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CENTRO UNIVERSITÁRIO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA THIAGO DA SILVA LEITE AGDA ALVES DE SOUZA RECREIO ORIENTADO: Momento Propício à Prática de Formação de Valores Ceilândia – DF 2013 THIAGO DA SILVA LEITE AGDA ALVES DE SOUZA RECREIO ORIENTADO: Momento Propício à Prática de Formação de Valores Artigo Científico apresentado ao curso de Pedagogia com habilitação em Séries Iniciais do Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília, como requisito parcial para a obtenção do título de licenciado em Pedagogia. Orientadora: Profª Msc Magalis Bésser Dorneles Schneider Ceilândia – DF 2013 3 RECREIO ORIENTADO: Momento Propício à Prática de Formação de Valores Thiago da Silva Leite* Agda Alves de Souza** Magalis Bésser Dorneles Schneider*** RESUMO Este artigo tem como objetivo investigar o recreio na Escola Classe Clarinda Maria da Conceição localizada no Distrito Federal, e se a presença de educadores neste espaço/tempo pode contribuir para a prática de formação de valores. Para isto, o trabalho apresenta o contexto histórico e legal do recreio nas escolas do Distrito Federal; em seguida aborda as questões sociais que se fazem presentes na interação entre os alunos; e traz algumas experiências de sucesso em que escolas contaram com a presença de educadores no recreio. Por fim, expõe os resultados da pesquisa de campo realizada na referida escola, que contou com a participação da coordenadora e da orientadora, e com a análise do Currículo em Movimento da Educação Básica do Distrito Federal (2013) e do Projeto Político Pedagógico da instituição. Palavras-chave: Educadores. Recreio. Valores. 1. INTRODUÇÃO A escola convive hoje com um dos maiores problemas enfrentados pela sociedade: a violência. Este mal tem estado presente, principalmente, nas atitudes dos alunos para com os professores que, em sua maioria, não demonstram o mínimo controle ao se depararem com tais situações. Isto ocorre porque, segundo Lima (2012) essa instituição, desde a educação infantil, está mais preocupada em passar um conhecimento formal para os educandos em detrimento a uma prática de formação de valores. O recreio, momento rico pelas suas relações sociais que poderia ser utilizado como meio auxiliar nesta prática, acaba passando despercebido na maioria das escolas. Diante do exposto questiona-se: o que a escola pode fazer para utilizar o recreio como instrumento na prática de formação de valores? * Discente do curso de Pedagogia do Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasíl ia. ** Discente do curso de Pedagogia do Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasíl ia. *** Docente do curso de Pedagogia do Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasíl ia. Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário de Brasília, UNICEUB, Brasil; Pós-graduada em Administração Escolar pela Universidade Candido Mendes, UCAM, Brasil; Mestre em Educação pela Universidade de Brasília, UNB, Brasil; Doutoranda em Educação pela Universidade de Brasília, UNB, Brasil. 4 Acredita-se que uma possível solução para o problema apresentado, é a adoção da presença de educadores durante este período. Não com o intuito tradicional de coagir os educandos, mas de orientá-los no momento mais propício, que é quando eles estão, efetivamente, interagindo uns com os outros e com o ambiente. Este trabalho tem o objetivo de investigar o recreio na Escola Classe Clarinda Maria da Conceição, localizada no Distrito Federal e se a presença de educadores neste espaço/tempo pode contribuir para a formação de valores nos alunos. Para isto, a pesquisa deve apresentar o contexto histórico e legal do recreio nas escolas do Distrito Federal. Em seguida, abordar as questões sociais que influenciam no comportamento dos alunos e que podem ser observadas na interação entre estes e, por fim, relatar algumas experiências de sucesso em que as escolas adotaram a presença de educadores no recreio. A escolha do tema se justifica por constatar-se, após a observação do recreio na referida escola, que os alunos agem uns com os outros, muitas vezes, de forma desrespeitosa e que não há – apesar de constar no PPP da escola – um trabalho voltado para o recreio, de modo que este período acaba se tornando palco para muitas injustiças, sem a devida intermediação de um educador. Atuando no recreio este profissional, segundo Neuenfeldt (2005), terá um vasto campo de oportunidades para a propagação de valores na vida dos alunos. O trabalho aqui desenvolvido poderá servir de fonte para futuras pesquisas sobre o tema, visto que, a cada dia buscam-se novas soluções que contribuam para um melhor relacionamento entre as pessoas na comunidade escolar. Esta pesquisa teve cunho qualitativo, pois segundo Minayo (2008), caracteriza-se por estar vinculada a um nível de realidade que não pode ser mensurado, quantificado. Ou seja, atua com o universo dos significados, das pretensões, das crenças, dos valores e das ações. Esse conjunto de fenômenos humanos é compreendido como parte da realidade social, pois o ser humano não se diferencia só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por entender suas ações dentro e a partir da realidade vivida com seus semelhantes. A pesquisa foi realizada na Escola Classe Clarinda Maria da Conceição, localizada na Região Administrativa de Ceilândia/DF e contou com as participações da coordenadora e da orientadora da instituição. A comunidade escolar, de modo geral, provém de famílias muito carentes com lares desestruturados por causa de problemas como, por exemplo, a falta de emprego, baixa renda e dependência química e/ou alcoólica. Como ferramentas de coleta de dados foram realizadas, além de entrevistas, análises: do Currículo em Movimento da 5 Educação Básica do Distrito Federal (2013) – nova proposta de currículo para as escolas do Distrito Federal – e do Projeto Político Pedagógico da escola. 2. CONTEXTO HISTÓRICO E LEGAL DO RECREIO NAS ESCOLAS DO DISTRITO FEDERAL A ideia de uma educação integral que inclui a formação para a cidadania já permeava o Distrito Federal na época da construção de Brasília, pois segundo Pereira (2011) a primeira escola pública do Planalto Central foi inaugurada em 1957 e recebeu o nome de Escola Júlia Kubitschek em homenagem à mãe do presidente Juscelino. Esta escola foi criada sob a influência do ideário escolanovista com orientação técnica do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP/MEC) administrado, na época, por Anísio Teixeira. A autora relata, ainda, que a proposta educacional elaborada por este educador para a nova capital visava à formação integral dos cidadãos em todos os níveis de ensino: do jardim de infância à universidade. E a Escola Júlia Kubitschek tornou-se a pedra fundamental do Projeto Político-Pedagógico emergente, pois: Caracterizava-se por ser uma escola de educação integral e em tempo integral. Pautava-se no ideário da escola nova, que buscava proporcionar às crianças formação integral, com vistas a inseri-las na vida moderna. Nessa perspectiva, além do tempo destinado às matérias tradicionais, como português, matemática, ciências, história e geografia, havia atividades complementares: iniciação musical, artes plásticas,educação física, atividades de trabalho e de caráter social. De acordo com os princípios filosóficos que a fundamentavam, a escola deveria se organizar como comunidade de vida e de trabalho. (PEREIRA et al., 2011, p. 9). Campello (2013) aborda um projeto que também fez parte do plano de construção escolar (utopia educativa) na época da construção de Brasília. Foi o projeto de construção das Escolas Parque. Uma proposta arrojada de Anísio Teixeira pela qual se pretendia criar um modelo de educação voltado para a formação de uma sociedade mais justa e democrática. Assim, na nova cidade, as super quadras acolheriam, conforme definido no planejamento educacional, quatro Escolas Classe voltadas para as atividades de conteúdo formal e uma Escola Parque onde eram desenvolvidas atividades que contribuíam para a formação integral dos estudantes. A carga horária de oito horas diárias previstas para a educação integral era dividida de modo que os alunos ficassem durante quatro horas nas Escolas Classe e as outras quatro na Escola Parque. Percebe-se, através das leituras apresentadas que a escola, desde o início de suas atividades em Brasília, preocupou-se com a formação das pessoas para o convívio social. Mas, quando da elaboração desses planos utópicos, não se pensou nos rumos que o Distrito Federal tomaria em termos de crescimento populacional, o que começou a ser sentido ainda 6 naquela época quando, de acordo com Campello: “Novas super quadras foram sendo construídas sem serem dotadas de todos os recursos e serviços previstos no projeto original”. CAMPELLO et al 2013, p. 44). A pesquisadora afirma que, mesmo com a elevação na quantidade de alunos, novas Escolas Parque não foram construídas. Isto provocou uma redução da carga horária das aulas destinadas à integração da educação à vida cultural da cidade, missão dada a estas escolas. Aos poucos, o tempo de permanência dos estudantes nas Escolas Parque foi sendo diminuído. Das quatro horas iniciais, reduziu-se, em 1962, para duas horas. Outra sugestão proposta na época para “solucionar” (grifo do autor) o problema da carência de vagas, ainda segundo a autora, previa que os estudantes fossem atendidos em dias alternados. Por fim, não foi mais possível sustentar a proposta original, ficando em funcionamento apenas cinco Escolas Parque de forma diferente do que previa Anísio Teixeira; e as novas Escolas Classe deixaram de ser vinculadas a uma Escola Parque. Campello afirma ainda que outro problema logo se fez presente: os operários que trabalharam na construção de Brasília (candangos) foram deixados à margem da nova capital, o que representava um desvio das finalidades de uma educação democrática. Estas pessoas não tinham lugar ali e acabaram se deslocando para outros pontos do Distrito Federal. Esse movimento deu origem às cidades satélites – hoje conhecidas como regiões administrativas. Para esta pesquisa, vale ressaltar a história de Ceilândia, região administrativa onde se encontra a Escola Classe Clarinda Maria da Conceição, que é objeto de estudo do presente artigo. De acordo com a Administração Regional de Ceilândia RA-IX em um texto publicado em sua página na internet (2013)1: em 1969, nove anos depois de fundada a capital, já havia no Distrito Federal quase 80 mil habitantes vivendo em favelas que eram compostas por aproximadamente 15 mil barracos. Problema grave, pois esse número (80 mil) representava mais de 15% da população do Planalto Central (500 mil habitantes) vivendo sem a menor infraestrutura. Segundo o texto, naquele ano houve um seminário onde foram discutidas as questões sociais do Distrito Federal. O favelamento foi o maior problema apontado nas discussões. Preocupado com as consequências a que isto poderia levar; o governador Hélio Prates da Silveira solicitou à Secretaria de Serviços Sociais, comandada por Otamar Lopes Cardoso, que fosse feito um trabalho com o intuito de erradicar as favelas do Distrito Federal. No 1 http://www.ceilandia.df.gov.br/sobre-a-ra-ix/conheca-ceilandia-ra-ix.html, acessado em 31 de outubro de 2013 7 mesmo ano, foi criado um grupo de trabalho que, mais tarde, recebeu o nome de Comissão de Erradicação de Favelas. Surgiu, então, a Campanha de Erradicação das Invasões (CEI), presidida por Vera de Almeida Silveira, esposa do governador. Numa área de quase de 232 quilômetros quadrados foram demarcados milhares de lotes. Esta área ficava ao norte de Taguatinga, nas antigas terras da Fazenda Guariroba. Em 27 de março de 1971, o governador Hélio Prates lançava a pedra fundamental da “cidade-satélite” de Ceilândia. Às 9 horas do mesmo dia, tinha início o processo de assentamento das vinte primeiras famílias. De acordo com a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (Ceilândia - PDAD 2013) Ceilândia hoje possui aproximadamente 449.592 habitantes dos quais apenas 29,34% estudam. Percebe-se através dos números apresentados na pesquisa, que as escolas de educação básica de Ceilândia não têm contribuído muito para que as pessoas permaneçam estudando, visto que, do total da população, apenas 21,92% possuem ensino médio completo e, apenas 4,48% concluíram um curso superior. Isto pode ser estendido, com algumas variações, às demais regiões administrativas. Com o intuito de transformar esta realidade, a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEE/DF), desde o início do milênio, vem fazendo reformas curriculares a fim de criar, com o apoio de toda a comunidade escolar, o Currículo da Educação Básica. Um documento que tem a finalidade de nortear a prática pedagógica dos/as educadores/as na perspectiva da construção de uma instituição educacional pública de qualidade para todos. Essas publicações não são um manual ou uma cartilha a serem seguidos, mas um instrumento de apoio à reflexão do/a professor/a e deve ser utilizado em favor do aprendizado. Espera-se, dessa forma, que cada professor/a aproveite estas orientações como estímulo à revisão de suas práticas pedagógicas e que sejam alvo de reflexões e de discussões para seu aprimoramento com vistas à publicação do Currículo da Educação Básica em sua versão definitiva. (CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA/DF 2010, p. 8). Em 2003 o Conselho Nacional de Educação aprovou um Parecer da relatora Sylvia Figueiredo Gouvêa que aponta o recreio como atividade escolar. No documento a educadora expressa o seguinte: Estando os alunos sob a responsabilidade da instituição, também durante os intervalos ou recreios, esses momentos podem se transformar em excelentes oportunidades para os educadores conhecerem melhor os educandos, assim como para exercerem a sua função educativa. (PARECER N.º: CEB 02/2003, p. 1). Gouvêa afirma ainda, com base no Parecer CNE/CEB 05/97, que no conjunto da legislação vigente fica claro que a jornada obrigatória de quatro horas diárias de trabalho no 8 Ensino Fundamental, não corresponde exclusivamente às atividades realizadas na tradicional sala de aula. [...] Assim, não são apenas os limites da sala de aula propriamente dita que caracterizam com exclusividade a atividade escolar de que fala a lei. Esta se caracteriza por toda e qualquer programação incluída na proposta pedagógica da instituição, com frequência exigível e efetiva orientação por professores habilitados. (PARECER Nº: CNE/CEB 05/1997, p. 4). Para a autora, o fato de o recreio ser considerado “efetivo trabalho escolar” (grifo do autor) não é um entendimento novo, pois: Já foi adotado quando da implantação da Lei 5.692/71 e o CFE, no Parecer 792/73, de 5-6-73, concluiu: o recreio faz parte daatividade educativa e, como tal, se inclui no tempo de trabalho escolar efetivo...; e quanto à sua duração, ...parece razoável que se adote como referência o limite de um sexto das atividades (10 minutos para 60, ou 20 para 120, ou 30 para 180 minutos, por exemplo). (PARECER Nº: CEB 02/2003, p. 3). O contexto histórico e legal do recreio nas escolas do Distrito Federal apresentado nesta pesquisa reforça a ideia de que: se a escola busca preparar os alunos para se tornarem cidadãos conscientes de seu papel perante a sociedade, então a presença de educadores faz-se necessária, não apenas nos horários de aula, mas também nos momentos de interação como o recreio. 3. QUESTÕES SOCIAIS PRESENTES NO RECREIO A escola é um ambiente propício ao crescimento social e afetivo das crianças, pois segundo Roncuni (2007) é o local “onde as crianças terão contato com momentos como o recreio, as aulas de Educação Física e a sala de aula” (RONCUNI 2007, p. 1). Macarini et al. (2006) citada por Roncuni (2007) acrescenta que: [...] o ser humano necessita do contato com outras pessoas, pois é através da interação social que se desenvolve a linguagem, são reconhecidas as habilidades e são ampliados os conhecimentos em diferentes áreas. Para a criança, o contato físico, o social e a comunicação são fundamentais no seu desenvolvimento e uma das maneiras mais eficazes para ela estabelecer estes contatos é através da brincadeira. (MACARINI et al. 2006 apud RONCUNI 2007, p. 1). Por ser o lugar onde a maioria dos alunos terá seu primeiro contato com outros membros de sua comunidade, que não sejam seus familiares ou vizinhos, a escola deve criar condições que proporcionem a estes um bom relacionamento interpessoal. Para Vygotsky as funções psicológicas superiores classificam-se em dois momentos ao longo do desenvolvimento da criança: Primeiro no nível social, e, depois, no nível individual; primeiro entre pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (intrapsicológica). Isso se aplica igualmente para atenção voluntária, para a memória lógica e para a formação de 9 conceitos. Todas as funções superiores originam-se das relações reais entre indivíduos humanos. (VYGOTSKY. 2007, p.58). Para este autor o contexto social é um fator de suma importância e que, obviamente, reflete na escola. Sendo o recreio o momento de maior interação entre os alunos, o reflexo da sociedade nas relações escolares pode ser facilmente observado neste espaço/tempo. O recreio nas escolas públicas do Distrito Federal, assim como nas outras regiões do país, envolve crianças que apresentam diferenças em vários aspectos: etnia, classe social, cor, religião etc. Segundo o Currículo da educação Básica (2010) estas diferenças acabam interferindo nas relações gerando, muitas vezes, conflito, por causa da dificuldade que alguns têm em aceitá-las. Para Chrispino (2002) citado por Chrispino (2007) o conflito, geralmente, só é percebido nas escolas quando aparece de forma violenta. O autor explica que isso se deve, entre outras coisas, à incapacidade de muitos profissionais em identificar as circunstâncias que derivam do problema ou que levam a ele. Resultam disto, duas conclusões: [...] a primeira é que se o conflito se manifestou de forma violenta é porque já existia antes na forma de divergência ou antagonismo, e nós não soubemos ou não fomos preparados para identificá-lo; a segunda é que toda a vez que o conflito se manifesta, nós agimos para resolvê-lo, coibindo a manifestação violenta. E neste caso, esquecemos que problemas mal resolvidos se repetem! (CHRISPINO et al. 2002 apud CHRISTINO 2007, p. 16). Chrispino afirma, ainda, que a mediação de conflitos pode: [...] induzir a uma reorientação das relações sociais , a novas formas de cooperação, de confiança e de solidariedade; formas mais maduras, espontâneas e livres de resolver as diferenças pessoais ou grupais. A mediação induz atitudes de tolerância, responsabilidade e iniciativa individual que podem contribuir para uma nova ordem social. (CHRISPINO 2007, p. 23). Observar as brincadeiras das crianças é muito importante para que o educador possa compreendê-las e assim reagir de forma positiva frente aos comportamentos apresentados por elas. Estando muito preocupado com uma educação focada nos aspectos cognitivos formais, fica difícil para o educador, visualizar a relação entre brincadeira (interação) e desenvolvimento. Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais: As diferentes competências com as quais as crianças chegam à escola são determinadas pelas experiências corporais que tiveram oportunidade de vivenciar. Ou seja, se não puderam brincar, conviver com outras crianças, explorar diversos espaços, provavelmente suas competências serão restritas. Por outro lado, se as experiências anteriores foram variadas e frequentes, a gama de movimentos e os conhecimentos sobre jogos e brincadeiras serão mais amplos. Entretanto, tendo mais ou menos conhecimentos, vivido muitas ou poucas situações de desafios corporais; para os alunos a escola configura-se como um espaço diferenciado, onde terão que ressignificar seus movimentos e atribuir-lhes novos sentidos, além de realizar novas aprendizagens. (PCN’S: EDUCAÇÃO FÍSICA 1997, p. 45). De acordo com esse documento o recreio pode ser utilizado como auxiliar na aprendizagem dos alunos, pois é um momento em que estes organizam as atividades e 10 brincadeiras por eles vivenciadas em outros ambientes. Neste espaço/tempo é possível trabalhar aspectos como a coordenação motora e o desenvolvimento intelectual de forma a contribuir na formação geral da criança. Alguns alunos apresentam dificuldades que estão relacionadas a problemas no ambiente onde vivem: lares com extrema pobreza, brigas, drogas, álcool etc. A este respeito Olson (2000) citado por Ferreira (2002, p. 35) afirma que “essas crianças estão em risco de rejeição pelos companheiros, conflitos com a família e com os professores, fracasso escolar, dificuldades ocupacionais, além do risco mais sério para comportamentos socialmente desviantes”. Ainda de acordo com Ferreira (2002), os problemas apresentados acima podem resultar em dois tipos de padrões de comportamento classificados, segundo a autora como externalizantes (hiperatividade, agressividade, manifestações anti-sociais etc.) e internalizantes (medo, retraimento, ansiedade etc.). Este comportamento alterado costuma se manifestar nos momentos de interação com os outros colegas – no recreio, por exemplo – gerando o conflito que, se não for identificado a tempo, poderá resultar em atos de violência. Algo muito frequente no recreio e que deriva desses comportamentos apresentados acima é o bullying – ofensa física ou moral que geralmente ocorre entre os estudantes. Segundo a psicóloga Ângela Soligo, em entrevista concedida ao Portal do Professor em 2010, este tipo de agressão atinge o emocional da criança fazendo, até mesmo, com que ela diminua o interesse em ir à escola e se isole, dando espaço à depressão e a adoção de reações violentas ou condutas suicidas. A entrevistada afirma ainda que: […] na base do bullying está alguma forma de preconceito. São em geral vítimas de bullying aquelas crianças ou adolescentes que carregam alguma marca desvalorizada socialmente: negros, gordos, portadores de certas deficiências ou dificuldades, meninas em alguns contextos, muito pobres, etc. (SOLIGO, 2010). Ferreira (2002), embasada em McGee (1986) e Parreira (1995), afirma que os comportamentos externalizantes, ao mesmo tempo em que são base para as dificuldades escolares, são também amplificados por essas dificuldades.Ou seja, os problemas sociais refletem nas relações das crianças na escola, e essas relações refletirão no futuro da sociedade. Sendo assim, uma educação que se preocupa mesmo com a formação dos alunos para o exercício da cidadania, deve estar atenta à entrada desses problemas no meio escolar e, ao observá-los, deve buscar alternativas para superá-los de forma que o educando não seja prejudicado. Esta educação, somada à participação da família e à adoção de atividades externas, pode resultar em um ser humano mais preparado para os desafios da vida, 11 autônomo, responsável e que dará excelentes contribuições para a comunidade em que estiver inserido. Um cidadão autônomo busca soluções para os problemas que surgem no dia-a-dia de acordo com as condições que lhe são apresentadas. Esta autonomia pode começar já no espaço do recreio. Para Lopes: As características dos espaços de recreio condicionam os acontecimentos, se está vazio de estruturas e materiais, as crianças brincam com seus próprios corpos (lutam, correm e perseguem-se) e frequentemente inventam conflitos, se existem materiais, as suas relações são mediadas pelos materiais e as regras dos jogos, ajudando a resolver conflitos. (LOPES et al. 2006, p. 272). É fundamental a construção de uma escola que não se limite a ensinar às crianças apenas o conteúdo programático, mas que os eduque para a prática da vida em sociedade. 4. EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO NO RECREIO ESCOLAR A inquietação deve ser marca presente na personalidade do educador, pois ela promove a ação que gera experiências significativas na realidade escolar. Ao analisar as experiências de algumas escolas que adotaram a presença de educadores durante o recreio, percebe-se que uma das preocupações da gestão é que haja profissionais suficientes para atender às demandas dos alunos. Se a escola é muito grande, fica complicado dispor de tantos profissionais. Para resolver este impasse a Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Alexandre Bacchi adotou o seguinte procedimento: Dividimos o recreio em três horários. Primeiro saem da sala de aula as turmas de 1º ano, que têm 15 minutos para fazer a merenda, acompanhadas das professoras. Quando elas vão para o pátio, os 2ºs e 3ºs anos se dirigem ao refeitório. Finalmente, quando chega a hora de esses últimos irem para a área externa, os 1ºs anos voltam para a sala de aula e os 4ºs e 5ºs anos chegam para fazer a merenda. (FLAMIA, 2010/2011). De acordo com uma matéria da 11ª edição da Revista Gestão Escolar Digital, a equipe gestora desta escola do município de Guaporé no Rio Grande do Sul, após perceber uma completa falta de organização no recreio, reuniu-se com os professores e, juntos, encontraram uma solução: “escalonar o intervalo das turmas e começar a oferecer algumas atividades supervisionadas”. (FLAMIA, 2010/2011). Segundo a reportagem, a escola trabalha com inclusão. Naquele ano (2010) havia 13 alunos com deficiência que, antes da implantação do projeto, tinham pouca ou nenhuma interação com os outros colegas devido ao fato de o pátio estar sempre tumultuado. Com o escalonamento do intervalo e a presença de educadores isto mudou, já que os alunos com deficiência passaram a se sentir “mais seguros e à vontade para participar das atividades e brincar com os colegas, pois contam com o apoio dos adultos”. (FLAMIA, 2010/2011). 12 Para a diretora Joelma Flamia não foi fácil organizar o recreio desta forma, mas: [...] depois que entrou na rotina percebemos os resultados. Valeu a pena. Antes, os alunos se machucavam muito. Agora, isso é mais difícil de acontecer e, nesses casos, o atendimento é rápido. Percebemos uma melhora tanto na inclusão de todos durante o recreio como no retorno à sala de aula. Os alunos estão mais satisfeitos - e os professores também. (FLAMIA, 2010/2011). Segundo Neuenfeldt (2005) “É necessário que haja um comprometimento da instituição em acrescentar o recreio escolar como um momento educativo que deva ser contemplado no seu Projeto Político Pedagógico”. (NEUENFELDT 2005, p. 27). O autor afirma ainda que em um projeto assim a participação da comunidade é imprescindível. Citando Gaelzer (1976) ele afirma que esta autora, ao pensar no recreio ao longo do ano, sugeriu que este fosse organizado em três etapas: Na primeira, ele deve ser dirigido, os alunos vão para o pátio, juntamente com seus professores, para locais previamente destinados para praticar jogos selecionados que busquem incluir novas formas lúdicas de movimento. Na segunda, as atividades devem ocorrer em locais reservados, mas cada aluno escolhe o que gostaria de fazer. E, na terceira, o recreio seria apenas supervisionado e coordenado por um professor, mas são os alunos que devem gerenciar suas atividades. (GAELZER 1976 apud NEUENFELDT 2005, p. 41). Analisando o recreio em uma escola de Lajeado no Rio Grande do Sul a qual atribuiu o nome de “Escola B”, o autor Derli Juliano Neuenfeldt, em seu artigo "Recreio escolar: espaço para recrear ou necessidade de recriar este espaço?" (2003), propôs uma intervenção pedagógica no recreio da referida escola. Mais tarde, em 2005, o autor juntou este trabalho a outros que havia feito e transformou-os em um livro que recebeu o mesmo nome do artigo mencionado. É com base neste livro que será tratada, no presente trabalho, mais uma experiência de sucesso em que educadores intervêm no recreio. De acordo com o autor, a Escola B fica a 4 km do centro da cidade e é única em seu bairro. Atende nos níveis de Educação Infantil e Ensino Fundamental e possui cerca de 300 alunos. A análise buscava interpretar e conhecer, além do recreio, o pensamento dos colaboradores da escola. Após esta análise foi proposta a organização de um recreio orientado para o qual definiu-se uma programação semanal em que deveriam atuar três bolsistas e dois professores da escola. A escolha do recreio orientado, ao invés do recreio dirigido ou supervisionado, dá-se pelo fato de se acreditar que, segundo Gaelzer (1976), a participação no recreio orientado passa a ser mais espontânea do que dirigida, porque o aluno terá a oportunidade de escolher com quem vai brincar e o que vai praticar, sem permanecer, a rigor com o seu professor de classe. (NEUENFELDT 2005, p. 42 e 43). A dificuldade de oferecer atividades que fossem atrativas para diferentes faixas etárias foi uma das grandes preocupações na execução da proposta de Neuenfeldt, pois havia no 13 recreio alunos da educação infantil ao 5° ano. ”A partir daí pensou-se, inicialmente, em oferecer atividades diferentes e que ocorressem em locais diferentes. No entanto, não se proibiria que os maiores participassem das atividades dos menores e vice-versa”. (NEUENFELDT 2005, p. 43). Ao se questionar sobre a eficiência do projeto, Neuenfeldt chegou a duas constatações: 1. O recreio pode contribuir muito na formação dos alunos; 2. É necessária, na escola, a presença de pessoas qualificadas e interessadas em transformar o recreio em um ambiente de formação para a cidadania. Sobre a segunda constatação acima, o autor relata ao final do capítulo II de seu livro que há uma forte resistência do corpo docente em atuar neste período por considerá-lo um “momento sagrado” (grifo nosso). Neuenfeldt afirma isso com base nas observações, em que os professores apareceram poucas vezes e de forma passiva no recreio. [...] essa relação de oposição entre professor versus recreio precisa ser equacionada. De nada adianta se ter pessoas no recreio, se não há envolvimento, ou seja, apenas de corpo presente. É importante que o recreio seja visto como um momento rico de possibilidades educativase que faz parte do período educativo, não apenas como uma obrigação. (NEUENFELDT 2005, p. 61) O autor finaliza o artigo ressaltando a importância do recreio que, apesar de durar pouco, deve ser levado em consideração no ambiente escolar de modo que se torne um espaço/tempo agradável para os alunos onde eles tenham liberdade e diversidade nas suas ações. A escola não é apenas um lugar rígido com um caminho traçado que deve ser seguido à risca, mas um lugar com pessoas que têm a opção de seguir este caminho ou de buscar, nas suas inquietações, outros meios que venham a contribuir para um trabalho mais significativo que não apenas ensine, mas também eduque. 5. ANÁLISE E DISCUSSÃO Com o intuito de atingir o objetivo deste trabalho foi realizada uma pesquisa de campo em que se entrevistou a orientadora e a coordenadora da Escola Classe Clarinda Maria da Conceição. Além disso, foram analisados: O Currículo em Movimento da Educação Básica do Distrito Federal (2013) e o Projeto Político Pedagógico da escola. O Currículo em Movimento é uma nova proposta de trabalho da Secretária de Educação do Distrito Federal para as escolas de educação básica que vem sendo elaborada desde 2011. Este documento considera que o currículo na prática “diz respeito não somente a 14 saberes e competências, mas também a representações, valores, papéis, costumes, práticas compartilhadas, relações de poder, modos de participação e gestão etc.” (CURRÍCULO EM MOVIMENTO/DF 2013, P. 11). Ao analisar o Currículo percebe-se que ele não trata especificamente do recreio, mas diz – baseado na pedagogia histórico crítica – que a formação de valores deve estar contida nas ações da escola como mais um fator que contribui para o desenvolvimento integral do aluno. Para Neuenfeldt (2005) sendo o recreio uns dos momentos de maior interação entre as crianças, em que estas demonstram suas reais características no relacionamento com os outros, é também um dos melhores momentos para observação e intervenção do educador nessas relações, induzindo à prática de valores. Esta é uma ação que não pode ser negligenciada. [...] quando o professor assume uma postura de não interferência na prática social dos estudantes, reforça a realidade social marcadamente desigual e excludente, contribuindo para sua manutenção. Por isso, a seleção dos conteúdos no contexto escolar não deve referenciar-se em qualquer conhecimento, mas naqueles que possibilitem a constituição de uma nova postura mental dos educandos, preparando - os para o confronto de forma crítica dos problemas sociais que fazem parte de seu cotidiano. (CURRICULO EM MOVIMENTO/DF 2013, p. 21 e 22). Um dos grandes problemas sociais na atualidade é a violência. E, segundo Szadkoski (2010), esta se faz presente na vida dos alunos e, consequentemente, na escola; sendo influenciada em grande parte pelos meios de comunicação: Pesquisas atuais apontam para a influência dos meios de comunicação de massa incentivando o consumismo e a adoção de valores materiais imediatistas, assim como a não aceitação da disciplina. Os desenhos mostram alto índice de agressividade entre crianças, adolescentes e adultos que dele fazem parte, os programas infantis ensinam atitudes de insurreição contra o comportamento adotado pelos pais para a educação, os filmes mostram adolescentes a mercê das drogas e da violência, sem falar das novelas que ridicularizam o papel do professor frente a toda sociedade, bem como zombam de toda estrutura familiar que contenha respeito dos valores e a ética. (SZADKOSKI 2010, p. 46) Uma escola que adota o desenvolvimento de valores éticos como o respeito, a tolerância, a cidadania, o zelo, o senso de justiça e a responsabilidade, por exemplo, tornará o aluno mais crítico em relação a estas influências. Neste sentido o Projeto Político Pedagógico da Escola Classe Clarinda Maria da Conceição está de acordo com o Currículo, pelo menos no papel, pois relata que a instituição tem como missão: [...] assegurar um ensino de qualidade aos alunos tendo por base o desenvolvimento humano de forma global e harmônica respeitando as individualidades. Garantir o acesso e permanência dos alunos na escola. Contribuindo com a formação de cidadãos críticos e conscientes para os desafios do mundo moderno. (PPP/EC CLARINDA MARIA DA CONCEIÇÃO 2013, p. 19) 15 Este desenvolvimento global deve levar em consideração, como já foi visto neste artigo, não apenas o trabalho desenvolvido em sala de aula, mas também as experiências vividas pelos alunos em outros espaços. E uma das estratégias propostas no PPP da escola é a adoção do “Recreio dirigido (músicas/brincadeiras), sob a supervisão dos professores, com atividades previamente estabelecidas”. (PPP/EC CLARINDA MARIA DA CONCEIÇÃO 2013, p. 23). Mas, observando o recreio na instituição, percebe-se que esta prática não é adotada, visto que, principalmente no turno vespertino, os alunos ficam sozinhos a maior parte do tempo. Questionadas sobre isto em entrevistas realizadas nos dias 06 e 07 de novembro de 2013, a orientadora e a coordenadora da escola foram unânimes em dizer que, apesar de constar no PPP da escola, o recreio dirigido não acontece. “[...] é colocado, mas é como eu venho falando: muitas vezes fica no papel e não se consegue colocar em prática como deveria e aí fica muito jogado”. (ORIENTADORAENTREVISTADA EM 07/11/2013). “[...] está no PPP o recreio dirigido, nós não temos é quem participar deste recreio”. (COORDENADORA ENTREVISTADA EM 06/11/2013). A orientadora relatou também que a direção da escola tentou implantar o recreio dirigido com a participação dos professores em horário de coordenação dando a estes (que participassem) a oportunidade de saírem para casa com meia hora de antecedência. “Mas alguns professores alegaram que preferem não ajudar no recreio e não ter essa saída antecipada”. (ORIENTADORA ENTREVISTADA EM 07/11/2013). Reforça-se aqui a afirmação de Neuenfeldt (2005) citada no capítulo anterior em que o autor fala sobre a necessidade de superar essa relação de oposição entre o professor e o recreio. Quanto a isto a coordenadora ressaltou que é importante que haja um comprometimento por parte do profissional que for atuar no recreio. Que este não fique de forma passiva, mas que aja sabendo que o recreio é um espaço/tempo muito importante, onde o lúdico pode ser explorado de forma que contribua no desenvolvimento dos alunos. É do lúdico que saem vários conceitos, é do lúdico que saem várias respostas, é do lúdico que saem novas ideias [...] até a sua decisão profissional sai do lúdico, por que é ali naquele prazer do momento que você descobre se você deseja ser médico, se você deseja ser arquiteto, se você deseja ser desenhista. (COORDENADORA ENTREVISTADA EM 06/11/2013). A entrevistada falou também de uma ideia que já tentaram implantar na escola no início dos anos 2000: o recreio monitorado pelos alunos maiores. Ela disse que chegaram até a confeccionar jalecos para que estes alunos usassem no recreio. Nesta época observaram que, por não ter profissionais para supervisionarem os alunos maiores, estes se acharam com 16 autoridade suficiente para colocar de castigo, levar para a direção etc. E esta autoridade não foi reconhecida pelos menores, o que acabava gerando brigas. Acabou tendo desavenças porque os menores viam o coleguinha deles, não como uma pessoa com autoridade pra isso, mas simplesmente como um colega mesmo. Então acabavam agredindo, acabavam trocando palavras, assim, bem fortes. Não conseguiam respeitar o colega como “o monitor”, por quê? Porque tinha que ter um educador do lado monitorando..(COORDENADORA ENTREVISTADA EM 06/11/2013). As entrevistadas relataram, ainda, que várias sugestões foram adotadas para um melhor recreio na escola, como a distribuição de brinquedos (bolas, cordas, jogos etc.) e a colocação de bancos de madeira com tabuleiros de damas e trilhas. Mas, segundo a coordenadora, “nunca dá certo, porque não há mesmo a presença constante de educadores. Eles até aparecem no começo, mas com o tempo somem, voltam pra sala dos professores, e, quando se percebe, as crianças já estão sozinhas novamente”. (ENTREVISTA EM 06/11/2013). 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve como objetivo, investigar o recreio em uma escola do Distrito Federal e o que pode ser feito para que o educador atue neste período de maneira que venha a contribuir para a formação de valores nos alunos. O papel da escola e do professor é mais difícil hoje, porque a sociedade caminha acentuadamente para o individualismo, que vive uma profunda crise de valores e a escola não pode se furtar de dividir conhecimentos sobre convivência, cooperação, solidariedade, generosidade, complacência, amizade, respeito mútuo e valorização do outro. E não há didática para ensinar valores: o aprendizado se dá na forma como o professor se mostra e na sua postura. (SZADKOSKI 2010, p. 47) Para apoiar o trabalho foram trazidas algumas questões relevantes: como o contexto histórico e legal do recreio nas escolas do Distrito Federal, as questões sociais presentes no recreio e algumas experiências de sucesso em que escolas adotaram a presença de educadores neste espaço/tempo. A Escola Classe Clarinda Maria da Conceição foi escolhida para a pesquisa por verificar-se, após observações em seu horário de recreio, que não há nenhum trabalho voltado para este espaço/tempo. Assim os alunos ficam, na maioria das vezes, sem a presença de um educador mediando suas relações. O que dá margem aos conflitos que provêm, principalmente, da falta de respeito entre os alunos. Ao analisar o Projeto Político Pedagógico da Escola, percebeu-se que este não condiz com sua realidade, pois se fundamenta, entre outros documentos, no Currículo da Educação Básica do Distrito Federal que traz em seu texto a compreensão de que: 17 [...] não se faz uma educação de qualidade sem uma educação cidadã, uma educação que valorize a diversidade, é imprescindível. Faz-se necessário contextualizar o currículo e construir uma cultura de abertura ao novo, que absorva e reconheça a importância da afirmação da identidade, levando em conta os valores culturais dos estudantes e seus familiares, resgatando e construindo o respeito aos valores positivos que emergem do confronto das diferenças. (CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA/DF 2010, p. 10). Estas questões foram levadas à orientadora e à coordenadora da escola, que confirmaram que apesar de constar no PPP da escola um trabalho voltado para o recreio com a presença de educadores, este não acontece. As entrevistadas atribuem a isso, a falta de interesse dos professores, visto que já tentaram implantar o projeto várias vezes, mas a ausência dos profissionais impede que este se desenvolva. A conclusão a que chegamos com o presente artigo é que a Escola Classe Clarinda Maria da Conceição tem dado pouca importância ao recreio, apesar de adotar, em seu Projeto Político Pedagógico, uma educação cidadã que busca resgatar o respeito aos valores. Concluímos também, baseados nas experiências apresentadas no texto e na fala das profissionais entrevistadas, que a presença de educadores no recreio da referida escola contribuiria para que, de fato, a instituição cumprisse o que está escrito em seu Projeto Político Pedagógico. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica. Parecer CNE/CEB Nº 02. Recreio como atividade escolar. Brasília, 19 Fev. 2003. BRASIL. Ministério da Educação. 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