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Disciplina de genética básica para o curso de Zootecnia Extensões à análise mendeliana Introdução Mendel estabeleceu, em 1865, os princípios básicos da hereditariedade, o que posteriormente resultou na primeira e segunda Leis de Mendel. Segundo as regras mendelianas clássicas, cada caráter seria governado por um gene e cada gene teria dois alelos, um de efeito dominante e o outro recessivo. Na geração F2, isso resultaria em uma proporção fenotípica clássica de 3:1. Por outro lado, se dois caracteres mendelianos fossem analisados em conjunto, na F2 isso resultaria em uma proporção fenotípica de (3:1)(3:1) = (9:3:3:1). Ao longo do tempo, novos estudos, espécies e caracteres foram sendo analisados, mostrando que as proporções mendelianas clássicas, bem como a forma de interação dominante/recessiva, poderiam não ser totalmente universais. Dessa forma, o termo extensão à genética mendeliana se refere aos padrões de herança que complementam aqueles que foram descobertos por Gergor Mendel. Neste grupo, normalmente são estudados: Os padrões de dominância incompleta, codominância e sobredominância; Os genes letais; O alelismo múltiplo; Os padrões de interação gênica (com ou sem epistasia) A ligação gênica. A - Interação alélica Neste caso, o enfoque é a forma como os diferentes alelos de um mesmo gene interagem entre si para produzirem os fenótipos dos indivíduos. De acordo com o tipo de interação, isso resulta em proporções fenotípicas diferentes na prole dos indivíduos. I - Dominância completa: Mendel descreveu em seus experimentos uma relação de dominância completa para todos os pares de genes que ele estudou em ervilhas. Assim, na geração F1 o efeito do alelo recessivo era mascarado pela presença do alelo dominante nos heterozigotos. E, na F2, o caráter recessivo ressurgia na frequência de 1/4. Esse tipo de interação gênica é conhecido por dominância completa e já foi analisado anteriormente. II - Dominância incompleta: Nas flores de maravilha (Mirabilis jalapa), quando uma linhagem pura de pétalas vermelhas é cruzada com uma linhagem pura de pétalas brancas, a F1 não apresenta nem pétalas vermelhas nem brancas, mas sim rosadas. E, se uma geração F2 for produzida por autofecundação da geração F1, o resultado será: Fenótipo da F2 Genótipo ¼ com pétalas vermelhas ½ com pétalas rosadas ¼ com pétalas brancas C¹C¹ C¹C² C²C² A ocorrência de um fenótipo intermediário no indivíduo heterozigoto, como a cor rosa na planta maravilha, introduz a possibilidade da existência de uma dominância incompleta. Quer dizer, apenas uma cópia do alelo para a cor vermelha (C¹) no heterozigoto não é capaz de produzir a mesma intensidade de coloração observada nos indivíduos homozigotos para as duas cópias deste mesmo alelo. III - Codominância: O fenótipo diferenciado no heterozigoto é também a chave de um outro fenômeno chamado codominância, só que, neste caso, o heterozigoto manifesta os fenótipos dos dois homozigotos. Assim, num certo sentido, a codominância é a falta total de dominância entre os alelos (já que ambos se expressam quando em heterozigose) e, por isso ela também é frequentemente referida como ausência de dominância. Um bom exemplo disso é encontrado na cor da pelagem do gado da raça Shorthorn. Estes animais podem ter pelagem vermelha (R¹R¹), branca (R²R²) ou ruão (R¹R²). Acontece que a cor ruão surge da mistura de pelos vermelhos e brancos produzidos em um mesmo animal. IV - Sobredominância: Também é possível que o heterozigoto produza um fenótipo que ultrapasse ambos os progenitores, fenômeno este conhecido como sobredominância. Esse tipo de efeito genético é bastante explorado naquelas situações onde os híbridos produzidos a partir do cruzamento entre linhagens ou raças diferentes se mostram muito mais resistentes e/ou produtivos que as linhagens parentais que lhes deram origem. A Figura abaixo procura explicar de uma maneira simplificada como interpretar esses diferentes tipos de interações alélicas: Conforme podemos percerber no esquema, quando temos dominância completa, indivíduos AA e Aa produzirão a mesma quantidade de pigmento vermelho, sendo fenotipicamente iguais; por outro lado, os indivíduos aa não produzirão nada (por exemplo, pelo fato da enzima codificada pelo alelo a não ser funcional), permanecendo brancos. Na dominância incompleta, o homozigoto BB produzá a quantidade máxima do pigmento marrom, o heterozigoto Bb produzirá uma quantidade intermediária deste pigmento (e por isso terá uma cor mais clara), e o indivíduo bb não produzirá nada (novamente, a enzima codificada pelo alelo b pode não funcionar adequadamente, por isso nenhum pigmento é produzido). Na codominância, os dois alelos condicionam uma enzima funcional, mas que produzem duas substâncias diferentes entre si; ou seja a enzima codificada pelo alelo C¹ pega um substrato e o transforma em um pigmento verde; e a enzima codificada pelo o alelo C², pega esse mesmo substrato e o transforma em um pigmento azul. Assim, o heterozigoto, por codificar as duas enzimas produzirá os dois pigmentos. Por fim, na sobredominância, os heterozigotos (D¹D²) produzirá muito mais da substância laranja que cada um dos homozigotos. Neste caso, podemos explicar essa forma de interação imaginando que a enzima codificada pelo alelo D¹ é mais ativa em determinadas condições fisiológicas e a enzima codificada pelos alelo D² funciona melhor em outras condições. Portanto, o heterozigoto, que produz as duas formas enzimáticas conseguirá produzir uma quantidade elevada de pigmento pelo fato de ter sempre uma de suas duas enzimas em funcionamento pleno. Diferenciando os locos com diferentes formas de interação alélica: Para diferenciar a interação alélica do tipo dominante/recessiva das outras formas de interação, os geneticistas convencionaram representar os alelos dominantes por letras maiúsculas (ou pelo símbolo do gene seguido do sinal “+”) e os recessivos por letras minúsculas (ou pelo símbolo do gene seguido do sinal “-”), conforme exemplificado abaixo: Homozigoto dominante (CC ou +/+) Heterozigoto dominante (Cc ou +/-) Homozigoto recessivo (cc ou -/-) Nas outras formas de interação, usa-se o símbolo do gene seguido de uma letra ou numeral: Homozigoto tipo 1 (A¹A¹) Heterozigoto (A¹A²) Homozigoto tipo 2 (A²A²) Exercício 1 - Trabalhando a segunda lei de Mendel para caracteres de herança do tipo dominância incompleta: As flores de boca-de-leão podem ser vermelhas, rosas, ou brancas. Já, as suas folhas podem ser estreitas, largas ou intermediárias. Do cruzamento entre plantas vermelhas e largas com plantas brancas e estreitas, para cada 160 plantas nascidas na F2 são esperadas: 20 brancas e intermediárias, 10 vermelhas e largas, 20 rosas e estreitas, 10 vermelhas e estreitas, 20 rosas e largas, 40 rosas e intermediárias, 10 brancas e largas, 20 vermelhas e intermediárias e 10 brancas e estreitas. Quantos genes devem estar envolvidos no controle desses caracteres? Para sabermos a resposta devemos organizar os resultados da geração F2: Brancas e intermediárias: 20 Vermelhas e largas: 10 Rosas e estreitas: 20 Vermelhas e estreitas: 10 Rosas e largas: 20 Rosas e intermediárias: 40 Brancas e largas: 10 Vermelhas e intermediárias: 20 Brancas e estreitas: 10 Total: 160 plantas Sabemos que são dois caracteres segregando nessas plantas: Cor das flores: brancas, vermelhas e rosas. Tamanho das flores: largas, intermediárias e estreitas. Em primeiro lugar, vamos analisar cada caráter individualmente: Cor vermelha: 10 + 10 + 20 = 40/160 (= 1/4) Cor rosa: 20 + 20 + 40 = 80/160 (= 2/4) Cor branca: 20 + 10 + 10 = 40/160 (= 1/4) Total: 160 Folhas largas: 10 + 20 + 10 = 40/160 (= 1/4) Folhas intermediárias: 20 + 40 + 20 = 80/160 (= 2/4) Folhas estreitas:20 + 10 + 10 = 40/160 (= 1/4) Total: 160 Fazendo isso, podemos perceber um padrão de 1:2:1 para cada um desses caracteres. Portanto, é possível sugerir que a cor da flor da boca de leão seja governada por um loco com dois alelos (Ex: B e b) e, a largura das folhas por um outro loco, também com dois alelos (Ex: E e e). Considerando que esses dois caracteres segregam independentemente, de acordo com a segunda lei de Mendel, então teríamos: (1/4 vermelha : 2/4 rosas : 1/4 branca) x (1/4 larga : 2/4 intermediárias : 1/4 estreita) = (1/16 vermelha larga) : (2/16 vermelhas intermediárias) : (1/16 vermelha estreita) : (2/16 rosas largas) : 4/16 (rosas intermediárias) : (2/16 rosas estreitas) : (1/16 branca larga) : (2/16 brancas intermediárias) : (1/16 branca estreita) Comparando as previsões com os dados originais ajustados para o total de indivíduos obtidos (160), vemos que eles são idênticos: Brancas e intermediárias: 20/160 = 2/16 Vermelhas e largas: 10/160 = 1/16 Rosas e estreitas: 20/160 = 2/16 Vermelhas e estreitas: 10/160 = 1/16 Rosas e largas: 20/160 = 2/16 Rosas e intermediárias: 40/160 = 4/16 Brancas e largas: 10/160 = 1/16 Vermelhas e intermediárias: 20/160 = 2/16 Brancas e estreitas: 10/160 = 1/16 Que tipo de interação alélica explica o mecanismo de herança desses dois caracteres? Esse padrão fenotípico de 1:2:1 na geração F2 indica que não se trata de herança do tipo dominante/recessiva. Nesse tipo de situação seriam esperados apenas dois fenótipos na proporção de 3:1. Também não se trata de herança codominante, pois nesse caso, os heterozigotos deveriam expressar os fenótipos de ambos progenitores (como no clássico exemplo do tipo sanguíneo AB em humanos ou na cor ruão do gado da raça Shorthorn). Por sua vez, esse exemplo se encaixa no padrão de herança conhecido como dominância incompleta. Ou seja, uma única cópia do alelo para a cor vermelha no indivíduo heterozigoto (Bb) não consegue levar a produção da mesma quantidade de pigmentos que a encontrada nos indivíduos homozigotos (BB). Esse mesmo raciocínio vale para o tamanho das folhas. Portanto, teríamos os seguintes genótipos para esses diferentes fenótipos: Caráter cor das flores: Caráter formato das folhas: Vermelha (BB) Rosa (Bb) Branca (bb) Largas (EE) Intermediárias (Ee) Estreitas (ee) - Quais dessas classes fenotípicas poderíamos reconhecer como homozigotas nessa F2? Indívudos de cor rosa (Bb) e/ou de folhas intermediárias (Ee) não se encaixam nessa situação. Sendo assim, os homozigotos para ambos os caracteres serão aqueles marcados em vermelho: Brancas e intermediárias (bbEe) Vermelhas e largas (BBEE) Rosas e estreitas (Bbee) Vermelhas e estreitas (BBee) Rosas e largas (BbEE) Rosas e intermediárias (BbEe) Brancas e largas (bbEE) Vermelhas e intermediárias (BBEe) Brancas e estreitas (bbee) Exercício 2 - Identificando homozigotos e heterozigotos nos diferentes tipos de interação alélica: Na ovelha, a cor da gordura e o tamanho da orelha são características governadas por dois genes diferentes que segregam independentemente. O gene para a cor da gordura possui um alelo dominante que determina gordura branca (A) e um outro recessivo que determina gordura amarela (a). Animais de gordura amarela são pouco aceitos pelos consumidores. Quanto ao tamanho da orelha, indivíduos O¹O¹ têm orelhas normais, indivíduos O¹O² têm orelhas curtas e indivíduos O²O² nascem sem orelhas. A presença dessa última característica também não é conveniente em animais de criação, pois ela aumenta o risco de infecção de ouvido nesses animais. Qual dessas duas características indesejáveis poderia ser mais facilmente eliminada de um rebanho? Por que? O loco para a cor da gordura possui dois alelos, um dominante (A = gordura branca) e o outro recessivo (a = gordura amarela). Se o caráter mais aceito pelo consumidor fosse gordura amarela, seria fácil obter uma linhagem homozigótica para essa cor de gordura, pois bastaria selecionar e cruzar machos e fêmeas de genótipo aa. O problema é que o público prefere animais de gordura branca! Numa população em que os dois alelos ocorrem, encontraremos animais de gordura branca homozigotos (AA) e heterozigotos (Aa). Acontece que não conseguiremos diferenciar o homozigoto do heterozigoto apenas olhando para eles ou para sua gordura. Sendo assim, por puro acaso, dois animais Aa do rebanho podem se acasalar e, quando isso ocorrer, teremos uma probabilidade de 25% de surgimento de filhotes de gordura amarela (aa). Ou seja, para podermos ter certeza que estamos escolhendo apenas os animais homozigotos, precisaremos realizar alguns cruzamentos, ou analisar a sua genealogia. Quanto ao formato da orelha, por ser possível distinguir homozigotos de heterozigotos, é mais simples a obtenção de uma linhagem pura tanto para o caráter orelhas normais (O¹O¹), como sem orelhas (O²O²). Basta separarmos os animais com orelhas normais e cruzá-los entre si (O¹O¹ x O¹O¹), ou fazer o mesmo para os animais sem orelhas (O²O² x O²O²). Ou seja, de pronto podemos eliminar do rebanho os indivíduos heterozigotos (O¹O²), que serão todos os animais com orelhas curtas! Em um rebanho no qual todos as combinações fenotípicas possíveis para essas duas características ocorrem, como você estabeleceria uma linhagem pura para gordura branca e orelhas normais? Com relação a cor da gordura, a situação é mais difícil, pois não sabemos qual animal de gordura branca será homozigoto ou heterozigoto. Assim podemos recorrer ao cruzamento teste para obtermos uma linhagem pura para esse caráter. Neste caso, pegamos animais de gordura branca (A_) e os acasalamos com animais de gordura amarela (aa). Se surgirem descendentes de gordura amarela (o que é esperado em 50% da descendência de um acasamento do tipo Aa x aa), saberemos que os progenitores de gordura branca são heterozigotos. Portanto, descartamos eles dos futuros acasalamentos, evitando assim que o alelo a se propague pelas próximas gerações. Quanto ao formato da orelha, a situação é mais simples, basta impedir que os animais sem orelha (O²O²) e/ou com orelhas curtas (O¹O²) se acasalem. Seria possível estabelecer uma linhagem pura para ovelhas de orelhas curtas? Se não, que cruzamento você sugeriria para obter o maior número possível de indivíduos desse tipo? Não é possível obter uma linhagem pura (ou seja, homozigótica) para orelhas curtas pelo fato desse caráter, cuja interação alélica é do tipo dominância imcompleta, aparecer apenas nos híbridos ou heterozigotos (O¹O²). A única maneira de se conseguir uma grande quantidade de animais com orelhas curtas é mantendo duas linhagens distintas, sendo uma composta por animais de orelha normal (O¹O¹) e outra de animais sem orelha (O²O²). Quando quisermos obter uma grande quantidade de animais de orelhas curtas, basta cruzar essas duas linhagens entre si, que teremos 100% de descendentes com esse caráter. B - Genes letais Algumas mutações que afetam os genes podem produzir alelos que resultam em modificações significativas em seu funcionamento. Quem herda tais alelos mutantes podem apresentar uma ou mais vias metabólicas importantes não completadas, resultando em sua morte. Tais variantes alélicas são chamadas de genes letais. Os genes letais comumente têm efeito dominantes ou recessivos: Um gene letal de efeito dominante jamais será passado para a próxima geração, uma vez que quem o herda morrerá antes ou logo após o nascimento. Assim, qualquer gene letal dominante deve surgir por mutação em um dos gametas de um indivíduo normal, desaparecendo da população logo em seguida. Por outro lado, os genes letais recessivos podem ficar mascarados nos indivíduos heterozigotos, podendo então ser passados para a próxima geração. Assim, um indivíduo normal portadorde um alelo letal recessivo, quando se acasalar com outro indivíduo de mesmo genótipo produzirá uma prole com um padrão de segregação genotípica de 1:2:0, ao invés de 1:2:1. E o padrão de segregação fenotípica será alterado de 3:1 para 3:0. A Figura abaixo exibe um exemplo de gene letal em camundongos, que também afeta a coloração da sua pelagem: Nestes animais, o gene K/k está envolvido em duas vias metabólicas diferentes, uma delas relacionada com a coloração da pelagem e uma outra com o desenvolvimento embrionário: Com relação a coloração, o alelo que determina a cor amarela é dominante sobre a aguti. Quanto a sobrevivência ou morte, esses mesmos alelos possuem um efeito contrário: dominante para a sobrevivência e recessivo para a letalidade. Portanto, vemos pelo esquema que não é possível obter uma linhagem pura de camundongos de coloração amarela (KK), tendo em vista que eles morrem durante o desenvolvimento embrionário. Mas qual seria a importância de se identificar locos que apresentam alelos com efeito letal? Isso é importante pelo fato deles poderem, dentre outras coisas, diminuir a fertilidade de seus portadores. Portanto, é fundamental a identificação dos animais normais que carregam esse tipo de alelo para a sua completa eliminação dos acasalamentos futuros. Assim, evita-se que esse alelo seja transmitido para as próximas gerações. Como um mesmo loco pode influenciar duas características tão diferentes? Neste exemplo, vimos que o loco K apresenta dois efeitos distintos, um sobre a coloração e outro sobre o desenvolvimento do camundongo. Genes que controlam mais de uma características são chamados de pleiotrópicos (do grego pleiotropo = mudança). Pleiotropia se refere aos múltiplos efeitos que um gene pode apresentar sobre o fenótipo de um organismo. Assim, um gene pleiotrópico é aquele que controla diferentes características fenotípicas e que não estão necessariamente correlacionadas. Por exemplo, no esquema abaixo, o loco B codifica uma enzima cujo substrato é usado por duas vias metabólicas diferentes, uma delas conduzida pelo loco C e a outra pelo loco D: Portanto, mutações no loco B podem influenciar tanto o caminho metabólico II como o III. Exercício - analisando um caráter de herança letal recessiva: Em um rancho de criação de raposas em Wisconsin, EUA, surgiu um indivíduo mutante com uma pelagem com tom "platina". Essa cor se tornou muito popular entre compradores de peles de raposa. Entretanto, os criadores nunca puderam desenvolver uma linhagem pura com pelagem platina. Por exemplo, cruzamentos repetidos de um mesmo casal de raposas platinas resultou em 82 filhotes platinas e 38 normais. Estabeleça uma hipótese para explicar esses resultados. O fato de nunca se ter conseguido obter uma linhagem pura (ou seja, homozigótica) para a pelagem platina nos dá uma pista de que o alelo que produz essa cor poder ter algum efeito negativo na sobrevivência dos animais quando em homozigose. Isso fica ainda mais evidente no resultado do cruzamento entre animais platinas. Em primeiro lugar, como eles produzem filhotes platinas e normais, eles só podem ser heterozigotos para a cor da pelagem (Nn x Nn) e, como a pelagem normal surge a partir do acasalamento entre dois animais platina, a pelagem normal muito provavelmente é recessiva. Em segundo lugar, do total de filhotes produzidos [82 platinas (N_) + 38 normais (nn) = 120], se utilizamos as regras de segregação na geração F2 para a primeira lei de Mendel (3:1), então teremos 120/4 = 30. Dessa forma, esperaríamos 1 x 30 raposas normais (nn) e 3 x 30 rapozas platinas (N_) na geração F2. Acontece que foram obtidas 38 normais e 82 platinas. Ou seja, estão sobrando animais normais e faltando animais platina. Se considerarmos que o alelo N em homozigose é letal e que todos os animais platina homozigotos (NN) morrem durante o desenvolvimento embrionário, então os 120 animais que nasceram representam apenas 3/4 dos animais originalmente concebidos. Usando a regra de 3 teremos: 120 ------ 3/4 ou 75% x ------ 4/4 ou 100% x = (120 x 100) / 75 = 160 Assim, para as 120 raposas nascidas, 160 devem ter sido concebidas. Recalculando: 1/4 ou 25% seriam homozigotas platina (NN) que morreram durante a gestação: (25 x 160) / 100 = 40 2/4 ou 50% seriam heterozigotas platina (Nn) que nasceram: (50 x 160) / 100 = 80 1/4 ou 25% seriam homozigotas normais (nn) que nasceram: (25 x 160) / 100 = 40 Podemos notar que esses resultados são muito mais próximos daqueles encontrados nesse experimento (82 filhotes platinas e 38 normais). C - Polialelismo Em uma população selvagem de animais e de plantas é comum encontrarmos mais do que dois alelos para um determinado loco. É graças a essa diversidade genética que, ao longo do tempo, o homem conseguiu desenvolver as diferentes raças, variedades, linhagens etc, utilizadas na agropecuária. E, pelo fato desses organismos melhorados ainda possuírem muitos alelos diferentes para uma série de características é que o melhoramento genético continua sendo possível de acontecer. Os vários alelos de um determinado gene podem exibir diferentes formas de interação, alguns se comportando de forma dominante, outros de forma recessiva, outros exibindo um padrão codominante, e assim por diante. Um exemplo clássico envolvendo alelismo múltiplo é a autoincompatibilidade (AI) encontrada em diferentes espécies de plantas, onde, dependendo da espécie, é possível se encontrar dezenas de alelos distintos envolvidos neste processo: A AI se refere a incapacidade de uma planta fértil formar sementes quando fertilizada por seu próprio pólen. Este é um mecanismo fisiológico com base genética que promove a alogamia - o cruzamento entre indivíduos não aparentados. A AI tem despertado a atenção de melhoristas de plantas devido ao fato deste processo influenciar a produção agrícola em espécies de interesse econômico como Nicotiana sp (tabaco), Brassica sp (couve, nabo, mostarda, colza etc), Medicago sp (alfafa), Trifolium sp (trevo), Secale sp (centeio), Helianthus sp (girassol), Theobroma sp (cacau), dentre outras. A reação de AI engloba desde o impedimento da germinação do pólen até o rompimento do tubo polínico. Isso ocorre quando o estigma/pistilo e o pólen nele depositado expressam a mesma variante protéica de autoincompatibilidade. Atualmente, a ênfase nas pesquisas está na identificação e no entendimento dos processos moleculares e celulares que levam ao reconhecimento e a rejeição do pólen autoincompatível, incluindo a caracterização, localização e sequenciamento das proteínas, enzimas e genes envolvidos neste processo. Modificado de: SCHIFINO-WITTMANN MT, DALLÁGNOL M. Autoincompatibilidade em plantas. Ciência Rural, Santa Maria, 32:1083-1090, 2002. Existe dois tipos principais de AI, conhecidos como gametofítica (AIG) e esporofítica (AIE), exemplificadas na figura abaixo: Na AIG, o grão de pólen (gametófito) expressará a variante protéica determinada pelo alelo que este carrega. Já, a planta expressará as variantes protéicas dos dois alelos que esta possui. Ou seja, na AIG os genes envolvidos normalmente apresentam um comportamento do tipo codominante. Na AIE, a expressão da variante protéica de autoincompatibilidade tanto no pólen quanto na planta adulta (esporófito) é determinada pelo genótipo da planta, sendo normalmente encontrado, neste caso, um padrão de herança do tipo dominante/recessivo entre os vários alelos (S¹S² > S³...). Exemplificando: Determine os tipos de descendentes que poderão ser formados a partir dos cruzamentos abaixo em uma espécie que apresente incompatibilidade gametofítica e em uma outra que tenha incompatibilidade esporofítica: Situação I - Planta (S1S3) x Planta (S1S5): Plantas S1S3 produzirão 50% de gametas (S1) e 50% de gametas (S3); Plantas S1S5 produzirão50% de gametas (S1) e 50% de gametas (S5). Na incompatibilidade gametofítica, o mecanismo de interação alélica encontrado é o do tipo codominante: Assim, as plantas (2n) expressarão os dois alelos que elas venham a possuir e os grãos de pólen (n), o alelo que eles carregam. Logo, neste cruzamento, apenas os grãos de pólen (S³) da planta 1 fecundarão os óvulos da planta 2, originando 50% de descendentes S¹S³ e 50% S¹S5. Por outro lado, apenas os grãos de pólen (S5) da planta 2 fecundarão os óvulos da planta 1, originando 50% de descendentes S¹S5 e 50% S³S5. Na incompatibilidade esporofítica, o mecanismo de interação alélica encontrado é o de dominância completa, que condicionado pelo genótipo da planta (2n): Desse modo, as plantas heterozigotas expressarão apenas o alelo dominante, o mesmo acontecendo com os seus grãos de pólen. Assim, embora a planta 1 produza 50% de grãos de pólen (S¹) e 50% (S³), todos eles expressarão em sua superfície a proteína S¹, que é idêntica à proteína S¹ expressa pela planta 2. Logo, nenhum grão de pólen da planta 1 fecundará os óvulos da planta 2. E vice-versa. Situação II - Planta (S²S³) x Planta (S³S4): Plantas S²S³ produzirão 50% de gametas (S²) e 50% de gametas (S³); Plantas S³S4 produzirão 50% de gametas (S³) e 50% de gametas (S4). Considerando o mecanismo de incompatibilidade gametofítica: Apenas os grãos de pólen (S²) da planta 1 fecundarão os óvulos da planta 2, originando 50% de descendentes S²S³ e 50% S²S4. E os grãos de pólen (S4) da planta 2 fecundarão os óvulos da planta 1, originando 50% de descendentes S²S4 e 50% S³S4. Na incompatibilidade esporofítica, teremos: O alelo que é dominante na planta 1 (S²) é diferente do que é dominante na planta 2 (S³), portanto, todos os grãos de pólen de ambas as plantas serão interférteis, originando os seguintes tipos de descendentes: Grãos de pólen da planta 1 fecundando os óvulos da planta 2 originarão aos seguintes genótipos: 25% S²S³, 25% S²S4, 25% S³S³ e 25% S³S4. Grãos de pólen da planta 2 fecundando os óvulos da planta 1 também originarão os mesmos genótipos: 25% S²S³, 25% S²S4, 25% S³S³ e 25% S³S4.
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