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301 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 2016 São Paulo COORDENADORA CIENTÍFICA Lívia GaiGher Bósio CampeLLo ORGANIZADOR Gustavo santiaGo torreCiLha CanCio TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE Nossos Contatos São Paulo Rua José Bonifácio, n. 209, cj. 603, Centro, São Paulo – SP CEP: 01.003-001 Acesse: www. editoraclassica.com.br Redes Sociais Facebook: http://www.facebook.com/EditoraClassica Twittter: https://twitter.com/EditoraClassica Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ Editora Responsável: Verônica Gottgtroy Produção Editorial: Editora Clássica Capa: Editora Clássica Equipe Editorial EDITORA CLÁSSICA Allessandra Neves Ferreira Alexandre Walmott Borges Daniel Ferreira Elizabeth Accioly Everton Gonçalves Fernando Knoerr Francisco Cardozo de Oliveira Francisval Mendes Ilton Garcia da Costa Ivan Motta Ivo Dantas Jonathan Barros Vita José Edmilson Lima Juliana Cristina Busnardo de Araujo Lafayete Pozzoli Leonardo Rabelo Lívia Gaigher Bósio Campello Lucimeiry Galvão Luiz Eduardo Gunther Luisa Moura Mara Darcanchy Massako Shirai Mateus Eduardo Nunes Bertoncini Nilson Araújo de Souza Norma Padilha Paulo Ricardo Opuszka Roberto Genofre Salim Reis Valesca Raizer Borges Moschen Vanessa Caporlingua Viviane Coelho de Séllos-Knoerr Vladmir Silveira Wagner Ginotti Wagner Menezes Willians Franklin Lira dos Santos Conselho Editorial CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-PUBLICAÇÃO T278 Temas contemporâneos de direito ambiental e sustentabilidade / organização Gustavo Santiago Torrecilha Cancio; coordenação Lívia Gaigher Bósio Campello. 1. ed. - São Paulo: Clássica Editora, 2016. 300 p. Referências ISBN 978-85-8433-037-9 1. Direito cultural. 2. Educação ambiental - ecofeminismo - ética. I. Cancio, Gustavo Santiago Torrecilha. II. Campello, Lívia Gaigher Bósio. CDD: 341.2 4 Apresentação Com imensa alegria e satisfação apresentamos a presente obra coletiva, composta por artigos científicos motivados pelos debates e resumos expandidos submetidos ao IV Congresso Nacional da Federação dos Pós-Graduandos em Direito - FEPODI, ocorrido entre 01 e 02 de outubro de 2015, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP, sobre o tema “Ética, Ciência e Cultura Jurídica”. Os 18 (dezoito) artigos, abaixo sintetizados, que compõem a presente obra coletiva, mais do que discutir temas atuais do direito ambiental, refletem a sensibilidade e disposição dos (as) autores (as) para transformar a cultura da sociedade contemporânea em favor de um mundo melhor, mais digno e sustentável. Dentro dessa análise, no artigo “Da necessidade de respeito à cultura indígena nas políticas de desenvolvimento econômico: do multiculturalismo e aspecto cultural do conceito de desenvolvimento econômico sustentável”, Lorena Silva de Albuquerque discute a necessidade de se observar o elemento cultural em políticas públicas, defendendo que o conceito de desenvolvimento sustentável também abrange o aspecto cultural, no qual estão inseridas as tradições indígenas. Por seu turno, Paulo Silva Nhemetz e Leonardo Raphael Carvalho de Matos propõem-se, no artigo “Solidariedade cogente: percepção de direitos às futuras gerações (o princípio da solidariedade infinda)”, a analisar o princípio constitucional da solidariedade aplicado àquele que ainda não existe, ou seja, às futuras gerações, dando origem ao princípio da solidariedade intergeracional e transgeracional. Já em “O meio ambiente do trabalho e o adicional de insalubridade sob uma análise fraterna”, Luana Pereira Lacerda e Lafayette Pozzoli enfocam 5 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE na análise crítica da problemática que envolve o meio ambiente do trabalho e o enquadramento do adicional de insalubridade e sua agressão à saúde do empregado. Carla Judith Cetina Castro apresenta em “O ecofeminismo e as relações de poder de Foucault” uma visão geral sobre o ecofeminismo, uma corrente filosófica feminista, que não tem impedido sua adopção como forma de luta na degradação ambiental, por parte de ecofeministas no redor do mundo. No artigo intitulado “Procedimento administrativo de liberação dos OGM’S”, as autoras Elisângela Assayag Neves e Suame da Costa Tavares incitam o debate sobre os organismos geneticamente modificados (OGMs), cuja realização ainda fomenta incertezas na área do Biodireito, quanto à análise de risco à segurança humana e ao meio ambiente. Cyro Alexander de Azevedo Martiniano e Ygor Felipe Távora da Silva introduzem em “A educação ambiental e a função da comunicação social conforme a ordem constitucional brasileira” a ideia de que o contexto constitucional da comunicação social exerce um papel importante para a efetivação da Educação Ambiental. Trazendo um outro enfoque, o artigo “A competência ambiental concorrente do manejo do pirarucu no Estado do Amazonas”, de Adriana Almeida Lima e Rayanny Silva Siqueira Monteiro, discorre sobre a nova competência concorrente do Estado do Amazonas para legislar sobre o manejo do Pirarucu, investigando a aplicaçao da lei e eficácia bem como descrição de um novo modelo que se desenha. Ao tratarem da “Ameaça à sustentabilidade das unidades de conservação: o caso da reserva extrativista chico mendes”, Paulo Fernando de Britto Feitoza e Idelcleide Rodrigues Lima Cordeiro aborda os principais fatores que vêm ameaçando a sustentabilidade Reserva Extrativista Chico Mendes - RESEX, localizada no sudeste do Estado do Acre, criada para garantir a exploração auto- sustentável e a conservação dos recursos naturais renováveis. O estudo sobre o “Regime sui generis de proteção jurídica transnacional dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade: possibilidade a partir da região amazônica”, realizado por Ana Carolina Couto Lima de Carvalho, trata da tutela jurídica dos conhecimentos tradicionais dos povos da Amazônia e sua imprescindível interrelação com a sustentabilidade ambiental e a transnacionalidade. Andrea Cláudia Sales Silva e Cristine Cavalcanti Gomes apresentam uma análise sobre os “Possíveis impactos do licenciamento ambiental único estabelecido pela Lei Complementar n. 140, de 08 de dezembro de 2011”, enfocando, dentro da repartição de ações administrativas dos entes federados e o exercício do licenciamento ambiental, a figura do licenciamento ambiental TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 6 único, caracterizada como um instrumento capaz de evitar sobreposição de atuações entes os componentes da Federação. Por sua vez, Mayara Ferrari Longuini e Rafael Junqueira Buralli, no artigo “Participação social em decisões políticas ambientais: dimensões e efetividade”, buscam analisar as dimensões jurídicas e efetividade da participação da sociedade em decisões políticas que envolvam questões ambientais dentro do contexto do Estado Democrático de Direito. Em “A Constituição Federal e a proteção ao direito socioambiental: o caso da reserva indígena Raposa Serra do Sol no Supremo Tribuinal Federal”, Bárbara Dias Cabral e Juliana Soares Viga aduzem, em síntese, que o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o caso da demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, embasou uma nova ideia jurídica denominada Direito Socioambiental. Marcelo Pires Soares e Elisa Oliveira da Silva Bentes apresentam em “O plantio de organismos geneticamente modificados no entorno de unidades de conservação” uma análise da validade do Decreto 5.950/2006, que autoriza o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGMs) no entorno de unidades de conservação, tendo como ponto de partida a funçãodas zonas de amortecimento, as incertezas quanto ao plantio de OGMs e a aplicação do Princípio da Precaução. No artigo “O princípio do poluidor-pagador e a responsabilidade civil do estado por omissão no dever de fiscalização e proteção ambiental”, Laís Batista Guerra e Juliana de Carvalho Fontes tratam da responsabilidade civil do Estado por omissão no dever de proteção e fiscalização ambiental, à luz da aplicação do princípio do poluidor-pagador e das normas constitucionais e legais vigentes. Em “Importância da educação ambiental para efetivação da sociedade sustentável”, a autora Tereza Cristina Mota dos Santos Pinto traz a relevância do papel da educação ambiental para a mudança na forma de se posicionar do ser humano, de modo a permitir a efetivação do desenvolvimento sustentável preceituado constitucionalmente no artigo 225. Carlos Antonio de Carvalho Mota Júnior e Guilherme Gustavo Vasques Mota, ao discorrem sobre “Os igarapés da cidade de manaus: degradação e remédios legais”, esclarecem que a cidade de Manaus possui fartos braços d´água conhecidos como “igarapés”, os quais atualmente encontram-se em estado de grande degradação, sem qualquer uso para a população exceto o lançamento de dejetos residenciais, comerciais e industriais. Já os autores Narcisa Batista Lunguinho Silva e Leonardo Raphael Carvalho de Matos apresentam uma visão sobre a “Responsabilidade social no direito ambiental internacional e os refugiados ambientais”, levantando as 7 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE consequências advindas da problemática da degradação ambiental cada vez mais crescente e indicando o surgimento de uma nova categoria de refugiados: os refugiados ambientais, também conhecidos como (refugiados climáticos). Por fim, em “Educação ambiental: as ações pedagógicas da Secretaria Municipal de Educação de Manaus/AM”, Bárbara Dias Cabral e Erivaldo Cavalcanti Silva Filho apresentam um estudo sobre as ações que corroboram a educação ambiental na Secretaria Municipal de Educação de Manaus/AM (SEMED). Feita essa breve introdução aos artigos que constituem a presente obra coletiva, acreditamos que, pela dinâmica do livro, haja uma excelente fluidez na compreensão e exame dos estudos aqui apresentados. Boa leitura! Lívia GaiGher Bósio CampeLLo Coordenadora Científica Gustavo santiaGo torreCiLha CanCio Organizador 8 Sumário DA NECESSIDADE DE RESPEITO À CULTURA INDÍGENA NAS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: DO MULTICULTURALISMO E ASPECTO CULTURAL DO CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO SUSTENTÁVEL Lorena Silva de Albuquerque ......................................................................... SOLIDARIEDADE COGENTE: PERCEPÇÃO DE DIREITOS ÀS FUTURAS GERAÇÕES (O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE INFINDA) Paulo Silva Nhemetz e Leonardo Raphael Carvalho de Matos ........................... O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E O ADICIONAL DE INSALUBRIDADE SOB UMA ANÁLISE FRATERNA Luana Pereira Lacerda e Lafayette Pozzoli .................................................... O ecofeminismo e as relações de poder de Foucault Carla Judith Cetina Castro .......................................................................... Procedimento Administrativo de liberação dos OGM’s Elisângela Assayag Neves e Suame da Costa Tavares ........................................ A EDUCAÇÃO AMBIENTAL E A FUNÇÃO DA COMUNICAÇÃO SOCIAL CONFORME A ORDEM CONSTITUCIONAL BRASILEIRA Cyro Alexander de Azevedo Martiniano e Ygor Felipe Távora da Silva ............... A COMPETÊNCIA AMBIENTAL CONCORRENTE DO MANEJO DO PIRA- RUCU NO ESTADO DO AMAZONAS Adriana Almeida Lima e Rayanny Silva Siqueira Monteiro ............................... AMEAÇA À SUSTENTABILIDADE DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO: O CASO DA RESERVA EXTRATIVISTA CHICO MENDES Paulo Fernando de Britto Feitoza e Idelcleide Rodrigues Lima Cordeiro .......... 10 22 39 57 75 87 105 116 9 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE REGIME SUI GENERIS DE PROTEÇÃO JURÍDICA TRANSNACIONAL DOS CONHECIMENTOS TRADICIONAIS ASSOCIADOS À BIODIVERSIDADE: POSSIBILIDADE A PARTIR DA REGIÃO AMAZÔNICA Ana Carolina Couto Lima de Carvalho .......................................................... POSSÍVEIS IMPACTOS DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL ÚNICO ESTABE- LECIDO PELA LEI COMPLEMENTAR N. 140, DE 08 DE DEZEMBRO DE 2011 Andrea Cláudia Sales Silva e Cristine Cavalcanti Gomes ................................. PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM DECISÕES POLÍTICAS AMBIENTAIS: DIMENSÕES E EFETIVIDADE Mayara Ferrari Longuini e Rafael Junqueira Buralli ...................................... A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A PROTEÇÃO AO DIREITO SOCIOAMBIENTAL: O CASO DA RESERVA INDÍGENA RAPOSA SERRA DO SOL NO SUPREMO TRIBUINAL FEDERAL Bárbara Dias Cabral e Juliana Soares Viga ..................................................... O PLANTIO DE ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS NO ENTOR- NO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Marcelo Pires Soares e Elisa Oliveira da Silva Bentes ..................................... O PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO E PROTEÇÃO AMBIENTAL Laís Batista Guerra e Juliana de Carvalho Fontes ........................................... IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA EFETIVAÇÃO DA SOCIEDADE SUSTENTÁVEL Tereza Cristina Mota dos Santos Pinto .......................................................... OS IGARAPÉS DA CIDADE DE MANAUS: DEGRADAÇÃO E REMÉDIOS LEGAIS Carlos Antonio de Carvalho Mota Júnior e Guilherme Gustavo Vasques Mota .. RESPONSABILIDADE SOCIAL NO DIREITO AMBIENTAL INTERNACIONAL E OS REFUGIADOS AMBIENTAIS Narcisa Batista Lunguinho Silva e Leonardo Raphael Carvalho de Matos ........ EDUCAÇÃO AMBIENTAL: AS AÇÕES PEDAGÓGICAS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE MANAUS/AM Bárbara Dias Cabral e Erivaldo Cavalcanti Silva Filho .................................. 133 153 171 188 199 223 243 261 274 291 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 10 DA NECESSIDADE DE RESPEITO À CULTURA INDÍGENA NAS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: DO MULTICULTURALISMO E ASPECTO CULTURAL DO CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO SUSTENTÁVEL THE NECESSITY OF RESPECT THE CULTURE OF INDIGENOUS PEOPLES IN POLICY OF ECONOMIC AND SOCIAL DEVELOPMENT: THE MULTICULTURALISM E CULTURAL ASPECT IN CONCEPT OF SUSTAINABLE DEVELOPMENT Lorena Silva de Albuquerque Mestranda em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas. Procuradora do Estado do Amazonas. Resumo: Na implementação de programas de crescimento econômico é possível que haja choques com diferentes formas de viver. Considerando que o Brasil adotou o multiculturalismo como diretriz constitucional e assumiu compromissos internacionais de respeito aos costumes e tradições indígenas, é necessário observar o elemento cultural em políticas públicas. Outro reforço a tal obrigatoriedade foi o fato de o Brasil ter adotado o chamado desenvolvimento econômico sustentável. Defende-se que o conceito de desenvolvimento sustentável também abrange o aspecto cultural, no qual inseridas as tradições indígenas. Assim, a partir de pesquisas em doutrina pátria, análise do ordenamento jurídico brasileiro e documentos internacionais, será demonstrado que o Brasil não pode se descuidar do aspecto cultural em seu desenvolvimento econômico. PalavRas-Chave: Desenvolvimento Sustentável. Cultura. Índios. abstRaCt: In the implement of economic growth plan is possible shocks with diferentes ways of life. Whereas Brazil has adopted multiculturalism as a constitutional guideline and made international commitments to respect the customs and indigenous traditions, is necessary to respect cultural element in public politics. Another demonstrativeof this obligation is the fact that Brazil adopted the concept of sustainable development. The concept of sustainable development also covers the cultural aspect, in which indigenous traditions are inserted.Thus, from research in doctrine, as well as analysis of Brazilian law and international documents, it will be demonstrated that Brazil can not neglect the cultural elemente in economic development. KeywoRds: Sustainable Development. Culture. Indigenous people. 11 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE INTRODUÇÃO O Brasil busca constantemente o crescimento econômico. Para tanto, faz investimentos em usinas hidrelétricas, expande rodovias, realiza transposição de rios, o que em geral contribui para baratear custos e facilitar escoamento de produção. Ao mesmo tempo em que busca se agigantar economicamente, possui uma realidade da qual não pode se afastar: é um país formado por diversos povos, um verdadeiro mosaico de várias formas de viver. Disso resulta que medidas consideradas essenciais para o desenvolvimento econômico por vezes agridem a cultura de determinados povos. Justifica-se a pesquisa em decorrência da atual política de crescimento econômico brasileiro e do fato de que muitas obras em andamento, em especial a construção de usinas hidrelétricas, motivam diversas manifestações de indignação de povos indígenas, que alegam afronta a seus direitos. O objetivo do presente trabalho será demonstrar que o aspecto cultural deve estar atrelado ao desenvolvimento. Além da necessidade de proteção à cultura indígena, o Brasil adotou o modelo do desenvolvimento econômico sustentável, no qual se integra tal proteção. Para tanto, será realizada pesquisa na doutrina pátria, Constituição Federal e legislação infraconstitucional, além de documentos internacionais. A primeira etapa da pesquisa consistirá em abordar a proteção da cultura. Posteriormente será demonstrada a proteção constitucional dos direitos indígenas. Em seguida, será apresentado o conceito de desenvolvimento sustentável, para, ao final, ser realizada conclusão sobre o tema. 1. DA PROTEÇÃO À CULTURA O Brasil foi destino de vários povos. Aqui já residiam os índios. Após vieram os portugueses, africanos, italianos, espanhóis e diversos outros. Como resultado, há uma mistura de povos, com diversas formas de viver e pensar. A diversidade da população brasileira é fato notório. O contraste entre as diversas regiões demonstra a relevância e existência de variadas formas de identidade cultural. Fisicamente, já há indício de diversidade cultural. Em cidades como São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, a presença indígena é marcante. Já no Nordeste, em várias cidades da Bahia a presença negra anos é inegável. O aspecto cultural, no entanto, ultrapassa os caracteres físicos e alcança os costumes e crenças de cada grupo. Afinal, como não imaginar demonstrativo de cultura o infanticídio em aldeias indígenas ou a farra do boi em Santa Catarina? TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 12 Como ignorar que num mesmo país há os que seguem Deus, alguns que temem os espíritos da floresta e outros que referenciam os Orixás do Candomblé? Tais exemplos, alguns mais questionáveis que outros, demonstram as diversas formas de pensar. Além das crenças, integra a cultura os diversos meios pelos quais os grupos empregam suas forças e obtém alimentação. Considerando o tema do presente artigo, cabe enfatizar a diferenciada forma de vida dos indígenas. Nela, há grande ligação com a natureza. Das águas, das florestas e da terra saem diretamente os alimentos para saciar fome e também as necessidades espirituais. Os rios são fontes de peixe, mas também símbolos sagrados. A necessidade de caça implica a reserva uma ampla área de terra para a sobrevivência indígena, o que também é reformado pela agricultura e coleta das quais o povo tira alimentos básicos. Assim, ao se falar em cultura indígena, fala-se em todos os seus costumes, hábitos, crenças e símbolos que fazem o índio se reconhecer como ser na terra. Fácil concluir que o direito de proteção à cultura não consiste na simples fixação de um dia de proteção ao índio. A a reserva de 19 de abril para comemoração do dia do índio não contribui diretamente com a proteção de sua cultura. Os trabalhos realizados em escolas não mata a fome ou eleva a autoestima desta minoria. Protege-se a cultura quando se possibilita que os povos perpetuem sua forma de viver. Possibilita-se a perpetuação da forma de viver quando protegidos os meios que permitem tal continuidade. Quando se permite o acesso à agua para a permanência de busca de alimentos. Quando mantidas as terras para a prática de atividades de subsistência e reprodução de modos de vida, por exemplo. Sabe-se que a relação entre a natureza e a cultura é direta e interdependente. A respeito do tema, transcreve-se lição de DERAMI (2001 p.72): Toda formação cultural é inseparável da natureza, com base na qual se desenvolve. Natureza conforma e é conformada pela cultura. De onde se conclui que tantas naturezas teremos quão diversificadas foram as culturas e, naturalmente, pelo raciocínio inverso, as culturas terão matizes diversos posto eu imersas em naturezas diferentes Nos povos indígenas tal relação é bem acentuada. A proteção à cultura, assim, perpassa pela proteção à natureza que permite a perpetuação dos símbolos culturais, o que está diretamente ligado ao respeito e seu território. 13 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE Há de se observar, ademais, que o conjunto de práticas e valores integrantes da cultura de um povo está diretamente ligado à identidade do povo e autoafirmação do indivíduo perante a sociedade. O direito à cultura, por conseguinte, constitui em verdadeiro direito fundamental, possuindo ligação direta com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o direito à busca da felicidade. Uma triste realidade é comprobatória do quão grave é a deterioração cultural para fins de se alcançar tal direito à felicidade. Atualmente, as maiores taxas de suicídio entre os jovens ocorre justamente entre os indígenas. O ranking é liderados por cidades com forte presença indígena, como São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, e cidades de Amambai, Dourados e Paranhos do Mato Grosso do Sul. Os choques culturais a que estão submetidos os indígenas em tais cidades por certo contribui para a fatalidade. Tamanha a importância da cultura, a mesma recebeu proteção constitucional. O capítulo III, Seção II da CF/88 disciplinou o tema Cultura. Nos termos do art.215, caput, da Constituição Federal, o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. O §1° do citado artigo determina que o Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional. O patrimônio cultural, como conjunto de bens de valor cultural, também foi disciplinado. Foi constitucionalmente conceituado, no art.216, caput, como bens de natureza material e imaterial, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas, as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais e os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. A respeito do tema, vale a menção aos ensinamentos de FEITOZA(2012, p.43): “Para que melhor se explique, considere-se que somente pode ser considerado bem cultural aquele que simbolizar uma evocação, representação TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 14 ou lembrança, sendo conclusivo que, tirante a materialidade da coisa erigida à condição de bem cultural, outra existe por uma vertente, que não é palpável nem material, mas imaterial ou mesmo psicológico, que emana de cada ser e converge para promover especial importância para determinado bem, alando-o à condição de cultural. A importância maior do bem está aí, na maioria das vezes, não na coisa em si, mas na lembrança que ocasiona A proteção da cultura, no entanto, ultrapassada a previsão da Seção II, na qual inclusa a proteção da cultura de forma genérica e do patrimônio cultural. Tal proteção também tem como fonte a previsão do art. 1°, III, de que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana. Não se pode olvidar, ademais, que constitui, ainda, objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, conforme art. 3°, IV, da Carta Magna. Ainda em termos de Constituição federal, determina o art.5° da CF/88 que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias, além de ser livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. A proteção à cultura, então, como direito fundamental que é, possui ampla proteção constitucional. 2. DO MULTICULTURALISMO E PROTEÇÃO AOS DIREITOS INDÍGENAS A diversidade cultural existente no Brasil é realidade. Na verdade, considerando a globalização, é realidade comum a quase todos os países. Disto surgem seguintes indagações: Como proceder diante de tal diversidade? Aceitar as diferenças, com todos os conflitos que poderia surgir ou padronizar comportamentos, exterminando o “diferente”? Com a evolução dos direitos e proteção de direitos fundamentais caminha-se para um respeito às diferenças. Este reconhecimento das diversidades e valorização do outro, com a exclusão de idéia de homogeneidade é que dá corpo ao multiculturalismo. 15 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE O conceito de multiculturalismo designava, originalmente, a coexistência de formas culturais ou de grupos caracterizados por culturas diferentes no seio de “sociedades modernas’. Rapidamente, contudo, o termo se tornou um modo de descrever as diferenças culturais em um contexto transnacional e global. (BOAVENTURA, 2003, p.26). O conceito aponta, simultaneamente, para uma descrição e um projeto. Conforme, novamente, lição de BOAVENTURA (2003, p.28) : Enquanto descrição é possível falar de: 1. A existência de uma multiplicidade de culturas no mundo; 2. A co-existência de culturas diversas no espaço de um mesmo Estado-nação; 3. A existência de cultuas que se influenciam tanto dentro como além do Estado-nação. O multiculturalismo pode ser visto também como uma forma de atuar, intervir e transformar a dinâmica social. As sociedades estão permeadas de grupos minoritários que exigem reconhecimento de suas diferenças culturais. Esta forma ativa do multiculturalismo impõe ao Estado brasileiro a necessidade de intervir de forma a preservar e fomentar a diversidade. O Brasil também é multicultural e pluriétnico porque protege e estimula o convívio harmônico das várias formas de viver, dos diversos costumes e crenças. Não objetiva uma padronização, que todos usem os mesmos trajes, possuam os mesmos deuses, tenham a mesma relação com a natureza, submetam-se à mesma organização ou alimentem-se da mesma forma. No desenvolvimento das Políticas Públicas e na implementação de obras para incremento econômico tais valores devem ser preservados, considerando a já exposta proteção constitucional à cultura. Em relação aos povos indígenas, há proteção ainda mais específica que as genéricas previstas na Constituição. A nova ordem constitucional destinou-os capítulo específico (capítulo VII), no qual, em seu art. 231, caput, determinou que são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. Há de se observar, em consonância com BARRETO (2011, p.100), que antes da Constituição Federal de 1988, os direitos indígenas eram basicamente restritos aos direitos de posse sobre a terra. Após, houve uma mudança de paradigma, com ampliação de seus direitos e reconhecimento de suas organizações, costume, tradições. TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 16 O avanço no reconhecimento da diversidade cultural indígena não ocorreu somente em termos de Constituição. O Estado Brasileiro assumiu compromissos internacionais de respeito aos direitos indígenas. Está submetido a documentos mais genéricos de proteção a direitos humanos como a Declaração Universal dos Direitos e Convenção Internacional sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial. Além disso, assinou convenções específicas sobre direitos indígenas, dentre as quais a Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre os Povos Indígenas e Tribais, que alterou a perspectiva integracionista presente na Convenção n. 107 sobre populações indígenas e outras populações tribais e semitribais em países independentes. A mudança de paradigma na segunda convenção é expressa em suas considerações iniciais, ao citar, como fundamento, que as mudanças sobrevindas na situação dos povos indígenas e tribais em todas as regiões do mundo fazem com que seja aconselhável adotar novas normas internacionais nesse assunto, a fim de se eliminar a orientação para a assimilação das normas anteriores. É fácil observar, então, o objetivo de se distanciar da visão integracionista da cultura indígena ao padrão geral de comportamento, de forma a se alcançar o fortalecimento da cultura indígena e preservar sua identidade. Assim, ao assinar a Convenção 169 da OIT, o Estado Brasileiro assumiu um compromisso internacional de direitos humanos no sentido de respeitar a cultura indígena e tomá-la em consideração em politicas de desenvolvimento do país. Ainda a nível de documentos internacionais, é interessante frisar a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que, desde de seus considerando, frisa a necessidade de respeito às diferenças. É de conhecimento geral que atualmente os compromissos internacionais de direitos humanos possuem proteção constitucional. Os tratados de tal natureza integram o que se chama de “bloco de constitucionalidade”, com base no art. 5º, § 2º, da Constituição Federal, que determina que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Há de se observar que existem doutrinadores que inclusive defendem o status constitucionais de tais normas independentemente do procedimento de aprovação previsto no §3º do supracitado artigo constitucional, conforme se extrai abaixo: A Constituição de 1988 recepciona os direitos enunciados em tratados internacionais de que o 17 TEMAS CONTEMPORÂNEOSDE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE Brasil é parte, conferindo-lhe natureza de norma constitucional. Isto é, os direitos constantes nos tratados internacionais integram e complementam o catálogo de direitos constitucionalmente previstos, o que justifica estender a esses direitos o regime constitucional conferido aos demais direitos e garantias fundamentais. (PIOVESAN, 2009, p.58) A despeito do compromisso internacional, no entanto, nem sempre dado o devido valor aos costumes indígenas. A título de exemplificação, cita-se que a construção das diversas hidrelétricas no Rio Telles é fonte de forte objeção pelos povos indígenas Munduruku, Kayabi, Apiaká e Rikabatsa. Segundo manifesto apresentado1, as usinas de Sinop, Colíder, Teles Pires e São Manoel estão mudando radicalmente o rio Teles Pires e afetando o modo de vida tradicional de tais povos, tanto no aspecto físico como cultural. Segundo alegam, com tais construções seriam afetadas áreas sagradas, como a Cascada das Sete Quedas. Ora, os símbolos culturais das áreas para os indígenas não devem ser levados em consideração? Os mesmos não integram, como já exposto, o conceito de cultura? Esta não está protegida constitucionalmente? Trata-se de indagações essenciais cuja resposta decorre na disciplina constitucional e internacional da matéria. 3. DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E O ASPECTO CULTURAL Na intenção de impulsionar o desenvolvimento econômico, o Estado pode irregularmente descuidar das proteções constitucionais ao direito à cultura. Ocorre que esta se trata de mais uma afronta à Constituição, vez que nos termos do art. 170, caput, da Constituição Federal, a ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Como visto, a proteção à cultura indígena guarda relação direta coma dignidade humana. Além disso, hoje o desenvolvimento econômico deve ser analisado à luz do conceito de desenvolvimento sustentável. O conceito de desenvolvimento sustentável não perpassa somente pelo aspecto ecológico. Trata-se de um conceito que engloba diversas facetas de um todo que seria um meio ambiente adequado para vivência. 1 http://amazonia.org.br/2015/05/munduruku-kayabi-apiak%C3%A1-e-rikabatsa-selam- alian%C3%A7a-contra-usinas-no-mato-grosso/ TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 18 Um marco da conceituação de desenvolvimento sustentável foi o Relatório de Brundtland, chamado de “Nosso futuro comum”, elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. Em tal documento internacional, o desenvolvimento sustentável é conceituado como “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. Em 1992, foi realizada a Conferência de Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, chamada Rio 92, que reafirmou e popularizou o conceito de desenvolvimento sustentável tendo por objetivo vincular desenvolvimento e ambiente, conciliando equidade social, prudência ecológica e eficiência econômica (SAISSE, 2014, p.105). Em atenção ao tema do artigo, observa-se que o art. 22 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável previu que os Estados devem reconhecer e apoiar de forma apropriada a identidade, cultura e interesses dessas populações e comunidades, bem como habilitá-las a participar efetivamente da promoção do desenvolvimento sustentável. Em 2012, foi realizada nova Conferência no Rio de Janeiro, a Rio + 20, da qual resultou o documento “O futuro que queremos”. Em tal documento, os Chefes de Estado comprometem-se a obter uma maior integração entre os três pilares de desenvolvimento sustentável – o econômico, o social e o ambiental. Sobre tema, relevante ainda são as seguintes previsões: 16. Nós reconhecemos a diversidade do mundo e reconhecemos que todas as culturas e civilizações contribuem para o enriquecimento da humanidade e a proteção do sistema de suporte à vida da Terra. Enfatizamos a importância de cultura para o desenvolvimento sustentável. Pedimos uma abordagem holística para o desenvolvimento sustentável que guiará a humanidade para viver em harmonia com a Natureza. 21. Nós reconhecemos a importância da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos de Povos Indígenas na implementação global, regional e nacional de estratégias desenvolvimento sustentável. Também reconhecemos a necessidade de refletir as perspectivas de crianças e jovens de questões que estamos abordando exercerá um profundo impacto sobre os jovens de hoje e sobre as gerações vindouras. 19 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE É necessário observar que o debate a respeito do desenvolvimento levou, como citado, à tradicional identificação de três elementos essenciais e interdependentes, quais sejam, o econômico, o social e o ambiental. A terminologia, no entanto, acabou por estar sempre sujeita a crítica e interpretações, vez que busca um desenvolvimento capaz de compatibilizar crescimento econômico, conservação e manutenção da natureza e justiça social, o que pareceria improvável numa economia de mercado (IRVING, 2014, p.20). O fato, no entanto, é que não se poderia conceber um planeta desenvolvido se nele há pobreza, desigualdades sociais, ou esgotamento de recursos naturais. A própria pobreza e falta de educação acarreta danos ao meio ambiente. Da mesma forma, a conservação das diversidades de cultura igualmente é relevante ao desenvolvimento, vez que preserva conhecimentos e conduz ao bem-estar. Neste aspecto, o art.6° da Convenção sobre a proteção e promoção da diversidade das expressões culturais determina que a diversidade cultural constitui grande riqueza para os indivíduos e as sociedades e a proteção, promoção e manutenção da diversidade cultural é condição essencial para o desenvolvimento sustentável em benefício das gerações atuais e futuras. Assim, ao se vincular a tais documentos, o Brasil adotou um modelo de desenvolvimento sustentável no qual se preserva o meio ambiente para futuras gerações e se respeita a identidade, cultura e interesse de povos indígenas. CONCLUSÃO A cultura consiste num conjuntos de costumes, crenças, símbolos, organização social, modos de vida em geral que tornam determinados grupos dotados de singularidade ao meio de tantos outros que o circundam. O Brasil, por sua história, é de grande riqueza de cultural, existindo regiões com prevalência de costumes indígenas, outras com influência africana e, mais ao sul, influência européia. Os chamados grupos minoritários, no qual se enquadram os índios, reclamam uma proteção maior por parte do Estado Brasileiro. No desenvolvimento de suas políticas públicas, por vezes o Estado Brasileiro se depara com manifestos de minorias, como os indígenas. A diferenciação cultural dos mesmos não raramente se choca com interesse econômico-político do país, o que deve ser solucionado a partir do regime jurídico adotado pelo Estado Brasileiro. O Brasil é um país multicultural, tanto pela realidade fática de diversidade entre seus integrantes, quanto pela diretriz constitucional de preservação de tais singularidades. TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 20 A Constituição Federal determinou expressamente a proteção da cultura, do patrimônio cultural, nas quais inclusas as diversas manifestações e crenças. O Estado brasileiro está obrigado constitucional e internacionalmente ao respeito às instituições. A Constituição Federal, em seu art. 231 da Constituição Federal e compromissos assumidos em documentos internacionais, em especial a Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho, fixam a obrigação de tal proteção. A construção de hidrelétricas, por afetarem diretamenteo meio ambiente e os meios de vida dos que dependem das áreas por ela afetadas, são questionadas pelos indígenas. Além da própria subsistência física, por vezes ocorre um desastre cultural, como no exemplo citado de destruição de lugares considerados sagrados. Ora, a partir do momento em que o Brasil adotou o multiculturalismo e comprometeu-se a proteger tradições indígenas, nas quais inclusas crenças que envolvem as águas sagradas, não pode se esquivar de tal proteção. Além disso, a busca pelo desenvolvimento engloba por si só a proteção à diversidade cultural. Na medida em que o Brasil aderiu a um conceito de desenvolvimento sustentável, na qual insertos os aspectos econômicos, ecológicos e sociais, a busca pelo crescimento econômico deve estar atrelada à satisfação de necessidades culturais, nas quais se incluem o exercício de costumes e tradições indígenas. Pelo exposto, conclui-se o pela obrigação de o Brasil, no planejamento de desenvolvimento econômico, observar a cultura indígena. 21 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE REFERÊNCIAS BARRETO, Helder Girão. Direitos indígenas: vetores constitucionais. Curitiba: Juruá, 2011. DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2ª ed. São Paulo: Max Limonad, 2001. FEITOZA, Paulo Fernando de Britto. Patrimônio cultural – proteção e responsabilidade objetiva. Manaus: Editora Valer, 2012. IRVING, MARTA DE AZEVEDO. Sustentabilidade e o futuro que não queremos: polissemias, controvérsias e a construção de sociedades sustentáveis. Sinais Sociais, Rio de Janeiro, v.9, n.26. p.11-36, 2014. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. RIBEIRO, Wagner Costa. Geografia Política da Água. São Paulo: Annablume Editora, 2008. SALSSE, Maryane Vieira. Sustentabilidade e Justiça social. Sinais Sociais, Rio de Janeiro, v.9, n.26. p. 97-121, 2014. SANTOS, Boaventra de Sousa. Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. SARLET, Ingo Wolfgang, FERNSTERSEIFER, Thiago. Princípios do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo. 10 ed. Editora Malheiros. 2013. SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. O Renascer dos POVOS INDÍGENAS para o Direito. Curitiba: Juruá, 2012. VILLARES, Luiz Fernando Villares. Direito e povos indígenas. Curitiba: Juruá, 2009. TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 22 Solidariedade Cogente: percepção de direitos às futuras gerações (o princípio da solidariedade infinda) Imposed Solidarity: constitutional perception of rights to future generations (the principle of endless solidarity) Paulo Silva Nhemetz Graduando em Direito pela Universidade Nove de Julho - UNINOVE; Aluno do Programa Escola da Ciência 2014/2015 pelo Mestrado em Direito da Universidade Nove de Julho - UNINOVE; Pesquisador do Programa de Educação Tutorial PET/MEC dos cursos de Administração e Direito (PETADi) da Universidade Nove de Julho - UNINOVE; Membro da Comissão do Acadêmico de Direito da OAB/SP. Leonardo Raphael Carvalho de Matos Mestre em Direito pela Universidade Nove de Julho - UNINOVE; Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP; Secretário Executivo da Federação Nacional de Pós-graduandos em Direito - FEPODI (biênio 2015-2017). Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MA; Colaborador no do Programa Escola da Ciência 2014/2015 pelo Mestrado em Direito da Universidade Nove de Julho - UNINOVE; Professor da Graduação em Direito da Universidade Nove de Julho – UNINOVE. Resumo: este estudo se propõe a analisar do princípio constitucional da solidariedade aplicado àquele que ainda não existe, ou seja, às futuras gerações, dando origem ao princípio da solidariedade intergeracional e transgeracional; as indagações norteiam-se pelo instituto dos direitos humanos principalmente em seus aspectos de direitos fundamentais, entra no campo do direito consuetudinário e em conceitos referenciais de alguns pensadores; a metodologia utilizada para este estudo, é dedutiva por meio de pesquisa exploratória, qualitativa e teórica. Traça ao final, um contorno contemporâneo de solidariedade intergeracional e transgeracional, suas possibilidades e consequências diante de uma necessidade emergente de sustentabilidade global, incitando a indigência de uma solidariedade infinda. PalavRas-Chave: solidariedade futura, direitos humanos, sustentabilidade. abstRaCt: the objective of this study is to analyze the constitutional principle of solidarity applied to the future generations; the inquiries are guided by the human rights institution, primarily in their issues of fundamental rights, 23 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE penetrate in the customary law field and reference concepts from some authors. The methodology used to this study is deductive by an exploratory research, both qualitative and theoretical. At the end, this study delineate a contemporary design on intergenerational and transgenerational solidarity, its possibilities and consequences due emerging needs for global sustainability, prompting indigence to an endless solidarity. KeywoRds: future solidarity, human rights, sustainability. INTRODUÇÃO Ao acordar para a problemática da efetiva existência do “princípio da solidariedade” em seu caráter intergeracional e transgeracional identificar-se-á a emergente necessidade da cultura sustentável como projeção garantista de direitos às futuras gerações, capazes de gerar condições mínimas aos próximos 300 anos ou mais. Transformações significativas ao longo dos últimos séculos influenciaram o modo de pensar o viver e o conviver com o restante do planeta; perceber-se-á que alguns direitos de 3ª geração são desprovidos de real eficácia, sinalizando necessidade de mudanças; deste modo, caberá ao Estado de forma positivada, contribuir para a busca de novo paradigma sustentável em conjunto com os diversos stakeholders: os indivíduos, a sociedade, as empresas, as organizações sociais. Descrever aspectos contemporâneos de solidariedade intergeracional e transgeracional tem relevância neste estudo para prognosticar possibilidades e consequências relativas aos escassos recursos e a perenidade sustentável; incitando a indigência de uma solidariedade infinda. Neste estudo tratar-se-á, de forma geral, descrever como a solidariedade, enquanto dispositivo social constitucional, garantirá direitos fundamentais e recursos naturais às gerações futuras; e de maneira específica, (i) entender a solidariedade contemporânea; (ii) identificar a penetrabilidade do instituto; (iii) analisar dispositivos internacionais e constitucionais nas questões garantistas às futuras gerações. Metodologicamente é um estudo dedutivo por meio de pesquisa exploratória, qualitativa e teórica: revisão bibliográfica, observações e apreciações de políticas públicas e de organizações sociais, dos veículos de notícias e do embasamento normativo positivado; estabelecimento de recortes; organização das informações analisadas e discutidas de forma descritiva e dissertativa.. Estruturado em três partes, primeiramente abordar-se-á algumas características e entendimentos sobre solidariedade na preocupação de trazer um recorte do contexto contemporâneo a ser trabalhado neste estudo. TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 24 Por sua vez, no segundo momento, o tema posicionar-se-á no espaço tempo do ordenamento jurídico nos limites constitucional e internacional do dispositivo solidariedade, incitando o princípio constitucional e o seu grau de sua penetrabilidade no ordenamento.Em derradeiro, concatenar-se-á uma discussão entre os pontos convergentes dos direitos humanos em seus aspectos de direitos fundamentais aos da solidariedade intergeracional e transgeracional, ponderados por questionamentos e exemplificações atuais. Deste modo, ter-se-á relevância, examinar as possibilidades e consequências diante dos recursos existentes no planeta, descrever os aspectos contemporâneos sobre solidariedade que tenham como efeitos questões intergeracionais e transgeracionais, incitando posteriormente a reflexão de existência de algum tipo de solidariedade mais profunda e cogente, muito além dos pensares familiares em bisnetos e tataranetos e, que perfaz, a indigência de uma solidariedade infinda2. 1. SOLIDARIEDADE Solidariedade3 ou solidarité4, forma contrária do vocábulo egoísmo, é palavra derivada de termo latino obligatio in solidum, que seja, a obrigação na íntegra, no todo, que do direito romano compreende-se como uma obrigação comunitária ou social onde existe a indicação das responsabilidades que cada cidadão deverá ter em relação aos círculos aos quais pertence. Ainda da etimologia, Roberto Patrus (2003) em referência ao verbo solidare (consolidar, fazer sólido), conceitua que: “Exercer a solidariedade implica fazer-se parte de algo maior, com vistas a solidificar, consolidar, tornar algo sólido”. Léon Duguit (2006, p. 23) conceitua que o ideal de solidariedade foi construído partindo do pressuposto que, vivendo em sociedade, os homens precisam ser solidários entre si, seja em razão de necessidades comuns ou pela necessidade de trocar experiências em decorrência de possuírem diferentes aptidões. 2 Tipo de solidariedade com característica infinita, ou seja, que sempre se deverá economizar ao máximo, utilizar menos ou o mínimo de recursos para que outros possam também utilizá-los. Esta questão vai por vezes na contramão de outros direitos e garantias conquistados. (Nota do autor). 3 Dicionário Houaiss: [...] Compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas às outras e cada uma delas a todas; Sentimento de simpatia ou piedade pelos que sofrem; Manifestação desse sentimento, com o intuito de confortar ou ajudar; Cooperação ou assistência moral que se manifesta ou testemunha a alguém em certas circunstâncias; [...] 4 Origem francesa, “responsabilidade mútua”, cunhada em 1765, de SOLIDAIRE, “inteiro, completo, interdependente”, de SOLIDE, do Latim SOLIDUS, “firme, inteiro, sólido”. Fonte: site Origem da palavra, acessada em 09/07/2015: http://origemdapalavra.com.br/site/pergunta/ solidariedade/ 25 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE Nesta concepção pressupõem que o indivíduo solidário, no campo das virtudes, é alguém “x” que fez algo de bom a um alguém “y”, sendo este bem, algo de que “y” necessite, ou então, que “x” queira lhe oferecer. Também, pode indicar que “x” fez este algo de bem sem saber ou se importar quem será o seu beneficiado, tendo assim uma atitude solidária favor de um desconhecido. Porém, este entender solidário deve ir mais além, pois, o dispositivo social solidariedade tem atributos mais profundos, não devendo, equivocadamente, ser comparado ao dispositivo social caridade. Portanto, em linhas gerais, enquanto a caridade se propõe a sanar ou amenizar determinada situação sem o envolvimento de saber os porquês ou entender os resultados alcançados, por sua vez, a solidariedade procura sanar ou amenizar de forma comprometida, constante e eficaz, ou seja, procurando investigar os porquês, e/ou se preocupar com os resultados alcançados, e/ou dar continuidade na conduta solidária até a extinção desta necessidade, ou então, que se perda o interesse pela causa, de seu comprometimento inicial. A existência de um comprometimento maior em relação ao simples ato de se dispor de algo, de valores, de esforço físico ou de tempo para sanar ou amenizar determinada situação é o que faz da solidariedade uma ferramenta importante para a sustentabilidade do viver e do conviver com o planeta. Deste modo, solidariedade é um estágio posterior, superior, ao da caridade, é algo que nasce da vontade natural do indivíduo ou de sua percepção de carência de algo tangível para outrem, sendo este outrem um indivíduo ou uma coletividade. Afirma-se que a solidariedade é uma das características mais importantes para a evolução humana e que nos distinguiu dos outros animais. Sobre este pensamento, Otávio B. R. da Costa (2009), acompanha o entendimento de Edgar Morin ao descrever o fato em sua obra “O Método III”: [...] a solidariedade se encontra na raiz do processo de hominização. Os ancestrais hominídeos ao saírem em busca do alimento, não o consumiam individualmente, mas o traziam ao grupo para reparti- lo solidariamente. Foi à solidariedade que permitiu o salto da animalidade à humanidade [...] (MORIN, o método lll p. 32 apud COSTA, 2009, p. 153). Vera Herweg Westphal (2008, p. 44) faz a percepção que a solidariedade é uma categoria dos tempos modernos e, na sua concepção atual, surgiu no início TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 26 do século 19, como resposta às realidades decorrentes da sociedade industrial e mais adiante, sobre os diversos conceitos existentes sobre o tema constrói o seguinte entendimento: [...] nas mais diversas exposições teóricas, podem ser identificados dois aspectos comuns: a) um substrato descritivo da solidariedade, constituindo-se na idéia da relação de reciprocidade entre os membros de um grupo e b) um outro substrato, uma base normativa da solidariedade, presente no cotidiano da política, da filosofia moral e em parte também na sociologia [...] (WESTPHAL, 2008, p. 44). A ideia de dois grandes sentidos de solidariedade apontados por WESTPHAL (2008) nos mostra no contexto contemporâneo um importante norte para a questão cerne deste estudo, ou seja, como será possível garantir por intermédio da solidariedade direitos fundamentais e recursos naturais às gerações futuras. Vera Herweg Westphal (2008) sugere que um dos aspectos mais comuns seria a relação de reciprocidade de indivíduos de grupos afins, percebendo-se desta forma características inerentes aos valores humanos, morais, éticos ou por simples condicionamentos dos grupos onde os indivíduos estão inseridos, como exemplo ilustrativo, podemos citar o metrô de São Paulo em seu horário de pico, em determinado eixo onde o transporte é oferecido, as pessoas se acotovelam e demonstram um certo grau de hostilidade frente aos indivíduos próximos durante o trajeto; por sua vez, quando este mesmo público faz a transferência para outro eixo do sistema, estes mesmos indivíduos se comportam de maneira diferente, fazem filas, entram ordeiramente na composição, se tornam gentis e solidários com os demais passageiros. WESTPHAL (2008) apresenta como segundo aspecto uma abordagem normativa solidária, composta de outros agentes presentes de nosso cotidiano, neste ponto presume-se enquadrar questões como a obrigação solidária no Código Civil, que perfaz forma cogente de solidariedade, o posicionamento sociológico sobre solidariedade de Émile Durkheim. Outro exemplo, o documento assinado por senadores de 6 países com intuito solidário de garantir direitos sociais, dentre os 157 senadores que assinaram o documento estavam: Brasil (32), Chile (12), Colômbia (57), Costa Rica (25), Estados Unidos (18) e Peru (13); em síntese o documento demandava eleições livres, transparentes e democráticas na Venezuela ao presidente Nicolás Maduro, ou seja, uma tentada no âmbito da solidariedade transnacional ao povo Venezuelano. 27 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE Tendo como base as diferenças dos indivíduos, quer sejam culturais, raciais, religiosas, políticas, sociológicas, etc., surge uma dúvida:o que nos assemelha e o que nos torna diferentes? Para responder a esta questão indispensável para a compreensão do escopo de pesquisa se faz necessário refletir sobre a percepção do sociólogo Zygmunt Bauman5: [...] O aspecto em que somos semelhantes é decididamente mais significativo que o que nos separa; significativo bastante para superar o impacto das diferenças quando se trata de tomar posição. E não que “eles” sejam diferentes de nós em tudo; mas eles diferem em aspecto que é mais importante que todos os outros, importante o bastante para impedir uma posição comum e tornar improvável a solidariedade genuína, independente das semelhanças que existam. [...] (BAUMAN, 2001, p. 220). Na percepção de BAUMAN (2001) as diferenças são pontos chaves para o entendimento desta questão, pois quando é percebido estes fatores de diferença eles acabam se tornando mais importantes que as relações de semelhanças, gerando conflito e estranhamento, sendo este um ponto importante dentro do entendimento que se espera ter por solidariedade, pois nas diferenças não é possível se trabalhar ou se promover a solidariedade como dispositivo social. Portanto, não caberá tratar o tema com aspectos virtuosos, mas sim pela forma positivada. Por fim, solidariedade é algo complexo de se perceber quando é arrazoada pelo segundo aspecto, que seja, pela legiferação de normas, existindo portanto forma distinta daquela comumente entendida como valores inerentes aos indivíduos ou grupos sociais. 1.1 SOLIDARIEDADE MECÂNICA E ORGÂNICA Émile Durkheim6 em seus estudos sobre a divisão do trabalho social propõe para entender a sociedade complexa a sua divisão a partir do trabalho, sugerindo a lei superior das sociedades humanas e a condição do progresso. Estes estudos vislumbram uma solidariedade nascente do indivíduo e outra que nasce da coletividade e a forma como elas interagem e se relacionam 5 Bauman utiliza o termo “nós” para as pessoas que são iguais a nós e “eles” as pessoas diferentes de nós. 6 Sociólogo francês (1858-1917), responsável por tornar a sociologia uma ciência social e disciplina acadêmica; suas obras: Da divisão do trabalho social, 1893; Regras do método sociológico, 1895; O suicídio, 1897; Sociedade e trabalho, 1907; As formas elementares de vida religiosa, 1912. TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 28 com os indivíduos e com a coletividade dará existência a outras duas espécies de solidariedade a mecânica e a orgânica. A solidariedade mecânica, aquela percebida nas relações de semelhança entre os indivíduos em sua forma mais primitiva e generalista, a exemplo da família, dos costumes, da religião, das tradições, ou então, onde existir relacionamentos sociais formadores de algum tipo de vínculo que interfira na conduta humana. O exemplo corriqueiro de solidariedade mecânica é compará-lo a uma máquina, um relógio, algo que possua engrenagens onde, cada indivíduo corresponde a uma destas engrenagens funcionando perfeitamente, trabalhando sincronizados, sempre da mesma maneira, assim, quando uma desta engrenagens falha ou se quebra, esta será substituída e tudo voltará a ser como sempre foi. Por sua vez, a solidariedade orgânica, é baseada nas diferenciações que existem entre os indivíduos, principalmente na divisão social do trabalho, ou seja, são gerados vínculos hierárquicos e destes, uma existência de interdependência, o reconhecimento da importância de todos na cadeia social. Um dos exemplos mais comuns é um organismo vivo, um corpo humano7, onde cada indivíduo, dentro da questão do trabalho, ocupará a função de um órgão ou membro deste corpo funcionando cada qual para a sua finalidade, porém, mesmo que cada uma destas partes falhe ou execute novas funções (dentro dos seus limites) o todo continuará funcionando e se adaptando. Deste modo, para existência de harmonia na complexidade social, haverá a predominância da solidariedade orgânica, garantidora da coesão social, que por sua vez não estará determinada por valores sociais, religiosos, costumes ou tradições, ela estará baseada no ordenamento jurídico, ou seja, nas normas e regras que estabelecem a maneira como se deverá agir, os direitos e seus deveres enquanto indivíduos de uma coletividade. A conduta humana. Nota-se que ao refletir sobre a existência de um pensamento solidário intergeracional em Durkheim (1977), na solidariedade mecânica, percebe-se que questões valorativas provenientes da religião, costumes ou valores sociais podem talvez não garantir um pensamento altruísta massificado, talvez elevando o resultado pretendido a uma esfera de saberes duvidosos, questionáveis e frágeis. Contudo, de forma orgânica, ou seja, por meio da solidariedade positivada nas normas, ser possível garantir recursos às futuras gerações, a exemplo da Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e da Lei nº 9.605/98 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, 7 Alguns sociólogos utilizaram os conceitos das ciências biológicas, para compreender as sociedades complexas, entre estes podemos destacar Humberto Maturana, Francisco Varela, Niklas Luhmann, Émile Durkhaim, Edgar Morin, entre outros. 29 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE ou seja, determinar a necessidade de ser solidário e punir aqueles que não tem postura solidária de preservação. Deste modo, é possível entender porque a expressão: futuras gerações, é referida em tratados e declarações internacionais e na própria Constituição Federal, logo, a sua positivação é preceito fundamental para que o fator solidariedade seja pensado mais além do que as garantias de sobrevivência dos filhos, netos e bisnetos. 2. OS LIMITES CONSTITUCIONAL E INTERNACIONAL DA SOLIDARIEDADE O princípio da solidariedade é uma positivação do direito natural e costumeiro, que na Constituição Federal de 1988 é expresso por meio do artigo 3º, constituindo objetivo fundamental da República, conforme Paulo Sergio Rosso (2008) “o princípio encontra-se tacitamente presente em toda a Constituição8, servindo não apenas como mecanismo de interpretação ou reafirmação de outros princípios, mas também como fundamento da própria ordem constitucional”. Ives Grandra da Silva Martins (2005) em suas considerações sobre a ineficácia do governo no que tange a solidariedade, indica o abrandamento de parte desta tarefa pelas ONGs, onde o cidadão interage de forma solidária, realizando mais trabalho social que o governo. Seguindo a mesma linha de raciocínio da solidariedade orgânica, este é positivado quando na contrapartida o Governo oferta incentivos tributários para o indivíduo ou organização social que pratica a solidariedade, assim: Como benefício, vocês terão a imunidade tributária. Vocês trabalharão para a sociedade, preencherão o vácuo do Estado, fortalecendo a democracia e ajudando a criar uma sociedade livre, justa e solidária. Por essa razão, vocês são imunes de tributos. (MARTINS, 2005). 2.1 A SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL E TRANSGERACIONAL E A SUSTENTABILIDADE A questão garantista de direitos às futuras gerações prevista no artigo 2259 da Constituição Federal de 1988 demanda solitária de cunho ambiental e sustentável, é o mecanismo pelo qual é tutelado um mínimo de recursos naturais ao indivíduo que ainda não existe. Nesta visão constitucional, deverá existir, em tempo futuro, um meio ambiente ecologicamente equilibrado e sustentável para 8 Exemplificação: artigos 40, 194, 195, 196, 203, 227, e 230 (ROSSO, 2008) 9 Todos têm direito ao meio Ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentese futuras gerações. (grifo nosso) TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 30 garantir a sobrevivência dos que virão, uma percepção solidária axiológica em relação a dignidade humana daqueles que ainda não existem. Nesta mesma corrente de pensamento Andreas Joachim Krell, (CANOTILHO, MENDES, et al., 2013), faz comentários ao Art. 225 da Constituição Brasileira, alertando o constituinte e o legislador do cuidado que devem ter com o tema: A consagração de um direito fundamental ao meio ambiente na Constituição do País significa uma importante decisão axiológica em favor de um bem imaterial, [...] Tornam-se imprescindíveis também profundas alterações no uso dos instrumentos normativos e administrativos bem como nas próprias atitudes de compreensão dos conflitos envolvidos, a partir da perspectiva de solidariedade (benefício e responsabilidades comuns).10 A visão de sustentabilidade e preservação do ecossistema terrestre, já era preocupação mundial desde a Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano11, na década de 70, onde destaca-se os princípios 1, 2 e 5, que estabelecem uma série de preocupações inerentes ao meio ambiente, por parte dos países membros da ONU - Organização das Nações Unidas: Princípio 1 - O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar e é portador solene de obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente, para as gerações presentes e futuras. [...] Princípio 2 - Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das gerações atuais 10 O autor faz referência ao termo - benefício e responsabilidades comuns – de autoria de Patryck de Araújo Ayala no artigo: O novo paradigma constitucional e a jurisprudência ambiental no brasil. In. CANOTILHO, J. J. G.; LEITE, J. R. M. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2007, p. 363-402. 11 Declaração publicada pela Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre o meio ambiente humano, realizada em Estocolmo de 5 a 16 de junho de 1972. 31 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou administração adequada. Princípio 5 - Os recursos não renováveis da Terra devem ser utilizados de forma a evitar o perigo do seu esgotamento futuro e a assegurar que toda a humanidade participe dos benefícios de tal uso. (grifo nosso). No sentido contrário deste pensamento verifica-se o desenvolvimento tecnológico e o consumo desenfreado da população mundial, principalmente dos países mais ricos e desenvolvidos atestando a impotência das observações estipuladas no Tratado de Estocolmo. Independente da forma como cada nação se organiza e estabelece suas estratégias, nota-se que o sistema econômico capitalista, em sua corrida para o desenvolvimento, não procurou no passado concatenar suas ações com elementos como a sustentabilidade e por consequência a solidariedade. Ademais, organizações ambientalistas e de preservação como o Greenpeace12 e a WWF13 e tornaram públicas questões importantes sobre o planeta reservado ao futuro, a exemplo disso, o Greenpeace em diligência na floresta amazônica aponta como são retiradas a madeira na região do Pará: A investigação revelou que o descontrole no setor é tão grande que nem o documento oficial é capaz de garantir a origem legal da madeira. E que o trânsito de caminhões carregados de toras trazidas de áreas sem manejo florestal até as serrarias é completamente livre. (GREENPEACE, 2014, p.4). Pelo Fundo Mundial para a Natureza, WWF Brasil (2010), nas percepções de como anda a saúde do planeta, de acordo com seu relatório, Planeta Vivo de 2010, estudos da Organização das Nações Unidas apresentava projeções de que até 2030 a humanidade precisaria da capacidade de dois planetas Terra para absorver os resíduos de CO2 tendo como fatores: o consumo, o crescimento populacional global e o aumento climático. Ainda, no sumário executivo do relatório Planeta Vivo de 2014 foram publicadas considerações 12 O Greenpeace é uma organização global cuja missão é proteger o meio ambiente, promover a paz e inspirar mudanças de atitudes que garantam um futuro mais verde e limpo para esta e para as futuras gerações. (grifo nosso) 13 World Wide Fund for Nature (Fundo Mundial para a Natureza), no Brasil é uma organização não-governamental dedicada à conservação da natureza com os objetivos de harmonizar a atividade humana com a conservação da biodiversidade e promover o uso racional dos recursos naturais em benefício dos cidadãos de hoje e das futuras gerações. (grifo nosso) TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 32 sobre o planeta, contendo entre os seus dados a pegada ecológica14: Há mais de 40 anos, a demanda da humanidade sobre a Natureza ultrapassa a capacidade de reposição do planeta. Seria necessária a capacidade regenerativa de 1,5 Terras para fornecer os serviços ecológicos que usamos atualmente. Esta “sobrecarga ocorre porque nós cortamos as árvores mais rápido do que elas são capazes de crescer e florescer; nós pescamos mais peixes do que os oceanos podem repor e nós emitimos mais carbono do que as florestas e oceanos podem absorver. (WWF, 2014, p. 10) (grifo nosso). 3. OS DIREITOS HUMANOS E A SOLIDARIEDADE A maneira como a coletividade emprega o dispositivo solidariedade em suas ações cotidianas pode dar algumas pistas de como ela é exercida, exemplo: a 20 anos ou mais era comum qualquer indivíduo ao presenciar um cidadão idoso, abdicar seu lugar em um assento público; na atualidade, são necessárias dezenas de placas informativas e de sinalização para garantir a dignidade humana necessária aos idosos em seus direitos mais simples15. O indivíduo não tem a percepção clara em seus direitos e deveres o que é boa ação e o que é boa educação. O indivíduo deve ser estimulado e motivado ao exercício de um papel solidário, e assim, conhecer a realidade alheia evitando que padeça num estado de natureza hobbesiano16. Na pesquisa do World Giving Index 2014 divulgada pelo IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social17, pesquisa esta que estabelece o ranking mundial dos países mais solidários, o Brasil está estampado na 90ª posição. Segundo o Instituto, “os dados mostram que 22% dos brasileiros entrevistados afirmaram ter doado dinheiro para organizações da sociedade civil, 40% ajudaram desconhecidos e 16% fizeram algum tipo de trabalho voluntario”. (IDIS, 2014). 14 A Pegada Ecológica mede a quantidade de terra biologicamente produtiva (ou biocapacidade) necessária para prestar os serviços ou gerar produtos que usamos: áreas de cultivo, pastagens, áreas urbanizadas, estoques pesqueiros e produtos florestais. Também inclui a pegada de carbono, que é a quantidade de floresta necessária para absorver as emissões adicionais de dióxido de carbono que os oceanos não conseguem absorver. (WWF, 2014, p.10) 15 Este tipo de questão já havia sido consolidada no direito consuetudinário, mas que na atualidade parece dar novo viés paradigmático. 16 A guerra de todos contra todos. 17 IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, fonte: http://idis.org.br/world- giving-index-brasil-sobe-uma-posicao-em-ranking-global-de-doacoes/, acesso em 15/07/2015. 33 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE Estados Unidos e Mianmar18 compartilham o primeiro lugar no ranking do World Giving Index, mas a liderança de Mianmar se deve principalmente a uma incidência muito alta de doações de dinheiro. Nove em cada dez pessoasem Mianmar seguem a escola Theravada de budismo, com uma forte cultura de solidariedade, o que contribui para que o país esteja na primeira posição em doação de dinheiro, conforme fonte do instituto IDIS. Tomando como base Mianmar, outras duas aparentes mostras de direitos humanos com viés de solidariedade, recortadas do portal de notícias G1 (2015), podem ser analisadas: o primeiro recorte19, junho/2015, apresenta uma forma negativa de solidariedade, onde um grupo de 608 homens, 74 mulheres e 45 crianças migrantes que desembarcou na costa ocidental de Mianmar junto à fronteira com Bangladesh. Mianmar tenta então deportá-los para o país vizinho e afirma que não são da etnia rohingya e sim migrantes originários de Bangladesh, gerando grande confusão entre os dois países. Os rohingyas são apátridas de origem muçulmana vítimas de discriminação em Mianmar, não têm acesso à educação e à saúde e o país nega-se a reconhecê-los como cidadãos. O presidente norte-americano, Barack Obama, também colaborou nas tratativas de negociações solicitando que Mianmar acabasse com a discriminação à etnia rohingya e a reconhecer seu êxodo. O segundo recorte20, julho/2015 (G1), expõe um governo mais humanitário, onde o presidente de Mianmar, Thein Sein, concedeu a graça presidencial do indulto a 6.966 prisioneiros daquele país com intento de uma motivação humanitária e objetivo de uma reconciliação nacional, o fato coincidiu com uma festa religiosa budista e indiretamente como pré-campanha das eleições gerais previstas para novembro. Entre os prisioneiros 155 chineses condenados à prisão perpétua por exploração madeireira ilegal e tráfico de madeira, presos a apenas uma semana. Solidariedade ou oportunismo? Deduz-se nestes recortes que os contextos culturais, sociais, ideológicos e políticos consuetudinários influenciem questões como a solidariedade, visto que, ao mesmo passo que o indivíduo doa com uma das mãos, com a outra a fecha para uma etnia não reconhecida dentro de seu próprio país. Por outro lado, também observa-se interesses políticos travestidos de ações solidárias voltados para o relacionamento político interno e externo, pois, 18 Mianmar ou Birmânia, capital Naypyidaw, língua Birmanês, tornou-se independente do Reino Unido em 04/01/1948, situada ao sul do continente asiático, IDH 0,524 (150.º), República Presidencialista. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Myanmar. Acessada em 30/07/2015. 19 http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/06/mais-de-700-imigrantes-desembarcam-no-norte -de-mianmar.html - Acessado em 30/07/2105. 20 http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/07/mianmar-liberta-milhares-de-prisioneiros- incluindo-estrangeiros. html - Acessado em 30/07/2105. TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE 34 a despeito dos trabalhadores chineses presos, vale destacar que na atualidade a China é um dos maiores investidores naquela região. Percebe-se uma solidariedade condicionada e seletiva, ou seja, notada quando o ato solidário envolve ou não um parente, um amigo, uma comunidade próxima, ou os interesses pessoais ou coletivos, ou ainda que tenha um certo grau de afinidade ou de repulsa sobre o assunto. Decodifica-se os recortes em Durkheim, percebe-se que a solidariedade motivada por elementos virtuosos e morais é determinada por elementos sociais mecânicos, principalmente pelo budismo ou ainda de reflexos mecânicos da cultura Estatal condicionada por décadas, gerando um conformismo natural. Por sua vez, a solidariedade positivada organicamente pelo Estado seja por norma motivadora ou norma cogente: esta nas questões que envolvem todas as dimensões dos bens de posse ou propriedade individual, ou seja, a motivação Estatal do dar ou do dividir, e dos bens coletivos de tutela Estatal, a exemplo dos recursos naturais e aqueles destinados ao povo que também são repassados solidariamente a outros como a saúde, segurança, educação, alimentação, entre outros; e aquela todos os regramentos das campanhas sociais Estatais, dos fundos de solidariedade e das leis de protetivas sociais e ao meio ambiente, como é o caso dos chineses presos pelo corte ilegal de árvores. CONCLUSÃO Diante das análises, observou-se historicamente, a existência de uma real intensificação de medidas para garantir não só a manutenção da vida contemporânea como também para as próximas gerações, entretanto, notou-se que o dispositivo social solidariedade com caráter de intergeracionalidade e transgeracionalidade é ainda algo intangível na compreensão humana. Em outra perspectiva, os avanços tecnológicos e científicos que deram margem para um ser humano mais racionalizado e conhecedor da dimensão de seus impactos sobre o planeta, o que colabora para a percepção da melhoraria na forma de como vivemos e convivemos com o meio ambiente, bem como na forma como interagimos com os escassos recursos que ainda restam no planeta, questionou, por diversas vezes nesta pesquisa, se estamos vivendo e utilizando o planeta de maneira assertiva. É por meio da solidariedade que parte da população mundial raciona, preserva e reciclam seus recursos, gerenciando desta forma sua produção e bens que ainda dispõe, ao passo que, outras culturas e indivíduos degradam sem limitações e precedentes com a finalidade de acumular riquezas e garantir o seu abstrato direito conforto, liberdade e livre arbítrio. A pesquisa expôs a complexidade do tema solidariedade, bem como a necessidade de mudança na forma de como o indivíduo e a sociedade envolvem- se dentro de cada situação cotidiana demonstrando seu papel solidário. 35 TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE DIREITO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE E neste sentido, ao mesmo passo que abrir diálogos para a legiferação de normas tanto motivadoras como cogentes nas questões de direitos humanos fundamentais atreladas ao fator solidariedade intergeracional e transgeracional, com viés a uma solidificação cultural de racionamento infindo de recursos, se tornam imprescindíveis. Notou-se em diversas situações que é esta solidariedade cogente positivada a grande força constitucional, capaz de garantir recursos as próximas gerações, apta a motivar, mobilizar e induzir pela moralidade cogente Estatal o mínimo existencial. Assim sendo, a visão de solidariedade é algo bem estabelecido e percebido nos núcleos familiares e nos grupos conectados por afinidade ou interesses, especialmente dentro de uma mesma cultura ou país, tornou- se portanto, a solidariedade uma especificação de ordem nacional, ou seja, delimitada aos seus nacionais. Deste modo, dificuldades maiores surgiram nas relações intercontinentais e nas fronteiras de cada país ou território, cabendo à Organização das Nações Unidas intermediar diplomaticamente as relações e conflitos mundiais, pelo bom senso e respeitando as questões culturais e soberanas de cada Estado envolvido, clareando assim, uma forma de utilização do dispositivo solidariedade como forma de garantir a paz mundial e a cooperação dos países membros. Nesta conjectura mundial, outra forma de sopesar a penetrabilidade e aderência deste dispositivo, que seja social ou positivado, em relação às diferentes nações, destacou-se a análise do equilíbrio da desigualdade social nas ajudas humanitárias, nas guerras, nos desastres naturais, nas questões inerentes a fome, a saúde, aos refugiados e na assistência aos países mais pobres. Ademais, percebeu-se que enquanto o homem viver em sociedade ele será capaz de pensar o coletivo, incorporar o ser solidário e se portar segundo o pensamento da massa social coletiva. Antagonicamente, a individualização poderá ser uma das maiores geradoras do desperdício em razão da falsa ideia de bem-estar social individualizado, visto que nem sempre os seus direitos e deveres serão exclusivamente seus, mais sim o reflexo de direitos
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