alores dos mov imentos hor izontais ou adv ect ivos. Ent retanto, temos que adm i ti r que os lev antamentos ou mov imentos do a r sejam a causa pr inc ipal de quase todas as f ormas de prec ipi tação, de f ormação de nuvens (nebulosidade) e, porque não dizer , de quase todas as modal idades de t ipos de tempos. A inda resta-nos inc lui r como elementos ou var iáveis importantes, a dist r ibuição das te rras e águas, a distância em relação aos oceanos, o relev o (or ientação, exposição), a al t i tude, a topograf ia e a ação ant rópica, pr inc ipalmente nas escalas de detalhe (pr inc ipalmente do nível mesocl imático em di reção ao microc l imático) . CAT EGORIAS TOXONÔMICAS DO CLIMA: MÉTODOS, T ÉCNICAS E FONT ES. Procuraremos, agora, most rar para cada grandeza taxonôm ica os dados ou f ontes de informação meteorológicas e c l imatológicas f undamentais, bem como o t ratamento metodológico adequado, em termos de técnicas. Nível zonal Os pr inc ipais f atores que atuam nesse nível de organização c l imático são: lat i tude, al t i tude, d istância dos oceanos (cont inental idade) e o própr io mov imento de rotação da T erra. Torna-se pois, nesse nív el , importante a est ruturaçãodo bloco em faixas ou grandes zonas c l imáticas ( f a ixas lat i tudinais) . Aparecem, no entanto, c l imas azonais, e esse grau de azonal idade resul tam, pr incipalmente, da inf luência da al t i tude, induzindo, por exemplo, o aparecimento dos c l imas de montanha ou de nev es constantes, mui tas v ezes dent ro da própr ia zona equator ia l . Do equi l íbr io resul tante ent re a recepção di f erencial de calor ent re as vár ias f a ixas de lat i tude, dos deslocamentos dos v entos para oeste prov ocados pelo mov imento de rotação da Terra e da dist r i buição das terras e águas, resul tam os c l imas zonais. Nesse nív el de abordagem torna-se geralmente necessár io um longo período de observ ações meteorológicas (30 anos conforme recomenda a Organização Meteorológica Mundial – W MO), t rabalhando-se com as normais hídr icas ou térm icas ou mesmo com os valores médios que representam quaisquer out ros elementos c l imáticos. Ao nív el da expl icação, ou da gênese dos c l imas zonais, busca-se estudar a c i rculação gera l da atmosfera, caracter izando os grandes mov imentos ondulatór ios, quer sejam dos v entos de oeste ou dos v entos Al íseos. Os esquemas, nesse caso, são os mais amplos possív eis e a c i rculação super ior normalmente é incorporada pelo estudo dos índices de c i rculação (relações ent re a c i rculação zonal e a mer id ional ) . Ao nív el da documentação cartográf ica, as bases ou mapas normalmente ut i l i zados osci lam ent re 1:50.000.000 e 1:10.000.000. Nível regional À medida que passamos a desdobrar os c l ima zonais em unidades menores, surgem nov os f atores que assumem importância e que passam a interagi r com aqueles c i t ados anter iormente. No nív el regional é necessár io esc larecer que a grandeza escalar ( tamanho ou ex tensão espacial ) v ar ia bastante, na real idade surgem mui tas v ezes “cl imas int raregionais” , dependendo da combinação resul tante ent re os v ár ios f atores. Como v ariáv eis importantes a serem lev adas em conta nos estudos do c l ima de caráter regional , a exposição, f orma e or ientação do relev o assumem um papel destacado. Pr inc ipalmente porque é nesse nív el que as var iações, ano a ano na local ização e f reqüência dos cent ros de al ta e baixa pressão (organizados em células de c i rculação geral ) def inem o r i tmo de v ar iação anual , sazonal e mensal dos pr inc ipai s elementos c l imát icos. Resul tam, 3 pois, da interação ent re os f luxos t ropicais e ex t rat ropicais, o maior ou menor grau de i r regular idade c l imát ica, sobre uma determ inada região. Torna-se importante, nesse caso, como est ratégia de abordagem, não apenas anal isar as normais ou médias de um longo período, mas também acompanhar essas médias com um estudo das v ar iações mês a mês ou estação por estação, durante, por exemplo, 5 ou 10 anos, selec ionados por cr i tér io de representat iv idade dentro daquela sér ie, maior de 30 ou mais anos. É nesse nív el que se determ inam os chamados “anos-padrão” . Nível local A inf luência das al terações prov ocadas pelas at iv idades do homem no c l ima, ex ige dos estudos nesse nív el , a int rodução de nov os inst rumentos de anál ise. É nesse nív el que a anál ise dev e necessar iamente descer a uma v ariação diár ia dos elementos c l imáticos. Enquanto que o estudo do c l ima local d i f i ci lmente poderá ser f e i to sem se apoiar em out ras áreas do conhecimento geográf ico, ta is como geomorfologia, geograf ia urbana, pedologia, biogeograf ia etc . Por out ro lado, há grandezas intermediár ias. Por exemplo, ent re o nív el regional e o nív el local , ex istem c l imas interregionais; enquanto que do ponto de v ista est r i tamente meteorológico, o estudo de cer tos subsistemas atmosfér icos (calhas induzi das, por exemplo) está num nív el de mesocl imatologia e mesometeorologia. Conv ém ainda sal ientar que a def in ição dos t ipos de tempos se f az pr inc ipalmente no nív el de organização c l imática regional . Topocl ima T rata-se de uma categor ia taxonôm ica especial , onde as caracter í st icas da topograf ia (decl iv idade, exposição, f orma do terreno) produzem al terações pr inc ipalmente na quant idade de calor recebido do Sol . É prec iso av al iar , por exemplo, o quanto di f erentes exposi ções (norte, sul , leste ou oeste) combinadas com dif erentes graus de decl iv idade (5o , 10 o, 20o, 45o) a l teram o comportamento nas v ar iações di urnas da temperatura, um idade, v entos etc . Por exemplo, no estado de São Paulo, é sabido que as v ertentes v ol tadas para o sul são quase sempre 2o a 3o C mais f r ias e 10 a 15% mais úm idas do que as v ol tadas para o norte, pr inc ipalmente no inv erno aust ral . Essas informações são fundamentais para o planejamento agrícola. Microcl ima Ent re os v ár ios cr i tér ios de def in ição de microc l ima, adotamos o do Prof . Rudol f Geiger2 segundo o qual a expressão m icroc l ima refere-se, pr inc ipalmente, ao cl ima próx imo do solo, ou seja, tudo o que está a mais ou menos 2 metros da superf íc ie terrest re. Temos, ent retanto, a acrescentar nessa noção fornecida pelo Prof . Geiger, a necessidade de não se estabelecer l im i tes tão r ígidos (2 metros) , pois estamos mui tas vezes dent ro de uma f loresta com as copas das á rv ores a 10 ou 20 metros do solo e, no entanto, nada nos def ine melhor um microc l ima como o inter ior de uma f loresta. O cr i tér io de prox imidade do solo permanece v ál ido (0 a 30 ou 40 m do solo) . A denom inada camada l im ite (boundary layer) , onde o v ento tende a sof rer uma redução máx ima ( tendendo a zero) pelo at r i to ou con tato com a superf íc ie rugosa do solo, e onde os perf is de um idade, temperatura e f luxo de calor permanecem mais ou menos constantes para os v ários t ipos de cobertura do solo. Normalmente, do nív el local para o nív el m icrocl imát ico, torna-se necessár io o uso de equipamentos especiais (aparelhos meteorológicos portáteis ou regist radores) , bem como a real ização de t rabalho de campo. A ex igência de lev antamentos especiais é f undamental , tendo em v ista que a maior parte das medidas ou observ ações f ei tas nas estações meteorológicas conv encionais são real izadas a 10 metros do solo e, portanto, quase sempre, f ora do ambiente m icrocl imát ico. Nesse t ipo de anál ise, é út i l comparar os t rabalhos real izados pelas equipes de agrometeorologia e pelos pesquisadores interessados no c l ima urbano, onde tanto um como out ro se ut i l i zam de métodos e técnicas que são muito semelhantes mui to embora com objet iv os e objeto di f erentes. Uma das pr inc ipais l inhas de pesqui sa que está sendo desenv olv ida, tanto no nív el das c idades como na agr icul tura, são os estudos referentes ao balanço de radiação ou balanço de energia. No entanto, uma das pr inc ipais l imi tações a esse t ipo de estudo, são as di f i culdades para se obte r os equipamentos (radiômetros, a lbedômetros et c . ) . 2 GEIGER, R. Manual de microclimatologia. O clima da camada de ar junto ao solo. Tradução de Ivone Gouveia e Francisco Caldeira Cabral. 4.ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1961.
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