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Foucault e a Teoria Queer (Tamsin Spargo)

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FOUCAUL T 
i 
EDITORA 
U F J r 
E A TEORIA OUEER 
Tamsin Spargo 
TR AO IJ CÍ•O 
WlaJimir Freire 
PAZ ULIN 
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p y}. : : li 7 l 9 9 9 
UN1YHSIDAO[ FED( RAl 0 [ J t11l DE FO ll:A 
Reitor Henrique Duque de M1·n.,cu Cho .... C's : ilho Vice-Reitor. Jose 
luiz Resende Pró-Reitora de Pesquiso: "-~ar"o D'Agos10 Pró-
Reitor de Cullturo: Jc,::.e 1\ :)\•1 · F nno r .... e.es D iretora da 
Editora: Nelmo 1 roes Conselho Editorial: Ar1ur Andriolo; Enilce 
do Co,mo r\lbc1gw1u Rod10, frnn:.:1sco de Assis; Penteodo f\Aazetto; 
G1rlcne A! .•es do S1l.o, José- .\llv•r1, 1 Bc!roso Costo'lon; José Barbosa 
Gomes; I /iorro~ Vu•1'"KJCrlCn f c 11..-s 
Ed itoro UFJF 
Ruc1 Ben1o·nin Cnns~ont. /90 l/11.J~eJ d" ,-\r1e 1'Aode1na M urilo 
tv\endc~ . Ccn1ro. Cep 360 l ~- -WO - Juiz de Foro· fl.\G. Fone/ 
r o, (37 3220 7b·1 o \3? 37:'º 76 "1 J c :moil 
cd1toro(glcd1to10 .uf1l .br/ d1s1~1)cd11oro .uf1I. br 
site: www.ed11oro.uf1f br 
f Pozulin Editoro Ltda . 
Av. Rio Bronco 120, saio 90.i - Centro, Rio de Joneiro,RJ CEP: 
"A"" 'N 20040-00 l .Tel/lox:(2 l) 2225-22 l 5 e·moil:pozulin@brfree.com.br 
Coordenoçõo do Studio: Afonso Rodrigues Projeto 
grófico: Joõo de Souza Leite Revisão: Clodooldo Lino 
Editoração e Capa: Stúdio Gróloco - Editora UF JF. 
Sporgo, Tomsim 
Foucoult e a teoria queer/ Tomsim Sporgo; tradução Vladimir 
Freire - Rio de Janeiro: Pozulin; Juiz de Foro : Ed. UF JF, 2006 
67 p. (Coleção Encontros Pós-Modernos, 5) 
Inclui Biografia 
ISBN 978-85-7672-037-9 
1. sexo e moral - Foucoult, Michael, 1926 - 184. - !.Título. 
CDU 176 
Direitos poro esta ediçã o controtados pelo Pozulin Editoro Ltdo. 
'I1:rl::s cs dU:eitcs reserva±s. A :repro:i.r;ã:> cEsta ~' ro tab 
ru en pme, antitui viola;ão <b o::pfrigi: (lei fe:E:ral 5588) 
TAMSIN SPARGO 
SEXO É IMPORTANTE 
Recentemente, há rnuira coisa qucer acontecendo 
nas univ<.:rsidades. Barbic, Slu kcspcare e mesmo 
.Jane Austcn receberam urna rclcirura quecr. Nas 
ruas, vê-se Bart Simpson exibindo um triângulo 
cor-de-rosa, e a palavra '"queer", antes lançada ou 
sussurrada como insulto, é agora orgulhosamente 
reivindicada como marca de rransgressão por pes-
soas que se autodenominavam lésbicas ou gays. 
O que isso quer dizerº 
Há alguns anos, o diretor do Channcl 4 foi des-
crito como o "chefe da pornografia" por causa do 
notável conteúdo sexual de sua programação, e a 
internet e os canais pornográficos a cabo foram 
\·i,r0s ..:<Hn 0 am<.:J'rª' ... Jp~zD J<.: p<.:n.:tr~,r a, Jeie-
sas da nossa ilha de inocência. Agora, ao que pa-
rece, todos estão nessa, ou pelo menos falando dis-
so. A ssistimos a documentários e dramas sobre a 
prostituição, a divisão de costumes da polícia, os 
hábitos sexuais de todo tipo de animal existente. 
Se um programa tem apresentadores, há boas 
chances de eles falarem sobre aquilo. E se você 
não quiser fazer aquilo, é melhor ficar calado (o 
celibato deixou de ser sensual) ou tentar o sexo 
Marcia
Realce
Marcia
Realce
Marcia
Realce
Marcia
Realce
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fO UCAU l. T [ A TEORI~ OUf[íl 
t:\ntri co. Essa parece ser a última de Madonna, e 
da sabe das coisas. 
Na política, a velha equação de po<lcr e sexo 
ainda parece triunfar sobre princípios e posturas. 
Embora políticos gays ainda sejam "outed"1, ser 
ga~• já não é mais, aparentemente, tão problemáti-
co quanto j:i foi para aqueles com ambição de po-
der. A imprensa tem repetidamente noticiado um 
crescente clima de "tolerância"; o tablóide The Sun, 
por exemplo, anunciou o fim de editoriais anti-
gay. Embora as personagens gays e lésbicas de se-
riados de televisão _sejam geralmente muito res-
peitáveis, o estilo caip.p2 ornamentado de Julian 
Clary e o travestismo de Eddie lzzard contribuí-
r.1 111 para <>. cu succs,u. I~rc~e que c>t:1111u,, nunu 
sociedade bem mais aberta, mais tolerante, mais 
-·-·---·-- -· --·- ---·---- - -s~~~ que as coisas não param de melhorar. 
&;;?()~a cultura d~;;;_ina~t;estari-;~i~plesmén~· 
te fl.ertando timidamente com o outro, a fim de 
nos manter num "caminho certo" mais amplo? 
Enquanto parece haver uma definição mais 
ampla de comportamento sexual aceitável, mui-
tos dos velhos preconceitos permanecem e novas 
crises continuam a ser criadas. Cenas de histeria 
T Al.'Sl.'1 SPARGO 
cok tiva r ()r causa de pessoas acusadas ou lllt''mO 
suspei tas de pe<lotili:1 1-cHlam o Lido ª ' susr:1dor 
<lo podt:r popular. Freud pode h:n·cr dcs1rnd:1do :l 
sexu:1lidade infan til, mas isso ainda 11~0 é algo que 
:1 sociedade cio final do sécul1) XX consegue dis-
cutir racionalmente. Parece ha\·cr um:1 cri'c gl'nc·· 
ralizarla de como lirlar com "agressores s.:xu:iis'. 
Será que eles são doentes? E, se este for u c:iso, 
qual é a cura? Ou será que são "maus"? Q1em ou 
o que eles agridem> A Natureza, a Lei Di\·ina. a 
Sociedade' 
E, r:i~11:i_:iivc! mais geral, como sabem?~ ? q~e 
f~z uma atividade erótica boa e outra má? É um 
caso de vontade divina, natureza biológica ou con-
\ e1''r"" >rn.i .u : l'udcmo,, realmente ter cen.:za <.:k 
que nossos desejos e prazeres são normais, natu-
rais, bons - ou de que nós o somos? Por que o sexo 
é tão importante? 
Como argumenta a antropóloga Gayle Rubin: 
"O reino da sexualidade tem sua própria política, 
iniqüidades e modos de opressão internos. Assim 
como outros aspectos do comportamento huma-
no, as formas institucionais concretas da sexuali-
dade, em qualquer tempo e local, são produto da 
Marcia
Realce
Marcia
Realce
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FOUCAUL T E A HORIA OIJHR 
atividade humana. Elas estão imbuídas de confli-
tos de interesse e manohras políticas, tanto deli-
berados quanto casuais. Nesse sentido, o sexo é 
sempre políti co . .i\ las existem também períodos 
históricos cm que a sexualidade é mais acirrada-
mcntc contestada e mais abertamente politizada. 
Em tais períodos, o domínio da vida erótica é, com 
efeito, rencgociado".3 
Se, como parece, vivemos um desses momen-
tos, então uma das modalidades atuais de renego-
ciação da vida erótica é através da exploração das 
maneiras como entendemos o sexo. Ainda que essa 
exploração possa acontecer numa miríade de con-
textos - na mídia, na medicina, no parlamento -
,1 ;,n:1Ji,c L] Lll .. ( " Cu.:u dt:,tc c11>.1iu l~>i n:.1:iud .. 
mais vigorosamente por indivíduos e grupos que 
experimentaram os maiores e às vezes mais mor-
tais efeitos da política do sexo. Assim como as mu-
lheres foram o primeiro grupo a explorar a dife-
rença de gênero, também as lésbicas, os gays e 
outros grupos cujas sexualidades são definidas con-
tra a norma da heterossexualidade estiveram à fren-
te na exploração da política da sexualidade. Ao 
desafiarem nossas suposições mais básicas sobre 
1 AMSIN SPARGO 
sexo, gênero e sexualidade, incluindo as oposições 
entre heterossexual e homossexual, sexo biológico 
e gênero culniralmcntc dererm inado. homem e mu-
lher, esses pensadores dcscm·olvem novas manei-
ras de explorar a questão d:i identidade humana. 
QUEM É FOUCAUL T? 
Miehel Foucault (1926-84), filósofo, historiador 
e ativista, foi um dos mais influentes pensadores 
cujo trabalho é geralmente categorizado como pós-
estru turalista. Junto com as críticas da metafísica 
ociderital de Jacques Derrida e a radical rearticu-
lação da teoria psicanalítica feita por Jacques La-
can, as diversas investigações de Foucault sobre 
,abc1 i;: poJcr türmaram os ai11.:crccs paradoxalmen-
te desestabilizadorespara muitos trabalhos recen-
tes sobre o status da subjetividade humana. 
Foucault, além do mais, era gay e morreu de 
AIDS em 1984. Depois da sua morte, sua vida e 
seu trabalho foram alvo de uma série de ataques 
que, alegando buscar a "verdade" de Foucault, ma-
liciosa e desaprovadoramente conectaram suas su-
postas práticas e preferências sadomasoquistas a 
uma leitura (reducionista) dos aspectos políticos 
Marcia
Realce
Marcia
Realce
Marcia
Realce
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I OllCldll I 1 A lfORIA OULLR 
de >cus cscri ro,; hisn'iricos e filosóficos. A vida, o 
1 r:1h:1lho. as conqu ist:1s e a dcmoniz:i~·ão de Fou-
r:iul t tiza:1111 dele um po<lero,;o modelo para mui-
tos intclcctu:tis - gays, lésbic:1,; e outros - e sua 
a1ülisc das interrelaçiies de saber, poder e sexuali-
dade foi o mais importante c1t:1lisador intelectual 
d:1 teori a qucer. 
O QUE É A TEORIA OUEER? 
·'~1eer" pode funcionar como substantivo, adje-
tivo ou verbo, mas cm qualquer caso s_c define con-
tra o "normal" ou normatiz~do:: A teoria queer 
não é um quadro de referência singular, conceitua! 
ou sistemático, mas sim uma coleção de com-
prom1:,su,, intekctuai:, cum :b rc i a~ôc~ entre scxo, 
gênero e desejo sexual. Se a teoria queer é uma es-
cola de pensamento, então ela é uma escola com 
uma visão bastante heterodoxa de disciplina. O ter-
mo descreve um leque diverso de práticas e prio-
ridades críticas: leituras da representação do de-
sejo pelo mesmo sexo em textos literários, filmes, 
música e imagens; análise das relações de poder 
sociais e políticas da sexualidade; críticas do sis-
tema sexo-gênero; estudos de identificação trans-
TAMSIN SPARGO 
sexual e transgêncro, de sadomasoquismo e de de-
sejos transgressivos. 
UMA GENEA LO GIA QUEER 
Este ensaio considerará algumas das maneiras co-
mo a teoria e o pensamento queer giram sobre e 
em torno de Foucault, como escri tores, trabalha n-
do num espectro de disciplinas acadêmicas, des-
dobram e desenvolvem suas idéias sobre sexuali-
dade e sociedade . .f9u_cault po_de ser visto como 
u~atal~ad5Jr, um po_!:to ~ p~rti~a, um exemplo 
e um antecedente, mas também um provocador, 
uma ponta de ousadia que ainda gera a produção 
de novas idéias. C omo narrativa, este ensaio ine-
1 it,1n:lrnentc apresentará u111 tipo de h i~r0 ria li-
near do trabalho de Foucault e do desenvolvimen-
to da teoria queer, mas sempre que possível ten-
tarei evitar a sedução dos mitos da causalidade 
.simples e do progresso. Foueault não é a orige_El 
d!_ teoria q~~.~m a teoria queer é o destino 
do p~samento de Foucault. Para usar um dos 
----------
termos do próprio Foueault, o ensaio poderia ser 
visto como uma breve e parcial "genealogia" [veja 
"Idéias-Chave" no final deste livro para uma ex-
Marcia
Realce
Marcia
Realce
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FOUCAULT E A lfORIA OU EER 
10 plicação desse e de outros termos] de um conju n-
to particuL1r de discursos sobre a sexualidade, cul-
minando (remporária e não-exclusivamente) no 
atual momento queer. 
SEXO, VERDADE E DISCURSO 
O primeiro volume de História da S,·.rnalidadc. de 
Michel Foucault, foi escrito nos anos 1970, no fi-
nal da assim chamada "revolução sexual" na cul-
tura ocidental. O livro oferecia uma contra- nar-
rativa poderosa e provocadora para a história, há 
_muito estabelecida, da repressão sexual vitoriana 
dando lugar à progressiva liberação e ao esclareci-
mento no século XX. Era o começo do projeto mais 
.11nb;'-;<J:-.o ,lc Foucault, pr0jetu yuc 1l c<Jll i11 .1<.:,1-
bado com a sua morte. 
E m relatos tradicionais, a sexualidade é vista 
como um aspecto natural da vida humana que foi 
reprimido na sociedade e cultura ocidentais a partir 
do século XVII, escondido como as pernas de um 
piano vitoriano, não-mencionável, censurado na 
fala e na escrita. A sexualidade continuava lá, bor-
bulhando levemente sob a superfície afetada da 
respeitabilidade burguesa do século XIX, mas 
1 AMSIN SPARGO 
sufocada por proibições e repressões. Até que eh 
e nós fomos liberados na era da minissaia e do 
analista, revelando nossas pernas e nossos dese-
jos mais profundos, trazendo tudo à tona. Os pro-
blemas permaneceriam, é claro, e alguns de nós 
seriam mais felizes e saudáveis do que os outros 
na proporção direra da nossa capacidade de expres-
sar livremente nossos fe lizes e saudáveis desejos 
sexuais. Mas a ajuda estava ali para aqueles com 
problemas. O terapeuta, o analista, o conselhei ro 
poderiam nos ajudar a nos endireitarmos. Um fi-
nal feliz para uma triste história de restrição do 
potencial humano. Mas será que essa história, fa-
m iliar e reconfortante, é verdadeira? Será que a 
SLXualiJ:1Je ::.cmpn; eote\ e esptranJo que: nóo a li-
bertássemos das amarras sociais, e que, junto com 
ela, libertássemos também a nós mesmos? 
Foucault rejeitou essa "hipótese repressiva" e 
declarou que evidências do século XIX aponta-
vam não para uma proibição de falar sobre a sexu-
alidade mas sim para uma notável proliferação de 
discursos sobre sexualidade. Então, o que era, o que 
é sexualidade? U m aspecto vital da argumentação 
de Foucault é que a sexualidade não é uma carac-
l i 
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FOUCAUL T [ A HORIA OUEER 
12 teríst~<l_ o~ faro natural da vida h~~~1'.!!L~1as uma 
carcgoria construída da experiênc_ia_ que não tem 
origens biológicas e sim históricas, ;;?e~'li s e3 ul-
turais. Essa concepção de sexualidade é difícil de 
apreender; ela parece contra- intuitiva. A sexuali-
dade, assi m como o gênero, parece simplesmente 
estar lrí, mas também ser de alguma forma especi-
al, pess0al, algo a ver com os nossos "desejos mais 
profundos" - quem queremos, o que queremos, 
como queremos. É algo dentro de nós, uma pro-
priedade, nossa propriedade. Mas o fato de ter-
mos investido tanto na crença de que a sexualida- _ 
de é natural não significa que ela o seja. 
Isso não quer dizer que Foucault descartava toda 
Ji1m:us;t<J biolúgi-:a, 111;,s sim que de Jlli\lÜZà\"íl o 
pa2el crucial das instituições e dos discursos na for-
mação da sexualidade. Como observa D avid Hal-
perin, autor de Saint Foucault: Towards a Gay 
Hagiography, Foucault não comentou explicitamen-
te sobre as causas dos desejos pelo mesmo sexo. 
Qiando perguntado a respeito da distinção entre 
predisposição inata à homossexualidade e condi-
cionamento social, sua resposta foi: "Sobre essa · 
questão eu não tenho absolutamente nada a dizer. 
TAMSIN SPARGO 
Sem comentários" .~ Em vez de buscar ;\ ilusória 
··wrda<le" da sexualidade humana, Foucault de-
dicou-se a examinar sua produ\·~o . Ç!c :;e pre9cu-
l~A .. ll1Çf!Q§ co_m o que é '"sexualidade" e mais com 
a .. m<mcira como_ ela fu nciona na sPcicda<lc. 
SCIENTIA SEXUALIS 
Enquanto os psicanalistas encorajavam seus paci-
entes a explorar os segredos sexuais que poderiam 
ser a chave para sua saúde mental e emocional, Fou-
cault dedicou-se a explorar as maneiras pelas quais 
a psicanálise (entre vários outros discursos) nos con-
vida, ou, mais propriamente, nos incita a produzir 
um saber sobre nossa sexualidade, saber que é mais 
..:ultu1.il Ju ljUL natur~u e: <JU <.: -:umriimi para a ma-
nutenção de relações de poder específicas. 
A psicanálise pode ser vista como a última num 
amplo leque de práticas discursivas que procura-
ram não silenciar ou reprimir a sexualidade, mas 
fazer com que as pessoas falassem a seu respeito 
(e a respeito de si mesmas) de formas particulares. 
A scientia sexua/is do Ocidente, como Foucault a 
chamou (em contraste com a ars erotica de cultu-
ras como a China, o Japão, a Índia e o Império 
13 
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fOUCAUl T E A HORIA Qll[fR 
14 Romano, que era baseada na multiplicação de pra-
'l.ercs), fixou-se em encontrar a (vergonhosa) ver-
dade sobre a scxualid:idc, e usava o processo da 
conti ssão como mérodo-cha\'e para descobri-la. 
Da confissão cristã, passando pelas práticas mé-
dicas, judiciais, pedagógicas e familiares até a ci-
ênci:1 contemporânea da psicanálise, podemos tra-
çar uma história de homens e mulheres, meninos 
e meni nas escrutinando seus desejos, emoções e 
pensamentos, passados e presentes, e relatando-
os para alguém. ÇQntando ao padre os seus peca-
dos, descrevendo ao médico os seus sintomas, sen-
do curados pela fala: confessando _pecados, con-
fessando doenças, confessando crimes, con~~ -
d,i a \Tr<l:idc:. E :1 1-crcbck cr:1 ::.cxual. 
----~- --· ·- - - ---
Em todas essas cenas confessionais, o falante 
produz uma narrativa sobre sua sexualidade que é 
interpretada por uma figura de autoridade. A "ver-
dade" que é revelada nesse processo não é, claro, 
encontrada e sim produzida. E la existe como sa-
ber dentro de um discurso particular e está amar-
rada ao poder. Como em todo o trabalho de Fou-
cault, o __E?der é entendido como uma questão_9.e 
relações complexas em vez de uma propriedade i~-
-
TAMSIN SPARGO 
rente a um indivíduo ou classe Pª'.!~cular~. O que, 
então, perguntava ele, esta\'a cm _iogo na constru-
ção da sexualidade em diferen te-; momentos his-
tóricos~ Como o poder circulav:1 através da pro-
dução de saber sobre sexo? 
A partir do século XV1II, argumentava Fou-
cault, a sexualidade foi vista como algo a ser regu-
lado e administrado em vez de _julgado. A Igreja 
e a Lei Divina há muito preocupavam-se com a 
regulação da sexualidade, mas durante o Ilumi-
nismo foram desenvolvidos novos regimes go-
vernamentais que tiveram como enfoqt>.e o indi-
víduo corporificado e sexual. Versões modifica-
das e seculares da confissão estavam no centro 
de uma \'aricdadt: Jc técniGts para inrernalizar 
normas sociais. Foi nesse contexto que muitas das 
m~as de entender a sexualidade ª inda hoj_e 
dominantes começaram a ser formuladas, inélu-
sive a oposição entre homossexualidade e heteros-
.-----...... __.~~~~~~~~~~~~~~ 
sexualidade. 
A CONSTRUÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE 
Uma das afirmações mais provocativas de Fou-
cault, e que certamente funcionou como catali-
15 
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FOUCA UlT E A TEORIA OUHR 
1s produtivos, desejos e práticas homossexuais eram 
um problema a ser resolvido, aberrações da nor-
ma procriadora. 
O homossexual era sujeit~de, e suj~a,_jn­
vestigação sistemática num vasto l~ue_ ~c .g rn-
- -- --- -----
129s d i~cursivos, incluindo a demografia, a edl:!Ql-
ção e o direito, que estavam preocupados em pro-
·- ·- ·-- ----- - -·· - ·- .. . 
~er a saúde e a pureza da população. Enquanto 
o homem ou a mulher que confessasse praticar 
sodomia no século XVI seria convencido da peca-
minosidade desse ato, 1:1º caso do homossexuajjo 
s~culo XIX, a ênfase não estava na_s ações, i:;_as 
sim na condirão "cientificamente" determinada do 
. -~ - - ~· --~- ·--
in~\!2.- Nas palavras de Foucault: "A homosse-
xualiJa<lc apareceu cumo uma das formas Je :, c.; -
xualidade quando foi transposta da prática de 
sodomia para um tipo de androginia interior, um 
hermafroditismo da alma. O sodomita tinha s.ido 
u~ aberração temporária; o homossexual era ~1!;_0-
::.::ma espécie".5 E. o homossexual era visto como 
alguém totalmente tomado de sexualidade: "Es-
tava presente nele por toda a parte: na raiz de to-
das as suas ações".6 
l AMSlll SPARGO 
PODER E RESISTÊNCIA 
Os aspectos negativos da con>trução da homosse-
xualidade no fi nal do sl'rnlo XJ....'\. e começo do 
século XX são óbvios. O fato de que a posição ou 
identidade de um sujeito sejam co11struídas não 
as faz menos reais para o identificado . O h~!J-~q­
s~ual foi parologizadQ com_o u11l_tiP..<? E<:!:''~~ 
i~;;~ag~, um caso de desenvolvimento interrom-
pido, um caso passível de tratamento, em suma, 
uma aberração à norma heti:::~· Como tal, 
ele era sujeito aos efeitos d isciplinadores, margi-
nalizadores e subordinadores do controle social. 
Foucault foi criticado por ter um modelo conser-
vador de poder, mas de fato ele o via como algo 
qu..: procluzia..: nunc<L CU11tinlia rc.::,i:,ténci<t: ··:\au 
há relações de poder sem resistências; essas últi-
mas são mais reais e efetivas porque são formadas 
bem no pon to onde as relações de poder são exer-
cidas; a resistência ao poder não precisa vi r de ou-
tro lugar para ser real, nem é inexoravelmente frus-
trada por ser compatriota do poder ... ".7 
A ênfase na produção do "discurso reverso" é 
tim aspecto crucial da análise de Foucault: "~ 
há dúvidas de que a aparição, na psiquiatria, ju!i_s-
19 
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FOUCAULT E A TEORIA OUEER 
1a produtivos, desejos e práticas homossexuais eram 
um problema a ser resolvido, aberrações da nor-
ma procriadora. 
O homossexual era sujeito de, e suj~1,jn­
vcstigação sistemática num vasto legue de c_!lm-
-- -- -- ·-----·- -
r?~i~cursivos , inclui ndo a demografia, a ed~-
ção e o direito, gL~C:.C::~~-m_r rc:_~.c~a~os ~m pro-
~er a saúde e a pureza da população. Enquanto 
o homem ou a mulher que confessasse praticar 
sodomia no século XVI seria convencido da peca-
minosidade desse ato, no caso do homossexual do 
século XIX, a ênfase não estava n~s ações, mas 
sirr;-~a condição "cientificamente" determi~:hdo 
. _.. . -- .. _______ ·--
i~~'::.2: Nas palavras de Foucault: ''A homosse-
xu:diJa<le apareceu como uma <las formas Jc :,<.: -
xualidade quando foi transposta da prática de 
sodomia para um tipo de androginia interior, um 
hermafroditismo da alma. O sodomita tinha sido 
u~a aberração temporária; o homossexual era ~12.0-
ra uma espécie".5 E_ o homossexual era visto como 
alguém totalmente tomado de sexualidade: "Es-
tava presente nele por toda a parte: na raiz de to-
das as suas ações". 6 
1 AMSIN SPARGO 
PODER E RESISTÊNCIA 19 
O s aspectos negativos da ronm·ução da homosse-
xualidade no final do scrnlo :\IX e começo do 
século XX são óbvios. O fato de que a posição ou 
identidade de um sujeito sejam coustruídas não 
as faz menos reais para o identificado. O ht2_m_0~~­
S_9'.ual foi patologizadq com_o um_t.U~<?~~v~~ 
~_:;vi~, um caso de desenvolvimento interrom-
pido, um caso passível de tratamento, em suma, 
uma aberraçã~ma het~~· Como tal, 
ele era sujeito aos efeitos disciplinadores, margi-
nalizadores e subordinadores do controle social. 
Foucault foi criticado por ter um modelo conser-
vador de poder, mas de fato ele o via como algo 
yuc procl uzia e nunc:a ,·,11 1tinli<t r<.:oÍSLl:ncia: ··:\au 
há relações de poder sem resistências; essas últi-
mas são mais reais e efetivas porque são formadas 
bem no ponto onde as relações de poder são exer-
cidas; a resistência ao poder não precisa vir de ou-
tro lugar para ser real, nem é inexoravelmente frus-
trada por ser compatriota do poder ... ".7 
A ênfase na produção do "discurso reverso" é 
um aspecto crucial da análise de Foucault: "~ 
há dúvidas de que a aparição, na psiquiatria,juris-
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FOUCAUl.l [ A TEORIA OUEER 
20 prud2:ncia e literatura do século XIX, de ~o@ uma 
---------- ~ -~áic ~e _discursos sobre_as_es1iécics e subcsp~cie~ 
de homossexualidade, inversão, pederastia e 'her-
mafroditismo pslq:iic-o' tornaram possível um forte. 
avanço de controles sociais nessa área de 'perver-
s~dc'; mas isso também tornou possível a for-
ma\·âo de um discurso 'reverso': a homossexuali-
dade começou a falar en~Se~j;róprio nome, a exi-
gir que sua legitimidade ou 'naturalidade' fossem 
reconhecidas, muitas vezes no mesmo vocabulá-
rio, usando as mesmas categorias pelas quais eram 
medicamente desqualificadas" .8 
É possível ver nesse modelo de discurso re-
verso o germe da política de identidad~. Aqueles 
que ,:-i0 µrn<luzido, como :,ujcit,,, Jc:, 1·i,uncs, "110-
mossexuais", podem encontrar uma causa comum, 
uma voz de dissenso comum que transforma con-
fissão em profissão. O discurs~~e~logi~_?r 
exemplo, produziu a categoria de identidade do 
------------- ~ ~ -· . . .... 
"invertido" como uma aberração à norma, mas 
- - - .. .... . 
pode ta:ribém ter permitido a esse indivídu~gu!!_s-
~?.i:ªr sua posição soe~ e R~Et!~ca. E le forneceu 
um vocabulário e um saber que puderam ser es-
trategicamente usados por seus sujeitos. Como 
TAMSIN SPARGO 
revelaram trabalhos recentes, houve unLOi!.m_cJ·o 21 
d~~tativas explícitas~ reutilizar o saber e a :-c-
t?.rica da inversãt~ e d~Hi_:osscxualidade para apc-
la_:_pela ~escriminalização no final do século XlX. 
Mas a análise que Fou.~aul t faz das "perpétuas 
espirais de poder e prazer" que foram produzidos 
nos discursos da sexualidade não pode ser facil -
mente reduzida a uma oposição binária de discur-
so versus discurso reverso.9 O "mosaico sex~1al" da 
s~1od:E~~ é~.1ma_E~de_d~~1mica na qual 
a otimização do poder é obtid~ com e através da 
-----· ·- - -· · ·-- - . 
multiplicação de prazere~~ nã~ _at~avés _ci.~-s~a pr~i-
bição ou..r.e.s.trição..!~ É difícil ver o poder, a não 
ser em termos tradicionais, como uma força ne-
gctti1·;1 aginJv ,vbrc i11Jil'íduo> ou g rupP, , 111a, a 
análise mais sutil que Foucault faz de seu status 
como uma relação que simultaneamente policia e 
produz, requer que pensemos além de uma lógi-
ca política convencional de dominação e resistên-
cia. As relações de poder não podem ser simples-
mente depostas ou invertidas. 
Vários críticos observaram que Foucault ter-
mina o primeiro volume de História da Sexualida-
de com uma invocação de uma futura "economia 
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fOUCAUL T E A TEORIA OU[[R 
22 de corpos e prazeres" Jifcn:ntc, não sujeira à "aus-
tera monarquia do sexo". 11 Ai1-,ri.111s leram isso como 
um momento utcípico. Mas se é um ato de imagi-
nação, então não h:í razãn para supor que o futuro 
imaginado traria um avanço. Em O Uso dos Pra-
zeres e O Cuidado de Si, segundo e terceiro volu-
mes de Hi.1tória da Scx11alidarle, Foucault anali-
sou abordagens do sexo no contexto de antigas 
formações sociais e éticas que contrastavam com 
as da modernidade ocidental. E le se concentrou 
nas técnicas de si gregas e romanas e em sua in-
terseção com antigos processos cristãos de auto-
cultivo. Essas eram práticas disciplinares através 
das quais indivíduos tentavam transformar-se 
paL\ atingi1 ol<ldv~ 11:1rti-ttlan.:s de ic:licid,1Jc, 
pureza, sabedoria, perfeição ou imortalidade. Na 
~tura greco-romana, desejo e práticas sexuais 
e~ vistas como preocu.e.ações éticas ou morais, 
mas não como a verdade crucial, vergonhosa ou 
r_~ida, da~~iência humana, ~o~m 
~-~,t!o posteriormente. Fundamentalmente, a éti-
ca era vista como uma relação do indivíduo con-
sigo mesmo, e não como a base dos padrões ou 
normas de comportamento; e a disciplina era vista 
TAMSIN SPARGO 
como parte de uma prática com objetivo de arin- 23 
gir liberdade ou autonom ia individuais, e nfo de 
subordinar omros. Enquanto as sociedades gre-
ga e romana d iferiam entre si, com a última enfa-
tizando mais a heterossexualidade e o casamen-
to, a cultura cristã rompeu efetivamente com todo 
o modelo de ética do mundo clássico. O cristia-
nismo, segundo Foucault, desenvolveu códigos 
morais e interdições universais cada vez mais cen-
tradas na verdade do sexo. Enquanto os romanos 
podiam ter considerado o desejo como algo poten-
cialmente nocivo, os cristãos o percebiam como al-
go intrinsecamente mau. 
Por vezes Foucault parece aprovar a cultura 
n:iu 11orn1:ttizadura d,1 GréLia amig.t cm µani..:u -
lar, mas sua recusa em oferecê-la como alternativa 
para a sociedade contemporânea foi enfática. Res-
trições quanto a quem poderia ser um indivíduo 
no domínio da ética - homens livres, e não mu-
lheres ou escravos - e relações desiguais de poder 
como aquelas entre penetrador e penetrado reve-
lavam a persistência de formas de dominação que 
não poderiam ser descritas como produtos do 
auto-controle. 
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FOUCAUL 1 [ A TE ORIA OUEER 
24 Em hora alguns críticos tenham recentemente 
volradn a esses últimos estudos para explorar a 
possibilichde de práticas éticas e sexuais não-
normatizadoras, foi o modelo geral de Foucault da 
rnnstrução discursiva das sexualidades que serviu 
como principal cata.lisador inicial para a reoria queer. 
REAÇÕES A FOUCAULT 
Foucault não foi o primeiro a argumentar que a 
sexualidade é construída socialmente mas, a partir 
dos anos 1980, seu trabalho foi aquele que indu-
bitavelmente t:_eve mais impacto e influência sobre 
novos desenvolvimentos em estudos gays e lésbicos 
e cm estudos culturais da sexualidade. Muitos as-
pc-.tc>o de , Li a 11'11 rativa 1(_,r;un rei i,,,,!u>, ;ntlLliGca-
dos e desafiados: historiadores ofereceram análises 
mais atentas de relacionamentos entre pessoas do 
mesmo sexo e categorias emergentes de identida-
de no início do período moderno; taxonomias de 
inversão e homossexualidade do século XlX foram 
diferenciadas com mais precisão. Sua abordagem 
geral também foi submetida a críticas, notada-
mente o eurocentrismo de seu foco histórico e sua 
concentração na história da se)malidadc masculina. 
1 AMSIN SPARGO 
!\s idéias de Fouc:wlt claramcntq.:~vimenra- 25 
r~m o caminho para uma abordagem difcrc1}_t·c go 
entendimcnw das rehções rntrc sexo, sc~uJU.\.l.a­
d.:..:_pode!. J\ l:is nenhum trabalho inrelecnial existe 
em tora] isolamento de um contexto cultural mais 
amplo, e a política d:1 diferença sexual nos anos 
1970 e l 980 foi pane d~1 experiência que levou ao 
desc m·olvimcnto da teoria queer tanto quanto o 
modelo analítico de Foucault. A história do ati-
vismo durante esse período também pode ofere-
cer exemplos concretos das operações de poder 
identificadas por Foucault. 
FOUCAUL T + ? ~ TEORIA QUEER? 
i\,i, .rnu, l 97u, l!uando Foucault C>crevia sua His-
tória, o termo "homossexual" ainda era emprega-
do em discursos médicos e legais, mas as pessoas 
mais e mais se definiam como "lésbicas" ou "gays". 
"G " d Ih d ay , um t~rmo usa o_p_gi:í!..!Uu eres e re~: 
ção dúbia no século :x::QÇ~jado~~~ 
3;!!ernativa para "hom~exual" nos~~ 1960, para 
consternação de algumas pessoas que lamentaram 
a corrupção de uma palavra "inocente''. A diferença 
mais óbvia entre "gay" e "lésbica" e as antigas ca-
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FOUCAUL T E A TEORIA OUHR 
is tcgorias existentes era que, ao invés de ac~itar~ 
u'.1~1 __ posi\·:io passi~a co1~~~1J 9~j_~t(l de conl12-
cimcn to, o.s .sui.citP-S ideni:!ficados como gays. e l~s­
bicas estavam ostensivamente escolhendo ou rei-
----------·- - ·-
':'.i ndicando u1~.P.9.~iÇ.~<.!· Ser gay ou ksbica era 
uma questão de orgulho, não de patologia; de re-
sistência, não de auto-ocultação. E nquanto a li -
beração das mulheres desafiava as construções do-
minantes da feminilidade como algo inferior, pas-
sivo e secundário, a liberação gay contestava a re-
presentação de desejos e relacionamentos entre 
pessoas de mesmo sexo como não- naturais, des-
viantes ou incompletos. 
Em meados dos anos 1970, o objetivo do mo-
\·i1.i c r1t > c r .1 tra11 ~1Ürn 1.1r o si:-t<.:111J ,ocial <.:1HcnJ i-
do como a causa da opressão.Assim como as femi-
nistas criticavam instituições como o casamento e 
a família por apoiarem a opressão das mulheres, 
e pressionavam por uma mudança social radical, 
até mesmo revolucionária, algo semelhante era 
feito pelo movimento de liberação gay. Ambos 
tinham forte fili ação, embora de forma alguma 
absoluta, com políticas de esquerda e podiam ser 
vistos como se estivessem acontecendo paralela-
TAMSIN SPARGO 
mente a abordagens marxistas, socialistas e femi- 21 
nistas na academia. 
J\1as o modelo de liberaçiio através da tran~-­
forma~·ão do sistema deu lug:tr, no final dos 1970, 
a uma concep~·ão diferente da política gay e lésbi -
ca, mais próxima do que conhecemos como mode-
lo "étnico". E sse modelo apresentava gays e lésbi-
cas como um grupo minoritário distinto, igual mas 
diferente, e trabalhava para conseguir direiros 
iguais e proteção legal dentro da ordem existente. 
As conquistas dessa abordagem foram consi-
deráveis, rc o modelo básico permanece influente 
hoje em dia. Além de campanhas por justiça e di-
reitos iguais, grupos como o Campaign for Homo-
><'.rn11/ Lq11aíity, na Grã-Bretanha, e o Gay/kti·T..'is:s 
Al/iance, nos Estados Unidos, estiveram ativamen-
te envolvidos na promoção de imagens "positivas" 
dos homossexuais. I sso incluiu críticas a imagens 
negativas e homofóbicas na mídia, entre elas 0s 
estereótipos populares camp dos seriados cômi-
cos de televisão, vistos como depreciativos ( queer-
ing?] à imagem de pessoas gays e lésbicas. A pro-
moção de imagens e narrativas de auto-valoriza-
ção, prazer e estilo talvez tenha avançado as pers-
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f OUCAUL 1 E A TEORIA OUEER 
78 pectivas de grupos 011 indivíduos cuja imagem 
positiva adaptava-se :1 cu ltura dominante heteros-
sexual. Campanhas e alianças também podiam ser 
vistas como construtoras de comunidade, ofere-
cendo a gays e lésbicas uma cultura que poderiam 
chamar de "c:isa''. 
Para cheg:ir cm "casa", é c l:iro, era necessário 
primeiro "sair''. 11 P ara léshicas e gays, estar "fora" 
ou "dentro" do "armário" tornou-se uma marca cru-
cial de sua política sexual. '.'.§filr_.Q9_ar!Tiário" sug~­
ria emergi_r qq confir:_an:i~~tg_~a. ocultação, rea-
lizar um movimento do sigilo para a afirmação 
---- ----pú~a._ Homens e mulheres visivelmente queer 
estariam "dentro" ou "fora"? E as pessoas que não 
": aJap r;n-.un a cs~a i111,1gcrn , yuc não sc ~c11tiam 
à vontade no mundo positivo, confiante e ascen-
dente da política e cultura assimilacionistas? E o 
que dizer dos atos, prazeres e identificações que 
eram causa de dissenso e conflito no interior das 
comunidades gays, e não motivo de uma recon-
fortante auto-afirmação coletiva? As identifica-
ções de bissexualidade, transexualidade, sado-
masoquismo e transgênero implicitamente desa-
fiavam o ideal inclusivo da política assirnilacio-
1 AMSIN SPARGO 
nista. A incompatibilidade pode ser p:trcialrnente 29 
inrerpn:rada em termos de rc::spci t:1bilid:1dc. Se 
você quer fazer parte de um mundo heterossexual 
provando o quanto voei: é cnmurn, "bcm-igual-
aos-outros" (embora talvez um pouco mais sensí-
vel ou artístico), a ostenta<;fo de seus desejos ou 
relações mais excessivos e tr;tnsg:ressorcs si mplcs-
mcntc não funcionará. 
Ao longo dos anos 1980, versões da experiên-
cia gay e lésbica promoú das no âmbito de cam-
panhas políticas foram criticadas por privilegia-
rem valores da classe média branca. Tensões entre 
gêneros e entre os imperativos de gênero e se)a1a-
lidade também causaram debates acalorados e re-
vdararn a fragiiiJadc J u m\iJcÍ<J uc ..:umunidade 
da política gay e lésbica. Ao longo da história da 
liberação gay, algumas lésbicas criticaram o mas-
culinismo da cultura gay dominante. Urna facção 
do feminismo lésbico desenvolveu um modelo de 
lesbianismo como identificação da mulher que 
priorizou a motivação política em detrimento do 
desejo sexual. Em mais um desdobramento, po-
rém, outras lésbicas, incluindo feministas, senti-
ram que essa versão dessexualizada do desejo ho-
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í OUCAUI 1 f A HORIA OU[ [R 
30 mo,;st:xual feminino as exduía e implicitamente 
cndPssava uma noção scxualrncntt: dcspotencia-
liz;rn tc das mulheres. As cliscorcláncias culmina-
ram no que conhecemos como "guaras <lo sexo", 
nas quais lésbicas sadomasoquistas, mulheres cm 
rchtêÍonamcntos butch -fem 11 e femi nistas contrá-
rias ;'1 ct:nsura contestaram cm alto~ brados <\ idéia 
ele uma irmandade lésbica unida . Enquanto a con-
cep\·ão dominante da ident idade gay masculina 
reconhecia diversas práticas sexuais, incluindo sexo 
grupal e não-monogâmico, alguns também a viam 
como a promoção de um ideal restrito, respeitá-
vel, do relacionamento compromissado. Portanto, 
embora políticas gays e l~sbica~ganl~~~c:_in consi-
cki_a vci _L~1!..~pru1 11ove1Ld'> uma n~::i<:!·_;~ ta~ <tll 
e_:p~"OXimando-se da igua19~~e!....~ ideal de uma 
i <;ie~!idade coletiva era fragmentado por diferen-
~~. ~~~-
CRISE DE ID ENTID ADE 
Em uma visão retrospectiva, e com ajuda da aná-
lise foucaultiana, a fratura do mito de uma identi-
dade gay e/ou lésbica unificada e unificante pode 
ser visto como um produto não apenas de dife-
UMSIN SPAnGO 
renças de prioridades pessoais e políticas, mas tam- 31 
bém do t:mba~amcnto da política na identidack. 
E mhor:1 possam ser 1·istas corno cul tural mente 
construíd:1s t:m vez de inatas, identidades gavs t: 
lésbicas fo ram tanto restritivas quanto emanci-
padoras. A característica definidora central foi a 
"escolha de objeto", preferência por rclacionamt:n-
tos sexuais com alguém do mesmo gênero. l sso 
pode parecer a marca evidente da identidade gay 
e lésbica, mas como História da Sc'Xualidade mos-
trara, tal escolha de objeto nem sempre havia cons-
tituído a base para uma identidade e, como mui-
tas vozes discordantes sugeriram, não era inevita-
velmente o fator crucial na percepção que todos 
ti11l1.11n da -, u:i ~t:xualidadc . Esse modelo dcriva-
mentc fez com que os bissexuais parecessem ter 
uma identidade menos segura ou desenvolvida 
(assim como os modelos essencialistas de gênero 
fazem dos transexuais sujeitos incompletos), e ex-
cluiu grupos que definiam sua sexualidade por 
meio de atividades e prazeres em vez de preferên-
cias por gênero, como os sadomasoquistas. 
Com o surgimento da AIDS, esse coletivo já 
fraturado confrontou-se com uma nova série de 
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FOUCA'Ull E A l fOlllA Ollrl ll 
32 pressões. Os di~cursos populares que erroneamen-
te representav:1111 a A lDS (orno uma doença ga1· 
~1~1íram para uma renovada homofobia e cri-
:iram a necessid~1dc cÍc u~11;1revi~ão das estratégias 
assimilacionistas. O que parecia ser aceitação logo 
~~ rl'._''Clou rnmn tnlerància, rapidamente- t-;:;;nsfor-
!11:i<la cm int:olcr:incia: Is~~lcvou , por sua vez, :i um 
renovado mas descentralizado radicalismo na po-
lítica gay e lésbica. Novas coalizões foram forma-
das entre homens e mulheres, não com base na iden-
tidade essencial mas sim cm um compromisso com-
partiillado de resistência às representações que es-
tavam custando as vidas daquelas pessoas com 
AIDS. Mais interessante talvez, sob a luz de His-
toria da :::"·x1111/iii11d,., de Foucault, seja o fato Jc que 
o impacto da educação do sexo seguro levou a uma 
renovada ênfase em práticas em vez de identidades 
ao se pensar em sexo e sexualidade. ~ 
_crucial era o W você faz e não o que você é. 
No desenvolvimento dessas novas estratégias 
poüticas muitos críticos viram provas das formas 
de resistência a forças sociais opressivas e norma-
tizantes que Foucault identificou como mais sus-
tentáveisdo que grandes projetos revolucionários. 
TAMSIN SPARGO 
Entre os grupos estabelecidos dur:inte esse perío- 33 
do estava o ACT UP, que o rganizou protestos 
públicos sobre as polític:1s e a retóri ca <la AIDS, 
invadindo a bolsa de Non York, bloqueando a 
G olden Gate Bridge e inrcrrompendo a transmis-
são de telejornais da CBS. A estratégia do ACT 
UP concentrou-se em resistir aos efeitos de poder 
e saber que se manifestavam em instituições mé-
dicas e de assistência pública, em companhias de 
seguro e em vários outros contextos. O grupo foi 
descrito pelo ~eórico queer David H alperin como 
_a mais original, inteligente e criativa corporificação 
política da estratégica reconceitualização de sexo, 
saber e poder sugerida por Foucault. 14 
Para muita~ pcsso;t:., a cxp<:ril'.nl·ú d.i epidemia 
da AIDS fez ruir seu entendimento sobre saber e 
identidade, revelando ambos como inextricavel-
mente ligados às operações de poder. O impacto 
da AI_D_S sobre a compreensão convencional da 
subjetividade e da sexualidade é semelhante àquele 
que o Holocausto e a bomba atômica tiveram so-
bre os ideais do iluminismo progressista. D epois 
disso, nada poderia permanecer o mesmo. ~~ 
contexto do ativismo da AIDS e da rejeição às 
-- --~- - -- - . ---- --
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1 OllCALll l 1 A 1 EORI A OUlER 
3• ~ stratégias assimilacionisras qllc o "quecf' f~i~­
dobrado cm sua form a arual, tanto na cul~~~­
plll a r,_q~ant~ ;1a r~o ria.] nflucnciado pelo ACT UP 
e outras estratégias ativistas da AIDS, outro gru-
po fundado cm Nova York cm 1990 assinalou, em 
seu nome e em sua rercírica, a reapropriação de 
um termo que até então tinha sido predominan -
temente associado ;·1 homofobia e ao preconceito. 
"WE'RE HERE. WE'RE OUEER, GET USED TO IT" '5 
Qieer Nation e grupos afiliados como os Pink 
Panthers organizaram patrulhas urbanas parares-
ponder a agressões contra gays, celebraram as ví-
timas de violência homofóbica com campanhas 
de pichação pelas ruas e realizaram sessoe::s de edu-
cação anti-homofóbica em bares de heterossexu-
ais. Eles também organizaram campanhas na mí-
dia e nas artes subvertendo propaganda e imagens 
direitistas e homofóbicas. E~ central para a~ 
tpgft~~d~ _ _:etórica e represe!!_~ção do grupo2 
p~vra "gueer", gíria usada principalmente no dis-
~~r~o hoJEofóbic? ~as ~ambém por alguns homos-
sexuais que escolhiam o termo antes ou em vez de 
---------- __ __, 
,"gay" ou "lésbica". 
1 
TAMSlrl SPARGO 
Embora seu radicaLsmo tenha sido questio- 35 
nado quando comparado a grupos como o ACT 
UP, em parte com base no problemático conceito 
de "nação", a celebração feita pela Q1ecr Nation 
de um nome publicamente ouvido como insulto 
está ligada ao que alguns vêem como uma real 
1~_ud~1nça na ~tin1de de alguns gays e lésbicas nos 
Estados Unidos (e na Grã-Bretanha) em relação 
~.s.':.~ identidades....:_ às su~~ p_osi~õ~~ so~~ai2_cul­
turais e _políticas. Alguns críticos vêem essa mu-
dança como uma questão de idade, outros de classe 
ou atin1de para com a sociedade dominante.~al-
g_L1_e1: que seja o catalisador, algumas pessoas que 
ad~avam "gay" e "~sl;>ico," j_cientidades_jnadequa-
da~ vu n:~triti\·,1:> cncu1itrarnm cm "yuccr .. urna 
posição com a qual podiam se identificar. N a cul-
- ... ~ 
tura popular, queer significava mais sensual, mais 
transgressor, uma demonstração deliberada de di-
ferença que não queria ser assimilada ou tolerada. 
Essa _e.rn lll!llliferença que visava incomodar o 
-- - · ---~- -st~ q~c:Igun~gue supomos que Bart 
§_11l.Rson seja he~~- ___.. 
É relativamente fácil anaLsar em termos fou-
caultianos as ~JIJ.~J!~~d.$' P!egQ!Ili-: 
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1 FOUCAUI T f ~ 1! OHl 4 OUffR 
36 11-~~tes dt.: "homosseÀ"Ual" para "gay:' e "lésbica", e 
depois par~\ "ciucer", e ver como cada uma delas ofe-
receu possibilidades e problemas para indi\'íduos 
e para açtil:s políticas, produzidas através de rcla-
~·õcs com discursos e saberes dominantes. As cate-
~orias sucederam umas às outras, embora tenham 
ha1·ido superposi~·ões signifiotivas que uma his-
tória linear não revela. Relatos tradicionais da his-
tória da homossexualidade tenderam a minimizar 
a importftncia de aspectos do passado que não se 
ajustam ao modelo de progressão da repressão para 
a liberação, incluindo subculturas queer como co-
munidades lésbicas butch-fem dos anos 1950. Es-
sas subculturas, que antecederam o advento gay, 
têm mais em comum com a atuai cultura l]Ut.:er. 
Mas s!.'.'.gl!f!e( é vi!)to_primari;une_nte com?~ b~ 
Pilf.ª_i:m~ ~;'_ª polLtic~~e i2_enti4~de, en_!_ão_!~ 
bém e.~e _neç~ssaria!J1ent_e ir<t~xcJuir e re~tringi!; 
a dificuldade c~m~e ~i:~a_s pessoas _v~m ~ 
p~;~p-;~tiva de identificar-se como queer reflete 
esse fato. 
TORNAN DO A TEORIA "QUEER " 
Embora em uso popular "queer" seja efetivamente 
TAMSIN SPARGO 
empregado como uma c_ategoria de identidade 37 
aqicional ou altcrrutiva, a tc.:oria qucer não pode 
ser lida simplesmente como um suporte acadêmico 
desse momento cultural. O desencanto dos teóri -
cos queer com al~u11s aspectos da política g•w e 
lésbica não é simplesmente uma rejeição da nor-
matividade dessas categorias particulares, ma~ an-
tes deriva de um entendimento diferente de iden-
tidade e poder. Se a cultura queer_resgatou "queer" 
~orno um adjetivo que contrasta com a relativa 
r~speitabil idadc de "gay" e "lésbica", então se po-
d.eria considerar que a teoria qyeer p~s a palavra 
"queer" em circu.lação como um verbo que de-· 
s~stabiliza suposições sobre ser e fazer sexual e 
:_:xuadu. Em teoria, lJUécr t:Sl<i perperuamcnrc.: cn1 
confronto com o normal, a norma, seja ela a hete-
rossexualidade dominante ou a identidade gay/ 
lésbica. ~eer é definitivamente excêntrico a- ! 
···-- ' normal. ---
----
A teoria queer faz uso de várias idéias da teo-
<r~-- ___, 
ria ~~!~a2 incluindo os modelos psi-
canalíticos de identidade descentrada e instável, 
de Jacques Lacan, a desconstrução de estruturas 
binárias conceituais e lingüísticas, de Jacques D er-
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( 
\ 
' 1 
fOUCA lll T E A H ORIA ourrn 
38 rid.1 e, t claro, o modcln de discurso, saber e po-
Jcr, de Foucaulr. Prc\'i>ivdmcntc, da n:io tem um 
momento único de orif;em mas, retrospectivamen-
te, o início de sua cristalizaç:io é muitas vezes iden-
tificado como uma série de conferências acadê-
micas realizadas nos Estados U nidos no final dos 
anos J 980, que abordaram assuntos g:ws e lésbicos 
em relação a teoria~ pós-cstruturalistas. Em sua 
maioria, os estudos coletivamente chamados de 
teoria queer estão ~nseric:Jos nas ciências hu~ 
nas, na história, cm estudos culturais e literários~ 
na filosofia, embora os tópicos inr!uam discursos 
l~gãls,Ci~~tíÍicos e o utros. Os escritores geralmen-
te compartilham uma p.:_~c_upação com i1_~lítica 
<l_:: i:=p__:eser~_tação_ e uma forrnaçao na anális..: da 
~ultur~ escrita e visual, da literatura e do cinema 
ao discurso político. Muitos trabalhavam, e ainda 
trabalham, no âmbito de programas.~tudos 
gays e lésbicos, que cresceram rapidamente em 
- --
;;-6mero à medida que a teoria queer aumentou 
sua influência. 
A relação entre a teoria queer e os estudos gays 
e lésbicos é complicada. Alguns escritores e pro-
fessores nscilam entre os dois campos ou adotam 
1 AMSIN SPARGO 
para seu trabalho o termo que for mais estrategi- 39 
CIITH.:nte apropriado, da mc;;ma f(>rma que as iden -
tidades gay, lésbic1 e quccr podem parecer apro-
priadas em di ferente~ contextos . i\ las há aqueles 
que sentem que qucer de cerra forma encoraja as 
pessoas a desprezar ou descartar trabalhos teóri-cos e críticos gays e lésbico:;, da mesma maneira 
com que viram a ênfase cm Foucault eclipsar tra -
balhos semelhantes de historiadores não tão em 
voga. l\1uitos académico' estão, como Foucaul r, 
envolvidos em diferentes formas de ativismo po-
lítico, e talvez seja melhor ~ntender a relação da 
teoria queer com os estudos gays e lésbicos em 
t~rmos foucaultianos, como parte de uma red~ 
Jin:L111ica Je c1mpu> dt.: ,ai.>cr e pratica discur~i\·a 
diferentes mas superpostos. 
FOUCAULT OUEER 
Alguns estudos queer dão continuidade ao proje-
to de Foucault ao explorarem as diversas forma-
ç~~-~f~~nt:~~~c~i~~qe~ sexu~s;,--ida-;-e 
presentes. Exemplos notáveis são os estudos de 
D avid Hal2erin sobre a sexualidade na G récia d ás-
~ --··· .. 
sica e sobre o próprio trabalho de Foucault, o es-
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fOUCAUL1 ( A H ORIA OUEER 
40 rndo cm andamento de Ç;ylc_Rubin sobre a co-
munidade masculina "Leather" (que veste couro) 
de São Francisco, e o trabalho sobre identidades 
lésbicas fei to por }._1artha Vicinius. A teoria queer 
fundamenta trabalhos sobre discursos e constru-
~·iies homofóbicas feitos por Çi_ndy Panon e ~imon 
\ 'Yatncy, entre outros. Muitos estudos qucer se con-
c~nrram nos relacionamentos entre gays, lésbicas 
e sexualidades dissidentes e a produção cultural. 
Entre aqueles que trabalham nesse campo estão 
Joseph Bristow, Ed Cohen, Jonathan Dollimore, 
Lee Edelman, Alan Sinfield e Yvonne Yarboro-
Bejarano. O número de textos e autores queer, 
bem como de cursos universitários sobre a teoria 
queer aumentou considcravdmcnte durante os 
anos 1990. 
Em razão de sua atenção ao funcionamento 
de formações culturais específicas e suas relações 
de poder, os estudos mais localizados poderiam 
ser considerados como o ramo mais foucaultiano 
da teoria queer. Mas, sem querer subestimar sua 
importância, gostaria de me concentrar no res-
tante deste ensaio em alguns dos estudos que 
trouxeram as idéias de Foucault para uma série 
ThMSIN SPAAGO 
de encontros com outros modelos teóricos e ti- 41 
losóficos, a fim de explorar as normas e os pro-
cessos de normatizaçlio que sustcnt ;\ m o atual 
sistema sexual. 
U m dos primeiros tópicos explorados por tc<'>-
ricos queer foi a o_p_osiçãQ entre hcterossexualida-
d.e e h_omossexualidadc, vista como algo que ope-
ra no centro conceituai tanto de discursos homo-
fóbicos, quanto anti-homofóbicos. 
HE TEROSSEXUALIDADE VERSUS HOMOSSEXUALI DADE 
Se a homossexualidade é, comõ afirmou Foucault, 
um produto cultural, então o que é a heterosse-
xualidade? E por que ela é vista como a sex11:1li<la-
dc natural, normal? Por que a sociedade ocidental 
é governada pelo que os teóricos queer chamaram 
"!_ietero!2.?_E_~Ê.".:idade"? A reprodução humana 
pode necessitar da contribuição do esperma de um 
homem e do óvulo de uma mulher mas, como ar-
gumentou Foucault, a sexualidade é u~Jr?d~to 
cultural que não P.9de ser en~endido como um~ 
~i~pl:s extensã~ d_e .u_m ~:.º~~~:_o _b~ol~gico. Assim 
como a homossexualidade é uma categoria cultu-
ral específi ca, também a heterossexualidade deve 
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fOUCA\111 r A 1 fOll lA nu1 fR 
42 tt r uma h is tória a ser analisada. Essa análise pode 
ser r0111;1cb como uma necessidade política:}Je que 
\•;de L' quais s:io os perigos de aceitar que não exis-
te unu i<lcnt idade homossexual natu ral e unificada 
se a suposi~·ão de uma heterossexualidack natural 
6 inqucstion;ívcl? 
O s estudos qucer sobre essa oposição combi-
nam a h istóri a da sexualidade de Foucaul t com a 
análise textual desconstrutivista. Em sua introdu-
ção para urna coletânea de ensaios chamada Imide/ 
Out: Lesbia11 Theories, Gay Theories (1991 ), Diana 
Fuss aplica a noção de "suplemento" de D errida à 
análise da oposição heterossexual/homossexual. 
O suplemento (aqui homossô.•ual) é aquilo que pa-
rec<.: estar cm adirão a um termo aparentemente 
original, m as do qual o suposto original (heteros-
sexual) na verdade depende. Então a_ heti:r~~­
~al~~~~~ !?º~ ser vista como um produto da !:_o-
mossexua)idade,_~fü.9!i~rtence_n~ aos m~s­
mo_s parâmetros_ç_oncei~Sendo assim, como 
a homossexualidade torna-se a parte inferior da-
quilo que talvez seja uma oposição de iguais? Ne-
nhuma oposição existe em esplêndido isolamento 
- todas elas trabalham através de relações com 
TAMSJri SPARGO 
outras. A t radicional, mutualmcnte dependente 43 
mas antagônica oposição entre.: homcm/mulher, 
por exemplo, adquiriu sua estrutura hiedrquica 
através da associação com outras: racional/emo-
cional, forre/ fraco, at ivo/passivo, e assim por d i-
an te. Da mesma fo rma, a oposição heterossexual/ 
1:_0!11ossexual esr;i presa numa rede de oposições 
q~1 e se sustc.:ntam. 
Como exemplo, Fuss explorou a interdepen-
dência de heterossexual/homossexual e a oposi-
ção afim dentro/fora em culturas dominantes e 
opositivas. Além da óbvia divisão entre heteros-
sexuais estando dentro e homossexuais estando 
fora da sociedade dominante, esse movimento 
dialético pode ser localizado na retórica de estar 
"fora", e isso sugere suas limitações como projeto 
liberatório. Declarar-se fora do armário da sexu-
----- . -------a~~:ondida pode s~r l!.!11_ª Ji~_!t~-ªº pes-
~~ impli<:_!Lr~_ÇQ~~ centralidade da 
hetero~s_e~alid_ade, assim como...r.â.9.rÇM_l!_QlEgi-
nalidade dag~~qy_ç_,tinda estão dentro do ar-
!?.~E.i<2.:_ Em suma, é impossível mover-se inteira-
mente por fora da heterossexualidade. 
Como o trabalho de Foucault e a experiência 
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44 
FOUCAU l T [ A HOHIA OUlER 
de al).!;11Illas políticas homossexuais afirmativas 
mostrar:tm, ~xigir o reconhecimento de uma iden-
ridadc homossexual distinta inevitavelmente rea-
tir111:1 uma oposição binária e desigual entre ho: 
mosscxual e heterossexual. Assim, cm \ 'CZ de ten-
tar desconsiderar ou invcrt<'r a oposição, a teoria 
queer pode ser entendida como o exame das ma-
l nciras pelas quais essa oposição modelou hierar-
quias morais e políticas de saber e poder. Alguns 
1 dos trabalhos mais detalhados nessa área foram 
feitos por E~e Kosofsky Sedgwick, a crítica lite-
rária que a re.vista Rõlling Stone chamou de "a rai-
nha de fala mansa dos estudos gays". 
(\ tnil>alho r!e Sed10.vick não oferece uma saí-
da que ultrapasse essa oposição, mas começou a 
revelar as maneiras pelas quais o enorme p!_i~é­
~nceitual da-hçteros~exualidade está ent!._~­
nhad~ ~~~pla ga~~-d·e discursos. Ao fazer 
isso, ela ~_eJ~la o quanto a promoç3íoAe u_m~e­
rossexualidade normativa depende de uma homos-
~exualidade estigmatiz~d-a. Em B:tween Men: 
English Lite1~ure and M ale H omosocial Desire 
(1985), Sedgwick examinou as manei!as pel~ 
quais a interação s~cial entre homens _!i~-
- ----- --- - -- ·- -
T AMSIN SPARGO 
~L~is é estruturada cm torno da hostilidade à ho-
mossexualidade. Em Ep íslt'111ology ef tht' C!os,·t 
(1990), ela atirmo11 que o "armário" ou r~gimc do 
"s~gredo aberto'' associado com a homossexual i-
dade tem idéias profundamente estruturadas so-
bre \'alor e saber na sociedade ocidental. 
A fértil relação entre saber, poder e sexo se re-
vela na rccepç~ o :1cadêmica de alguns escritos 
queer. O trabalho de Sedgwick freqüentemente 
toma a forma de estudos de caso de textos literá-
rios, um exercício acadêmico tradicional. Seu en-
saio sobre a masturbação como figura de lingua-
gem no livro Razão e Sensibilidade, de Jane Austcn, 
foi causa de grande consternação em alguns cír-
ndo, acadcn1ico, Jl üS LsraJo, Unido,, e e muit.l> 
vezes apresentado como um símbolo da influên-
cia corruptora da teoria queer sobre uma discipli-
na inocente.16 A preocupação sobrea validade de 
ensinar disciplinas queer, gays ou lésbicas está cla-
ramente ligada ao medo de que o tópico possa 
corromper o estudante. O exemplo mais óbvio des-
se medo na Grã-Bretanha foi a Seção 28 do Ato 
Governamental Local de 1988, que proibia a "pro-
moção da homossexualidade" pelas escolas. Em-
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rQUCAUL T E A TEORIA QU[[R 
46 hora tal lcgisla\·âo dependesse de uma idéia ho-
mofóbica de cri:tn(;as innccntes (e implicitamente 
heterossexuais) sendo desviadas, isso levanta a ques-
tão de ro1110 nos vemos na condição de gays ou hete-
rossexuais. Se a homossexualidade e a heterosse:\.'Ua-
lLdadc são categorias de conhecimento cm vez de 
propriedades in:llas,. c~lmo é que nós, como indi-
víduos, aprendemos a nos conhecer dessa maneira? 
Essas qucstôes são centrais em alguns dos tra-
balhos mais ambiciosos da teoria queer, que de-
senvolvem idéias de Foucault e outros teóricos pós-
estruturalistas em uma nova e controversa teoria 
de gênero, sexualidade, corpo e subjetividade. 
fOBNAlfüO·SE PE5SOAL 
Um aspecto crucial da análise da sexualidade feita 
por Foucault, bem como de leituras pós-estrutu-
ralisras e queer relacionadas a ela, é que_0.nQ.iy~­
duo não é visto como u~ sujeito __ autônomo carte-
--·------- - - ---
. siano ("Penso, logo existo"), de posse d~s;.n-
-tidade inata ou essencial que existe indepen_deQ.-
t:~~ da lingua_g_::.~. O que comumente ou ca-
sualmente pensamos ser o "self' é considerado 
como uma ficção socialmente construída (ainda 
l AMSIN SPARGO 
que séria), como um produto da linguagem e de 47 
discu1:sos específicos n.:lacionado' a ,·,lmpartimen-
\ 
tos do saber. Posso acrcdit<H t]llC s<>u, de alguma 
forma, essencialmcnrt: e unic1mcnte cu mesmo, e 
que estou engajado cm um processo contínuo, e 
muitas vezes frustrante, de rcnur expressar a mim 
mesmo, assim como meus pr:lpósitos, para outros 
por meio da linguagem. J\1as essa crença, esse senso 
de j~dividualidade e ~lutonomia, é ela própria um 
constructo social e não o reconhecimento de um 
fato natural. 
Da me~ma maneira que '! gênero parece ser 
u~<:>_~2!1e_!l~e fi-!ndador da minha identidade, 
minhas p~(e:ências sexuais e desejos parecem cru-
ciais para a perccpi;ao de quem cu ,ou. !\esse final 
d;;écttlo, é -pro;âvel que -eu pense a respeito de 
minha sexualidade em termos de uma variedade 
de identidades possíveis - hetero, gay, lésbica, 
bissexual - que estão ligadas à classificação do meu 
gênero. Posso me considerar um homem gay ou 
uma mulher heterossexual, mas seria problemáti-
co pensar em mim como um homem lésbico (mais 
sobre isso em breve!). O que me permite pensar em 
mim mesmo como possuidor de uma identidade 
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1OUCAUL 1 f i< l[QRIA Ollff P 
48 de algum tipo sfo os próprios i;!.jscursos e saberes 
que produzem e p<>lici:un tanto :1 sexualidade 
qu:1nto o gl:ncro. As palavras que uso. os pensa-
mento' CJUC tc11ho, estão ligados às construções 
de realidade da minha sociedade; assim como vejo 
as rnrcs dcfi11i ch~ pelo espectro, também perce-
bo minha idcntidadt: sexual 110 lcCJUC de "opções" 
detnmina<lo pnr uma rede cul tural de <liscursos. 
O QUE BUTLER VIU 
Gender Troublc: J•;nninism and the Subversion oJ 
ldcntity, de Judith Butler, publicado em 1990, é 
talvez o rexto mais influente da teoria queer. Butler 
explicitamente desenvolve o trabalho de Foucault 
t:m rcb~au a tcun;1, icmi11istas <lc gc11cr<>, a t·lm de 
expor e explorar modelos naturalizados e norma-
tivos de gênero e de heterossexualidade. 
Muitas críticas feministas haviam observado 
que o estudo de Foucault tinha sido quase que ex-
clusivamente sobre a produção do homossexual 
homem. Enquanto alguns explicaram isso referin-
do-se a um suposto androcentrismo autoral, para 
outros isso podia ser visto como o resultado dos 
contextos históricos que ele examinou (tais como 
TAMSlrJ SPARGO 
discursos legais), que h:wiam ignorado a sex"Uali- 49 
dade feminina. Em ambos os casos, as fcminist:ts 
se preocuparam porq uc a imporr:incia do gênero 
estava sendo subestimada em algumas apropria-
ções do trabalho de Foucault. E mbora seu traba-
lho tenha sido útil para permitir que os trabalhos 
sobre sexualidade fossem realizados auronoma-
rnenri.:, e não como ~ecundários :'1 análise de gêne-
ro, as íntimas conexões entre as duas categorias 
no pensamenro moderno constituíram um cam-
po óbvio de ulteriores estudos e intervenções. 
O estudo de Butler recoloca o gênero em uma 
posição central da análise dos desejos e relações 
sexuais, mas não para preservá-lo como base de 
soliJ:1ritJade polnica. E m vez disso, ela adora o 
argumento de Foucault de que.ª "sexualidade" é 
pro?uz~~a d~~rsj-:_~mente e o ~'.11~lia para i~cJ~ir . 
O_J;ên~!º· Ela considera o gênero como um efeito 
performativo experimentado pelo indivíduo como 
uma identidade natural, argumentando contra a 
suposição de que a categoria de identidade de gê-
nero "mulher" possa ser a base das políticas femi-
nistas, pois tentativas de desenvolver qualquer 
identidade cqmo um fundamento irão inevitavel-
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1 
1 
1 
1 
i OUCAUl 1 [ A TEORIA OUHl1 
"º mente, ainda que inadvertidamente, sustentar as 
estruturas normativas binárias das atuais relações 
de sexo, de gênero e de libido. 
Como argumenta Hutler, gênero nâo é a exten-
sâo conceituai ou cultural do sexo cromossr1mico/ 
biológico (uma leitura fem inista estabclccida),mas 
uma continua pr{ttica discursiva hoje cm dia estru-
t~a cm torno do conceito de heterossexualida-
de com~ a ~arma dos relacionamentos humanos. 
A heterossexualidade compulsóri ~ é instalada no 
gê~o ; tr; vis da ~rodução de tabus contra a ho-
rüossexualidade, resultando numa falsa coerência 
de gêneros aparentemente estáveis vinculados aos 
sexos biológicos apropriados. É por isso que identi-
ficar-se como um homem lésbico parece <lbsurdo. 
Mas as conexões não são inevitáveis ou naturais. 
Se a sexualidade é um constructo cultural ou 
uma categoria do saber, e se, como insistem as fe-
ministas, o gênero é produzido culturalmente, en-
tão por que supomos que o sexo, concebido como 
uma oposição binária entre homem e mulher, é 
algo natural? No final da introdução de História 
da Sexualidade, observa Butler, Foucault argu-
menta que o próprio "sexo" é uma categoria fictí-
TAMSIN SPARGO 
ci;t que foi compreendida corno a fonte e a causa 
do desejo. O corpo não é naturalmenrc .. sexuado", 
mas se torna ass im atra\·és dos processos cul tu-
Ltis que usam a produção da sexualidade para 
ampli ar e sustentar relações de poder cspccífi-
c'.t.:'..: Mas a idéia de que o corpo é natural, de 
uma natureza diferente dos processe;, culru c1is, 
é poderosa, como o próprio trabalho de Foucaulr 
surpreendentemente revela. 
51 
Butler retorna a Foucault e descobre que em 
seu argumento geral há uma constante metáfora 
ou fig ura do corpo como uma superfície na qual a 
história escreve ou imprime valores culturais. Isso 
parece implicar, para Butler, °-fato de que o corpo 
l.:_1!.2_ u.~11a _ _:_i1_a~c:_.:~~tlidadc que precede a significa-
~ o que ela consi·d~~a .problemático. El;-;;~o 
procura uma ri::~n.eira de_ ler o corpo como uma 
p~·áti:_(;!_sjz!!_i/!-_f_!!_nte:_ No trabalho de M ary Do~gl~~ 
e Simon W atney sobre discursos que constróem 
as margens e limites do corpo como perigosos (in-
cluindo os discursos sobre a AIDS), Butler en-
contra a possibilidade de desenvolver a análise de 
Foucault para além de suas próprias fronteiras e 
limites, bem como de explorar o corpo como ~!.:.1-ª 
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57 fronteira mediadora que divide o interno e o ex-
r:rno par;1 produzir a experiência de ser um suj ei-
t;) esr:í1·cl, coerente. Em vez de estar além d;t aná-
lise, tl corpo, assi m como a sexualidade, pode ter 
uma genealogia. 
Enqlunto Foucault geraLnente abordav;1 a psi-
L·anúli'e como um discurso a ser estudado e não 
us:1do. Butler emprega idéias de Freud, Kristcva, 
Lacan e \Vittig, entre outros, para explo rar as 
maneiras pelas quais os efeitos de identidade são 
produzidos através da diferenciação entre: sujeito 
e Outro e da produção de um núcleo ficcional. 
Para Butler, é através da repetição estilizada 
de atos corporais, gestos e movimentos particula-
res que o eleito de gên1..:rn é criado corno ' tempo-
ralidade social". 17 N ão nos comportamos de de-
terminados modos -;m razão da nossa identida~e 
de gênero; adquirimos ~ssa identidade através d~s­
s-~s padrões comport~mentais, os quais sust~~~m 
~ormas de g~nero. O processo de rt"petição é "tanto 
uma reencenação e uma reexperimentação de uma 
série de significados já socialmente estabelecidos, 
quanto a forma mundana e ritualizada de sua le-
gitimação" .18 Essa teoria de "performatividade é 
l 4MSIN SP~RiiO 
um a das idéia' mais influcnrcs, aind;i que c1usa-
dora de confus;·10, ;t emergir da tcori;1 ljllL'l'r ou do 
femin ismo cm te mpos rcccnrcs .. \ ssirn como ;1 
análise de Fouc nilt d;1 implicac;ão entre saber e 
poder na proJuçfo de posiç<les do sujeito, a pcrfor-
matividade de ~ênLT<l li ieralmenre destrói a base 
de movimentos ptilíricos que têm por obje tivo a 
Jiheraç:lo de nai u rcz<tS reprimi das ou oprimiJas, 
tanto de gênero quanto sexuais, nus abre possibi-
lidades de resistência e sul)\"crsfo que haviam sido 
obstadas pela política da identidade. 
No senso comum, a performatividade é mui -
tas vezes mal interpretada como performance, co-
mo uma questão de escolha em vez da necc~~ i ­
dade dc se ter uma idcnridadc intcligível em ter-
mos do atual sistema de gênero. Isso em parte se 
deve ao principal exemplo escolhido por Butler 
para a subversiva e paródica performatividade de 
gênero: drag. Tradicion:ilmente vista pelas femi-
nistas como a manifestação de uma feminilidade 
estereotipada, a hiperbólica paródia das drags ex-
põe, na leitura de Butler, a própria estrutura imi-
tativa de gênero, fazendo-nos ver com outros 
olhos aquilo que pensamos ser natural. 
53 
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1 Ollr.AUL T [ A HORIA OUllR 
54 A interpretação errônea da performatividade 
corno escolh:l de gênero, como se fosse a escolha 
de urna roup:1. po<lc l'ro\· ir de um desejo utópico 
de fi.igir às compul s<->cs do sistema binário de gê-
nero e heterossexualidade identificado por Butlcr, 
ou então do consumismo dissemi nado da cultura 
ocidc11t:1l contcmµpr:lnca, estruturado em torno 
do miro da linc escolha. Ou pode ainda, é preciso 
d izê-lo, estar ligada ao estilo difícil e às vezes opaco 
com que I3utler escreve, e com um desejo de res-
postas, de sugestões tangíveis. 
SABERES QUEER 1 PERFORMANCES OUEER 
A linha de investigação que vai de Foucault a 
Butler ramificou-se cm muitas direções dentro de 
estudos e teorias feministas, gays e lésbicas, e da 
teoria queer. No âmbito da teoria queer, a crítica à 
naturalizada classificação binária de gênero foi am-
pliada em trabalhos sobre transexuais e trans-
gêaeros. Algumas ~nálises concentram-se na cons-
trução do corpo na prática e no discurso médicos, 
enquanto outros exploram as possibilidades de di-
ferentes configurações sexo-tecno-corporais na era 
da realidade virtual. Alguns trabalhos nessa área 
T .\MSIN SPARGO 
parecem extraordinariamente utó11icos. lVbs, ao 55 
ampliarem a análise da cn11srrtH;ii1> de corpos se-
xualizados e dotados de géncrc> 11 :1 s novas co nfi-
gurações de tecnologia, sahcr e poder, tais traba-
lhos oferecem um contrap1inro :'i tendência de con-
centrar-se em reprcscnta\·\ic,; 1itcr:írias ou ficci o-
nais de muitas análises queer. 
Outra corrente dos estudos quccr que se cruza 
com o trabalho de Butler, e igualmen te com a cul-
tura e política queer, é um,1 rclcitur:1 do po tencial 
subversivo e transgressor do cam p. E nquanto a 
interpretação errônea de perforrr:.àtividade como 
possibilidade de escolher a que gênero pertencer 
vai contra a compreensão tanto foucaultiana como 
c1ueer da subjetividade, a idéia de que alguns mo-
dos de performance hiberbólica de gênero podem 
ser subversivos tem sido vinculada com sucesso 
ao camp. De acordo com M oe Meyer, camp é a 
linguagem (num sentido amplo) sem crédito, po-
rém astuta e subversiva de um sujeito queer rejei-
tado.19 A performance camp de fato traz esse su-
jeito à existência, além de funcionar como crítica 
cultural. Isso parece relacionar-se diretamente com 
o modelo de performatividade de gênero de Butler 
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IOllC•\ 1111 1 .\ lilllllA Oll f l A 
56 e , nrn a ptissibilicbde d:1 su:1 suhn:rsão através da 
d«1~ irm:1,·ãu tlll "qucning". 
F~sc " dois aspectos da teoria queer - a investi-
~:H;fo de saberes sobre a sexualidade e :l Í1l\TStiga-
,.;h, dL· perfonnativi<ladc e perfonnance - nos le-
\·;1111 de ,·nlta i1 questão presente no com L\'O deste 
cn-::1io: o que faz Ju\i;rn Cbr;· e l~ddie l·u .ard pa-
recerem suh,·ersivns, cnquantn í , '<l!1CS cimp mais 
antig<'s eram freqüentemente vistos como refor-
1; ;1ndo estereótipos limitadores? P.ira alguns, ara-
zfo deve ser uma questão de assertividade ou "exte-
rioridade" do performer/performancc, mas essa 
explírnç~to rom a-se inadequada a partir de uma 
posição queer. E la se apóia em uma narrativa de 
p1 og;n;s~o - Lle '\lcnrro do arrnan Li. para "t'ura" - e 
~1~~nÇa-de qu~·a motivação ou intenção i_n-
dividual é o determinante do seu sentido. Como 
argumentou Foucault, esses são poderosos mitos 
culturais e(n::B> verdades. 
Poderíamos, em contrapartida, entender isso 
como uma questão de contextos diferentes. Nos 
anos 1970, as imagens camp de homossexuais "es-
condidos no armário" ou espalhafatosos confirma-
vam 0 "saber" negativo sobre "qucers" que circula-
T Af-'SI~ sr ;;BGO 
va na rrídia. enquanto ga,·s e lésbicas tcnt;wam 
reivindicar um s:1bcr diferente ,obre si mcsnHi,;. 
Estrateg icament e, portanto. Clmp tinha um im -
pacto diferente do que tem hoje, quando pode :1g ir 
como urna subversão quecr de normas rcspcitú-
vcis de identidades e modos de ser tanto heteros-
scxu;iis quanto gays e lésbicos. l\1as não se trata 
simplesmente de o camp ser agora inevitavelmente 
um modo subversivo. fa:s críticas queer sobre 
norm atividade não podem menosprezar a habili-
d~de dos discursos e saberes dominantes de con .. 
terem e apropriarem-se da subversão. 
A força dos modos de compreensão dominan-
tes sobre sexo, sexualidade e gênero pode ser oh-
servada na diterença <la recepção a Clary e lzurd . 
C lary parece ocupar previsivelmente um nicho 
camp que adaptou com sucesso para os formatos 
aceitos de shows e com édias de tevê. As reações a 
Izzard têm sido bem mais complexas. E nquanto 
o travestismo desse comediante ainda provoca di-
versas reações em entrevistadores e com entadores, 
é sua sexualidade que parece ser vista como acha-
ve para seu status problemático nos atuais m ode-
los de gênero. O s depoimentos do próprio lzzard 
57 
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rOUCAUl T E A llOíllA 011r1 R 
58 sobre suas escolha' e preferências têm variado, mas 
eles n3.o são realmente a questão. Sua cornhinação 
de signos co11ve11cio1Jais de gêneros opostos. como 
saias e barba por fazer, significa que ele não se en-
quadra nas alrcrnarivas másculo=homem=m acho 
ou fcminino=mulhcr=fêmea. Em muitas com·cr-
sas sobre ele, isso leva a urna pergunta: "Ele é 
hctcro, ga~' m1 o ciuê?" Sua performance pcrt',1rba o 
saber convencional sobre com que gênero concebi-
do como masculino e/ou feminino ele se parece. 
Assim, observadores desorien tados voltam-se para 
o outro casal convencional, homossexual-heteros-
sexual, a fim de dar algum sentido à sua confusão. 
Nesse exemplo, é possível ver a dinâmica da 
cons trlli,.au discursiva de gêm:ro e de sexualida-
de sendo ao mesmo tempo separada e conectada. 
A aparência de Izzard pode ser interpretada como 
o "queering" performativo de normas de gênero 
e sexualidade, enquanto as reações a ela revelam 
a ~orça .Q~Q9rE_!a,tizaçã~ q~. no~ _'.lrra_sta para c_Qm-
preensões convencio_na~ de_corpos e idef!.tida-
.4~Êm termos fo~caultianos, poderíamos ler isso 
como um a incorporação de resistência, "inflaman-
do certos pontos do corpo, certos momentos da 
1 AMSlN SPARGO 
vid;i, certos tipos de comportamcnto", e também 
como uma incorpora,;3.o de nossas tcntati\·as de 
dcvoh-er cs~e corpo :1 sua <:onJiçilo própri.1 e re-
conhecível. 
59 
Esse tipo de rcsis rência não é limitada aos as-
pectos mais dram;íricos de performance. f\ cultu-
ra e a teoria quecr pudcm enfatizar as conexões 
entre teatralidade e política cm \·ez de considerá-
las mutuamente excludentes, mas existe um lado 
mais "sóbrio" do queer. l'\a teoria e na prática, queer 
poderia ser entendido como um adjetivo que age 
como um performativo, que tem a força de um 
verbo. D avid Halperin vê queer como um "hori-
zonte de possibilidades" e 9 sujeito queer ocupan -
do u1:1 "p~~~cionamcnro excêntrico" em relação ao 
n?:_i:ial_, ao !egíti~, ao dominante.20Eve KosofsJ<Y 
Sedgwick sugere que chamar a si p róprio de queer 
envolve "empreender atos par ticulares, perform a-
tivos, de filiação e auto-percepção experimen-
. " 21 'T'_1 . . 
tais . 1a.ivez existam, nessas tentativas de pensar 
em identidades sem essências e sujeitos em pro-
cesso, ecos do interesse de Foucault p elas técnicas 
não-normatizantes do self na cultura grega. H al-
perin vê nos comentários positivos d e Foucault 
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FOUCl,IJI T E A HORIA ourrR 
GO sobre a pdrica cio sadomasoq uismo um jogo es-
tratégico que n i:i. pnzer em vez de uma fó rrna de 
dominac;:in, \111l indicador para uma pdtici. sexual 
quecr que poderia abrir a possibilidade de um "sclf 
111:1is impc~so:tl ". 22 E m geral, algu ns dos trabalhos 
mais recentes cm teoria queer c rocuram ente nder 
as rclaçües entre idrntidade e ação de fo rmas que 
penn it:i. 111 :1 aç·fo individual e cole tiva na res istên-
cia a saberes e práticas opressivas, sem retornar <1 
idéia modernista do sujeito au tônomo. Como em 
alguns dos pronunciamentos de Foucault, mais do 
que em suas análises, esse trabalho tem um ângulo 
utópico, porém temperado pelo reconhecimento de 
que a forma do futuro jamais pode ser prescrita. 
HOJE OUEER, AMANHÃ NADA? 
A cultura queer e a teoria queer atraíram recente-
mente muitas críticas de ativistas lésbicas, gays e 
queers, bem como de acadêmicos. Para alguns, o 
momento queer já passou, seus gestos transgres-
sores foram transformados em acessórios de moda. 
Você pode usar um piercing no mamilo ou uma 
camiseta que diz "Qieer as Fuck", pode assistir 
filmes queer, mas será que isso faz alguma dife-
l AMSIN SPARGO 
rença> Será que quccr tornou -se apenas mais uma 61 
categoria de ident idade, nu is undlcada do C]Ue 
fragmentada) 0Ja sociedade consum ista do cap i-
talismo tardio, seriam as pc~soas queer real men-
te apenas lésbicas , ga,·s e alguns outros cujo rela-
cio namento mais ínti mo é· com seus cartÕ<:s de 
crédito? 
A própria teor ia C)Ueer foi criticada por sua 
abstração, sua fe tichização do discurso e seu apa-
rente desprezo pelo mundano. E ssas críticas fa -
zem eco àquelas lançadas contra as teorias pós-
estruturalistas e pó!'".- rnodernas em geral. Mais es-
pecificamente, ela foi acusada de ignorar o u me-
nosprezar as realidades da opressão e os ganhos a 
serem obtidos com c:ampanhao organizadas por 
direitos e por justiça. Suas credenciais interven-
cionistas - políticas, intelectuais e sociais - são 
vistas por alguns como enfraquecidas por sua ten-
dência em concentrar-se na diferença e na trans-
gressão como fins em si mesmos. A tendência que 
têm alguns textos queer de apresentar gênero e 
identidade de maneira quase exclusivamente ne-
gativa, aprisionando estruturas ou conceitos, tam-
bém recebeu críticas, e alguns comentadores su-
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íOllCAUl 1 l A HO Rlt, OlJI fR 
r,2 geriram que queer dew mais 3 identidade gay 
n1asculi11ista do que quer rcconht·ccr. 
lne,·ir;n·dmcnte, algumas crí ticas s:io baseadas 
numa comr rccns:io rcduci\ln i~r;1 . No dilúvio de 
ensaios e livros que aspiram ao status de queer, 
:ilgum dos ;1rµ;umcntos (h teoria quccr foram d i-
luídos ou mal representados :1té ~e tornarem ab-
surdos. E m algu ns est11dos, as tentativas da teoria 
queer de ir além de um impasse construtivismo 
versus cssencialismo foram <leslocadas por uma 
recusa em ver qualquer estudo genético como algo 
motivado apenas pelo genocídio. O modelo de 
performatividade de gênero de Butlcr é regular-
men te transformado num convite para escolher 
cotid ianameme ~cu gcne1«> uc a...:vrJo com seu 
guarda-roupa (uma atraente possibilidade u tópi-
ca, mas que presta um desserviço ao rigor concei-
tua! do argumen to original) . 
C omo discurso acadêmico, sustentado no âm -
bito de um sistema universitário que apóia a pes-
quisa ao m esmo tempo em que define os seus li-
mites, a teoria queer está presa a um duplo movi-
mento de contestar e produzir saber, de desafiar 
normas enquanto encara um possível futuro como 
1 AMSIN SPARGíl 
uma ortodoxia paradoxal. Se o quccr se torna nor- 63 
mal, respeitável, ,·irando apen:1s mais um:l opç:io, 
cnt:io deixa de ser qucer. Tcn:-::1 de L1un:ti~ . uma 
das primeiras a usar o termo, atirmou q ue :\ teoria 
queer "rapidamente to rnou-se uma criatura con-
ccirualrnenre va7.Í;1 da indústria editorial". '' .i\1as 
cnqu:mto o termo pode ser agora desdobrado cm 
projetos distintamente n:io-gueer, ele também é 
constantemente retrabalhado cm conrcxtos soci-
ais e discursivos cm mutação. Novos encontros in-
telectuais diversificam o alcance dos temas e dos 
métodos da teoria qucer. ~mbora a sexualidade 
p~_:1eça o objeto-chave da análise queer, ela é 
cada vez mais examinada em relação a outras ca-
tegorias oe sab<.:r envolvidas na manutenção <lc 
r;X;çõ~; de p_~der d~si~uais: raça, religiã~, n~ci?­
nalidade, idade e classe. 
E nquanto os teóricos queer renegociam os ter-
mos de compromisso com seu tem a, talvez aspa-
lavras finais devam ser de Foucault: "A ontologia 
crítica de nós m esm os certamente deve ser consi-
derada não como uma teoria, uma doutrina ou 
mesmo um corpo permanente de saber que se acu-
mula; ela deve ser concebida com o uma atitude, 
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um crhos, uma vida fi losófica na qual a crítica do 
que somos é, a um só tempo, :1 :tn:ílisc histório. dos 
limites que nos foram impo~ tns e uma cxpenmen-
ração com a possibilidade de irmos além deles".2·' 
NOTAS 
;'\
1
. n(l Tr:11.l.: "Ü ut ing" t'. li nnmc dadt) :1 pr:í ti1.:a C\Cr\:id:t 
po r ;1lguns grupos h t)!lllbSt.:xuai:-. dt' aponur ;dgut m 
tgcr.tlillcnrc famoso) co nh) g .1:· ou k -.hic.1 , J tl rn llc 
prn\'0c.tr uma dccl:iraç:1o públi.::1 tk sua nric nr:1ç:lo sexual. 
2 N. do Trad.: "C arnp" é um e>r ilo de h11 n10r irn10 
cser;1chado, com um to m 1·ulgar. ulrr:ij:llltC e arriticial. 
3 Ca1•lc S. Rubin. "Thinli11i Scx: .V" t<.< j or a Nadical

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