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Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima CONFIGURAÇÃO TERRITORIAL E DINÂMICA SÓCIO-ESPACIAL DO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO DA CIDADE DE PETROLÂNDIA - PE1 Clélio Cristiano dos Santos2 clegeo2@yahoo.com.br Diana Cecília de Souza3 dianacsouza@yahoo.com.br Francisco Guedes de Lima4 francisconeto88pe@hotmail.com Resumo A proposta deste artigo é refletir sobre a atual configuração territorial da cidade de Petrolândia, buscando a apreensão dos principais aspectos que caracterizam a dinâmica sócio-espacial do processo de urbanização vivenciado por este município. Neste sentido, discute-se inicialmente a noção de Cidade do Campo, em seguida, aborda-se a atual configuração territorial da cidade e, posteriormente, tecem-se considerações sobre o processo histórico de constituição territorial da mesma e as principais desigualdades sócio-espacias nela presentes. Palavras-Chave: Cidades do campo, Urbanização, Petrolândia - PE. Abstract The purpose of this paper is to discuss the current territorial configuration of the city of Petrolândia, seeking the seizure of the main aspects that characterize the socio-spatial dynamics of the urbanization process experienced by this municipality. In this sense, initially it is discussed the notion of City of the Countryside then is approached the current territorial configuration of the city and after are weaved considerations about the historical process of territorial formation of the same and the main social-spatial inequalities that it presents Keywords: City of the Countryside, Urbanization, Petrolândia - PE. Introdução O Brasil chega ao século XXI com uma generalização do fenômeno da urbanização da sociedade e do território. No âmbito da globalização econômica, sob a égide da revolução tecnológica, ocorre no país uma aceleração da urbanização e do 1 O presente artigo resulta de um projeto de pesquisa desenvolvido no âmbito do Programa de Fortalecimento Acadêmico – PFA, da Universidade de Pernambuco – UPE, Campus Garanhuns. 2 Professor Assistente do Curso de Licenciatura em Geografia da UPE – Campus Garanhuns. 3 Mestra e Licenciada em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco. É professora da rede estadual de ensino em Pernambuco e, atualmente, encontra-se cedida à Universidade de Pernambuco - Campus Garanhuns, onde leciona no Curso de Licenciatura em Geografia. 4 Graduado do Curso de Licenciatura em Geografia da UPE – Campus Garanhuns e ex-bolsista do Programa de Fortalecimento Acadêmico – PFA/UPE. Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 64 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima crescimento numérico e territorial das cidades. A urbanização se interioriza e desencadeia inumeráveis transformações nas áreas mais distantes do país. Em meio século, o Brasil passa da condição de um país essencialmente agrário para uma das principais economias mundiais. Em nenhum outro período da história brasileira, o país conheceu uma urbanização tão complexa. De um país como um todo agrário, o Brasil emerge, no século XX, urbano, industrial e de relações de trabalho dominantemente capitalistas (SANTOS, 1993). Com a expansão do meio técnico-científico-informacional construíram-se os sistemas técnicos necessários à realização da produção e das trocas globalizadas. Isto se refletiu muito fortemente na organização do território brasileiro e na sua dinâmica demográfica, caracterizada por um acelerado processo de urbanização e crescimento populacional. O resultado é uma nova divisão territorial e social do trabalho (ELIAS, 2005a). A globalização da economia provocou profundas transformações em diferentes setores econômicos, dentre eles, a agropecuária, que vêm passando por intensa reestruturação produtiva nas últimas décadas. Com a introdução de um novo modelo técnico, econômico e social de produção agropecuária, denominado por Elias (2003) de agricultura científica, processou-se uma reestruturação dos antigos sistemas de ação e de objetos inerentes à agropecuária. Dentre os reflexos da agricultura científica, temos uma completa remodelação do território e a organização de um novo sistema urbano. Vê-se, assim, emergir nessas áreas de agricultura científica, fortemente integradas à economia urbana, uma nova gama de relações campo-cidade, construindo-se uma unidade dialética, na qual as cidades próximas se tornam responsáveis pelas principais demandas da agricultura científica, caracterizando aquilo que Milton Santos (1993) denominou de cidade do campo. Neste contexto, emerge o interesse de analisar a atual configuração territorial da cidade de Petrolândia, buscando a apreensão dos principais aspectos que caracterizam a dinâmica sócio-espacial do processo de urbanização vivenciado por este município. Desta forma, a partir do entendimento de que o espaço, como realidade, é uno e total, e que cabe à Geografia estudar esse conjunto de sistemas de objetos e de ações que formam o espaço, realizou-se, estudos bibliográfico, documental e estatístico do objeto em análise, considerando-se aspectos quantitativos e qualitativos relacionados à distribuição dos fixos e dos fluxos, vinculados às atividades econômicas e à dinâmica sócio-espacial do município. 1. Discutindo a Noção de Cidade do Campo O termo Cidade do Campo foi proposto pelo professor Milton Santos (1993) para denominar as cidades do Brasil agrícola. Ao discutir as novas relações entre a cidade e o campo, impostas pela agricultura científica e pelo agronegócio, identifica-se uma crescente integração dessas atividades ao circuito superior da economia urbana. Assim, a cidade passa a fornecer a grande maioria dos produtos, serviços e mão de obra, necessários à produção agropecuária e agroindustrial. A cidade local deixa de ser a cidade no campo e se transforma na Cidade do Campo. As produções agrícolas e agroindustriais modernas têm o poder de adaptar as cidades próximas as suas demandas. A cada processo de modernização das forças produtivas agrícolas e agroindustriais, as cidades das áreas adjacentes se tornam responsáveis pelas demandas crescentes de uma série de novos produtos e serviços, dos Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 65 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima híbridos à mão de obra especializada, o que faz crescer a urbanização, o tamanho e o número das cidades. O resultado dessa reestruturação produtiva da agropecuária brasileira é uma grande metamorfose e crescimento da economia urbana das cidades próximas das produções agropecuárias modernas. As cidades do campo têm a sua unidade, devido principalmente, à interseção com o campo, com as atividades agrícolas e agroindustriais, sendo campo e cidade participantes de uma mesma corrente de relações uníssonas, desenvolvendo inúmeros circuitos espaciais da produção e círculos de cooperação entre esses dois espaços. O resultado disto é uma total remodelação do território e a organização de um novo sistema urbano, hoje muito mais complexo do que há trinta anos, com uma veloz e incessante substituição do meio natural e do meio técnico pelo meio técnico-científico-informacional (ELIAS, 2005b). Nas cidades do campo, as atividades agrícolas e agroindustriais modernas têm o poder de comando da vida econômica e social das cidades e do sistema urbano, o que faz com que cada cidade se organize com a feição do seu campo, aumentando, dessa forma, a distinção entre as cidades, considerando que cada cultura agrícola, cada indústria têm necessidades específicas em momentos determinados. Nesta conjuntura, o perfil urbano do Brasil agrícola com áreas urbanas tem passado por grandes metamorfoses,tornando-se muito mais complexo, onde o tradicional esquema de análise de funcionamento da rede urbana simplesmente não é mais válido para o presente. Com a fluidez possível graças à construção dos modernos sistemas de engenharia dos transportes e das comunicações, intensificaram-se as trocas de toda natureza, com grandes impactos na vida social e no território, reformulando o antigo sistema urbano. Em razão disto, emerge uma nova divisão social e territorial do trabalho, com grandes impactos na estrutura demográfica e do emprego, que culminam com um processo acelerado de urbanização. Além disto, é preciso, segundo Elias (2005b), o conhecimento das atividades produtivas e de suas leis, assim como das cidades do campo e das leis que as regem, para melhor compreender a urbanização e o crescimento urbano das últimas décadas, pois cada cidade é singular e seu alcance é cada vez mais longínquo, podendo, muitas vezes, as cidades próximas não ter nenhuma relação entre si. 2. A Atual Configuração Territorial da Cidade de Petrolândia Localizado às margens do Rio São Francisco, no Sertão de Pernambuco (Mapa 01), o município de Petrolândia integra a Mesorregião do São Francisco Pernambucano, a Microrregião de Itaparica e a Região de Desenvolvimento do Sertão de Itaparica5. Compreendendo uma superfície territorial de 1.056.648 Km2, o município de Petrolândia se limita ao norte com Floresta, ao sul com Jatobá, a leste com Tacaratu e a oeste com o estado da Bahia. 5 As Regiões de Desenvolvimento – RD foram criadas pala Lei nº 12.427 do ano 2003 e divide o Estado de Pernambuco em 12 regiões. Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 66 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima Mapa 01: Localização do Município de Petrolândia no Estado de Pernambuco Fonte: Carlos Eduardo Santos de Lima (2014) Fundado em 09 de dezembro de 1938, pelo decreto-lei estadual nº 235, o na época intitulado município de Itaparica, só viria a se denominar Petrolândia, “Terra de Pedro”, em 31 de dezembro de 1943, pelo decreto-lei estadual nº 952, em homenagem ao Imperador Pedro II6 (CONDEPE/FIDEM, 2014a). O município de Petrolândia apresenta uma divisão territorial administrativa, definida pela lei estadual nº 11.256, de 28 de setembro de 1955, segundo a qual, o município é constituído pelo seu distrito sede, a cidade de Petrolândia, e por nove povoados compostos pelas Agrovilas7 e seus blocos. A cidade de Petrolândia se localiza na porção sudeste do município, a uma altitude de 282m e coordenadas geográficas de 08° 58` 45`` de latitude e 38° 13` 10`` de longitude. O acesso à cidade é feito por meio da BR 110, que liga os municípios de Jatobá e Floresta, distando 430 km da capital. A sua superfície territorial aproximada é de 3,77 Km2, tendo como principais limites urbanos o Lago de Itaparica e a BR - 316. 6 Em 1877, a região recebeu a visita do Imperador D. Pedro II, que ordenou a construção de um cais e de uma ferrovia para ligar economicamente o alto e o baixo São Francisco (PREFEITURA MUNICIPAL DE PETROLÂNDIA –PE, 2014). 7 Constituem os povoados as seguintes agrovilas: Agrovila 1 (bloco 1, bloco 3 e bloco 4), Agrovila 2 (bloco 1 e bloco 3), Agrovila 3 (bloco 3 e bloco 4), Agrovila 4 (bloco 3 e bloco 4), Agrovila 5 (bloco 4), Agrovila 7 (bloco 3), Agrovila 8 (bloco 3), Agrovila 9 (bloco 3) e Agrovila 10 (bloco 3). Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 67 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima Mapa 02: Localização dos Bairros da Área Urbana de Petrolândia - PE Fonte: Carlos Eduardo Santos de Lima (2014) O mapa 02 acima apresenta como se encontra atualmente a organização espacial de traçado urbano ortogonal, dividida em quadras, sendo 17 quadras residenciais, uma quadra de serviços e outra central. Posteriormente, em razão do crescimento da cidade, surgiu o Bairro Nova Esperança, as margens da BR 316. Tendo sida reconstruída de forma planejada em 1988 pela Companhia Hidrelétrica do Vale do São Francisco – CHESF, a cidade de Petrolândia foi dotada de uma série de equipamentos urbanos, como escolas e postos de saúde, com elevado percentual de ruas pavimentadas, abastecimento d’água e tratamento de esgoto. O município de Petrolândia possui 8.572 domicílios permanentes, nos quais reside uma população de 32.492 habitantes, sendo 8.871 pessoas residentes na área rural e 23.621 residentes na área urbana, isto é, uma taxa de urbanização de 72,7% (IBGE, 2011). Esta tônica urbana também se faz presente na ocupação da população economicamente ativa do município, cuja distribuição dos 2.655 postos de trabalho formal se concentra na cidade. O setor público desponta como o maior empregador, respondendo por 41,5% dos empregos formais, seguido pelas atividades tipicamente urbanas, como o comércio e a prestação de serviços, que juntas respondem por 44, 8%, a atividade agropecuária por 5,6%, as atividades industriais por 4,9% e o extrativismo mineral por apenas 3,2% dos postos de emprego (IBGE, 2011). Com relação ao setor agropecuário, convém registrar que a agricultura científica se faz presente no campo de Petrolândia, nas áreas de perímetro irrigado, cuja produção associada aos modernos sistemas de irrigação, tem no coco-da-baía, na banana, na melancia e na cebola as suas principais culturas. A influência desse campo moderno também se faz presente na cidade, onde é significativa a quantidade de estabelecimentos comerciais voltados para as demandas de produtos do campo (Quadro 01). Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 68 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima Quadro 01: Quadro de Estabelecimentos Agropecuários presentes na cidade de Petrolândia - PE Estabelecimento Endereço Armazém Real Rua Artur Vieira, Centro AGROPEL Rua Regente Feijó, Centro Campos Soluções Agrícola Rua Manoel Rodrigues de Almeida, Centro Comercial Agropecuária Santos Av. Marques de Olinda, Centro Paulinelly Irrigações Av. Manoel Borba, Centro Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados da ACAVASF (2014). Estes estabelecimentos comerciais ilustram o quanto o comércio da cidade de Petrolândia está voltado para as atividades do campo, ou seja, até mesmo as atividades ditas urbanas, por meio do comércio está imbricada com o campo, contribuindo diretamente na atividade dos produtores rurais. Os estabelecimentos comerciais agropecuários se apresentam como exemplo desta forte ligação entre o campo e a cidade e de como a relação entre esses espaços se convergem, ou melhor, os dois espaços participam do circuito de produção, o campo produz por meio da agricultura tradicional e a moderna agricultura científica, presente em seus perímetros irrigados, e a cidade participa desse processo, vendendo os insumos e serviços necessários na produção do campo. No tocante ao Produto Interno Bruto - PIB, que era de 631,8 milhões em 2011, o município ocupava a primeira posição entre os municípios que integram a RD do Sertão de Itaparica e a 19º posição no Estado. Em sua composição, a indústria tem uma participação de destaque, respondendo por 66,03%, sobretudo em razão da presença de uma casa de força da Usina Hidrelétrica da CHESF, seguida pelo setor de serviços como 31,43% e pela agricultura com 2,54%. O PIB per capita do município é o sexto maior do Estado, isto é, a riqueza gerada em relação ao total de sua população é de 19,2 mil (CONDEPE/FIDEM, 2014b). Todavia, PIB per capita não é igual à renda per capita, sendo assim, é significativa a concentraçãode renda no município, que em 2010 possuía 35,2% de sua população vivendo com renda domiciliar per capita inferior a R$ 140,00, isto é, 11.194 pessoas em condição de pobreza (PORTALODM, 2014). Associado a isto, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Petrolândia apresenta 5.007 pessoas cadastradas no programa Bolsa Família (BRASIL, 2014a). Diante do exposto, observa-se que Petrolândia apresenta uma configuração territorial de traçados ortogonal, e a sua dinâmica sócio-espacial é caracterizada por uma economia urbana e um campo de características contraditórias, onde práticas agrícolas tradicionais coexistem junto a modernas técnicas agrícolas. 3. Do Povoamento ao Processo de Urbanização da Cidade de Petrolândia - PE O processo histórico de ocupação do espaço que viria a constituir o território do município de Petrolândia pode ser organizado em diferentes fases, definidas a partir do processo de povoamento e de seus respectivos reflexos nas formas de organização espacial. Assim, é possível apontar três grandes fases: a primeira estaria associada ao primitivo povoamento do espaço por tribos indígenas do grupo linguístico Kariri, passando pelo início do processo de colonização ao longo do séc. XVIII, e se Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 69 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima estendendo até a chegada da Ferrovia em 1883; a segunda iniciaria com a chegada da Ferrovia Paulo Afonso a Petrolândia, abarcando diferentes momentos de desenvolvimento e declínio político, econômico e social do município no período de 1887 a 1928, findando-se com o início da construção da Usina Hidrelétrica de Itaparica em 1976; a última fase iniciaria com a reconstrução da cidade de Petrolândia em 1988 e adentraria pelos dias atuais (IBGE, 1958). O povoamento se inicia com o reconhecimento da presença primitiva de tribos indígenas do grupo linguístico Kariri na região, em especial os índios Pankararus, cujo registro histórico mais antigo da presença dos mesmos, data do século XVII, remetendo à existência de uma maloca ou ajuntamento de índios bravios, denominada de “Cana- Brava”, no espaço que viria a constituir o território do município de Tacaratu. Posteriormente, já no século XVIII, registra-se a chegada dos primeiros colonos e de missionários à região do Vale do São Francisco. Associado a isto, temos a implantação das primeiras fazendas de gado e o desenvolvimento de missões religiosas, vinculadas aos padres da congregação de São Felipe Nery. Decorre disso o início do povoamento da antiga freguesia de Tacaratu, em 1761, pelo Padre Antônio Teixeira de Lima. Mais tarde, em pleno ciclo do gado no Sertão nordestino, é criado, em 1849, o município de Tacaratu, com um povoamento constituído, sobretudo, por fazendas de gado. Inicia-se, assim, o processo de ocupação do espaço que viria a formar o território do município de Petrolândia, com a fundação das fazendas Brejinho da Serra e Brejinho de Fora, ambas dedicadas à pecuária extensiva. Os primeiros núcleos de povoamento serviam de ponto de parada apenas para vaqueiros, que os utilizavam como bebedouro para os rebanhos que cruzavam o estado. Em razão disto e da ocorrência de vários jatobazeiros, o local se tornou conhecido como Jatobá ou Bebedouro do Jatobá. Esta situação se manteve até 1883, quando a chegada da Estrada de Ferro Paulo Afonso, dinamizou o lugar, tornando-o uma próspera povoação às margens do Rio São Francisco. Com a chegada da ferrovia, ligando o Vale do São Francisco de Penedo a Piranhas e de Jatobá a Piranhas, o comércio do povoado se desenvolveu, tornando-se um dos mais florescentes do Sertão. Com a perspectiva de progresso e civilização, o povoado rapidamente se expandiu, com a construção de várias casas, inclusive as destinadas aos administradores e funcionários que trabalhavam na ferrovia. Os desdobramentos desse processo desencadearam transformações sociais, econômicas e políticas que resultaram em 1887 na transferência da sede do município, que era o distrito homônimo de Tacaratu, para o então povoado de Jatobá, que mais tarde, já no século XX, foi elevado à categoria de cidade em 01 de julho de 1909 (IBGE, 1958). Contudo, em razão de conflitos políticos e com o desenvolvimento de alternativas de transporte à Ferrovia Paulo Afonso na região, os serviços prestados pelo comércio de Jatobá decrescem e a cidade entra em declínio. Atrelado a isto, ocorreram em 1919 várias enchentes, que resultaram na destruição de várias casas e na reconstrução de uma parte da cidade numa área mais elevada. Neste contexto, surgem propostas que visavam alavancar a cidade, que nesta época se encontrava em grande decadência. Em 1923, a firma Brandão Cavalcanti Ltda., do Recife, apresentou uma proposta pioneira para a época, que consistia, em linhas gerais, no aproveitamento da Cachoeira de Itaparica para o desenvolvimento da irrigação no Vale do São Francisco, a fundação de agrovilas para o cultivo do algodão e a geração de energia elétrica. Desacreditado pelo poder público, o projeto foi conduzido inicialmente pela firma que o desenvolveu e depois foi repassado para a Cia. Agrícola e Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 70 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima Pastoril do São Francisco, que também não conseguiu desenvolver totalmente o projeto por falta de recursos financeiros. Em crise, a cidade de Jatobá, em 11 de setembro de 1928, é rebaixada à condição de distrito, cuja sede volta a ser o distrito de Tacaratu. Contudo, neste mesmo período, é fundado pelo Ministério da Agricultura, o Núcleo Colonial Agroindustrial São Francisco, que herdou o acervo da Cia. Agrícola e Pastoril do São Francisco e passou a desenvolver atividades que se refletiram em grande incremento ao comércio local e em estímulo à retomada da construção de novas residências em Jatobá. Assim, passada uma década, em 1938, a Vila de Itaparica, antiga Jatobá, volta a adquirir foros de cidade e a ser sede do município (IBGE, 1958). Em 1944, o já denominado município de Petrolândia vê concluída a instalação de uma pequena unidade geradora de eletricidade na cachoeira de Itaparica. Desta forma, o município passou a apresentar grandes possibilidades de desenvolvimento econômico, com especial destaque para os setores da agricultura, da pecuária e da silvicultura, que juntos respondiam por 34% da população economicamente ativa. Além destes setores, havia 19 estabelecimentos industriais e 20 estabelecimentos de comércio varejista (IBGE 2014). Assim, com uma economia predominantemente rural, os dados censitários de 1950, mostram que dos 8.506 habitantes que compunham a população de Petrolândia, apenas 21,9% viviam na cidade, ao passo que 78,1% da população residiam no campo. Acompanhando esta tendência, nos anos 1960, foram criados o Instituto Nacional de Irrigação e Colonização – INIC e o Núcleo de colonização Rural de Barreiras. Posteriormente, também foi instalado pelo DNOCS o campo experimental de Icó, a partir do qual se pretendia implantar um projeto de irrigação (BARROS, 1985). Todavia, as principais transformações sócio-espaciais do município ainda estavam por vir, quando em 1976 é instalado o canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Itaparica. A implantação da Usina, pela CHESF, envolvia a construção do Reservatório de Itaparica que implicaria na inundação de uma grande área de 150 km de extensão, cobrindo uma superfície territorial superior a 83 mil hectares entre os estados da Bahia e de Pernambuco. Em razão disto, foi desenvolvida uma política compensatória, que entre outros aspectos, envolvia o reassentamento de populações urbanas e rurais, a reconstrução de cidades e também a implantação de perímetrosirrigados na região. Ao longo dos 12 anos que se estenderam os trabalhos de construção da Usina, os reflexos desse processo tiveram implicações diretas, sobretudo, nas cidades da região de Itaparica. Petrolândia, especificamente, viu sua população urbana crescer 7,3% entre 1960 e 1980, com implicações no aumento do fluxo migratório, na qualidade dos serviços prestados, na dinâmica da economia local e no aumento das desigualdades nas periferias pobres da cidade. Tendo as obras da Usina concluídas em 1988, a cidade de Petrolândia foi inundada pelas águas do reservatório e uma nova cidade reconstruída. A Nova Petrolândia integrou um já citado conjunto de ações desenvolvidas pela CHESF como medidas compensatórias à população e à base da economia local, que além de relocar a população e os serviços básicos demandados, também implantaram, nas proximidades da nova cidade, alguns projetos de irrigação. Na década de 1980, a população de Petrolândia ainda se apresentava predominantemente rural, superando a urbana em 58,6% e com uma população economicamente ativa de 58,56% vinculada às atividades do campo. Esta situação só vai se alterar na década de 1990, quando a população urbana finalmente supera a rural em 60% no ano de 1996, sendo acompanhada pela população economicamente ativa nos Revista Diálogos – N.° 15 – mar. /abr. – 2016 – issn: 2236‐1499 71 Configuração Territorial e Dinâmica Sócio‐Espacial… ‐ Santos, Souza & Lima anos 2000, superando as atividades do campo em 72,19% (IBGE, 1980). É a partir deste contexto, portanto, que Petrolândia se insere no conjunto das discussões que caracterizam as relações campo-cidade no Brasil do século XXI. Considerações Finais No atual período histórico, as relações campo-cidade constituem uma unidade dialética, uma realidade sócio-espacial marcada pelo processo de modernização do campo, associado à reestruturação produtiva da agropecuária científica e à generalização do fenômeno urbano. Assim, para que possamos compreender essas novas relações, é preciso considerar que os espaços agrícolas e as cidades do campo se tornam cada vez mais diferenciados, explicando a existência de vários circuitos da economia agrária, possibilitando distinguir espaços agrícolas modernos e tradicionais. Neste sentido, a análise da configuração territorial e da sua dinâmica sócio- espacial da cidade de Petrolândia, a luz do seu processo de urbanização, possibilitou apreender que ao longo da história desse município, a inserção de modernos objetos técnicos, desencadeou sucessivas transformações em sua organização espacial, que contribuíram para tornar cada vez mais complexas as relações que se estabelecem entre a cidade e o campo. Petrolândia apresenta, hoje, a maior parte da sua população residindo na cidade, uma economia urbana, com destaque para a presença da Usina Hidrelétrica, e um campo caracterizado pela contradição entre a agricultura tradicional e a moderna agricultura científica, presente em seus perímetros irrigados. Evidencia-se, assim, que o perfil urbano do Brasil agrícola com áreas urbanas apresenta grandes transformações que tornam o tema cada vez mais complexo, suscitando diferentes questionamentos, tais quais: De que forma se dá o processo de urbanização associado à agricultura científica? Que relações são estabelecidas entre a reestruturação produtiva dos espaços agrícolas e as economias urbanas? Quais as principais desigualdades sócio-espaciais evidenciadas nesses espaços urbanos? As respostas a estas e a outras questões oferecem novas perspectivas de análise para as relações campo-cidade. Referências ACAVASF – Associação o Comércio Agropecuário do Vale do São Francisco. 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