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VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica INVESTIGAÇÃO SOBRE O ESCOAMENTO GRAVITACIONAL DE SÓLIDOS NA DESCARGA DE SILOS Monteiro, M. H.1 e Ferreira, M. C.2* 1- Aluno de IC - DEQ/UFSCar 2- Orientador – DEQ/UFSCar – C.P. 676 – 13.565-905 – São Carlos - SP e-mail: mariaf@power.ufscar.br RESUMO – Este trabalho visa investigar experimentalmente o escoamento gravitacional de sólidos em silos, e verificar a influência do ângulo de inclinação da base do reservatório na vazão de descarga de esferas de vidro e partículas de areia com diferentes diâmetros. Os dados experimentais foram obtidos em um reservatório de secção quadrada, com dimensão lateral de 14 cm e 66,5 cm de altura total, com bases intercambiáveis, com ângulos de inclinação iguais a 53, 60 e 74o. Os resultados indicaram que, em geral a vazão de descarga tende a aumentar com o aumento do ângulo de inclinação e a diminuir com o aumento do diâmetro médio das partículas. Uma exceção foi observada para as esferas de vidro de menor diâmetro (dp=0,273 mm), que apresentaram vazões de descarga menores do que as de dp=0,780 mm. INTRODUÇÃO Silos são construções para armaze- nar e escoar qualquer tipo de material sóli- do particulado, sendo utilizados em fazen- das, indústrias, (químicas, da construção ci- vil, de alimentação, de mineração, siderúr- gicas), portos, etc. Neles são armazenados compostos ou substâncias como cereais, sementes e produtos químicos. Podem ser classificados pelo tipo de categoria, como silos agrícolas (de granja, portuários) e silos industriais (Fortes Fo, 1985), e construídos de materiais variados, como concreto, ma- deira, alvenaria ou metal. Os sólidos necessitam de um grande volume para armazenamento, até maior, proporcionalmente, do que os fluidos, devido ao tipo de compactação, formato e densidade. Normalmente, em indústrias são entregues enormes carregamentos de sólidos, que são suficientes para o funcionamento sem interrupção do processo durante dias, semanas e até meses. Raramente o escoamento de materiais na indústria é uniforme, sendo necessário se ter um armazenamento, mesmo em operações contínuas. Gomide (1983) menciona que tanques, depósitos ou silos são normalmente usados para a armazenagem de produtos, e funcionam como “pulmões” normalizadores de vazão entre as diferentes unidades do processo. Em muitos casos, o ponto de descarga do material armazenado é crítico na operação de processos, porque o escoamento pode ser afetado por variações da vazão, umidade, densidade, diâmetro das partículas e diâmetro de abertura na descarga do silo. Escoamentos não uniformes podem prejudicar a operação de equipamentos como reatores, separadores gás-sólido, etc. Segundo Perry (1980), o escoamento de material particulado na base de um silo pode ocorrer de duas formas: escoamento mássico ou afunilado. No primeiro caso, todo o material no silo se movimenta quando qualquer parcela é retirada, ou seja, o escoamento é uniforme desde o topo da seção de armazenamento. No segundo, somente uma parte do sólido VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica flui quando se retira uma pequena porção, uma coluna de sólidos escoa sem perturbar o material das laterais, formando uma região estagnada. Eventualmente, pode acontecer um bloqueio do escoamento, impedindo a descarga (efeito de arqueamento), ou ainda uma retenção parcial dos sólidos. Estes fatores podem causar grandes prejuízos econômicos nas indústrias, pois o processo pode vir a ser interrompido por falta de material. As características dos sólidos particulados são muito variáveis, e afetam o escoamento (Woodcock e Mason, 1993). Há sólidos aglomerados, granulares ou em pó de difícil manuseio, lisos, angulosos, quentes, pegajosos, higroscópicos, frágeis, abrasivos e explosivos. Todas essas características devem ser levadas em conta no dimensionamento de sistemas de armazenamento (Gomide, 1983). O presente trabalho teve como obje- tivo verificar experimentalmente as variáveis que influenciam no escoamento de sólidos em silos, como o diâmetro médio das partí- culas e o ângulo de inclinação da base de descarga do silo. Visando uma compara- ção entre o escoamento com partículas de diferentes formatos, foram feitos ensaios com esferas de vidro e areia. Também foi verificada uma correlação da literatura para previsão das vazões de descarga. METODOLOGIA Materiais As partículas utilizadas nos experimentos foram esferas de vidro, pois são uniformes e fáceis de serem obtidas em diferentes diâmetros, e areia de diferentes diâmetros, para comparação com os resultados obtidos com o vidro. Equipamento O silo é feito de metal e é constituído de duas seções: uma seção superior e uma seção inferior através da qual é escoado o material. A seção superior tem altura de 50 cm, secção quadrada e dimensões laterais de 14 cm. Para a seção do escoamento, fo- ram utilizadas bases com três inclinações diferentes, com 53º, 60º e 74º, medidas em relação à horizontal. Todas têm seção qua- drada, com as laterais na parte superior medindo 14 cm. Na descarga, o diâmetro do orifício circular é de 3,9 cm. A altura de cada base varia, sendo 8 cm para o de me- nor grau de inclinação, 10 cm para o inter- mediário e 16,5 cm para o de maior grau de inclinação. Na Figura 1 é mostrada uma vista frontal do equipamento. No centro da base está localizado o orifício de descarga, o qual é fechado com uma ´porta´ fixada com pre- silhas, que permitia uma abertura pratica- mente instantânea. Figura 1: Vista frontal do equipamento (base com 53º de inclinação) Procedimento Experimental O silo era alimentado com partículas através da secção superior, sendo que a seção inferior permanecia inicialmente fe- chada. Manteve-se a altura de sólidos sem- pre no mesmo nível, com aproximadamente 10 kg de material. Depois de alimentado, abria-se rapidamente o orifício de descarga e com um cronômetro media-se o tempo VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica consumido até o total esvaziamento. O ma- terial coletado era pesado em uma balança com escala de 0 a 10 kg e precisão de ±20 g. O procedimento era repetido três vezes para cada condição. Caracterização dos sólidos: Foram utilizadas duas técnicas para caracterização da dimensão dos materiais: peneiramento e análise de imagens. Através do peneiramento foram obtidos os diâmetros médios de peneira (dp#). Com a análise de imagens pretendeu-se ter informações adicionais sobre a variabilidade de tamanhos para uma dada fração de partículas, depois de peneiradas e comparar a dimensão com o diâmetro de peneira, já que no caso da areia, que tem formato muito irregular, o diâmetro médio de peneira poderia não fornecer uma boa caracterização da dimensão do material. Foram peneiradas, em média, 12 kg de partículas para cada faixa de diâmetro. Para cada fração peneirada foram obtidas imagens utilizando-se para isso o Microscópio óptico Olympus (partículas menores que 1 mm), e o Galai Macro Viewer (partículas maiores que 1 mm). O software de visualização Image Pro Plus foi utilizado para a análise das imagens e obtenção das dimensões. Para cada fração foram separadas 10 amostras, e cada uma foi analisada separadamente. Foram obtidas as dimensões correspondentes aos tamanhos máximo e mínimo das partículas, sendo que como dimensão característica (dp*) foi adotada a média aritmética entre elas. A massa específica da areia foi de- terminada por picnometria, sendo obtido um valor igual a 2.595± 26 kg/m3. Para o vidro adotou-se o valor da literatura, 2.503kg/m3 (Zhou et al., 2002). O ângulo de repouso das partículas foi determinado pelo método descrito por Woodcock e Mason (1993), com as partículas sendo descarregadas em uma superfície lisa a partir de um funil, medindo- se o ângulo do cone formado em relação à horizontal. RESULTADOS Caracterização das Partículas Por peneiramento, foram obtidas amostras de esferas de vidro e partículas de areia com seis e sete especificações de diâmetros médios, respectivamente. Foram feitas as medidas de dimensão a partir das imagens projetadas, e construídos histogramas para verificar a distribuição de tamanhos para cada faixa de diâmetros. Na Figura 2 são mostrados alguns resultados obtidos, que representam a média de 10 amostragens em cada faixa de diâmetros. São apresentadas curvas apenas para partículas maiores do que 1 mm, analisadas no Gallai, porque quando as imagens foram analisadas usando o microscópio ótico, o número de partículas usado era insuficiente para a obtenção de curvas de distribuição. Observa-se que as amostras apresentaram distribuições com características diferentes, cada fração com faixas estreitas de variação, sendo que as amostras de areia 4 e 5 foram as que mais se aproximaram da distribuição normal. As dimensões obtidas a partir da análise de imagens (dp*), e os diâmetros médios de peneira (dp#) são mostrados na Tabela 1. No caso das esferas de vidro, como esperado, quase não há diferença entre as dimensões obtidas pelas duas metodologias. Já para a areia, as dimensões obtidas com base nos diâmetros médios de peneira foram sempre inferiores às obtidas através da análise de imagens, o que se deve ao formato irregular das partículas. Com o movimento de vibração durante o peneiramento, a tendência da partícula é passar pela abertura da peneira se uma das dimensões for menor do que a da abertura. Como a dimensão obtida por análise de imagens baseia-se nas dimensões máxima e mínima obtidas pela área projetada da partícula, a maior VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica dimensão contribui para o valor obtido, sendo portanto, mais representativa. Ângulo de Repouso: O ângulo de repouso, α, foi determinado para cada fração de sólidos, e caracteriza o tipo de escoamento. Segundo Zhou et al. (2002), α diminui com o aumento de dp, mas no presente trabalho, as variações ficaram dentro do erro experimental. Assim, considerou-se um valor médio igual a 25±2o para o vidro e 36±3o para a areia. O menor ângulo de repouso do vidro deve-se ao fato das partículas serem regulares, com superfícies lisas e, portanto, de escoamento mais fácil. Já a areia tem superfície rugosa e formato irregular, características que dificultam o escoamento. Para esferas de vidro de mono-tamanho, e dp variando entre 0,55 e 10 mm, Zhou et al. (2002) relatam valores de α entre 20 e 58º. Para areia com dp entre 0,095 e 1,89 mm, Verghese e Nedderman (1995) relatam valores entre 30 e 34o. (a) (b) Figura 2: Distribuições de tamanho obtidas através de análise de imagens; (a) esferas de vidro; (b) areia. Tabela 1: Dimensões das partículas utilizadas. Especificação Abertura das Peneiras (mm) dp# (mm) dp* (mm) Diferença (%) V-AB 0,250-0,297 0,273 0,261 4.4 V-A72 0,710-0,850 0,780 0,845 -8.3 V-A120 1,00-1,19 1,10 1,14 -3.6 V-A205 2,00-2,36 2,18 2,19 -0.5 V-A285 2,80-3,36 3,08 3,32 -7.8 V-A440 4,00-4,75 4,38 4,34 0.9 A #1 0,180-0,250 0,215 0,263 -22.3 A #2 0,425-0,600 0,512 0,593 -15.8 A #3 0,710-0,850 0,78 0,878 -12.6 A #4 1,18-1,40 1,29 1,65 -27.9 A #5 1,70-2,00 1,85 2,14 -15.7 A #6 2,80-3,35 3,08 3,50 -13.6 A #7 3,35-4,00 3,68 4,22 -14.7 Escoamento Foram medidas as vazões mássicas de escoamento para vidro e areia nas três inclinações de descarga e na Figura 3 são apresentados os resultados. VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica As vazões de descarga diminuem com o aumento do diâmetro médio, um comportamento consistente, do ponto de vista qualitativo, com o previsto por correlações como a de Beverloo et al. (1961). Uma exceção foi observada no escoamento de esferas de vidro dp#=0,25 mm, que apresentaram vazões de escoamento iguais ou menores do que as partículas de 0,72 mm, dependendo do ângulo de inclinação do reservatório. Verghese e Nedderman (1995), que trabalharam com areia, observaram comportamento similar com partículas de diâmetro abaixo de 0,5 mm. Nota-se também na Figura 3 que, para um mesmo dp#, há uma tendência de aumento da vazão de descarga com o aumento da inclinação da secção de escoamento. Entretanto, admitindo-se um erro experimental de cerca de ±5% nas medidas de vazão, para a maior parte das condições, as variações encontradas podem ser consideradas como dentro do erro experimental. Para uma melhor comparação entre os comportamentos na descarga de vidro e areia, na Figura 4 são mostrados gráficos de vazão de descarga em função de dp# para as duas partículas. Os dados mostrados foram obtidos para reservatório com ângulo de inclinação de 60º, mas para as demais inclinações foi observado comportamento similar. As vazões de descarga para o vidro foram em geral maiores do que as da areia, o que se explica pelo menor ângulo de re- pouso do vidro e pelas diferentes caracte- rísticas de empacotamento de cada materi- al, que são afetadas pela forma e dimen- sões das partículas. Observa-se que para as menores partículas (dp# abaixo de 0,300 mm), estas diferenças não foram significati- vas, pois as vazões de descarga foram mui- to próximas. 0 1 2 3 4 5 0 , 5 0 , 6 0 , 7 0 , 8 0 , 9 1 , 0 1 , 1 V a z ã o M á s s ic a ( k g /s ) d p ( m m ) I n c l i n a ç ã o 5 3 º 6 0 º 7 4 º (a) 0 1 2 3 4 0 , 5 0 , 6 0 , 7 0 , 8 0 , 9 1 , 0 V a z ã o M á s s ic a ( k g /s ) d p ( m m ) I n c l i n a ç ã o 5 3 º 6 0 º 7 4 º (b) Figura 3: Vazões mássicas de descarga em função do diâmetro médio de peneira; (a) vi- dro; (b) areia. 0 1 2 3 4 5 0 , 5 0 , 6 0 , 7 0 , 8 0 , 9 1 , 0 V a z ã o M á s s ic a ( k g /s ) d p ( m m ) I n c l i n a ç ã o : 6 0 º E s f e r a s d e V i d r o A r e i a Figura 4: Vazões mássicas de descarga em função do diâmetro médio de peneira para esferas de vidro e areia. VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química em Iniciação Científica A correlação de Berverloo et al. (1961), Equação 1, foi testada para a previsão das vazões de descarga. ( )dkD #p 2/5gCW −ρ= (1) onde W é a vazão mássica, ρ é a densidade do sólido, dp# é o diâmetro médio de peneira, g é a aceleração gravitacional, D é o diâmetro do orifício de saída, k e C são parâmetros empíricos. Esta equação forneceu boas previsões para partículas acima de 0,50 mm (desvios entre 2 e 35 %), em geral com valores subestimados em relação aos experimentais. Foi necessário, porém, ajustar parâmetros empíricos diferentes dos fornecidos na equação original. O ajuste do parâmetro k foi feito individualmente, para cada condição experimental, porque não foi possível obter um ajuste generalizado que fornecesse bons resultados para todas as condições. Na Tabela 2 estão apresentados os valores encontrados para essas constantes. Tabela 2: Valores das constantes C e k na Equação (1). Inclinação de descarga Material k C Vidro 1,75 0,38 53º Areia 1,50 0,28 Vidro 1,75 0,35 60º Areia 1,50 0,25 Vidro 1,75 0,29 74º Areia 1,50 0,21CONCLUSÕES Em relação à caracterização das par- tículas, observou-se que no caso da areia, o diâmetro médio de peneira fornece dimen- sões da ordem de 10 a 20% inferiores ao valor obtido através das medidas feitas com base na área projetada. No caso deste tra- balho, as diferenças não alteram a análise, porém deve-se observar que no caso de partículas irregulares, é importante definir como foi obtido o diâmetro nominal que es- tá sendo utilizado para caracterizar a partí- cula, uma vez que o valor depende da defi- nição e do método de medida. Em relação às vazões de descarga, os resultados per- mitem concluir que ela tende a aumentar com o aumento do diâmetro médio das par- tículas. Para as esferas de vidro de dp#=0,273 mm, no entanto, a vazão de des- carga foi inferior à observada para as esfe- ras de 0,780 mm, contrariando o compor- tamento observado para os maiores diâme- tros. Comparando-se areia e esferas de vi- dro, foram observadas menores vazões no caso da areia. A vazão de descarga mos- trou tendência de aumentar com o ângulo de inclinação do reservatório, embora para os dois menores ângulos de inclinação a variação tenha ficado dentro do erro expe- rimental. REFERÊNCIAS BEVERLOO, W.A.; LENIGER, H.A.; VAN DE VELDE, J. (1961), “The flow of granular materials through orifices”. Chemical Engineering Science, vol. 15, p. 260, 1961. FORTES Fo., J. (1985), Uma Introdução ao Estudo dos Silos. Editora da USP. GOMIDE, R. (1983), Operações Unitárias: Operações com Sistemas Sólidos Gra- nulares. Edição do Autor, vol. 1, São Paulo. PERRY, R. H. (1980), Manual de Engenha- ria Química. Guanabara Dois, 5ª ed. VERGHESE, T.M. e NEDDERMAN, R.M. (1995), “The discharge of fine sands from conical hoppers”. Chemical Engi- neering Science, vol. 50, p. 143-3153. WOODCOCK, C.R. e MASON, J.S. (1993), Bulk Solids Handling. Leonard Hill. ZHOU, Y.C., XU, B.H., YU, A.B. e ZULLI, P. (2002), “An experimental and numerical study of the angle of repose of coarse spheres”. Powder Technology, vol. 125, p. 45-54.
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