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Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 261 O “descaso” com o Patrimônio Histórico São-borjense: Educação Patrimonial em sala de aula. Júlio Ricardo Quevedo dos Santos * Márcia Cristina Cabreira Rodrigues ** Resumo: O Presente trabalho visa mostrar, através de um fato acontecido no município de São Borja, Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, onde um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus queimou duas estátuas do Período Missioneiro, uma parcialmente e outra totalmente, inventariadas pelo IPHAN, em ritual de cura, para a “libertação espiritual” do fiel depositário, o senhor Leôncio Ayala Chagas, que estava com câncer, e veio a falecer dois dias depois do “ritual de cura” [julho de 2007] realizado pelo pastor Fábio Guimarães da Silva Pereira. Grande parte do passado histórico de inúmeros municípios, em todo o Brasil imagens, documentos são perdidos ou destruídos devido ao “descaso” por parte da população que não tem sentimento de pertença com um determinado patrimônio. No entanto, quando o “descaso” se torna depredação ou destruição consciente, temos um crime em ação. Crime este, que é visto como algo corriqueiro, como se fosse comum queimar livros manuscritos de Primeiras edições de grandes obras, ou vê-los sendo destruídos lentamente pelas traças ou pela umidade; ou mesmo queimar uma imagem religiosa de origem católica, para tentar em um ritual de outra fé, salvar a alma do dono da imagem. Para tanto faremos uma análise, voltada para ao aspectos cultural e histórico, sobre como os estudantes tratam seu Patrimônio Histórico e Cultural missioneiro são-borjense, que lamentavelmente muitas vezes lhes é indiferente. Problematizando-se que, a partir da Educação Patrimonial é uma possibilidade de reavaliar as posições frente ao acervo, os fragmentos do passado que estão vivos na comunidade local e nas comunidades escolares. A partir desta questão, voltaremos o nosso foco para a sala de aula como um espaço privilegiado de discussão sobre o patrimônio missioneiro, sua preservação e valorização.Para tanto, teremos como objetivo geral: Analisar, sob o ponto de vista histórico e cultural, as possibilidades de preservação e valorização do patrimônio missioneiro a partir de uma consciência histórica construída no espaço escolar, para então se contrapor aos motivos que levaram a estátua de origem missioneira, ter sido queimada. * Professor do Departamento de História da UFSM, Doutor em História Social pela USP. ** Professora municipal da EMEF Ivaí, São Borja-RS. Acadêmica do Curso de História, Primeira Licenciatura Programa Nacional de Formação de Professores do Ensino Fundamental (PARFOR/UFSM) – Bolsista PROLICEN Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 262 Mesmo com esse título de “Berço Missioneiro”, constatamos através de pesquisas e também com a leitura dos primeiros questionários, que o município não é visto assim, pela maioria da população e particularmente pelos professores das redes Municipal, Estadual e Particular, pois, como foi já convencionado há décadas, São Borja é o “Berço dos Presidentes” convenção esta que não queremos de modo algum que desapareça, porém, queremos ressaltar que antes dos dois Presidentes fazerem história Nacional, São Borja como foco de História Regional Missioneira, é ainda mais rica. Palavras-chave: Educação Patrimonial – Patrimônio Cultural Missioneiro – História Regional – História de São Borja – Ensino de História Abstract: The present work aims to show, by something that happened in São Borja, Border West of Rio Grande do Sul, where a pastor of the Universal Church of the Kingdom of God burned Period Missioneiro two statues, one partially and one fully inventoried by IPHAN in healing ritual for the "spiritual liberation" of the trustee, Mr. Leoncio Ayala Chagas, who had cancer, and died two days after the "healing ritual" [July 2007] conducted by Pastor Fabio Guimarães Pereira da Silva. Much of the historical past of numerous municipalities throughout Brazil pictures, documents are lost or destroyed due to "negligence" on the part of the population that has no sense of belonging to a particular asset. However, when the "neglect" becomes vandalism or willful destruction, we have a crime in action. This crime, which is seen as something normal, like ordinary burning books manuscripts First editions of major works, or see them being slowly destroyed by moths or the humidity, or even burn an image of religious Catholic origin, to try to a ritual of another faith, save the soul of the owner of the image. For this analysis we will, facing the cultural and historical aspects on how students treat their Historical and Cultural Heritage are missionary são-borjense, which unfortunately often they are indifferent. Questioning that, from the Heritage Education is a chance to reassess positions ahead of the collection, the fragments of the past that are living in the local community and the school communities. From this point, turn our focus to the classroom as a privileged space for discussion about the missionary heritage, its preservation and valorization. Para either, we generally aim: to analyze, from the point of view of history and culture, the possibilities for preservation and enhancement of heritage missionary from a historical consciousness built in the school, so to counteract the reasons why the statue of missionary origin, have been burnt. Even with this title "Cradle Missioneiro", found through research and with the reading of the first questionnaire, the municipality is not so regarded by Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 263 the majority of the population and particularly by teachers in the municipal, state and private, for as has already been agreed for decades, São Borja is the "Cradle of Presidents" this convention we do not want in any way to disappear, however, want to point out that before the two Presidents make history National, São Borja focused history Regional Missioner, is still richer. Keywords: Heritage Education - Cultural Heritage Missioneiro - Regional History - History of São Borja - teaching of history, “Libertação Espiritual”: a queima de imagens missioneiras Tudo começou em 2007. A família Ayala Chagas possuía um acervo de 21 peças, sendo 8 destas do período reducional em uma pequena capela de chão batido na periferia do município de São Borja, Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. Conforme Rodrigues (2011), essas peças foram inventariadas pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e forma recebidas como doações, após 8 meses de tratativas. Quando as peças foram para o museu, a senhora Oraides Ayala Chagas, expôs que duas imagens, que foram levadas pelo Pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, para serem queimadas em um culto, um São Pedro1, e um Senhor Morto2, este último restou apenas o tronco intacto, o São Pedro não foi localizado possivelmente ter sido queimado. A queima das imagens, segundo as próprias palavras do pastor Fábio Guimarães da Silva Pereira, para o Jornal “A Folha de São Borja”, em 02/09/2007, formam colocadas assim: “a queima de imagem é uma prática habitual. [...] buscamos, com isso, promover a libertação espiritual”. Essa libertação espiritual seria do senhor Leôncio Ayala Chagas, esposo de dona Oraides que sofria de câncer. A referida senhora recorreu às orações do pastor Fábio, que exigiu a queima das imagens em troca dasmesmas. Esse fato, ainda segundo Rodrigues (2011), resultou em um processo3, na comarca local, tendo como réu o pastor Fábio. Após a busca e apreensão no Templo da Igreja Universal em São Borja, foi recuperado parte do tronco do Senhor Morto, comprovando assim a queima em culto na Igreja. Como o objetivo da ação era buscava recuperar e alcançar a preservação do patrimônio histórico/cultural, foi dada por encerrada a ação em 1ª instância, 1 Inventário nº RS/91-0001-0052 no IPHAN. 2 Inventário nº RS/91-0001-0053 no IPHAN. 3 Processo nº 030/1.07.0004052-1. Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 264 restando ao Pastor o pagamento das custas no valor de R$ 96,12 (Noventa e seis reais com doze centavos), o Ministério Público recorreu e a ação tramita em instância superior. No entanto, um dos desdobramentos pouco evidenciado é que, além da queima total de uma imagem e parcial da outra, a “libertação espiritual” do senhor Leôncio Ayala Chagas, não se efetivou como a família desejava, pois para a consternação de todos ele faleceu dois dias depois, do “ritual de cura’ do pastor Fábio. Então, começaram a acontecer os seguintes questionamentos: Por que as pessoas tratam com tanto descaso seu Patrimônio Histórico e Cultural? Por que as imagens foram queimadas? As pessoas que participaram dessa ato tinham consciência de sua importância histórica para a preservação da memória de todo uma população? Onde se encontra a imagem que foi salva? Esse acontecimento causou algum impacto na população em geral? Ele serviu para que as pessoas dessem mais valor ao seu Patrimônio Histórico? Os questionamentos acima, serão respondidos na medida do possível e com total imparcialidade. A partir desta questão, voltaremos o nosso foco para a sala de aula como um espaço privilegiado de discussão sobre o patrimônio missioneiro, sua preservação e valorização. Para tanto, teremos como objetivo geral: Analisar, sob o ponto de vista histórico e cultural, as possibilidades de preservação e valorização do patrimônio missioneiro a partir de uma consciência histórica construída no espaço escolar, para então se contrapor aos motivos que levaram a estátua de origem missioneira, ter sido queimada. Os nossos objetivos específicos partimos da compreensão de Vera Lúcia Maciel Barroso quando infere a “Educação Patrimonial como busca de entedimento de pertença/de protagonista da História”,4 já que esta questão em relação ao patrimônio missioneiro do passado jesuítico-guarani são borjense, na maioria das vezes não é pensado, nem debatido. No atual momento estamos pesquisando a prática pedagógica de algumas docentes, utilizando uma amostragem, onde averiguou-se que não há um debate qualitativo sobre o patrimônio cultural e histórico de São Borja, evidenciando nos resultados parciais que ocorre um certo grau de banalização sobre as discussões propostas. Assim, construímos os nossos objetivos especificos que partem da discussão sobre o sentido da Educação Patrimonial na práxis escolar; para tanto tratamos de reconhecer, preservar e valorizar o patrimônio missioneiro são- borjense; conhecer as razões da queima da estátua missioneira; saber onde se encontra a 4 BARROSO, Vera Lúcia Maciel. Educação Patrimonial e Ensino de História: registros, vivências e proposições. In: BARROSO, V.L.M et al [orgs] Ensino de História – Desafios Contemporâneos. Porto Alegre : EST, 2010. p. 22. Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 265 imagem; analisar a situação que gerou esse “descaso” com o Patrimônio Histórico; incentivar os estudantes a formularem uma política de preservação do patrimônio cultural são-borjense, respeitando-o e considerando-o importante em suas vidas. O Patrimônio Histórico e Cultural Missioneiro São-borjense: o “descaso” Grande parte do passado histórico de inúmeros municípios, em todo o Brasil imagens, documentos são perdidos ou destruídos devido ao “descaso”5, ao desinteresse evidente de determinados grupos sociais, que não compreendem algum patrimônio como representativo ou expressivo do seu passado, muito menos se vinculam ao passado histórico em que um determinado patrimônio foi construído como seu, portanto, mantém uma relação de indiferença para com aquele patrimônio. Nesse caso, tem-se percebido um grande descaso com o patrimônio cultural missioneiro do passado jesuítico-guarani são-borjense, como vamos abordar ao longo desta exposição. Compreendemos que este passado diz respeito aos acontecimentos cotidianos do povoado missioneiro de São Borja – uma das Missões Jesuíticas da Província do Paraguai – que prosperou e sedimentou uma experiência de êxito socioeconômico, cultural e político, fundado em 1682, considerado o “Primeiro dos Sete Povos Missioneiros”, cujos protagonistas foram os grupos de GUARANI que viviam às margens do rio Uruguai muito antes da chegada dos jesuítas. Na São Borja missioneira os GUARANI desenvolveram suas lavouras para alimentação e de erva-mate para o comércio, cuidaram do gado, exercitaram a prática política em seus conselhos políticos comunitários – os cabildos – e expressaram o seu cotidiano através da religião e da arte, construindo um expressivo patrimônio cultural, cujos vestígios chegam à atualidade embelezando acervos de instituições contemporâneas. Na São Borja moderna encontramos os denominados três “modos de acesso” ao passado os quais mais contribuem à consciência do patrimônio nas sociedades modernas. Esses “modos de acesso” são estipulados por Susan Davis, quando esclarece a relação entre história e patrimônio, quais sejam: memória, história e “relíquias”6, cujas expressões são os fragmentos, os vestígios encontrados da arte guarani-missioneira são-borjense. Ou seja, os poucos exemplares que compõem alguns acervos particulares na cidade e no Museu e 5 A palavra descaso, colocada entre aspas se deve a querer também ser usado como sinônimo de ignorância, ou seja, quando as pessoas ignoram a importância de peças históricas que tem em mãos e as tratam muitas vezes como lixo (no caso de estatuas e obras de arte) ou entulhos (no caso de livros ou documento). 6 As relíquias são concebidas como: “resquícios físicos sobreviventes de todos os tipos (construções, artefatos e coisas do tipo), sempre geram uma resposta emocional, seja favorável ou desfavorável,” segundo DAVIS, S. História e Patrimônio. In: LAMBERT, P. e SCHOFIELD, P. (orgs.) História: introdução ao ensino e à prática. Tradução R.C. Costa. Porto Alegre : Penso, 2011. p 320 Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 266 Biblioteca Municipal Apparício Silva Rillo. Ou ainda o que restou do altar da igreja da antiga redução, o único na região que contém elementos de entalhe barroco, remanescente da época reducional, tombado pelo IPHAN, que está na Igreja Nossa Senhora da Conceição, conhecida popularmente como Igreja do Passo, um dos bairros da cidade. Esses exemplares que sobreviveram ao tempo e a ganância das sociedades do passado que nem sempre preservaram, conservaram e valorizaram, como explica Roselene Moreira Gomes Pommer: “quando nos reportamos ao município de São Borja, que também compôs no período colonial de domínio espanhol, o espaço de ações reducionais jesuíticas sobre as parcialidades guaranis, não percebemos a comunidade negociando com as referências deste passado.”7 O fato da comunidade não negociareste passado tem ocasionado o desconhecimento e o não reconhecimento da importância do patrimônio cultural missioneiro para a sociedade são-borjense, cuja inflexão maior é o descaso. No entanto, Pommer também reconhece que a população são-borjense, os poderes públicos, as organizações – entre elas a mídia e o seu poder de influência – acabou acionando politicamente a identidade fronteiriça e acabou “se particularizando em nível estadual e nacional, como região de fronteira, onde o outro, na maior parte das vezes construído sob a idéia de inimigo, que a história diz ter invadido o Rio Grande do Sul entrando por São Borja, estava do outro lado do rio Uruguai. Por isso era aí que deveriam estar concentradas as forças repressivas a esse “outro” definido como inimigo. Quaisquer forças, política ou militar, que fossem capazes de reprimir ações materiais e/ou imateriais que pudessem colocar em risco o projeto de integração nacional defendido”8 pelo regime civil-militar durante 1964-1985. Dessa forma, quando propomos ações de Educação Patrimonial estamos almejando um exercício de leitura do mundo e de suas contradições, reconhecendo os silenciamentos, os esquecimentos, as exclusões, pertinentes à composição da memória e da história. É preciso “escovar a história a contrapelo” como alertou Walter Benjamin9 e, portanto, hermeneuticamente desconfiar das narrativas sobre o passado, para então produzir uma outra narrativa histórica que reconheça outros signos do passado. Diante desses argumentos, construímos a nossa premissa a partir do entendimento da importância da Educação Patrimonial como ferramenta de construção da consciência crítica e 7 POMMER, R.M.G. O Missioneirismo da “Terra dos Presidentes”. In: CHAMORRO, G., GONÇALVES, C.B. e KNAPP, C. Anais 13. Jornadas Internacionais sobre as Missões Jesuíticas – fronteiras e identidades: povos indígenas e missões religiosas. Dourados, MS : Universidade Federal de Grande Dourados, 2010. 8 Ib. idem. 9 BENJAMIN, W. Sobre o conceito de História. In: Magia e Técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Tradução Sérgio Rouanet. 7 ed. São Paulo : Brasiliense, 1996. p. 225 Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 267 de entendimento de pertença da História, conforme a abordagem de Vera Lúcia Maciel Barroso10. Nesse sentido, compreendemos a necessidade desta ferramenta para contribuir na revitalização dos vínculos do tempo presente com o passado histórico, buscando nos vestígios culturais de origem missioneira são-borjense os resíduos possíveis reconstruídos e ressignificados, que possam fortalecer a memória social e a memória coletiva. No entanto, não podemos deixar de mencionar que quando o “descaso” se torna depredação ou destruição consciente, temos um crime em ação. Crime este, que é visto como algo corriqueiro, como se fosse comum queimar livros manuscritos de primeiras edições de grandes obras, ou vê-los sendo destruídos lentamente pelas traças ou pela umidade; ou mesmo queimar uma imagem religiosa de origem católica, para tentar em um ritual de outra fé, salvar a alma do dono da imagem. É necessária uma Educação Patrimonial que supere o “descaso” com as relíquias, história e memória do passado missioneiro jesuítico-guarani, reconhecendo- o como importante e significativo nas construções da identidade missioneira, levando em conta outras disputas identitárias que formatam o são-borjense moderno. Mas uma Educação Patrimonial requer método, por isso sugerimos a orientação metodológica de Almir Félix Batista de Oliveira11 que nos apresenta quatro etapas: observação, registro, exploração e apropriação. Trata-se de um itinerário de reconhecimento e valorização do patrimônio que inicia no espaço da sala de aula, que percorre um caminho que vai da observação do objeto até a apropriação, ou seja, a valorização do bem cultural propriamente dito. No atual momento de nossa pesquisa educacional estamos observando como os docentes das redes escolares são-borjenses tratam desta questão no espaço escolar, as nossas primeiras constatações confirmam a tese de Roselene Pommer. Ou seja, as comunidades escolares tendem a valorizar São Borja como cidade de fronteira e “terra dos presidentes” em detrimento da sua origem missioneira. Isto é, até agora nenhum entrevistado apontou que São Borja foi à primeira cidade fundada no Rio Grande do Sul, remetendo ao tempo das Missões Jesuítico-guaranis. Como já abordamos o que nos moveu pensar a pesquisa e esta comunicação foi o episódio de julho 2007 de total destruição, descaso, desinteresse pelas relíquias missioneiras, a partir dessa constatação, construímos a premissa que requer a necessidade de uma adoção 10 BARROSO, Vera Lúcia Maciel. Educação Patrimonial e Ensino de História: registros, vivências e proposições. In: BARROSO, V.L.M et al [orgs] Ensino de História – Desafios Contemporâneos. Porto Alegre : EST, 2010. p. 22. 11 OLIVEIRA, A.F.B. Patrimônio, Memória e Ensino de História. In: OLIVEIRA, M.D., CAINELLI, M.R., OLIVEIRA, A.F.B. (orgs.) Ensino de História: múltiplos ensinos em múltiplos espaços. Natal, RN : EDFURN, 2008. p. 97 Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 268 urgente de Educação Patrimonial que preserve os vestígios, os signos, as relíquias, enfim, os diversos patrimônios culturais são-borjenses. Para tanto, nos propomos avaliar o episódio em si, os seus desdobramentos e as suas inflexões. Nossa pesquisa em andamento prevê o método etnográfico e da história oral e também em jornais da época e alguns depoimentos. Iremos à busca da imagem de Santo Missioneiro queimado por um pastor, a fim de salvar ao senhor a quem ela pertencia na época. Para isso, pretende-se discutir a questão da preservação e valorização do patrimônio missioneiro, voltado à educação patrimonial em sala de aula, a partir de uma pesquisa empírica em algumas escolas da rede pública de São Borja (a serem selecionadas). Outra situação é pesquisar no local onde esta imagem está atualmente, ou seja, o Museu e Biblioteca Municipal Silva Rillo, para saber como ela chegou lá e quais foram as providencias tomadas para a sua conservação. É importante levarmos em conta o contexto cultural e histórico como as pessoas tratam suas obras históricas e como esse patrimônio é, na maioria das vezes, tratado com “descaso” pela maioria da população, revendo a questão do ser missioneiro, do sentimento de pertencimento e principalmente, quais as políticas públicas – que devem iniciar no espaço escolar – a serem aplicadas para a preservação e valorização do acervo que compõe o patrimônio missioneiro são-borjense. Para tanto faremos uma análise, voltada para ao aspectos cultural e histórico, sobre como os estudantes tratam seu Patrimônio Histórico e Cultural missioneiro são-borjense, que lamentavelmente muitas vezes lhes é indiferente. Problematizando-se que, a partir da Educação Patrimonial é uma possibilidade de reavaliar as posições frente ao acervo, os fragmentos do passado que estão vivos na comunidade local e nas comunidades escolares. Nos ancoramos em Vera Lúcia Maciel Barroso quando define, entre outras: “a Educação Patrimonial como abordagem da herança do passado, concebida como fonte de desvelamento do mundo e de suas contradições”.12 A autora citada apresenta outras definições importantes para a Educação Patrimonial vinculando-a ao reconhecimento do patrimônio, seguido de sua preservação e valorização. Nesse sentido, conforme Soares eSilva (2011) ao analisar a Arqueologia e Educação Patrimonial nas Missões Jesuiticas estendendo um olhar sobre São Borja enfatiza que, a sociedade deve ter além do acesso a capacidade de entender o que se opera e precia elegar seu 12 BARROSO, Vera Lúcia Maciel. Educação Patrimonial e Ensino de História: registros, vivências e proposições. In: BARROSO, V.L.M et al [orgs] Ensino de História – Desafios Contemporâneos. Porto Alegre : EST, 2010. p. 22 Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 269 patrimônio, portanto antes de mais nada reconhece-lo, compreendendo desta forma, a sua importância em níveis culturais e de desenvolvimento econômico para a região em que se encontra. Dessa forma, o patrimônio não se restringe a políticas públicas, mas ao processo de construção e conscientização dos grupos sociais envolvidos. Partindo desta premissa, de ir em busca e de escolhas de heranças patrimôniais, esta comunicação de pesquisa se faz necessária devido ao fato de, em julho de 2007 um pastor ter queimado imagens de valor histórico incalculável em um “ritual de cura”, trazendo à tona as dicussões sobre como as pessoas tratam seu Patrimônio Histórico e Cultural na trama dos acontecimentos que envolvem o passado missioneiro de São Borja e as suas devidas disputas identitárias. Nesse sentido, é importante conhecer, reconhecer e avaliar a visão das pessoas em relação a esses objetos, que na maioria das vezes é tratado com descaso e, muitas vezes destruídos sem ao menos terem a visão do quanto eles são importantes para lhes mostrar seu passado comum, e de como eles trazem em si uma herança rica em fé, mitos, lendas e também violencia e crueldade. Um povo que é “cego” em relação à sua herança histórica e cultural, é um povo proprenso a enfraquecer e desaparecer em pouco tempo. Não ter raízes profundas, faz com que uma planta tenha uma vida breve e pouco satisfatória, mesmo que isso faça parte do equilibrio natural. Porém, não é nada natural quando as pessoas tratam sua histórica comum com indiferença e “descaso”. Visto que, muitas vezes esses sentimentos estejam também ligados ao modo como esse povo firmou suas estruturas políticas, econômicas e socais. Uma localidade onde sobrenomes, mesmo que já sem tanto respaldo de poderio econômico, fazem a diferença e também controlam o poder, só podem levar como consequência uma população alijadas a essas sombras e que não se importam, como foi seu passado histórico já que seu presente é de quase “submissão”. Mesmo que essa situação, contemporaneamente, comece a dar sinais de mudanças e, que as gerações mais jovens se monstrem mais questionadoras e também, mais interessadas em mudar esse visão, as mentatlidades custam a mudar e, portanto, tratar uma peça de valor histórico incalculável, como pretenso “exorcismo” de uma doença pode se tornar banal. Patrimônio Histórico e Cultural São-borjense: uma reflexão necessária Muitos estudiosos e filósofos falam que a riqueza de um povo está em sua história e como ela a transmitirá ela aos seus descentes. No entanto, sabemos que isto não acontece principalmente na América que foi historicamente explorada de suas riquezas, seus povos autóctones destruídos à quase extinção e, portanto as gerações futuras (muitas vezes fruto de Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 270 uma miscigenação massiva), já não têm a sua “real consciência” da importância de sua história e cultura. Assim, como na maioria da América Latina (incluindo o México neste contexto), os povos do Brasil e mais especificamente do Rio Grande do Sul, apontando principalmente para a região das Missões não terem essa consciência. É comum encontrarmos municípios que não tem a mínima consciência da importância histórica do lugar onde vivem em que, muitas vezes nasceram naquele lugar e, talvez, jamais sairão. Esta visão será voltada principalmente para o município de São Borja, que apesar de sua localização e também sua ideologia econômica estar voltada para a região da Fronteira Oeste, o município é considerado o “Primeiro dos Sete Povos Missioneiros”. Conforme os estudos clássicos de o cônego João Pedro Gay, os jesuítas Carlos Teschauer e Luís Gonzaga Jaeger e Aurélio Porto. O que nos fez refletir sobre o Patrimônio Histórico e Cultural, desse município foi um fato acontecido no mês de julho de 2007, onde um pastor ao realizar um ritual de cura, queimou imagens missioneiras, de valor inestimável, datada da época da Missão de São Francisco de Borja. Sendo que uma foi queimada totalmente e, outra parcialmente. Para tanto, esta comunicação se propõe ir em busca das questões do “descaso” em relação a objetos de valor histórico incalculável, usado sem a mínima consciência, principalmente por parte do pastor Fábio, como meio para chegar a um fim, que infelizmente não foi nada promissor. Contudo, todas estas questões só serão reconhecidas se, no espaço escolar, ocorrer o debate, a conscientização da importância da História e do Patrimônio Cultural, que passa pela Educação Patrimonial de qualidade. Em um primeiro momento já estamos pesquisando em jornais da época do episódio de 2007, que relatam o fato, após iremos em busca principalmente com ajuda da web, de sites que comentem o fato. Por fim utilizar-se-á do método do informante chave, onde uma pessoa que tenha conheicmento fato, relatará e fará uma ponte entre o pesquisador e sua fonte de pesquisa. Convém destacar também que estamos providenciando a leitura do processo crime dos arquivos do Ministério Público que relata as investigações, depoimentos das partes envolvidas no acontecimento, bem como as audiências no Foro de São Borja. Também está incluída na pesquisa dos registros do Museu e Biblioteca Municipal Apparício Silva Rillo, para conhecer a referia imagem, conversar com a pessoa responsável pelo acervo histórico que lá se encontra, para conhecer como ela passa o fato às pessoas que visitam o Museu. Enquanto isso, será aplicado um instrumento de pesquisa que demonstre a Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 271 forma de como as pessoas veem seu Patrimônio Histórico e como o fato da imagem do santo queimado repercutiu na sociedade. Utilizaremos questionários, entrevistas, depoimentos, direcionados a professores das redes Municipais, Estadual e Particular de São Borja, onde será verificado a visão desses profissionais em relação ao ensino de Educação Patrimônial em sala de aula e, também suas metodologias, avaliações e conhecimento sobre o patrimonio histórico e cultural missioneiro de São Borja. Considerações Finais Dentro deste projeto espera-se que se conheça os fato que levaram o pastor a queimar obras de valor histórico inestimável em um ritual de cura, cujas obras, inventariadas pelo IPHAN se encontravam sob a guarda família que permitiu sua queima. Porém, queremos demonstrar que pelo menos, da parte da família houve um “descaso”, ou seja, mesmo inventariadas as obras, eles desconheciam a importância da obra para a história do Município. A presente pesquisa apresentada pretende trazer à luz de discussões e debates do porquê, determinados municipios com um passado histórico riquíssimo, tem em seus municipes seres indiferentes em relação a esse contexto e também, como essa indiferença gera o “descaso” que tem em relação aos vestígios que resistiram ao tempo e às mudanças para nos contar uma parte dessa história. Também investigar como os professores,em sala de aula trabalham o Patrimônio Histórico, com seus metódos e avaliações e, também sua visão pessoal sobre São Borja, como “Berço Missioneiro”. Este último título retirado do folder do Museu e Biblioteca Municipal Apparício Silva Rillo, de São Borja, que diz por extenso o seguinte: “o Museu Apparício Silva Rillo, também conhecido como Museu Missioneiro, conservaem sua instalação parte da herança do período jesuítico na região como santos, mártires e anjos guerreiros. As obras missioneiras do Museu são um patrimônio incalculável. Esculpidas em cedro e louro, elas possuem refinamento sem igual. Sendo assim, o Museu Apparício Silva Rillo é um referencial13 nas Missões, e a cada dia, São Borja firma-se mais como “Berço Missioneiro”14 (BLOG COISASEAFINS, 2011). Mesmo com esse título de “Berço Missioneiro”, constatamos através de pesquisas e também com a leitura dos primeiros questionários, que o município não é visto assim, pela maioria da população e particularmente pelos professores das redes Municipal, Estadual e Particular, pois, como foi já convencionado há décadas, São Borja é o “Berço dos 13 Grifo dos autores deste trabalho 14 Grifo dos autores deste trabalho Revista Latino-Americana de História Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial © by PPGH-UNISINOS Página 272 Presidentes” convenção esta que não queremos de modo algum que desapareça, porém, queremos ressaltar que antes dos dois Presidentes fazerem história Nacional, São Borja como foco de História Regional Missioneira, é ainda mais rica. Referências Bibliográficas BARROS, J. D’A. O Projeto de Pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teórico. Petrópolis/RJ: Vozes, 2009. BARROSO, V.L.M.. 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