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BRUNER A cultura da educação cap 4 ao 9

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Ensinando o Presente,
o Passado e o Possível
-.
É surpreendente, e um pouco desencorajador, perceber a pouca atenção que tem
sido dada à natureza intrínseca do ensino e da aprendizagem escolar nos debates
sobre educação que ocorreram na década passada. Esses debates concentraram-se
tanto no desempenho e em padrões que a maioria deles acabou não considerando os
meios pelos quais professores e alunos realizam suas atividades em salas de aula na
vida real- como os professores ensinam e como os alunos aprendem.
É ainda mais surpreendente que esta perspectiva intrínseca tenha estado tão au-
sente do debate nacional, pois, de fato, tratou-se de uma década na qual aprendemos
muito sobre a aprendizagem e sobre o ensino nas escolas. Talvez a principal figura
neste progresso tenha sido Ann Brown, cujo trabalho mencionei em capítulos anterio-
res. Tirando minha inspiração de seu trabalho com joseph Campione, gostaria de
refletir neste capítulo sobre o que aprendemos com este trabalho. Dessa forma, gos-
taria de começar discutindo quatro idéias cruciais que se tornaram melhor entendi-
das graças a seus esforços. São idéias com as quais já nos deparamos no Capítulo 1.
A primeira delas é a idéia de agência: assumir mais controle de sua própria ativida-
de mental. A segunda é reflexão: não simplesmente "aprender por aprender", mas
fazer com que o que você aprende faça sentido, entendê-lo. A terceira é colaboração:
compartilhar os recursos do grupo de seres humanos envolvidos no ensino e na apren-
dizagem. A mente está dentro da cabeça, mas também com outros. E a quarta é
cultura, o modo de vida e pensamento que construímos, negociamos, institucionaliza-
mos e que, por fim (depois que tudo estiver resolvido), acaba por se chamar "realida-
de", para nos confortar.
Graças ao trabalho de Ann Brown nas escolas de Oakland, aquelas crianças nunca
mais olharão para o mundo da mesma forma - ou para seus colegas aprendizes, ou
para os recursos de conhecimento e para os usos que tais recursos podem ter, ou para
seu lugar em uma comunidade de aprendizagem. E nem seus professores, para usar
uma palavra singularmente antiquada. Aquelas crianças em Oakland aprenderam
muito mais do que simplesmente pensar sobre o meio ambiente. Elas aprenderam
formas capacitadoras de utilizar a mente, inclusive como utilizar a tecnologia para
expandir seus poderes. Elas aprenderam a refletir sobre o que sabiam e a chegar à sua
essência facilmente, a fim de ensinã-lo aos outros e para que elas mesmas pudessem
fazer mais usos do que sabiam. E elas adquiriram um sentido vívido de como pode
ser uma cultura de aprendizagem. Obviamente, o desempenho "melhorou" entre
estas crianças: como não poderia melhorar?
90 Jerome Bruner
Agora, gostaria de extrapolar estas quatro idéias - agência, reflexão, colaboração e
cultura - em relação a um aspecto do que nós ensinamos que tem sido pouquíssimo
discutido, possivelmente evitado como um assunto difícil de ser tratado. Trata-se da
matéria mais próxima da vida, mais próxima da forma como vivemos. No jargão
escolar geralmente é chamada de estudos sociais, história e literatura. Você também
poderia facilmente chamá-Ios de o Presente, o Passado e o Possível humanos, os três
grandes "pês". Minha mensagem é que os professores e alunos podem ser tão duros e
realistas na compreensão destes assuntos delicados quanto na compreensão de equa-
ções quadráticas ou da conservação da massa - e seria bom que o fizéssemos em prol
da sobrevivência. Para atingir esta dureza nos estudos humanos é preciso habilidades
um pouco diferentes, uma sensatez diferente e mais coragem, pois a consideração da
condição humana gera paixões contrárias. Mas essas paixões não podem ser aplacadas
ao dispersá-Ias em oásis isolados de "matérias escolares", como estamos aprendendo a
duras penas.
Como um prólogo à questão que está sendo tratada, deixe-me descrever uma
visita recente que me foi feita por dois altos funcionários do estabelecimento educa-
cional da Rússia. Pensei que entraria em mais uma discussão do corriqueiro: o Bruner
da fase inicial sobre ensinar a estrutura de uma disciplina (normalmente matemática)
ou sobre a elaboração de um currículo espiral, mas não foi nada disso. O que pode-
mos fazer agora, eles perguntaram, em relação a ensinar história russa do século pas-
sado, incluindo os 75 anos de regime comunista? Ensiná-Ia apenas como um grande
equívoco? Como a Rússia que foi lograda por oportunistas do partido no Kremlin?
Ou será que o passado pode ser reconstruído para que se extraia sentido não apenas
do passado e de suas tragédias, mas da forma como o futuro poderia ser moldado?
Um deles disse: "você tem escrito sobre história e cultura como narrativa, sobre a
necessidade de uma atualização e reinrerpretação constantes de narrativas do passado.
Então, de que forma podemos fazer com que uma nova geração reflita sobre sua
história e a reinterprete? De que forma podemos evitar de nos enganarmos novamen-
te?". A discussão passou da meia-noite - seria melhor fazer novas leituras de, por
exemplo, Notes from the underground, de Dostoevski, ou de O inspetor, de Gogol, do
que "expor" as histórias oficiais da "Revolução"? Na manhã seguinte pensei, por que
não estamos fazendo perguntas como estas? Por que "vencemos?". Será que isto de~e-
ria mascarar nossos fracassos e nossa cegueira - nem um único instante de luto oficial
pelas dezenas de milhares de civis iraquianos oprimidos mortos na operação Tempes-
tade do Deserto, não importando quão justa fosse nossa causa? Nenhuma pon~era-
ção pública sobre o fato de que o país mais rico do mundo gera pobreza em um ntmO
maior que nenhum outro país? Será que isto é "vencer"?
11
Deixe-me começar com o tema da "reflexão": fazer sentido, ir para o nível "metà', •
refletir sobre o que se aprendeu por meio da simples exposição, até mesmo pensar so~re
seu próprio pensamento. Desde o século XVII, o ideal de como entender qualquer COisa
A Cultura da Educação 91
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é explicá-Ia caus~mente c~m u~a teoria: o ideal ~a ciên~ia. Uma teoria que funciona é
um completo milagre: ela Idealiza nossas observaçoes variadas do mundo de uma forma
tão despojada que pode ser facilmente guardada na memória, permitindo que vejamos os
mínimos detalhes como exemplares de um caso geral As teorias explicativas funcionam,
além disso, não importando como você se sinta em relação a elas, ou (pelo menos
presumivelmente) qual seja sua per~pectiva pessoal _emrelação ao mundo. Não tem im-
portância alguma o fato de que as leis da cor de Newton lhe ocorreram no verão em que
Cambridge, onde ele morava na época, estava sendo ameaçada pela peste bubônica. En-
tão, ele saiu da cidade e terminou seu trabalho em outro lugar. O objeto de sua teoria era
explicar a mistura da luz colorida e as condições de sua descoberta são irrelevantes. As leis
da cor, dizemos, são "eternas" e "descontextualizadas".
Agora pense sobre o fato de que apenas meio século depois de a Suprema Corte ter
decidido que "separado, mas igual" não constituía discriminação racial (no caso P!essy
contra Ferguson), ela desconsiderou essa "conclusão" como inválida, substituindo-a pela
opinião do caso Brown contra a Secretaria de Educação. Então, de que forma os procedi-
mentos interpretativos da Corte diferem dos procedimentos explicativos de Newton?
As explicações científicas "morrem" por não serem parcimoniosas ou por não terem
generalidade ou profundidade derivacional. Mas trata-se de uma forma muito
intelectualizada e especializada de morrer. A lei de Newton ainda está certa ao afirmar que
a luz branca é uma mistura de todas as cores do espectro. Este modelo de explicação é tão
consistente que os filósofos daquela época, ansiosos pela certeza, a consagraram como o
único caminho para se chegar à verdadeira compreensão. "Jogue o restante nas chamas",
aconselhou David Hume, "quenão é nada além de sofisma e ilusão".
E o que se pode dizer de mudanças nas opiniões judiciais ou nos relatos históricos
sobre o fato de a obra Long day'sjourney into night, de Eugene O'NeilI, captar, ou não,
algo profundo sobre a classe média americana decadente? E Blake é criativo apenas
quando escreve: "O cão morreu no portão de seu dono/ Prenúncio da queda do
estado"? Sofisma e ilusão? Mas com o positivismo antiilusionista se sobressaindo no
final do século XIX, as humanidades estavam na defensiva (com a psicologia, obvia-
mente, presa no meio). A história, as ciências humanas (as antigas Geisteswissenschaften)
e a literatura não eram muito sérias, coisa para qualquer um e não sujeita a exame.
Elas não explicavam nada, apenas "enriqueciam a mente".
Então, enquanto os frios professores de ciências depreciavam a suavidade das
"~atérias leves", a Europa marchava para a guerra mais uma vez - encenando as
hlstó~ias das disciplinas de história, de estudos sociais e de literatura, cujo objetivo, se
acreditava, era apenas "enriquecer a mente". Nós certamente nos sairíamos melhor
em entender a nós mesmos e nossas atividades descontroladas. O gás tóxico e os
revólveres big bertha podem ser os frutos letais da ciência verificável, mas o impulso
d: utilizá-Ios surgiu daquelas histórias que contamos a nós mesmos. Então, será que
nao deveríamos tentar entender melhor sua força, ver de que forma as histórias e os
~elatos históricos podem ser reunidos e o que há neles que leva as pessoas a viver
Juntas ou a se mutilar e se matar?
C Nos primeiros 25 anos deste século, aconteceu algo crucial às pessoas pensantes.
hamemos este acontecimento de "mudança inrerprerativa". A mudança rnanifes-
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tou-se primeiramente no teatro e na literatura, depois na história, nas ciências sociais
e, por fim, na epistemologia, agora, ela está se manifestando na educação. O objeto
da interpretação é a compreensão, não a explicação; seu instrumento é a análise de
texto. A compreensão é o resultado da organização e da contextualização de Proposi-
ções essencialmente contestáveis e que não foram totalmente verificadas de uma for-
ma disciplinada. Uma de nossas principais maneiras de fazer isto é pela narrativa:
contando uma história sobre o que "trata" alguma coisa. Mas como Kierkegaard
deixou claro muitos anos antes, contar histórias a fim de compreender não é um
mero enriquecimento da mente: sem elas nós ficamos, para usar sua expressão, redu-
zidos a temer e tremer.
Compreender, ao contrário de explicar, não envolve preempção: uma forma de
construir a queda de Roma de maneira narrativa não impede que haja outras inter-
pretações. A interpretação de qualquer narrativa em particular também não descarta
outras interpretações, pois as narrativas e suas interpretações negociam significado, e
os significados são intransigentemente múltiplos: a regra é a polissemia. Os significa-
dos narrativos, além disso, dependem de forma apenas trivial da verdade no sentido
estrito da verificabilidade. A exigência, ao contrário, é a verossimilhança ou "seme-
lhança à verdade", e este é um componente de coerência e utilidade pragmática,
sendo que nenhuma delas pode ser rigidamente especificada.
Já que nenhuma construção narrativa descarta todas as alternativas, as narrativas
apresentam uma questão muito especial de critérios. Com base em que padrões as
narrativas concorrentes ou interpretações concorrentes de uma narrativa podem ser
julgadas como "corretas" ou "aceitáveis"? Uma coisa é certa, as alternativas podem
derivar de diferentes perspectivas. Mas isto, certamente, não é o suficiente: algumas
narrativas sobre "o que aconteceu" são simplesmente mais corretas, não apenas por-
que se encontram mais embasadas na factualidade, mas também porque estão ~e-
lhor contextualizadas, são mais "justas" do ponto de vista retórico, e assim por dian-
te. Mas o que é ainda mais crucial é que diferentes relatos narrativos podem expres~ar
uma consciência comparável das exigências da própria narrativa. Essas exigências
existem, como veremos em instantes. Resumidamente, os relatos narrativos podem
ser embasados ou não, embora este embasamento não repouse somente em uma
verificação sólida, como ocorre nas explicações científicas. Qualquer advogado cons-
titucional digno de sua profissão pode lhe dizer como a forma com que o Juiz Ta~ey
interpretou a história na famosa decisão do caso Dred Scott* foi extremamente bl~o-
lada, desconsiderando as perspectivas concorrentes e, portanto, com conseq~ênclas
letais. Sua opinião não foi correta nem sob a perspectiva pró-escravidão. Ela fOIfa~ha,
entre outros motivos, por não levar em consideração os posicionamentos alternatl:os
em termos dos "casos" semelhantes (e casos são sempre histórias) que haviam Sido
*N. de T. O caso Dred Scott foi levado à Suprema Corte americana por um escravo chamado Dred Scott q~e
alegava que por já ter vivido em um estado que não permitia a escravidão, ele deveria ser um homem livre e n~o •
um escravo. Além de declarar que Scott não poderia ser um cidadão, o Juiz Supremo disse que o Congresso nao
poderia proibir a escravidão em nenhum Estado. A decisão deixou o Congresso, os abolicionistas e muitas outras
pessoas indignadas e foi uma das principais causas da Guerra Civil americana.
A Cultura da Educação 93-
ditos no passado. Ele cometeu um erro grave e ajudou a desencadear a guerraescr I d histó IA "mais sangrenta e crue e nossa isto na. ma ln.terpretação narrativa ruim em altos
scalões é perniciosa. 'Ó.
e Agora, vam~~ a ~inha questão. Da m~sma ·forma qu.e o méto?o subjacente da
explicação na crencia ~ode e d~ve, ~er enslnad~ com ~~Idad~ e ngor, os ~étodos
arrativos e interprerativos da história, dos estudos sociais e ate mesmo da literatura
~ambém podem ser ensinados com cuidado e rigor. Mas isto raramente acontece, e
eles freqüentemente são vistos como exercícios de compreensão para encontrar a his-
tória única, ou como exercícios retóricos para a defesa de um ponto de vista parcial.
Nenhum deles está muito relacionado ao que, de fato, bons historiadores, cientistas
sociais e teóricos da literatura fazem quando estão trabalhando. Quando Simon Schama
conta a história de como o General Wolfe foi "construído" após a guerra francesa e
indiana, você aprende algo sobre como pensar a história: a história como uma disci-
plina de compreensão do passado, ao invés de um relato "do que simplesmente acon-
teceu". A história nunca acontece simplesmente: ela é construída pelos historiadores.
É uma desculpa esfarrapada dizer que as crianças são incapazes de fazê-lo. Eu vi a
abordagem interpretativa à história desenvolvida no Centro de Pesquisa da Aprendi-
zagem e Desenvolvimento em Pittsburgh, onde as crianças estavam aprendendo a ser
historiadores, em vez de consumidores de histórias "corretas" resumidas ou apoiadores
de explicações parciais imprecisas: nenhuma delas "obtendo os fatos exatamente cor-
retos" ou desfrutando do prazer retórica.
Sempre há uma certa preocupação de que a epistemologia pragmática da mudan-
ça interpretativa enfraqueça os valores: a crítica do "Nada é sagrado?". O que é sagra-
do é que qualquer interpretação do passado, do presente ou do possível bem elabora-
da, bem argumentada, documentada com escrúpulo e sob uma perspectiva honesta
merece respeito. Todos nós apreciamos o fato de que, contudo, temos que decidir
entre relatos concorrentes, narrativas concorrentes. Trata-se da realidade política e
social, mas isso não perdoa a supressão: afinal de contas, é disto que tratam as princi-
pais emendas à nossa Constituição.
Deixe-me ser bem claro em relação a uma questão antes de deixar o tema da
reflexão. Um vigor respeitoso em relação a "histórias" alternativas sobre como as
~oisas são, como elas podem ter chegado ao que são e para onde elas poderiam estar
I~do não é, de forma alguma, antitéticoao pensamento científico. As explicações
Científicas são auxiliares à interpretação narrativa e vice-versa: afinal, as histórias tarn-
b.ém lidam com significados humanos de teorias. Alguns esforços teóricos nas ciên-
c~as~ociais, de fato, são enriquecidos, e até mesmo elucidados, por narrativas respon-
savels. De que forma três quartos da riqueza do país acabaram nas mãos de menos de
Um~uarto de nossa população? Trata-se de uma história interessante que pede uma
teona explicativa mais precisa que a de Darwin. De fato, Carol Feldman demonstrou
de forma muito graciosa como a construção de histórias pode ajudar uma criança a
descobrir onde uma teoria (e não uma história) é necessária.'
94 Jerome Bruner
III
Deixe-me passar, agora, às questões de agência e colaboração. Elas precisam ser
tratadas em conjunto, caso contrário faz-se com que a aprendizagem pareça demasia_
damente solitária ou insuficientemente solitária. Mais uma vez, precisamos de um
pouco de contexto. Na tradição ernpirista clássica que formou nossa ideologia anglo-
americana sobre a "aprendizagem", a mente era uma superfície (um tablete de cera
no relato de Locke) sobre o qual o mundo escrevia sua mensagem. A ordem era criad~
com a mente acompanhando, por associação, que coisas se juntavam no mundo
influente. Os racionalismos continentais suplementavam esta versão solitária e passi-
va da aprendizagem com a idéia da "razão correta": a apreciação humana de relações
lógicas, especialmente uma sensibilidade à contradição lógica. Tanto nos relatos
racionalistas quanto nos empiristas, as coisas aconteciam de maneira bastante auto-
mática e sem a assistência dos outros. Não havia muito lugar em nenhuma das situa-
ções para a agência ativa ou para a colaboração.
A visão que reconhece o sujeito como ator, considera que a mente é proativa,
orientada para os problemas, concentrada na atenção, seletiva, construcional, inten-
cional. O que "entra" na mente é mais uma função de hipóteses válidas do que daqui-
lo que está bombardeando os sentidos. Decisões, estratégias, heurística - são noções
fundamentais de tal abordagem. Descobriu-se que até mesmo a vida mental dos
bebês humanos é muito mais ativa do que se esperava - graças a toda uma geração de
pesquisa, como foi mencionado brevemente no Capítulo 3.
E o que também estamos descobrindo é que a visão ativa solitária da mente é
extremamente equivocada - provavelmente uma projeção de nossa ideologia ociden-
tal individualista. Nós não aprendemos um modo de vida e formas de empregar a
mente sem auxílio, sem apoio, nus perante o mundo. E não é apenas a aquisição da
linguagem que faz com que as coisas sejam assim, é o "toma lá, dá cá" da conversação
que torna a colaboração possível. Pois a mente ativa não só é ativa por natureza, mas
também busca o diálogo e o discurso com outras mentes, também ativas. E é por
meio deste processo discursivo e de diálogo que passamos a conhecer o Outro e seus
pontos de vista, suas histórias. Aprendemos muitíssimo não apenas sobre o mundo,
mas sobre nós mesmos pelo discurso com os Outros. Agência e colaboração são mui-
to parecidos a yin e yang.
No projeto Oakland, Ann Brown reuniu agência e colaboração no plano da cul-
tura de sala de aula. As crianças não só geravam suas próprias hipóteses, mas as deba-
tiam com os outros - inclusive com seus professores. Mas elas também assumiam o
papel do professor - oferecendo seu conhecimento aos que tinham menos. Esta é a
forma como o projeto está estruturado. Você argumenta com seus colegas do lado
sobre quais seriam as melhores maneiras de tirar o óleo de uma ave marinha suja que
foi apanhada no derramento de petróleo do Exxon Valdez, ou como tal fato poderia,
antes de tudo, ter acontecido, e você aprende sobre a responsabilidade da explicação
e da interpretação durante o processo. As crianças são críticos mais duros que os'
professores. Há até mesmo um etnógrafo da sala de aula que faz um relato periódico
sobre como está andando a atividade de colaboração.
A Cultura da Educação 95---
Agora, deixe-m~ voltar ao. programa dos três. "pês": aprender a explicar como
struir de forma Interpretatlva o Presente, o Passado e o Possível humanos e, em
con fazer i I ' I d -. . Darticular, como azer ISto pe o uso responsave .~.narratlva. e que forma agência e
~olaboração se enquadram neste contexto? Para começar, a capacitação necessária do
sujeito ativo é adquirida na ~~Iaboração. Sem a q.ualificação,. nós somos impotentes.
O mesmo vale para as habilidades e para o knoio-boio da Interpretação narrativa.
Embora conheçamos os rudimentos da narrariva'desde uma tenra idade (da mesma
forma que conhecemos os rudimentos do discurso e do diálogo), há um longo cami-
nho a ser percorrido para se chegar à maturidade narrativa do adulto. E é isto que vou
considerar agora.
Para começar, parece que construímos histórias do chamado mundo real de for-
ma bastante semelhante como construímos histórias fictícias: as mesmas regras de
formação, as mesmas estruturas narrativas. Simplesmente não sabemos, e nunca sa-
beremos, se aprendemos sobre a narrativa a partir da vida ou sobre a vida a partir da
narrativa: provavelmente ambos. Mas ninguém questiona que aprender as sutilezas
da narrativa é uma das principais maneiras de se pensar sobre a vida - da mesma
forma que uma compreensão das regras associativas, comutativas e distributivas nos
ajuda a compreender o raciocínio algébrico. Deixe-me tentar fazer um rápido resumo.
Uma "história" (fictícia ou real) envolve, pelo menos, um Sujeito que Age para
atingir um Objetivo em um Contexto reconhecível por meio do uso de determinados
Meios. O que impulsiona a história, o que faz com que valha a pena contá-Ia, é o
Problema: algum desencontro entre Agentes, Atos, Objetivos, Contextos e Meios.
Por que o Problema é a licença para se contar uma história? A narrativa começa com
um prólogo explícito ou implícito que estabelece o caráter comum ou legítimo de
suas circunstâncias iniciais - "eu estava caminhando despreocupadamente pela rua
quando ... ". A ação, então, se desenrola levando a uma ruptura, a uma violação da
expectativa legítima. O que segue é uma restituição da legitimidade inicial ou uma
~udança revolucionária da situação com uma nova ordem de legitimidade. As narra-
tivas (verdade ou ficção) acabam com uma conclusão que retoma o narrador e o
ouvinte para o aqui e agora, normalmente com uma alusão de avaliação do que acon-
teceu. Em todos estes estágios - o estabelecimento da legitimidade inicial, a realiza-
ção da restituição ou subversão e a avaliação referida da conclusão -, as narrativas são
profunda e inevitavelmente norrnativas - embora essa normatividade possa estar ex-
t~emamente mascarada pela realidade convencional. Observe, também, que a narra-
tiva: s~ja ela ficcional ou "real", se desenrola em um cenário duplo: em um cenário
sub)etlvo na consciência dos protagonistas, e em um cenário "objetivo" ou "real" o
qua~ o narrado r informa ao ouvinte, embora os protagonistas da história talvez não
es~e)am cientes do mesmo - como no caso em que Edipo não sabe, embora você
saiba, que Jocasta, escolhida para ser sua esposa, é sua mãe de sangue.
_ Uma palavra sobre o lado mais cognitivo do pensamento narrativo ou da constru-
çao n~rrativa da realidade. Como propõe o grande Vladimir Propp," uma estrutura
narrativa é composta de um conjunto de regras semelhantes à gramática para ordenar
personagens e acontecimentos de forma seqüencial, de forma que os acontecimentos
e personagens, para usar a linguagem de Propp, tornem-se "funções" da estrutura
96 Jerome Bruner
geral do enredo. Um "falso herói" que tenta tirar as devidas recompensas de um herói
verdadeiro é uma representação do mundo que faz sentido apenas por estar incluída
em um tipo particular de estrutura narrativa. Há duas coisas sobre estas estruturas
que são particularmente fascinantes. A primeira delas é que seu número é bastantereduzido: teóricos da literatura magistrais como Norrhrop Frye alegam que só há
quatro: tragédia, comédia, romance e ironia.' No entanto, as histórias são infinita-
mente variadas, o que só pode significar, é claro, que os gêneros narrativos devem ser
extremamente abstratos, quase algébricos. As batalhas entre heróis falsos e verdadei-
ros constituem a matéria, por exemplo, de narrativas dramáticas tão diferentes como
os debates de Lincoln-Douglas, O morro dos ventos uivantes, A dolls house, de Ibsen, e
o testemunho oral contestatório de Thurgood Marshall e John W Davis no caso
Brown contra a Secretaria de Educação. Finalmente, pelo menos de acordo com Propp,
todos os gêneros narrativos giram em torno de algo desejado que está em falta, mui-
tas vezes indicado apenas de forma implícita.
Mesmo estando armados apenas com esta pequena compreensão da estrutura for-
mal da narrativa, é surpreendente quão mais disciplinados nos tornamos ao esclare-
cermos sobre o que um "texto" alega ser - "nós" incluindo não apenas os críticos
literários, mas psicólogos, advogados e especialmente as crianças. Contudo, mal men-
cionei a dimensão retórica da narrativa: com a ligação do narrado r com a história,
porque se presume que ela a esteja contando, com que autoridade, qual seu motivo e
a partir de que referência. ]. L. Austin nos lembrou há décadas atrás que as histórias
constituem o meio para nos desculparmos. Mas todas as histórias, mesmo que não
sejam "porque eu estou mais uma vez atrasado", são justificativas contadas a partir da
perspectiva de uma norma. Mais precisamente, quando se trata de negociação narra-
tiva, os narradores e espectadores competentes podem aprender, e aprendem, a tor-
nar a vida mais fácil ajudando uns aos outros a entender como suas histórias são
elaboradas, a partir de que perspectiva, etc. O narrado r onisciente é apenas uma
convenção ficcional: na vida, ele provavelmente representa uma ameaça à realização
da negociação narrativa. Nenhuma história pode ficar restrita aos limites de um úni-
co horizonte. Os romancistas foram os primeiros a nos ensinar isto: Flaubert, Kafka,
Joyce, Calvino - sem esquecer Laurence Sterne em Tristam Shandy. Então, vieram os
historiadores, depois os antropólogos." Como os romancistas, eles nos contam ou
nos indicam sobre o ponto de vista a partir do qual escolhem e constroem seus "fa-
tos". E ao fazê-Ia com uma autocrítica honesta e em reciprocidade com o leitor, eles
enriquecem muito nossa sensação do possível.
É uma idéia perversa acreditar que professores e alunos não podem lidar com
questões narrativas com capacidade e abertura comparáveis e com um ganho compa-
rável em termos de autoconsciência. Ninguém precisa "declarar a guerra" em relação
aos significados múltiplos, perspectivas múltiplas, estruturas múltiplas que podem
ser utilizadas na compreensão do Passado, Presente e Possível humanos. A interpreta-
ção da narrativa colaborativa não é um "toma lá, dá cá". Extrair sentido conjunta-
mente não precisa ser um exercício de hegemonia, fazer com que apenas a versão da •
história do mais forte seja engolida pelo mais fraco - mesmo quando questões políti-
cas tensas estão em jogo. Da mesma forma que a ficção feminista, terceiro mundista
A Cultura da Educação 97
e de minorias abriu nossos horizontes, a história e o comentário social escritos com
honestidade, interpr,e~ados c?m. inteligência e ~ebatidos abertamente podem criar
um mundo democrático mars nco. O mesmo tipo de negociação pode até mesmo
evitar que a avaliação psicométrica caia nos tipos dearmadilhas antifeministas e basea-
das na visão preconceituosa "dos nativos" que estudiosos como Cynthia Fuchs Epstein
e James Deese esclareceram de forma tão persuasiva em seus trabalhos recentes." Eu
vejo o debate e a negociação, mais uma vez buscados de forma aberta, como os inimi-
gos da hegemonia - seja ela relacionada ao sexo, à raça, à origem étnica, à religião ou
apenas à força bruta.
Mas deixe-me ser claro: não considero que o resultado deste processo de uma
interpretação conjunta justa produza uma única lista de "valores americanos" cinze-
lados em granito. De fato, acredito que a própria idéia de "valores americanos" tem
laivos de timidez intelectual e moral- o mesmo tipo de timidez que insiste em que as
histórias sempre tenham os mesmos fins. O objetivo da agência e da colaboração
competentes no estudo da condição humana é atingir não a unanimidade, mas mais
consciência. E mais consciência sempre implica mais diversidade.
IV
Meu. último tema neste capítulo é a cultura. Concordo com muitos antropólogos
d~ atualidade que conceber "uma cultura" como uma forma de pensar, acreditar, agir
~J~lgar estabelecida e quase. irreversivelmente estabilizada já não é uma ficção muito
útil. As culturas sempre estiveram no processo de mudança, e o ritmo da mudança
tor?a-se m~ior à medida que nossos destinos ficam cada vez mais interligados por
mel~ da. n:1~ração, do comércio e o do rápido intercâmbio de informações. Em um
s~ntldo iroruco, a melhor forma de descrever as culturas industrializadas contempo-
raneas pode ser pela referência aos procedimentos que elas possuem para a absorver a
~~dança de forma razoável, sendo tais procedimentos restritos por uma consciência
vlvl~a de metas mais amplas - como liberdade, responsabilidade, igualdade de opor-
tunidade e responsabilidade, e até mesmo igualdade de sacrifício. Diferentes culturas
~ratam tais questões diferentemente. O que todas têm em comum é o dilema da
Imperfeição: manter a fé na habilidade de mudar para melhor embora se saiba que
um final definitivo e estabelecido jamais pode ser atingido. Em nossa própria socie-
da~e professamente igualitária, por exemplo, temos uma distribuição incrivelmente
assl~étrica da riqueza e dos salários - 52.019 pessoas com rendas anuais de mais de
1 milhão de dólares em 1990 em um país cuja renda anual média fica abaixo de
$30.000: um aumento de seis vezes no número de mulrirnilionãrios em uma década!
Todos sentimos que isto é um problema. As crianças talvez não conheçam as cifras,
mas elas também sentem o problema no ar, como em um programa "real".
.Mas por motivos de delicadeza, talvez, ou de conveniência, este é um tema que é
de~xado de fora da escola. Caso um número muito grande de coisas deste tipo sejam
d.elxadas de fora da escola, esta começa a apresentar uma visão tão alienada e distan-
CIada do mundo que muitos alunos não conseguirão encontrar um lugar nele para si
98 Jerome Bruner~~---------------------------------------------------------------
ou para seus amigos. Isto é verdadeiro não apenas par~ meninas, crianças negras, de
origem hispânica ou asiática ou outras crianças às quals .damos aten~ão especial por
serem grupos de risco em potencial. Há também aquelas cnanças entediadas, Irrequietas
em nossos subúrbios em expansão que sofrem da síndrome pandêmica de "O que
estou fazendo aqui afinal? O que isto tem a ver comigo?". Elas sabem que algo está
sendo deixado de fora, ou por verem acontecendo na rua ou na tela da televisão
presente em toda parte. A desilusão res~ltante em relação ao estabe~ecimento educa-
cional expressa-se em tantas formas vanadas como a surpresa - e n~s ficamos surpre-
sos diante do poder da cultura das ruas, do medo crescente que as cnanças dos subúr-
bios têm em ir para a cidade, da anomia entre as crianças da classe média. Mas fico
igualmente impressionado com o sucesso de algumas escolas e professores em combatê-Ia.
Bem, a escola é uma cultura em si, não apenas um "preparo" para a mesma, um
aquecimento. Como afirmam alguns antropólogos, a cultura é um conj~nto de ferra-
.., mentas com técnicas e procedimentos para entender seu mundo e lidar com ele.
Quando mencionei anteriormente que uma análise mais inquiridora da estrutura
narrativa pode ajudar os alunos a entender as histórias que eles constroem sobre seus
mundos, foi neste sentido de procedimento que pretendi fazerminhas observações.
E, obviamente, os procedimentos desarmados sobre os quais falei podem ser aperfei-
çoados por meio das novas tecnologias para ajudar nas tarefas interpretativas que os
alunos precisam dominar - enormes sucessos de recuperação de informações, como o
CD-ROM, analíticos, como o Hypercard, dispositivos de classificação para coloc~r as
coisas em diferentes estruturas divisórias, e coisas do gênero. Está claro que as cnan-
ças aprendem rapidamente a utilizar estes auxílios técnicos e a compartilhar seus
resultados com os outros.
Mas a tecnologia de apoio não é a questão, mesmo que seja crucial para o que é a
cultura. A questão é o procedimento de indagação, do uso da mente, que é funda-
mental para a manutenção de uma comunidade interpretativa e de uma cultura de-
mocrática. Um passo é escolher os problemas cruciais, especialmente os problemas
que estão levando à mudança em nossa cultura. Façamos com que esses problemas e
nossos procedimentos para pensar sobre eles tornem-se parte daquilo que trata a
escola e o trabalho de sala de aula. Isto não significa que a escola deva tornar-se um
ponto de encontro para a discussão dos fracassos da ~ul.tura. Mas da mesma forma
que Ann Brown utilizou, na sala de aula de Oakland, a situação terrível do derram~-
mento de petróleo do Exxon Valdez para investigar questões do habitat humano, nos
deveríamos começar a investigar a condição humana - o Passado, o Presente e o
Possível- com os Problemas que mantêm este tema mais atual do que nunca. ~o~~:
por exemplo, partimos do original "todos os homens foram criados livres e IguaiS
para a assimetria de nosso sistema de distribuição de riqueza? Lembre-s: do. que .eu
disse anteriormente: o Problema é a força propulsora da narrativa e a Justificativa
para tornar uma história pública. É o sinal de problema que nos leva a buscar os
elementos constituintes relevantes ou responsáveis na narrativa, a fim de transformar
. dOio Problema bruto em um Problema controlável que possa ser tratado com o ngor
procedimentos.
A Cultura da Educação 99-----------------------------------------~~~~
Nada disto é novidade. A cultura é tudo isto - não apenas poemas em prosa
P
ológicos sobre padrões, mas um modo de lidar com os problemas humanos'antro . -', .
as transações humanas de todo tipO, repr~entadas em símbolos. Os bons pro-
com d h' ,. d d . . .c ores de literatura, e istorra e e estu OS--·SOClalSsempre tiveram consciência
ress . blernãtica" d . A I doi hdesta "característica pro e~atlca a narr~~lva.. que es o~sse~ ores r~ssos com os
ais passei aquela longa noite de auto-analise e.stavam passIvos a narrativa devido às
q·~cunstâncias. Eu, particularmente, gostaria dê ver-nos também enfrentando a res-
c~nsabilidade do relato narrativo, e nós estamos em uma posição muito melhor de
fazê-Ia. Além disso, vejo o desafio da narrativa como um meio de reunir o estudo da
sociedade, da natureza humana, da história, da literatura e do teatro, até mesmo do
direito, em prol, não tanto da superação de nossos rivais comerciais, mas de nossa
própria falta de visão.
Alguns leitores podem se perguntar por que a literatura e o teatro têm tanta im-
portância em meu relato. As narrativas, por todos seus roteiros padrão sobre a vida,
deixam espaço para aquelas rupturas e violações que criam o que os formalistas russos
costumavam chamar de ostronenyie: tornar o conhecido novamente desconhecido.
Então, embora "contar a história" da realidade seja um empreendimento em que há
um risco de criar a realidade hegemônica, as grandes histórias a reabrem para um
novo questionameno. É por isto que os tiranos colocam os romancistas e poetas na
cadeia primeiro. É por isto que eu os quero em salas de aula democráticas - para nos
ajudar a enxergar novamente, sob um novo ângulo.
NOTAS
Não se pode deixar de ficar surpreso diante do contraste, digamos, entre a interpretação da legalidade
da escravidão oferecida pelo Juiz Taney no caso Dred Scot contra Sandford, 60 U.S. 393 (1856), em
oposição à interpretação oferecida por Lord Mansfield no caso Sommersett contra Stuart, em King's
Bench: 12 George III A. D. (1771-72), Lofft, 20 Howells State Trials 1.A diferença reside totalmente
na forma como o conceito de "Lei Natural" é interpretado - Taney presume que ele não impede a
escravidão, enquanto Mansfield presume que ele a impedia. Esses dois juristas distintos acreditavam
firmemente que estavam operando dentro da tradição do direito consuetudinário anglo-saxão.
Carol Fleisher Feldman, "Monologue as Problem-Solving Narrarive", in Katherine Nelson, org.,
Narratives from the crib (Cambridge, Mass.: Harvard Universiry Press, 1989), p. 98-119.
Vladimir Propp, Morphology of the folktale, 2a ed. (Austin: University ofTexas Press, 1968).
Northrop Frye, Anatomy 01 criticism (Princeton: Princeton Universiry Press, 1957).
Robin Geotge Collingwood, The idea 01 history (New York: Oxford University Press, 1956);
Collingwood, Essays in the philosophy olhistory (New York: McGraw-Hill, 1965); Clifford Geertz,
The interpretation 01 cultures (New York: Basic Books, 1973); Geertz, Local knowledge; Clifford
Ge:rtz, ~fter the foct: two countries, four decades, one anthropologist (Cambridge, Mass.: Harvard
l!nlverslty Press, 1995); James Clifford, The predicament 01 culture: tuientieth century ethnography,
lzterature, and art (Cambridge, Mass.: Harvard Universiry Press, 1988).
Cy~thia Fucs Epstein, Deceptive distinctions: sex, gender, and the social arder (New Haven: Yale
Unlversity Press, 1988); James Deese, "Human Abiliries versus Intelligence" Inte//igence, 17 (1993):
107-116.
5
Entendendo e Explicando
outras Mentes
No capítulo anterior, defendi a narrativa interpretativa como um modo de pensamen-
to apropriadamente disciplinado para interpretar a condição humana presente, passada e
possível. Ao fazê-Ia, falei um pouco sobre as diferenças entre explicar e interpretar. Agora,
gostaria de tratar dessas diferenças de forma mais direta, pois elas são cruciais não apenas
à filosofia mais abstrata do conhecimento, mas também à realização do ensino e da apren-
dizagem em sala de aula.
Trata-se, porém, de um tema vasto, e como a maioria dos temas desta natureza,
ele precisa ser abordado fazendo-se referência a algum assunto mais específico para
que não se dissipe no ar rarefeito da análise lógica. A boa sorte e o trabalho árduo de
muitos psicólogos nos proporcionaram um tópico exemplar à luz do qual podemos
examinar a difícil distinção da qual tratamos no momento - ou seja, de que forma as
crianças pequenas aprendem a interpretar o que os outros estão pensando, sentindo,
pretendendo e, acima de tudo, o que elas querem dizer com o que dizem. Pois enten-
der outras mentes é, por excelência, um processo inrerpretativo, sendo o ponto cen-
tral da tarefa de extrair sentido do que um antropólogo diz sobre os ilhéus de Trobriand,
ou do que um historiador nos conta sobre a Revolução Industrial. Este processo não
é menos importante na sala de aula: os professores entendendo o que seus alunos
estão pensando e vice-versa.
Agora a pergunta prototípica do psicólogo é se o processo de interpretação pode
ser cientificamente explicado. Se puder, então a interpretação é, por assim dizer, mais
um "fato da natureza" como outros fatos da natureza sujeitos à explicação científica.
~e~t~ caso, ele pode ser "reduzido" à ciência convencional- apenas mais um tópico
dlflctl para ser domado cientificamente.
Eu sempre mantive que embora haja uma ligação entre explicar e interpre-
tar - entre as formas de trabalhar de um biólogo e as de um historiador -, os dois
modos de extrair sentido não podem ser reduzidos um ao outro. Eles são fundamen-
talmente diferentes.
Janet Astington e Oavid Olson escreveram recentemente um artigo ponderado
s~bre o assunto no qual atacaram minhas visões separatistas em relação a esta ques-
tão, um artigo a ser publicado em um importante periódico científicona área do
desenvolvimento humano. Eles argumentaram, se eu puder simplificar um I?ouco,
que se se considerasse a priori que a psicologia do desenvolvimento não poderia che-
102 Jerome Bruner
gar a uma explicação de como as. :ria.nças apren~e~am a interpreta~ outra~ mentes,
então ela fracassaria como uma crencia. Mas mais Importante que ISto fOI que eles
afirmaram que novos trabalhos sobre o desenvolvimento das teorias das crianças so-
bre outras mentes provaram que eu estava enganado quanto à impossibilidade de se
atingir uma explicação científica da interpretação.
Astington e Olson me enviaram uma cópia de pré-publicação de seu artigo, pois,
freqüentemente, trocamos idéias e manuscritos, e ao mesmo tempo o editor do perió-
dico científico no qual ele seria publicado escreveu-me perguntando se eu gostaria de
escrever um comentário sobre o artigo que seria publicado na edição do periódico no
qual o artigo apareceria. Este capítulo é, de fato, o comentário que eu preparei - um
dos vários a serem publicados com o artigo de Astington e Olson. Mas é mais do que
uma "resposta" a eles, pois aproveitei a ocasião como uma oportunidade para respon-
der não apenas a suas preocupações sobre o fato de podermos explicar o desenvolvi-
mento das teorias da mente das crianças, mas também para tratar da questão geral de
como a interpretação e a explicação diferem. Janet Astington e David Olson nos
fizeram um favor ao articularem uma queixa comum contra aqueles que insistem que
há uma diferença irreconciliável entre as abordagens causais-explicativas e
interpretativas-hermenêuticas em relação à forma como entendemos nossas próprias
mentes e as mentes dos outros. A primeira delas, a abordagem explicativa, tem por
objetivo elucidar as condições necessárias e/ou suficientes que permitem que reco-
nheçamos um estado mental: por exemplo, uma lesão na tonsila hipotalâmica destrói
nossa habilidade de reconhecer expressões faciais de emoção; portanto o funciona-
mento da tonsila é uma "causa" de nossa habilidade de reconhecer emoções. IA forma
interpretativa busca o fato e normalmente depende do contexto, sendo, portanto,
"histórica": a execução em massa no vilarejo balinês de Pare durante a revolução
indonésia' foi um reflexo do sistema social oprimido pela ansiedade discutido no
famoso "Briga de Galo Balinesà' de Geertz,' ou pode ser atribuída à política da r:vo-
lução anticolonialista que varria o terceiro mundo na década de 60? Pode-se dizer,
sem sombra de dúvida, que a tonsila tem um papel causal no reconhecimento da
emoção facial. Mas o melhor que podemos fazer é encontrar uma forma razoável de
interpretar como as pessoas em Pare extraíam sentido de sua situação. Neste caso,
uma interpretação razoável não impede que haja outras. .
Astington e Olson propuseram, de forma inteligente, limitar esta questão ~Iassl-
camente controversa da explicação versus interpretação à "nova áreà' das teonas da
mente das crianças, um tópico particularmente emblemático, pois trata-s.e de um
produto da revolução cultural que gerou muita discussão sobre a questão da lllterpre-
tação e explicação. Sempre se supôs, além do mais, que é o objeto de estudo que
determina quais das duas abordagens é apropriada ao mesmo. Em geral, a aç,ã~ hu-
mana que se acredita ser mediada pelo significado é considerada como o domllll~ da
interpretação. O significado, de acordo com o mantra clássico, não pode ser expliCa-
do causalmente.
A explicação causal, por outro lado, é categórica, e não particular, baseando-se na •
verificação de proposições cuja verificabilidade não depende de um contexto ou de
processos produtores de significado de participantes em ação. Em termos ultrapassa-
A Cultura da Educação 103------------------------------------------------------~--~~
dos, as explicaçõe~ c~usais tratarr; ape~as de causas .materiais, eficientes e formais.
Não é somente o significado que e eliminado daconsideração da causa, mas também
as explicações t:le?lógicas que pressupõem significado. Novamente, pelo menos este
é o mantra canomco. ....
Agora, olhemos para a "nova área" das teorias da mente. Observe, primeiramente, que
ela não é nem "nova" e nem pode, a não ser por decreto, ser chamada de uma "área". Os
antropólogos têm estudado as crenças dos povos pré-literários sobre outras mentes há
mais de um século." De fato, a principal escola de historiadores da França, o grupo Annales.'
tem como sua principal missão o estudo de "mentalidades", o que inclui o que as pessoas
em um determinado tempo e lugar fizeram com as mentes uns dos outros. Um historia-
dor do Annales 6 chegou até a escrever um livro muito bom sobre as mudanças que os
adultos fizeram nas teorias das mentes das crianças na história. Quanto às teorias da mente
das crianças, e o seu desenvolvimento, praticamente todos os lingüistas do desenvolvimen-
to do século passado (com a exceção conspícua de algumas pessoas que acreditavam fir-
memente no "órgão da linguagem" autônomo de Chomsky) consideraram as teorias da
mente das crianças como algo essencial à aquisição da linguagem e tentaram inferir sua
natureza a partir de observação - Grace de Laguna? talvez tenha sido a expoente mais
perspicaz.
Todo este trabalho foi inconscientemente interpretativo e continua assim ainda hoje.
Não consigo encontrar um melhor representante desta tradição interpretativa do que um
estudo feito anteriormente por Janet Astington," no qual ela investigou como as crianças
passam a entender falas "cornpromissivas" como previsões, intenções e promessas - frases
como eu prometo que vai fazer um lindo dia de sol no seu aniversdrio. As crianças menores
em sua amostra não conseguiam entender que esta expressão estava "errada" e Astington
argumentou que este erro poderia ser "explicado" pelo fato das crianças não conseguirem
compreender que o que elas pensavam (que julgavam por aquilo que diziam) não estava
relacionado ao que acontecia no mundo mais tarde. Ser capaz de entender esta relação é,
obviamente, uma "condição de felicidade" em relação à promessa" - não se pode prometer
o que não se pode cumprir.
A conclusão de Astington é uma interpretação, ou uma explicação causal? Ela certa-
mente repousa sobre uma interpretação do que prometer significa para uma criança. Mes-
mo se isto a torna interpretativa, ela, de forma alguma, desincentiva maiores esforços de
explicar o fenômeno através do uso de experimentação bem controlada. As crianças, que
receberam a promessa de que não iria chover no aniversário delas, contudo, reconhecem,
por exemplo, a distinção entre uma promessa cumprida e uma promessa quebrada feita a
elaspor seus pais? Suponhamos que sim. O primeira achado deveria, agora, ser considera-
do específico de um contexto? E se for? Nós podemos, agora, tentar "explicar" a natureza
~os ef~itos do contexto observados por nós. Será que podemos dizer que a função da
pesquisa explicativa" é transformar o que era uma interpretação naquilo que poderia vir
a ~er uma explicação? O único valor de uma interpretação é que ela fornece a matéria-
pnma para hipóteses posteriores que podem ser testadas e que levam a explicações? Por
favor, tenham cuidado!
. .Nós sabemos muito bem, de Dunn, 10que mesmo crianças muito pequenas ficam
Irntadas com promesas não cumpridas feitas a elas pelas pessoas de quem depen-
104 Jerome Bruner
dem - apesar de sua notória dificuldade de compreender a diferença entre crenças
falsas e verdadeiras. Assim, como Chandler, Frirz e Hala," temos que incorporar em
nossa teoria das mentes em desenvolvimento alguma distinção entre os tipos de situa-
ções onde as promessas podem ser feitas ou quebradas: participativa versus não-
participativa, ativa versus receptora, etc. Então, podemos submeter cada uma destas
novas condições a uma hipótese passível de testes empíricos. O que normalmente
surge no final do longo dia - considerando-se que os significados das crianças variam
de acordo com o contexto- é uma interessante colcha de retalhos de observações e
resultados experimentais reproduzíveis que são parcialmente explicativos em um sen-
tido causal e parcialmente interpretativos. Este tipo de colcha de retalho é representa-
do de forma muito contundente no principal livro sinóptico sobre o assunto: o exce-
lente A descoberta da mente pela criança, de Janet Astington.
Talvez, então, haja algo que seja, a princípio, um híbrido no estudo das teorias da
mente em desenvolvimento das crianças, já que parece incluir tanto explicação causal
quanto interpretação. Mas vamos examinar uma outra abordagem a essa questão.
11
Considere uma segunda pergunta. O que queremos dizer com o fato de que a
criança (ou qualquer um) tem uma "teoria da mente"? Qual é a relação entre ter uma
teoria da mente e responder aos outros de uma forma que parece pressupor que os
outros também têm teorias da mente particulares - sem que haja qualquer consciên-
cia de algo semelhante a uma teoria? Não há uma importante distinção a ser feita
entre um pressuposto tácito que orienta uma resposta e uma teoria? Bem, sacudir a
colcha, a forma como a maioria de nós o faz, "pressupõe" alguma consideração da
"resistência do ar". Esse foi o centro da questão até mesmo antes do grande Boyle
tornar-se famoso por sua "descoberta" deste fenômeno físico. Nossas práticas muitas
vezes pressupõem conhecimento que simplesmente não se encontra acessível a nós
por meios que não sejam a prática. A maioria das pessoas, não possui uma "teoria da
gramática", apesar de falarem com frases bem formadas. E preciso o trabalho monu-
mental dos lingüistas para descobrir as "regras" da gramática. Dessa forma, como
observaram Astington e Olson, nós devemos ouvir o alerta de Wittgenstein de que as
regras da gramática não explicam como as pessoas falam, nem "fazem" com que elas
falem de uma determinada forma.
Sendo assim, o que fazemos com a diferença entre as pressuposições tácitas qu.e
orientam nossas práticas intersubjetivas e as teorias que fornecem um cálculo descn-
tivo explícito para explicá-Ias após o fato? Norbert Weiner, por exemplo, propôs e
inferiu uma teoria da cibernética que "explicava" a agilidade de Martina Navratilo~a,
embora ela pudesse, sem sombra de dúvida, fazê-lo de bobo na quadra de tê~IS,
entendendo ou não sua teoria. De fato, o uso de uma teoria da mente explícita-
muitas vezes encontrado entre autistas superdotados," leva a uma experiência de •
revelação, não natural e incômoda, em suas interações interpessoais. Aparentemente,
A Cultura da Educação 105
uma teoria, no sentido explícito, não substitui as pressuposições tácitas sobre como
as mentes das pessoas funcionam. .
Dominar os pressupostos que orientam nossas interações irrefletidas com os ou-
rros é provavelmente algo bastante semelhante-a aprender uma língua. Ambos são
extremamente dependentes da participação no contexto local, ou até mesmo no
microcontexto, de uma cultura. 13 Nós estamos descobrindo muitas coisas sobre como
as crianças adquirem suas pressuposições ou preconceitos sobre outras mentes, e é
sempre difícil saber se nosso conhecimento é totalmente explicativo ou interpretativo.
Estamos até mesmo descobrindo alguns mecanismos neurofisiológicos natos que pre-
dispõem as crianças a adquirir algumas dessas pressuposições - como a tendência de
seguir a linha do olhar do outro," o que, por sua vez, é auxiliado pela tendência de
"ficar olhando" para os olhos dos outros, que pode ser ainda melhor explicada pela
operação de um centro cortical que é exclusivamente ativado por configurações se-
melhantes ao olho. I) E pode haver até algumas adaptações psicológicas mais comple-
xas, em larga escala, que predispõem as crianças a reagir como o fazem em interações
tipicamente culturais. 16 Refiro-me, obviamente, a tratar uma criança (ou, por exten-
são, tratar um filhote aculturado de chimpanzé pigmeu) como se seus estados intencio-
nais estivessem sendo levados em consideração - suas crenças, seus desejos, e assim
por diante. Esta forma de serem tratadas, portanto, parece levar as crianças a se com-
portar como se elas e as pessoas que tratam delas desta forma possuíssem estados men-
tais." Esta rotina interativa parece ser o caminho para a intersubjetividade mútua, de
forma ontogenética e, talvez, também filogenética.
Muitas das pressuposições tácitas que orientam as transações intersubjetivas pare-
cem surpreendentemente incorrigíveis, até mesmo surpreendentemente inacessíveis
à reflexão consciente. Isto não implica, contudo, que se baseiem em adaptações bio-
lógicas fortemente predeterminadas ou inatas. Pois as pressuposições culturais adqui-
ridas cedo também se tornam notoriamente automatizadas e inacessíveis à reflexão e
introspecção. Nós nos tornamos tão acostumados a tratar os outros "como se" possuís-
sem estados intencionais que passamos a simplesmente supor que eles os possuem.
Nós até mesmo desenvolvemos noções convencionalizadas sobre como são nossos
estados mentais e como eles são percebidos pelos outros. Por exemplo, acreditamos
que pensar é algo feito sem esforço, e que nós e os outros não estamos "pensando" a
menos que haja sinais de esforço acompanhando esta ação. Rudolf Arnheim certa vez
enviou-me duas fotografias que deveriam representar "pensadores" - uma delas, da
conhecida escultura musculosa de bronze de Rodin, a outra, uma bela estatueta japo-
nesa de madeira do século VI. Arnheim acabara de ler um artigo que eu escrevera
descrevendo uma discussão com um mestre Zen sobre a natureza do pensamento. O
co~entário de Arnheim que acompanhava as fotografias era o seguinte: "Talvez você
queIra comparar o raciocínio tipicamente japonês, delicadamente hesitante desta
estatueta de madeira do século VI com nossos esforços maciços de pensamento à Ia
~odin". Aparentemente, o esforço não era a marca externa do pensamento para os
Japoneses do século VI.
As culturas são famosas por cultivar convenções para expressar e para "ler" os
est d . d d " "a os mentais - como a demonstração de esforço concentra o no ato e pensar.
106 Jerome Bruner
Tais convenções podem ser encontradas não apenas nos mitos e nas artes visuais de
uma cultura, mas também nas rotinas e até mesmo no uso lingüístico. Essa
convencionalização é conhecida na pintura, com o famoso exemplo do cavalo cor-
rendo na arte ocidental, com suas pernas dianteiras e traseiras arremessadas longitu_
dinalmente para a frente e para trás do corpo. Foi apenas quando as famosas fotogra-
fias em série de Muybridge," tiradas para resolver uma aposta sobre o assunto que
Leland Stanford havia feito com um amigo, que se descobriu que esta extensão dian-
teira e traseira das pernas era impossível no cavalo a galope. No entanto, os cowboys
de Remington galopando em seus cavalos ortopedicamente impossíveis ainda pare-
cem para nós a apoteose do movimento em alta velocidade. Da mesma forma, a
figura musculosa de Rodin parece absorta em pensamento. O máximo que consigo
ler naquela estatueta hesitante do século VI é que seu modelo estava envolto em
contemplação estética.
Questões deste tipo tornaram-se ainda mais vívidas com um artigo recente escrito
por Flavell, Green e Flavell," intitulado "O conhecimento das crianças pequenas
sobre o pensamento". Ele trata principalmente das "teorias da mente" das crianças no
sentido de cima para baixo - por exemplo, o que as crianças realmente pensam que é
o "pensamento", que é examinado neste estudo fazendo-se às crianças perguntas dire-
tas sobre a questão. Um artigo como este teria sido praticamente inimaginável em
uma Monografia SRCD antes da revolução cognitiva. Paul Harris, um dos comenta-
ristas da monografia, oferece este resumo sucinto de seus achados." ''As crianças pe-
quenas em idade pré-escolar são surpreendentemente animistas em sua concepção de
pensamento; ao mesmo tempo, elas são surpreendentemente mal sintonizadas em
relação ao processo contínuo do pensamento."As crianças, de fato, descrevem o
pensamento como algo que ocorre "dentro de suas cabeças", embora não possam
falar muito sobre o que ocorre lá. Bem, o que ocorre lá? Apesar de suas deixas e
perguntas orientadoras, Flavell e seus colegas aparentemente não conseguiram fazer
com que as crianças "vissem" que o pensamento é experimentado como uma "corren-
te de pensamento" cujos conteúdos sucessivos são unidos por elos contingentes entre
eles. E em relação a esse "processo contínuo" em que, nos termos de Harris, as crian-
ças são mal sintonizadas. Considerando-se que "corrente de pensamento" é uma ex-
pressão jamesiana inteligente e que é matéria padrão de livros-texto, será que ela está
realmente lá para que todos vejam, desde que estejam "sintonizadas" com a "realidade"?
Mesmo James Joyce, que retratou a famosa corrente de pensamento em suas obras
mais tardias, teve que se esforçar muito para criar uma forma de escrever que pudesse
produzir a impressão de uma corrente desta natureza," pois, a corrente de pensamen-
to é uma teoria do pensamento, e não um tipo natural a ser observado. De fato, ela
não foi nem mesmo amplamente subscrita na história do assunto. Denner" acredita
que o pensamento está repleto de lacunas que preenchemos. Fedor" acredita que os
processos que ocorrem dentro do módulo do pensamento são completamente ina-
cessíveis à observação. E os psicólogos da escola de Würzburg24 ficaram convencidos, •
por meio de seus estudos, de que os pensamentos não tinham imagem (unanschaulich
Denken) e de que não podiam ser observados de forma alguma. E o que dizer de
Immanuel Kant, que concebeu o pensamento como a exigência de espaço, tempo,
A Cultura da Educação 107
causalidade e moral que se impõe sobre a matéria-prima do sentido? A única "falta de
sintonia" das crianças no experimento de Flavel! foi, realmente, em relação à teoria
herbatiana25 complicada de associações fluenres.uma complicação que é demonstra-
da até mesmo pela graciosa expressão de Wi 11iam James.
A questão é que não temos muita idéia do ,que é o pensamento, seja como um
"estado da mente", ou como um processo. De (ato, o "pensamento" na forma como
é geralmente discutido, pode ser pouca coisa além de uma forma de se conversar e
falar sobre algo que não podemos observar. Trata-se de uma forma de conversar que
funciona para dar ao "pensamento" alguma forma que é mais visível, mais audível, à
qual se pode fazer mais referência, e que é mais negociável." Pode simplesmente ser
uma daquelas "obras", discutidas no Capítulo 1, que criamos após o fato.
Janet Astington, que é a outra comentarista da monografia de Flavell, expõe bem
a questão: "Um grande problema é que, considerado simplesmente como uma ativi-
dade mental contínua, o pensamento não possui quaisquer índices comportamentais.
Portanto, é difícil para as crianças adquirirem conhecimento do mesmo, e para os
pesquisadores investigarem o conhecimento que as crianças têm sobre ele"." De fato,
como Flavell e colegas também observam, as crianças concebem o pensamento como
um processo mental trabalhoso e voluntário associado à resolução de problemas.
Rodin vive de novo! Astington observa: "No uso comum da linguagem, podemos
comparar os termos pensar e respirar. Ambos ... [passam] o tempo todo desapercebi-
dos e não se fala sobre eles, exceto em determinadas situações?" - como quando o
médico pede para "respirar fundo", ou quando seu pai ou sua mãe pedem que você
"pense" sobre onde pode ter deixado a chave do seu armário. A "teoria do pensamen-
to" expressa no uso da "conversação cultural" parece moldar e classificar a própria
experiência, definindo o pensamento em termos de certas experiências trabalhosas de
um determinado tipo. Aprender termos como pensar, acreditar, prestar atenção, lem-
braré, portanto, aprender uma teoria da mente. De fato, Astington cita uma pergun-
ta de Harris em uma publicação anterior, "a comunidade oferece à criança uma for-
ma de conversar, uma explicação, que fornece a instrução sobre como conceitualizar
estados mentais?"." E ela responde sua indagação como os interpretativistas, como
ela e Olson têm que responder: "Acredito que a linguagem é fundamental para a
conceitualização do mundo mental pelas crianças. Isto significa que qualquer tenta-
tiva de se avaliar a compreensão das crianças pequenas deve ser extremamente sensí-
vel à forma como as próprias crianças podem falar sobre estas coisas"."
A referência ao selfe aos estados do selfexige muito mais que um léxico de auto-
referência, mais ainda do que as exigências de deslocamento que regem o discurso
pronominal (eu sou "eu" quando estou falando; eu sou "você" quando você está
falando).31 Pois o selftambém é definido e delineado na fala contextualizada pela sua
localização no discurso e pelo papel que desempenha no mundo social no qual os
pa~ticipantes acreditam estar operando." Muitas línguas são até mesmo sintática e
l~xlcalmente contextualizadas para levar estas questões em consideração. Foram con-
~lderações desta natureza que levaram Markus e Kitayarna" a concluir que o "se/f
Japonês era mais relacional do que o americano. De fato, muitos lingüistas antropo-
lógicos afirmam que o self e seus estados estão classificados no discurso de acordo
108 Jerome Bruner -
com a posição do falante e/ou do ouvinte em um contexto social." Situar o selfem
japonês torna-se particularmente claro pela presença de pares lexicais cujo uso nesta
língua exigem decisões contextuais - pares contrastivos como uchi e soto (dentro
versus fora), omote e ura (fundo versus frente), giri versus ninjoo (sentimentos versus
obrigações), honne e tatamae (vida interior versus deveres superficiais) - todos eles
variações do mundo interior do self em contraste ao mundo externo de um indiví-
duo." Usar estas palavras requer que a criança entenda não apenas as palavras, mas
sua contextualização na sociedade a seu redor. E isto, obviamente, é necessariamente
uma tarefa interpretativa, uma busca por significado na prática. Estou certo de que
Astington e Olson não teriam dificuldade com exemplos culturais deste tipo - e estes
exemplos podem ser multiplicados amplamente em línguas indo-européias e de ou-
tros ramos lingüísticos."
III
Então, qual é o problema? Por que Astington e Olson estão tão preocupados com
a perspectiva interpretativista? Considerando que tal perspectiva é uma parceira um
tanto constrangedora para aquele que busca a explicação causal, são as conseqüências
de sua ligação ocasional tão preocupantes quanto Astington e Olson prevêem? Será
que o estudo das teorias da mente em desenvolvimento acabará dividido entre os
humanistas interpretativistas de um lado, estudando a aquisição de convenções cul-
turais, e os neuropsicólogos do outro, buscando estabelecer causalmente que, diga-
mos, uma tonsila intacta é necessária para o reconhecimento do estado emocional de
alguém? Nessa visão os psicólogos não participam da festa, não tendo oportunidade
de mostrar suas descobertas. Será que os psicólogos não têm nada a oferecer, como
explicações das atividades interprerativas de seus sujeitos pequenos - ou de seus cole-
gas não tão pequenos assim que tentam explicar as interpretações destes mesmos
sujeitos pequenos? A visão deles é demasiadamente pessimista e me parece um pouco
irrealista em relação à forma como a ciência da psicologia progride.
Fica claro que Astington e Olson não negam os processos interpretativos às crian-
ças. Mas eles, contudo, alegam que, de alguma forma, não conseguiremos explicar
estes processos interpretativos causalmente. Ou, mais precisamente, eles acreditam
que nos restará uma abordagem interpretativa cultural, em um nível, e uma explica-
ção biológica, em outro. Mas eles fundem esta questão ao fazerem uma distinção
demasiamente rígida entre as ciências do cérebro e a psicologia, e não levam total-
mente em conta o que se considera uma análise cultural.
Há quase 80 anos, Alfred Kroeber,"em um célebre artigo, "O superorgânico",
disse o seguinte: "A distinção entre o animal e os homens que realmente conta não é
a física e a mental, que é relativa, mas a orgânica e a social. .. A besta tem mentalidade,
e nós temos corpos; mas na civilização, o homem tem algo que nenhum animal
possui"." Ou, de forma mais sucinta, posteriormente: "Bach, se tivesse nascido no
Congo e não na Saxônia, não poderia ter produzido nem mesmo um fragmento de
A Cultura da Educação 109------------------------------------------------------------~----~
composição para coral ou de sonata, embora possamos ter igualmente a certeza de
que ele teria se sobressaído e~tre s,eus compat~iot~s em alguma ques:ão de música"."
Em uma palavra, pode-se Ir ate um determinado ponto ao se explicar a capacidade
de cultura do homem fazendo-se referência a processos causais, sejam eles psicológi-
cos ou biológicos.40 No domínio psicológico, exploramos processos como, digamos,
a capacidade de postergar a gratificação, enquanto no domínio cultural convencional
buscamos rituais comunitários públicos possíveis que possam apoiar esta postergação.
O primeiro exemplo é explicativo, o segundo, interpretativo. No domínio da cultura
em si, a explicação é inviável - por que, por exemplo, a flauta doce está em um
registrO de mi bemol e não de dó. Acredito que os dois modos de se saber são
irredutivelmente diferentes, mas complementares. Mas esta diferença entre eles, eu
insistiria, não faz diferença prática. Trata-se de uma diferença que se torna grande
apenas quando desejamos relacioná-Ias episternologicamente."
Deixe-me ilustrar com um exemplo. Suponhamos, para tomar um caso razoável,
que descubramos que o desenvolvimento de algum aspecto da teoria da mente das
crianças esteja claramente correlacionado a sua ida à pré-escola - que freqüentar a
pré-escola está correlacionado com a habilidade de distinguir entre a crença verdadei-
ra e a falsa. Nós dizemos, interpretativamente, que deve ter alguma relação com o que
a escola "significà' para as crianças. Será que é: (a) porque a escola torna a criança
explicitamente responsável por seu próprio uso da mente? (b) porque a criança tem
mais interação concentrada com colegas da mesma idade na escola do que em casa?
(c) porque a criança deve interagir com pessoas relativamente desconhecidas na esco-
la cujas formas de se comportar ela não consegue predizer tão facilmente, obrigando-
a, portanto, a se esforçar mais para descobrir de que forma se comportam mental-
mente? ou (d) porque a escola fornece um léxico padronizado das crenças verdadeiras
e falsas que se pode encontrar? Observe que cada uma destas hipóteses tem por obje-
tivo domesticar a interpretação obrigando-a a assumir um formato proposicional
característico da explicação causal. Com uma certa engenhosidade, nós geralmente
somos bem-sucedidos nesta domesticação. A ciência cognitiva seria árida sem a inter-
venção destas assistências interpretativas, considerando-se que a extração de sentido é
uma característica tão fundamental da cognição no mundo simbólico da cultura.
Por tudo isto, os dois processos, interpretação e explicação, não podem ser reduzi-
dos um ao outro. A explicação não exaure a interpretação, nem a interpretação exau-
re a e~plicação. De fato, é provavelmente a tensão entre as duas que impede que a
pesqUIsa sobre as teorias da mente em desenvolvimento transformem-se em um con-
junto de rotinas experimentais desinteressantes ou que se torne tão hermenêutica
~uanto, digamos, a teoria literária. Sim, a interpretação oferece produtos candidatos
a "domesticação" por aqueles que buscam causas. E, sim, os achados experimentais
q~~ podem produzir conhecimento sobre as causas, como a descoberta da linha divi-
sana da crença falsa, fornecem alimento para as interpretações do interpretativista.
Mas as duas abordagens são fundamentalmente diferentes e têm papéis diferentes na
busca do conhecimento.
Não acredito que Astington e Olson discordem disto. Deixe-me citá-los:
110 Jerome Bruner
o que precisa ser explicado é o início dos esforços das crianças em interpretar sua
própria fala e ação e a dos outros. Como sugerimos, esta interpretação deveria ser visr
pelo psicólogo como uma forma cultural de enxergar, não apenas como o
funcionamento de um órgão mental, [mas os] padrões de pessoas que agem em um
mundo, de fato, padrões de ações nos quais a criança já pode ser um participante.
Contudo, como nós também sugerimos, esses padrões de interação social, por fim,
têm que ser explicados em termos dos conjuntos de conceitos disponíveis e apelando-
se aos processos envolvidos na aquisição, na elaboração e na reorganização de conceitos
I
. 42
pe a cnança.
Concordo, mas vejamos o que isto significa na prática real.
Considere três características da visão interpretativa, todas relacionadas à forma
como extraímos sentido do que os sujeitos pequenos dizem em resposta a nossas
perguntas sobre suas teorias da mente. (1) Na interpretação, todas as afirmativas
(inclusive as afirmativas sobre outros seres humanos e suas mentes) são vistas como
relativas à perspectivas a partir das quais foram feitas. O que fazemos com a observa-
ção do outro dependerá se nós o vemos como um amigo, um rival ou um desconhe-
cido, o que, por sua vez, depende da forma como esses termos são utilizados em nossa
subcomunidade. (2) O que os sujeitos dizem, além disso, depende de como os parti-
cipantes interpretam a relação entre a pessoa que faz as perguntas e a que responde.
Algumas crianças em nossa cultura, por exemplo, respondem a perguntas diretas,
saídas do nada feitas por adultos, como se tivessem sido feitas por um professor e
como u~ sinal para darem uma resposta semelhante a de um adulto, ou, se não o
conseguirem, elas recorrem a sua versão de uma "resposta de criança". Assim, o que
uma criança diz sobre as outras mentes, ou sobre sua própria mente, será dependente
do discurso. E este truísmo não se limita à infância. Geoffrey Lloyd" nos conta que
os matemáticos da antiga China supunham que os problemas matemáticos eram
resolvidos pela discussão retórica, ao passo que os matemáticos da Grécia clássica
achavam que a dedução é que os regia - sendo que cada um seguia o modo aprovado
de discurso e a teoria da mente de sua cultura. (3) Finalmente, o que um indivíduo
diz sobre algo depende do "contexto do discurso". Eu faço objeção significa algo bas-
tante diferente na mesa de jantar de uma família e em um tribunal. Inferir o estado
mental de outros exige mais do que uma teoria da mente: exige, também, uma teoria
da cultura. Se não tivéssemos as pressuposições orientadoras exigidas pelos atos de
fala, de que forma poderíamos compreender o que alguém tem em mente quando
diz, "Poderia me passar o sal?". *
Perspectiva, discurso e contexto: certamente ninguém acredita, certamente Astington
e Olson não acreditam, que você é capaz de extrair sentido do que as pessoas lhe dizem
sobre suas crenças em relação à mente sem levar em consideração esta tríade. Mas como eu
disse diversas vezes, ser interpretativo não implica ser anti-empírico, antiexperimental ou
'N. de T. A tradução literal da expressão normalmente utilizada em inglês nesta situação é: "Você seria tão gentil
ao ponto de passar o sal?".
A Cultura da Educação 111-----------------------~~~~~
até mesn~o antiquantitativo." Signi~ca, simpl~smente, que temos primeiramente que ex-
trair.sentIdo do que ~s pessoas nos dizem considerando es~atríade antes de começarmos a
exph~r o que n~s dizem. E mesmo neste caso, _no~saexplicação não exaurirá as possibili-
dades lllterpret~tIvas. O ponto central da questao ~~,queambos os processos são necessári-
os. Como tentei argumentar em outra ocasião," os dois são mutuamente esclarecedores
mas nã~ red_utíveis u~ ao outro. Não obstante, pa"receque Astington e Olson gostaria~
que a sItuaçao fosse diferente. ~
IV
É preciso haver ap~nas uma única forma de saber,uma forma à qual todas as
outras devam ser reduzidas? Por achar que não, eu deveria, por fim, dizer como acre-
dit? que co.n~e~uimos viver co~ a interpretação e a explicação. Um exemplo: o apa-
reClme~to inicial da atenção visual conjunta entre mãe-filho pode, provavelmente,
ser e~~l~cada ~a~s~lmente,. e provavemente há até mesmo alguns auxílios biológicos à
senslbI!~da~e inicial da cnança à alguém que aponta para alguma coisa. Após isto,
como p fOI observado, tratar a criança como se você soubesse o que ela tem em
mente, e ~sperar que ela saiba.o que você tem na sua, torna possível seu progresso no
des~n~olvI~en,to. de un:a teona da mente viável." Provavelmente, há alguma predis-
pOSlçao psicológica universal para esta forma de interação entre pais-filho. Mas o
modo como mostramos que estamos tratando uns aos outros desta forma varia de
acord? com a cultura." A forma como os outros significados são construídos dentro
d~st.e Imp~rtant~ formato psicobiológico dependerá, em grande parte, das áreas de
atividade interanvas de cada cultura," o que Bourdieu chama de "mercados simbóli-
"49 'T' d .cos . trata-se os ambientes em que a criança passa a dominar o uso culturalmente
canônico, e eles precisam muito ser estudados. 50
. Deixe-me oferecer um último alento a Astington. Eu não sou um relativista con-
~ICt? apenas ~or .atribuir. um papel irredutível à interpretação. 51 Há muito tempo eu
UVIa ~dvertenCIa de Hilary Putnam de que as afirmativas absolutas de que todo o
co.nheCImento é relativo à perspectiva são contraditórias em si mesmas. 52 Segundo
minh .. .. b .a perspe~tlva mterpretatrvista, asear-se na verificação de proposições causais,
desc?ntextuahzadas para se chegar à explicação simplesmente indica que uma pers-
PAect~vacausal-explicativa está prevalecendo. Também não estou admitindo com relu-
tancla que esta perspectiva funciona de maneira brilhante em nos ajudar a predizer e
COntrolar d físi A' d f d .h o mun o ISlCOmorgaruco - e, e ato, ererrninados aspectos do mundo
W
u:n.ano. Mas não acredito que chegaremos algum dia a exolicar causalmente o que
Ilham Bl k . di '1', a e qUIS izer em 1802, ou o que achamos, agora, que ele quis dizer
naquela época, com seus famosos versos sobre a universalidade dúbia da ciência
newtoniana:
Deus nos livre
Da visão única & do sono de Newton."
112 Jerome Bruner
NOTAS
R. Adolphs, D. Tranel, H. Damasio, and A. Darnasio, "Irnpaired Recognition of Emotion in
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C. Geerrz, After the [act: two countries, four decades, one anthrapologist (Cambridge, Mass.: Harvard
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S. J. Tambiah, Magic, science, religion, and the scope ofrationality (Cambridge: Cambridge Universiry
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J. L. Ausrin, How to do things with words (Oxford: Oxford University Press, 1962).
10 J. Dunn, The beginnings o/social understanding (Cambridge, Mass.: Harvard Universiry Press, 1988).
11 M. Chandler, A. Frirz, and S. Hala, "Small Scale Deceit: Deception as a Marker ofTwo-, Three,
and Four-year-old's Theories of Mind", Child development, 60 (1989): 1263ff.
12 F. G. E. Happé, "The Autobiographical Writings ofThree Asperger Syndrome Adults: Problems
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(Cambridge: Cambridge Universiry Press, 1991); J. Bruner and C. Feldman, "Theories ofMind
and the Problem of Autisrn", in S. Baron-Cohen, H. Tager-Flusberg, and D. Cohen, orgs.,
Understanding otber minds: the perspectiue fiom autism (Cambridge: Cambridge Universiry Press,
1993); O. Sacks, An anthropologist on mars: seven paradoxical tales (New York: Knopf, 1995).
13 Anat Ninio and Jerome S. Bruner, "The Achievement and Antecedents of Labelling" Journal o/
child language, 5 (1978): 1-15.
14 M. Scaife and J. S. Bruner, "The Capaciry for joint Visual Atrention in The Infant", Nature,
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15 Simon Baron-Cohen, "Predisposing Conditions for [oint Artention", in C. Moore and P.Dunham,
orgs. [oint attention (Hillsdale, N.J.: Erlbaum, em preparação).
16 M. Tomasello, A. C. Kruger, and H. Ratner, "Cultural Learning", Behauioral and brain sciences,
16(3) (1993): 495-511. Ver também um comentário sobre este artigo na mesma edição escrito por
Jerome Bruner.
17 E. S. Savage-Rumbaugh, J. Murphy, R. A. Sevcik, K. E. Brakke, S. L. Williams, and D. ~.
Rumbaugh, "Language Comprehension in Ape and Child", Monographs o/the society for researcb tn
child deuelopment, 58 (3-4, Serial N. 233) (1993); Tomasello, Kruger, and Rarner, "Cultural
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18 E. Muybridge, Horses and other animais in motion: forty-five classic sequences (New York: Dover,
1985).
19 J. H. Flavell, F. L. Green, and E. R. Flavell, "Young Children's Knowledge about Thinking",
Monographs of tbe society for research in child development, 60 (1, Serial No. 243) (1995).
20 Paul Harris, "The Rise of Inrrospecrion", Monographs o/the society for researcb in child development,
60 (1, Serial No. 243) (1995): 97-103. . d
21 Umberro Eco, The aesthetics ofchaosmos: the middle ages of'[ames Joyce (Cambndge, Mass.: Harvar
Universiry Press, 1989).
22 D. C. Dennet, Consciousness explained (Boston: Little, Brown, 1991).
23 J. Fodor, Modularity o/ mind: foculty psychology (Cambridge, Mass.: MIT Press, 1983). . A
24 Por exemplo, N. Ach, Ueber die willenstiitigkeit und das denken (1905). Citado em E. G. Bonng,
history o/experimental psychology, 2" ed. (New York: Appleton, 1950). •
25 Johann F.Herbart, Collected ioorks, org. K. Kehrbach and O. Fluegel (Leipzig, 1887-1912; reimpresso
em 1963).
A Cultura da Educação 113
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26 Há muitos aspectos nesta categoria, assuntos importantes que não compreendemos, mas sobre os
quais, não obstante, somos obrigados a conversar. Eu incluo entre eles o amor, a reverência, a inveja
e a justiça. Durante a conversa constituímos entidades reconhecíveis ao especificarmos práticas e
comportamentos considerados apropriados a elas. Isto, de forma alguma, equivale a uma acusação
de não-racionalidade. Os conceitos e as idéias qué são constituídas por estas transações
convencionalizadoras compõem a maior parte daquilo que significa uma cultura.
27 Janet Wilde Astington and David R. Olson, "The Cognit~ve Revolution in Children's Understanding
ofMind", Human deuelopment, 38 (1995): 179-189. :
28 Janet W. Astington, "Talking It Over wirh My Brain", Monographs of the SRCD, 60 (1, Serial No.
243) (1995), p. 109. .
29 P.Harris, Children and emotion (Oxford: Blackwell, 1989), citado por Asrington, "Talking Ir Over
wirh My Brain", P: 109.
30 Astington, "Talking it Over wirh My Brain", P: 109.
31 Roman Jakobson, Selected writings, vol. 2: Word and language (Amsterdam: Mouton, 1971).
32 E. Ochs, Culture and language deuelopment (Cambridge: Cambridge Universiry Press, 1988).
33 H. Markus and S. Kitayama, "Culture and the Self: Irnplicarions for Cognition, Emotion, and
Motivation", Psychological review, 98 (1991): 224-253.
34 C. Goodwin and A. Duranri, "Rethinking Conrext: An Introducrion'', in A. Duranti and C.
Goodwin, orgs., Reading, thinking, context: language as an interactiue pbenomenon (Cambridge:
Cambridge Universiry Press, 1992), p. 1-42.
35 J. M. Bachnik and C. J. Quinn, orgs., Situated meaning: inside and outside in [apanese self, society,
and language (Princeron, N.J.: Princeton

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