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Jan Gehl Cidades ParaJ^essoas 0^ Cidades Para Pessoas Sumário XI Prólogo e Prefácio XI Prólogo, de Richard Rogers XII Prólogo à Edição Brasileira, de Jaime Lerner XIV Prefácio d o A u t o r D i. A Dimensão Humana 3 i . i A Dimensão H u m a n a 9 i . 2 Pr imeiro Nós M o l d a m o s as Cidades - Então, Elas Nos M o l d a m 19 1.3 A Cidade C o m o Lugar de Encont ro 31 2. Os Sentidos e a Escala^L 33 2.1 Os Sent idos e a Escala 47 2.2 Os Sent idos e a Comunicação 55 2.3 A Escala F ragmentada 61 3. A Cidade Viva, Segura, Sustentável e Saudável 63 3.1 A Cidade Viva 91 3.2 A Cidade Segura 105 3.3 A Cidade Sustentável 111 3.4 A Cidade Saudável 1 1 7 4 - > •-5 1 A Luta Pela Qua l idade se Dá na Pequena Escala 4. 2 Boas Cidades Para Caminhar '3- 4- 3 Boas Cidades Para Permanecer 148 4- 4 Boas Cidades Para Encontrar Pessoas Si 4- 5 Autoexpressão, Jogos e Exercícios Físicos 162 4. 6 Bons Lugares, Ótima Escala 168 4. 7 Cl ima Bom ao Nível dos Olhos, Por Favor - í 4. 8 Belas Cidades, Boas Experiências • i : 4. 9 Boas Cidades Para Pedalar 195 5- 1 A Síndrome de Brasília 198 5. 2 Vida, Espaço, Edifícios - Nessa O r d e m 215 6 1 Cidades e m Desenvo l v imen to 229 6.2 A Dimensão H u m a n a - U m Ponto de Partida Universal Caixa de ferramentas^ 2 4 7 ! Apêndices 248 Notas 252 Bib l iograf ia 255 Ilustrações e Fotos 256 índice Remissivo a Escala ?rcicios FÍSICOS lhos, Por Favor Nessa O r d e m o l v i m e n t o ia - U m Ponto de Partida Universal :a de ferramentas^ Apêndices ! r-OtOS ssivo Quafedade se Dá na Pequena Escala es Rara Encontrar Pessoas ssãa Jogos e Exercícios Físicos ao Nwe l dos Olhos, Por Favor 3es 5oas Experiências Nessa O r d e m o l v i m e n t o ia - U m Ponto de Partida Universal :a de ferramentas^ Apêndices otos vo 118 4-1 A Luta Pela Qua l idade se Dá na Pequena Escala 119 4- 2 Boas Cidades Para Caminhar 134 4- 3 Boas Cidades Para Permanecer 148 4.4 Boas Cidades Para Encontrar Pessoas 158 4. 5 Autoexpressão, Jogos e Exercícios Físicos 162 4- 6 Bons Lugares, Ótima Escala 168 4.7 C l ima Bom ao Nível dos Olhos, Por Favor 176 4.8 Belas Cidades, Boas Experiências 182 4.9 Boas Cidades Para Pedalar 195 5-1 A Síndrome de Brasília 198 5.2 Vida, Espaço, Edifícios - Nessa O r d e m 215 6.1 Cidades e m Desenvo l v imen to 229 6.2 A Dimensão H u m a n a - U m Ponto de Partida Universal Caixa de ferramentas^ 248 252 -55 256 Apêndices Notas B ibl iograf ia Ilustrações e Fotos índice Remissivo Prólogo de Richard Rogers As cidades são locais o n d e as pessoas se e n c o n t r a m para t rocar ideias, compra r e vender, ou s imp lesmente relaxar e se divert ir . O domínio público de uma cidade - suas ruas, praças e parques - é o pa lco e o cata l isador dessas a t i v idades . Jan Gehl, o decano d o p ro je to d o espaço público, t e m uma p r o f u n d a compreensão de c o m o usamos essas áreas e nos oferece as fe r ramentas para me lhora r o dese- n h o dos espaços públicos e, e m consequência, a qua l i dade de v ida nas cidades. A c idade c o m p a c t a - c o m e m p r e e n d i m e n t o s ag rupados e m t o r n o de t rans - p o r t e público, áreas para c a m i n h a r e andar de b ic i c le ta - é a única f o r m a de c idade a m b i e n t a l m e n t e sustentável. En t re tan to , para u m a u m e n t o da dens i - dade popu l a c i ona l e para u m a expansão das áreas para c am inha r e pedalar, a c idade deve a u m e n t a r a q u a n t i d a d e e q u a l i d a d e de espaços públicos agradá- veis, b e m p lane jados e, na escala d o h o m e m , sustentáveis, saudáveis, seguros e che ios de v ida . Cidades - assim c o m o livros - p o d e m ser lidas, e Jan Gehl en t ende sua l i ngua - g e m . A rua, os c am inhos para pedestres, a praça e o pa rque são a gramática da c idade ; f o r n e c e m a es t rutura q u e pe rm i t e às c idades nascer, es t imular e a c o m o - dar diversas at iv idades, daquelas quietas e contempla t i vas às ruidosas e agitadas. Uma c idade h u m a n a - c o m ruas, praças e parques cu idadosamen te pensados - dá prazer aos v is i tantes e t ranseuntes , b e m c o m o àqueles que ali m o r a m , t r aba - l ham e b r i n cam d i a r i amente . Todos devem ter o d i re i to a espaços abertos, fac i lmente acessíveis, t an to quan to têm d i re i to à água tratada. Todos devem ter a possib i l idade de ver uma árvore de sua jane la , ou de sentar-se e m u m banco de praça, p e r t o de sua casa, c o m u m espaço para crianças, o u de caminhar até u m parque e m dez m inu tos . Bairros b e m planejados insp i ram os moradores , ao passo que comun idades mal p lane- jadas bruta l izam seus cidadãos. Como Jan diz:"Nós m o l d a m o s as cidades, e elas nos moldam" . N inguém e x a m i n o u t a n t o a m o r f o l o g i a e o uso d o espaço público q u a n t o Jan Gehl. Ao ler este l ivro, qua lque r pessoa terá uma g rande percepção, d e n t r o da compreensão s u r p r e e n d e n t e m e n t e cr i ter iosa de Gehl, das relações ent re os espaços públicos e a soc iedade civil e de c o m o os dois estão inex t r incave lmente entrelaçados. Londres, Fevereiro de 2012 Richard Rogers, Baron Rogers of Riverside CH-Kt, FRIBA, FCSD Prólogo à Edição Brasileira de Jaime Lerner Se a v ida , c o m o disse Vinícius de Morais, é a arte d o encon t ro , a c idade é o cená- r io desse e n c o n t r o - e n c o n t r o das pessoas, espaço das trocas q u e a l i m e n t a m a cente lha cr iat iva d o génio h u m a n o . Encon t ro deve se t r a d u z i r e m q u a l q u e r m o m e n t o de convivência c o m a c idade, seja no t r aba lho , n o t r anspor te , e também n o lazer. Jan Gehl foca, nesta obra de referência, aqui lo que a c idade t e m de mais impor - t an te : sua dimensão h u m a n a , as o p o r t u n i d a d e s de e n c o n t r o q u e oco r r em nos espaços de vivência das relações cot id ianas e c o m o esses territórios prec isam ser es t ru tu rados para q u e essa dimensão não se perca. A premissa c o n d u t o r a deste g rande l ivro é que as nossas c idades p o d e m ser melhores se f o r e m pensadas para aqueles q u e as c r ia ram: as pessoas. Gehl abo rda , de f o r m a a p r o f u n d a d a , ob je t i va e r i c amente i lustrada, questões q u e são f u n d a m e n t a i s à qua l i dade de v ida na c idade e que se re f l e tem na escala dos espaços, nas soluções de m o b i l i d a d e , nas dinâmicas q u e f avo recem a v i t a - l idade, a sus ten tab i l idade e a segurança das áreas urbanas, na valorização dos espaços públicos, nas possibi l idades de expressão ind iv idua l e colet iva, na beleza d a q u i l o q u e p o d e ser a p r e e n d i d o ao nível d o observador . A m o b i l i d a d e é u m c o m p o n e n t e essencial à saúde da c idade. As c idades não p o d e m ser pensadas para os carros. O r i t m o d o e n c o n t r o é o r i t m o da c a m i - nhada. Precisamos desenhar as nossas c idades para q u e o espaço d o pedest re seja d e t e r m i n a n t e e q u e ou t ros m o d o s leves de des locamento , c o m o a bic ic leta, também sejam favorec idos . O t r anspo r t e público precisa ser de qua l idade , o f e - recendo con f i ab i l i dade , c o n f o r t o e d i g n i d a d e ao usuário. Para a dinâmica urbana c o m o u m t o d o , a dens idade gera a massa crítica neces- sária para dar supo r t e a u m a g a m a mais amp l a de serviços - cu l tu ra , arte, lazer, e n t r e t e n i m e n t o , g a s t r o n o m i a - q u e t o r n a m a v ida c i t ad ina mais in teressante e q u e f o r t a l e c e m a base económica local . Essa massa crítica tambémp e r m i t e o t im iza r i nves t imentos e m in f raes t ru tura , c o m o t r anspo r t e de alta capac idade, redes de energ ia e saneamento , t e cno log i a de comunicação e lógica. Há a inda o g a n h o de v i t a l idade dos espaços públicos pela in tens idade de pessoas c i r cu - l ando e f r e q u e n t a n d o lugares, o q u e traz a sensação de p r o x i m i d a d e , de c o m - panhia , de c o m p a r t i l h a m e n t o , de inclusão, de animação. A diversidade é o que traz a riqueza da mistura, d o complementa r , d o diverso. É expressa nas diferentes etnias, nas diferentes idades, nas diferentes rendas, nos diferentes usos, nas diferentes t ipologias que an imam o cenário urbano. Conecta- -se a dois e l ementos fundamenta i s à qua l idade de v ida urbana: a iden t idade e a XI coexistência. A ident idade gera o sent imento de pertenc imento, a referência que nos or ienta enquan to cidadãos. No âmbito urbano, a ident idade se reflete nos vínculos que estabelecemos com os espaços da cidade, seus e lementos de referência - patr i - mônio histórico, rios, ruas, praças e parques, edifícios emblemáticos -, que passam a fazer parte const i tut iva d o nosso cot idiano. Quanto mais diversificada for a cidade, mais humana ela será, na medida e m que se entenda que a coexistência - a receita de se abraçar a diversidade enquan to se valoriza a ident idade - deva ser exercitada. Na relação en t re d ivers idade, i d en t i dade e coexistência reside u m dos segre- dos da segurança e da saúde da c idade. A sus tentab i l idade ref lete o diálogo ent re o a m b i e n t e u rbano e o natura l . Se, po r exemp lo , a l ienamos os rios da pa isagem da c idade, enterrando-os e m caixas de conc re to de f o r m a que desapareçam da vista, pe rdemos essa referência e o ensejo para aver iguar a qua l idade de suas águas. Em con t rapa r t ida , se ao l o n g o de suas margens imp l an t amos u m parque linear, se i nco rpo ramos o seu usuf ru to à nossa vivência urbana, a dimensão amb ien ta l se valoriza e a sustentab i l idade a u m e n t a . Se c o m b a t e m o s o desperdício de todas as formas , ap rox imando-o de zero, recic lando o lixo, u t i l i zando formas de des locamento mais eficientes, ap rox i - m a n d o funções urbanas de vida e t raba lho, a sustentabi l idade tenderá ao in f in i to . Ruas, praças, parques : os espaços públicos são essenciais ao b o m a m b i e n t e u rbano . A f o r m a c o m o são desenhadas e man t i das essas "salas de estar" ao ar l ivre e, sob re tudo , a in ter face q u e a dimensão pr ivada a elas oferece - janelas, "olhos", pe rmeab i l i dades ao invés de muros , grades, barreiras - é d e t e r m i n a n t e para a v i vac idade d o cenário c i t ad ino . C o n q u a n t o a c idade seja também o cenário de trocas económicas, de p r o d u - ção cu l tu ra l , de exibição de avanços tecnológicos, de f luxos e des locamentos , ela é, ac ima de t u d o , o lar da maior ia da h u m a n i d a d e . Criação humana por excelência, é nelas que as batalhas decisivas pela qual idade de v ida de mais da me tade da população d o planeta serão travadas, e seus des- d o b r a m e n t o s terão u m efeito de f in ido r no me io amb ien t e e nas relações sociais. O au to r destaca q u e " i n i c i a lmen te nós m o l d a m o s as c idades - depo i s elas nos m o l d a m . Ass im, q u a n t o mais h u m a n o fo r o espaço u r b a n o q u e p roduz i r - mos, mais va lor izada nossa dimensão h u m a n a estará. Uma c idade de pessoas para pessoas". Jaime Lerner j unho de 2013 XI!! Prefácio do Autor Formei-me e m arqu i te tura e m 1960, o que significa que há c inquen ta anos venho a c o m p a n h a n d o o d e s e n v o l v i m e n t o das c idades. Embora u m privilégio, a j o r - nada, sem dúvida, também t e m s ido i nqu i e t an te . A f o rma c o m o as c idades são p lanejadas e se desenvo l vem m u d o u d r a m a t i - c amen te ao l o n g o desse período de m e i o século. Até 1960, mais ou menos , as c idades n o m u n d o t o d o se desenvo l v i am p r i n c i p a l m e n t e c o m base e m séculos de experiência. A v ida n o espaço da c idade era u m a par te v i ta l dessa r iqueza de experiência e acreditava-se, na tu ra lmen te , q u e as c idades e ram construídas para as pessoas. Em s intonia com a f lorescente expansão urbana, o desenvo l v imen to da c idade transferiu-se para prof iss ionais , os urbanistas. Teorias e ideo log ias começaram a subst i tu i r a tradição c o m o base para o desenvo l v imen to . O m o d e r n i s m o teve e n o r m e influência, c o m sua visão de c idade c o m o máquina e c o m suas partes separadas por função. Aos poucos, u m novo g rupo , o de planejadores de tráfego, e n t r o u e m cena c o m suas ideias e teor ias de c o m o garant i r as me lhores c o n d i - ções - para o tráfego de veículos. N e m os urban is tas , n e m os p l ane jadores de tráfego c o l o c a r a m o espaço u r b a n o e a v ida nas c idades no t o p o de suas agendas e, por m u i t o s anos, havia p o u c o c o n h e c i m e n t o sobre c o m o as estruturas físicas i n f l uenc i am o c o m p o r t a - m e n t o h u m a n o . As consequências drásticas desse t i p o de p l a n e j a m e n t o sobre o uso da c idade pelas pessoas não f o r a m reconhec idas até m u i t o depois . Em geral , o p l a n e j a m e n t o u r b a n o ao l o n g o dos últimos c i n q u e n t a anos t e m sido tarefa difícil. Não se reconhece que a v ida na c idade t enha se d i s tanc iado de seguir a tradição para tornar-se u m a função urbana v i ta l , e x i g i n d o cons ide - ração e cu idadoso p l a n e j a m e n t o de prof issionais. Agora , depo i s de m u i t o s anos, acumulou-se razoável c o n h e c i m e n t o e m rela- ção à conexão ent re f o r m a física e c o m p o r t a m e n t o h u m a n o . Temos uma a m p l i - t u d e de informações sobre o q u e p o d e e deve ser fe i to . Ao m e s m o t e m p o , as c idades e seus hab i t an tes tornaram-se m u i t o a t ivos na reivindicação p o r u m u rban i smo vo l t ado às pessoas. Nos últimos anos, e no m u n d o t o d o , mui tas ag lo - merações urbanas e m p r e e n d e r a m sérios esforços para concret izar o sonho de me lhores c idades para as pessoas. Inúmeros pro je tos inspi radores e estratégias urbanas visionárias a p o n t a m e m novas direções, após anos de negligência. De m o d o geral , agora se aceita que a v ida na c idade e a consideração pelas pessoas no espaço u r b a n o d e v e m ter u m papel-chave no p l a n e j a m e n t o u r b a n o e de áreas edif icadas. Não só esse setor fo i ma l a d m i n i s t r a d o d u r a n t e anos, mas só agora é que se percebe o q u a n t o cu idar das pessoas na c idade é fa tor essen- cial para obtenção de cidades mais vivas, mais seguras, sustentáveis e saudáveis; t odos ob je t i vos de crucial importância no século XXI. Espero que este l ivro possa dar uma modes ta contribuição para essa nova e i m p o r t a n t e direção. Este l ivro fo i possível e m função da estre i ta cooperação de u m g r u p o a l ta - m e n t e m o t i v a d o e capaz, c o m q u e m t raba lhar fo i u m prazer e u m a inspiração. Quero es tender meus sinceros ag radec imen tos a Andrea Have e Isabel Ducke t t pela sua ajuda na edição de fotos e diagramação, a Camilla Richter-Friis van Deurs pelos gráficos e ilustrações, a Karen S teenhard pela tradução d o l ivro d o d i n a - marquês para o inglês e, po r último, mas não menos i m p o r t a n t e , a B i rg i t te Bun- desen Svarre, ge ren te de p ro j e to , q u e d i r i g iu o autor, a e q u i p e e o p ro j e to c o m mão f i rme , mas gen t i l . Meus ag radec imen tos também ao escritório Gehl A rqu i t e tos , pe lo espaço e auxílio, s ob r e tudo na f o rma de muitas das ilustrações. Agradeço aos mu i t o s a m i - gos, colegas pesquisadores e fotógrafos d o m u n d o t o d o que , gene rosamente , co locaram suas fo tos à m i n h a disposição. Gostaria de agradecer a Solve jg Reigsted, Jon Pape e Klaus Bech Danie lsen pela crítica cons t ru t i va d o conteúdo e da edição. Um e n o r m e " m u i t o o b r i g a d o " também a Tom Nielsen, da Escola de A rqu i t e tu r a Aarhus, pelos conse lhos cons- t ru t i vos e a ten tos e m cada fase d o p ro je to . Ao lo rde Richard Rogers, de Londres, meus calorosos a g r a d e c i m e n t o s pe lo seu prólogo e val iosa introdução ao l ivro. D i r i jo a inda p r o f u n d o a g r a d e c i m e n t o à Fundação Realdania, q u e m e insp i rou a executar este p r o j e t o e p r o p i c i o u o auxílio f inance i ro para torná-lo possível. Para concluir , meus mais sinceros ag radec imen tos à m i n h a esposa, psicóloga Ingr id Gehl que , já no início dos anos de 1960, apon tava m e u interesse na inte- ração ent re f o r m a e v ida c o m o pré-condição crucial à boa a rqu i te tu ra e que , d is - c re tamente , sa l i entou que essa área específica precisaria de mu i t a compaixão e m u i t o s es tudos ao l o n g o dos anos. Nos anos subsequentes , Ingr id t r o u x e i l i m i - tada compaixão e in f in i tos insights t a n t o para m i m q u a n t o para a causa gera l . A você, m i n h a mais p r o f u n d a gratidão. Jan Gehl Copenhague, fevereiro de 2010 XV a dimensão humana vs. ideologias de planejamento K V Os modernistas rejeitaram a cidade e o espaço da cidade, mudando seu foco para construções individuais. Essa ideo- logia tornou-se dominante por volta de i960 e seus princípios continuam a afetar o planejamento de muitas áreas urbanas novas. Se alguém pedisse a uma equipe de planejamento para reduzir drasti- camente a vida entre edifícios, eles não encontrariam um método mais efetivo do que a utilização dos princípios moder- nistas de planejamento (diagrama de Pro- pos d'urbanisme de Le Corbusier b946]2. Fotos: Tâby, Suécia; Melbourne, Austrália; e Nuuk, Groenlândia) progresso apesar das p robab i l i dades Nas c inco décadas desde 1961, mu i tos pesquisadores e teóricos d o p l ane j amen to u r b a n o contribuíram para os es tudos e a r g u m e n t o s nessa discussão da v ida o u m o r t e nas cidades. Acumulou-se g r ande q u a n t i d a d e de c o n h e c i m e n t o novo . Registrou-se também i m p o r t a n t e progresso no p l ane j amen to u rbano prático, t a n t o em t e r m o s de princípios de p l a n e j a m e n t o c o m o de p l a n e j a m e n t o d o trá- fego . Espec ia lmente e m décadas recentes, mu i t as áreas urbanas pe lo m u n d o t i v e r am q u e se esforçar para criar me lhores condições para pedestres e para a v ida urbana , d a n d o m e n o r p r io r idade ao tráfego de automóveis. Mais uma vez, sobre tudo e m décadas recentes, houve a lguns interessantes dis- t anc i amen tos dos ideais d o p l a n e j a m e n t o u r b a n o modern i s t a , pa r t i cu l a rmen te para a criação de novas c idades e áreas residenciais. Fe l izmente , v e m a u m e n - t a n d o o interesse na construção de áreas dinâmicas e de uso mis to , e m vez de g rupos de edifícios autónomos isolados. Nas últimas c inco décadas, t ambém h o u v e c o r r e s p o n d e n t e d e s e n v o l v i - m e n t o no p l a n e j a m e n t o de tráfego. Diferenciaram-se acomodações de tráfego, I ci; Nos países emergentes , a situação da dimensão h u m a n a é b e m mais séria e comp lexa . A maior ia da população é forçada a usar i n t ensamen te o espaço da c idade , para mu i t as a t i v idades cot id ianas . T rad i c i ona lmen te , o espaço u r b a n o f u n c i o n o u e m u m nível b e m aceitável para esses usos, mas q u a n d o o tráfego de automóveis, por e x e m p l o , cresce ve r t i g i nosamen te , a competição pe lo espaço se intensi f ica . A cada ano, as condições para a v ida urbana e para os pedestres tornam-se menos d ignas. a dimensão h u m a n a - dimensão Pela p r ime i ra vez na história, l ogo depo i s da v i rada d o milénio, a ma io r par te da necessária de u m novo p l a n e j a m e n t o população g loba l é u rbana e não rural . As c idades cresceram r a p i d a m e n t e e o c resc imento u r b a n o vai con t i nua r ace lerado nos próximos anos. Tanto as c ida - des existentes c o m o as novas terão q u e fazer mudanças cruciais e m relação aos pressupostos para o p l a n e j a m e n t o e suas pr ior idades . Deve-se destacar, c o m o obje t ivo-chave para o f u t u r o , u m ma ior f oco sobre as necessidades das pessoas que u t i l i zam as c idades. Esse é o p l ano de f u n d o para a proeminência da dimensão h u m a n a no p la - n e j a m e n t o u rbano , neste l ivro. As c idades d e v e m pressionar os urbanistas e os a rqu i t e tos a reforçarem as áreas de pedestres c o m o u m a política u rbana i n t e - grada para desenvo lver c idades vivas, seguras, sustentáveis e saudáveis. Igua l - m e n t e u r g e n t e é reforçar a função social d o espaço da c idade c o m o local de e n c o n t r o q u e c o n t r i b u i para os ob je t i vos da sus ten tab i l idade social e para uma soc iedade democrática e aber ta . procuram-se: c idades vivas, seguras, Agora , n o início d o século XXI, p o d e m o s perceber os c o n t o r n o s dos vários e sustentáveis e saudáveis novos desafios g loba is q u e sa l ientam a importância de uma preocupação m u i t o mais focal izada na dimensão h u m a n a . A visão de c idades vivas, seguras, sus ten - táveis e saudáveis tornou-se u m desejo universal e u rgen te . Os q u a t r o objet ivos- -chave - c idades c o m v i ta l idade , segurança, sus ten tab i l idade e saúde - p o d e m ser i m e n s a m e n t e reforçados pe lo a u m e n t o da preocupação c o m pedestres , ciclistas e c o m a v ida na c idade e m gera l . U m g rande reforço desses ob je t i vos é u m a intervenção política uni f i cada por t o d a a c idade para garant i r que os m o r a - dores s intam-se conv i dados a c am inha r e pedalar, t a n t o q u a n t o possível, e m conexão c o m suas a t i v idades cot id ianas . uma c idade cheia de v ida Reforça-se a po tenc i a l i dade para a c idade tornar-se viva, sempre q u e mais pes- soas sintam-se conv idadas a caminhar , pedalar o u pe rmanece r nos espaços da c idade. A importância da v ida no espaço público, pa r t i cu l a rmen te as o p o r t u n i - dades sociais e cu l tura is , assim c o m o as atrações associadas c o m u m a c idade cheia de v ida , será d iscut ida e m seção poste r io r d o l ivro. u m a c idade segura Em geral , reforça-se o po tenc ia l para uma c idade segura q u a n d o mais pessoas se m o v i m e n t a m pela c idade e p e r m a n e c e m nos espaços urbanos . Uma c idade q u e conv ida as pessoas a caminhar , po r definição, deve te r uma es t ru tura razoa- v e l m e n t e coesa que pe rm i t a curtas distâncias a pé, espaços públicos atrat ivos e u m a var iedade de funções urbanas. Esses e l emen tos a u m e n t a m a a t i v idade e o s en t imen to de segurança d e n t r o e e m vo l ta dos espaços urbanos . Há mais o lhos nas ruas e u m incen t i vo ma io r para a c o m p a n h a r os a con tec imen tos da c idade, a par t i r das habitações e edifícios d o e n t o r n o . 6 cidades para pessoas mais vias, mais tráfego - menos vias, menos tráfego Depois de cem anos de tráfego de auto- móveis, é notório que mais vias levam a um aumento de trânsito. Em Xangai, China, e em outras grandes cidades, maior número de vias, de fato, significa mais trá- fego e mais congestionamento. Quando Embarcadero, larga via expressa em São Francisco, foi fechada depois do terremoto de 1989, as pessoas rapida- menteadaptaram seu comportamento no trânsito e o tráfego residual encontrou outras rotas. Hoje, a Embarcadero é um agradável bulevar com árvores, bondes e boas condições para a vida na cidade e para os ciclistas. Em 2002, Londres introduziu um pedágio urbano em vias congestionadas, o que significava que os motoristas passariam a pagar para dirigir em determinada área do centro da cidade. Desde o começo, a cobrança dessa taxa reduziu drastica- mente o tráfego de veículos. Mais tarde, a zona atingida pelo pedágio foi ampliada a oeste e agora compreende quase 50 km2s. 8 c idades para pessoas convidando ciclistas - exemplo Copenhague Abaixo: indo para e vindo do trabalho e/ ou da escola em Copenhague (2008) 37% 4 % 20,000 15,000 5,000 £m 2005, um mo/or número de bicicletas do que de carros entrava e saía da zona central de Copenhague, durante as horas de pico. j ; ; ¡ fc. 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 Por muitos anos, Copenhague estimulou um maior uso de bicicletas. Agora, redes de boas ciclovias dão apoio a esse seguro e eficaz sistema alternativo de locomoção. Em 2008, os ciclistas respondiam por 37% da movimentação de e para o trabalho e escolas. O objetivo é atingir os 5 0 % 6 . O desenvolvimento de uma cultura dife- rente do uso da bicicleta é um resultado importante dos muitos anos de trabalho de estímulo às pessoas para pedalar em Copenhague. Essa prática tornou-se signi- ficativa na atividade cotidiana em todos os grupos sociais. Mais de 50% dos habi- tantes pedalam todos os dias7. 10 c idades para pessoas melhor espaço urbano, mais vida na cidade - exemplo Copenhague 1968 Um gradual processo iniciado em 1962 aumentou as áreas sem veículos em Cope- nhague. Estudos de 1968, 1986 e 1995, sobre a vida pública no espaço público, mostram que o índice das atividades de permanência aumentou quatro vezes no período estudado. Quanto mais espaço é ofertado, mais vida tem a cidadem. Acima à direita: Strxdet, uma rua de Copenhague antes e depois de sua conver- são em área com prioridade para pedes- tres em 1992. À direita: Nyhavn transformada em rua de pedestres em 1980. melhores condições para a v ida urbana - mais v ida na c idade Não é surpresa que uma conexão direta ent re convi tes e padrões de uso também possa ser d e m o n s t r a d a para a movimentação de pedestres e a v ida na c idade. Mu i t a s c idades an t igas es tabe leceram-se c o m o c idades para pedes t res , e essa função c o n t i n u a naque las o n d e a t o p o g r a f i a t o r n o u impossível o tráfego de veículos, o u o n d e a e c o n o m i a e as redes sociais a inda são baseadas nos percursos a pé. Veneza goza de uma situação toda especial entre as velhas cidades para pedes- tres. Ao l o n g o de sua mi l ena r história, c o n t i n u a m e n t e , t e m f u n c i o n a d o c o m o c idade de pedestres e, até hoje , f unc iona p o r q u e as inúmeras pon tes sobre os canais e as ruas estreitas i m p e d i r a m o acesso dos carros. Na Idade Média, Veneza era a ma io r e mais rica c idade da Europa. Além disso, o fa to de a c idade ter sido pensada e adaptada para uso de pedestres, du ran te séculos, a torna , hoje, pa r t i cu - l a rmente interessante c o m o m o d e l o para se t raba lhar c o m a dimensão humana . Veneza t e m t u d o : densa es t ru tu ra u rbana , cur tas distâncias a pé, belos per- cursos e espaços, in tensa m is tu ra de usos, térreos b e m at ivos , a r q u i t e t u r a 12 cidades para pessoas melhor espaço urbano, mais vida na cidade - exemplo Melbourne Tráfego de pedestres em Melbourne 265, 000 191,000 "O E 91,000 46,000 1993 2004 1993 2004 Entre 1993 e2004, a cidade de Melbourne, Austrália, implantou um amplo programa de melhoria das condições para a vida na cidade. O estudo realizado em 2005 mos- trou um aumento de 39% de pedestres desde 1993 e três vezes mais pessoas per- manecendo na cidade por certo tempo. As melhorias de qualidade serviram como um convite direto ao aumento dessa ativi- dade na cidade'1. A Federation Square é um dos novos espa- ços que funcionam bem em Melbourne e muitas das arcadas e alamedas esqueci- das da cidade foram incorporadas como espaços de permanência. No geral, Mel- bourne fez grandes esforços para estimu- lar os moradores a utilizarem sua cidade. 14 c idades para pessoas melhor espaço urbano, mais vida na cidade - exemplo rio Árhus, Dinamarca O rio que atravessa Ârhus, a segunda maior cidade da Dinamarca, foi cana- lizado e utilizado como importante via de tráfego, antes de ser reaberto em 1998. Desde então, a área de pedestres e recreação, ao longo do rio, é o mais popu- I'UI cjpuc^u UIOUIIU. Os pteçus do mercado imobiliário, ao longo do rio, também estão entre os mais altos da cidade. d o c u m e n t a n d o a v ida na c idade • i m p o r t a n t e i n s t r u m e n t o para o d e s e n v o l v i m e n t o u r b a n o Os l e van tamentos de M e l b o u r n e e C o p e n h a g u e são espec ia lmente interessan- tes, p o r q u e as análises da v ida no rma l na c idade d o c u m e n t a r a m q u e me lho ra r as condições para os pedest res e para a c idade leva essenc ia lmente a novos padrões de uso e mais v i t a l idade n o espaço u rbano . Uma ligação precisa en t re a qua l i dade d o espaço público e o propósito da v ida na c idade fo i c l a ramente d o c u m e n t a d a nas duas c idades, M e l b o u r n e e C o p e n h a g u e - no nível u rbano . m e l h o r espaço u rbano , mais v ida nas c idades - c idades, espaço u r b a n o e deta lhes Não é de es t ranhar q u e a estrei ta ligação en t r e uso d g gspaçg p y b j j f g P^lâS pessoas, a qua l i dade desse espaço e o grau de preocupação c o m a dimensão h u m a n a seja u m padrão gera l q u e p o d e ser v i s to e m todas as escalas. Ass im c o m o as c idades p o d e m conv idar as pessoas para uma v ida na c idade, há m u i - tos exemp los de c o m o a renovação de u m único espaço, o u m e s m o a mudança n o mobiliário u r b a n o e ou t ros deta lhes p o d e m conv idar as pessoas a desenvo l - ver u m padrão de uso t o t a l m e n t e novo . O r io Ârhus, na D inamar ca , c ana l i zado e t r a n s f o r m a d o e m via para o trá- f e g o de veículos na década de 1930, f o i r eabe r to e m 1996-1998 e os espaços ao l o n g o de seu curso t rans formaram-se e m área de recreação e pedestres . Desde então, as áreas ao l o n g o d o rio vêm s e n d o o espaço e x t e r n o c o m u m mais u t i - l i zado da c idade . Essa transformação fo i tão p o p u l a r e e c o n o m i c a m e n t e tão bem-suced ida - o va lor dos edifícios ao l o n g o d o r io mais q u e d o b r o u - q u e o u t r o t r e c h o m a i o r d o r io fo i r e a b e r t o e m 2008. O n o v o espaço da c i dade e os novos conv i t es l e va ram ao d e s e n v o l v i m e n t o de padrões c o m p l e t a m e n t e novos de uso da c idade . Mudanças s imples, c o m o melhor ias nos bancos no p o r t o de Aker Brygge, e m Oslo, p o d e m muda r os padrões de uso de fo rma signif icat iva. Em 1998, os bancos an t igos f o r a m substituídos por m o d e l o s novos que mais que d o b r a r a m a capa- c idade de assentos da área (+129%). Levantamentos feitos e m 1998 e 2000, antes 16 c idades para pessoas Dl Dl +129% 485 213 1998 2000 > 73 "D C L OJ " O O mais bancos, mais pessoas sentando - exemplo Aker Brygge, Oslo +122% 224 1998 2000 Os mais modestos convites também têm efeitos mensuráveis. A duplicação dos assentos em Aker Brygge, em Oslo, dobrou o número de pessoas sentadas nessa área'8. e depois da mudança, mostram que dobrou o número de pessoas que utilizam os bancos,em resposta às novas opções (+122%) 1 7. pessoas na cidade - uma questão de convite A conclusão de que se oferecido um melhor espaço urbano o uso irá aumentar é aparentemente válida para os espaços públicos de grandes cidades, os espaços urbanos isolados até para um único banco de praça ou cadeira. A conclusão, em geral, também é válida em várias culturas e partes do mundo, em inúmeros cli- mas e em diferentes economias e situações sociais. O planejamento físico pode influenciar imensamente o padrão de uso em regiões e áreas urbanas específi- cas. O fato de as pessoas serem atraídas para caminhar e permanecer no espaço da cidade é muito mais uma questão de se trabalhar cuidadosamente com a dimensão humana e lançar um convite tentador. A cada ano, no verão, a avenida ao longo do rio Sena, em Paris, é fechada e con- vertida na "Praia Paris", rapidamente invadida por milhares de habitantes que esperaram durante todo o inverno por esse convite. a dimensão humana 17 atividades necessárias, opcionais e sociais Atividades necessárias são partes inte- grantes, não opcionais, do dia a dia, Nesse caso, não se tem escolha. Atividades opcionais são divertidas e de lazer. A qualidade da cidade é uma condi- ção decisiva para esse importante grupo de atividades. Atividades sociais incluem todo tipo de contexto entre as pessoas e ocorrem em qualquer lugar onde existam pessoas nos espaços da cidade. 1.3 A cidade como lugar de encontro há muito mais em caminhar Como conceito,"a vida entre edifícios"inclui todas as diferentes atividades em que do que apenas andar! as pessoas se envolvem quando usam o espaço comum da cidade: caminhadas propositais de um lugar a outro; calçadões; paradas curtas; paradas mais longas; ver vitrines; bater papo e encontrar pessoas; fazer exercícios; dançar; divertir-se; comércio de rua; brincadeiras infantis; pedir esmolas; e entretenimento de rua19. Caminhar é o início, o ponto de partida. O homem foi criado para caminhar e todos os eventos da vida - grandes e pequenos - ocorrem quando caminhamos entre outras pessoas. A vida em toda a sua diversidade se desdobra diante de nós quando estamos a pé. Em cidades vivas, seguras, sustentáveis e saudáveis, o pré-requisito para a existência da vida urbana é oferecer boas oportunidades de caminhar. Con- tudo, a perspectiva mais ampla é que uma infinidade de valiosas oportunida- des sociais e recreativas apareça quando se reforça a vida a pé. Por vários anos, durante os quais a circulação de pedestres foi tratada, sobre- tudo, como forma de transporte dentro do planejamento de tráfego, a vida na cidade, repleta de nuances e oportunidades, foi amplamente ignorada ou negli- genciada. Os termos usados eram "tráfego de pedestres", "fluxo de pedestres", "capacidade da calçada" e "cruzar a rua com segurança". Mas nas cidades, há muito mais em caminhar do que simplesmente andar! Há um contato direto entre as pessoas e a comunidade do entorno, o ar fresco, o estar ao ar livre, os prazeres gratuitos da vida, experiências e informação. Em essência, caminhar é uma forma especial de comunhão entre pessoas que com- partilham o espaço público como uma plataforma e estrutura. é também - e em especial sobre - Se observarmos mais de perto os estudos sobre a vida na cidade, antes mencio- a cidade como lugar de encontro nados, percebemos que, uma após outra, nas cidades onde as condições para vivenciar o tráfego a pé foram melhoradas, a gama de atividades desenvolvidas por esse meio aumenta de forma significativa. Vemos até mesmo um crescimento mais amplo nas atividades sociais e de recreação. Como já mencionamos, um maior número de vias convida ao tráfego de auto- móveis. Melhores condições para os ciclistas convidam mais pessoas a pedalar, mas ao melhorar as condições para os pedestres, não só reforçamos a circulação a pé, mas também - e mais importante - reforçamos a vida da cidade. Assim, podemos ampliar o nível da discussão das questões de tráfego para uma discussão muito mais ampla e abrangente relativa às condições de vida e às opções humanas na cidade. a dimensão humana 19 uma vida urbana multifacetada vida urbana multifacetada Uma característica comum da vida no espaço da cidade é a versatilidade e a complexidade das atividades, com muito mais sobreposições e mudanças fre- quentes entre caminhada intencional, parada, descanso, permanência e bate- -papo. Aleatoriamente e sem planejamento, ações espontâneas constituem parte daquilo que torna a movimentação e a permanência no espaço da cidade tão fascinantes. Enquanto caminhamos para nosso destino, observamos pessoas e acontecimentos, somos inspirados a parar e olhar mais detidamente ou mesmo a parar e participar. Um evidente padrão central emerge da grande diversidade de atividades no espaço urbano. Um modo simples de identificá-las é colocar as categorias mais importantes em uma escala, de acordo com seu grau de necessidade. Em uma ponta ficam as atividades obrigatoriamente necessárias, ou seja, atividades que as pessoas geralmente têm que fazer: ir trabalhar ou à escola; esperar o ôni- bus; trazer mercadorias para clientes. Estas atividades acontecem sob qualquer condição. Na outra extremidade dessa escala ficam as atividades opcionais, no mais das vezes recreativas, das quais as pessoas poderiam gostar: caminhar em um cal- çadão;, ficar em pé e dar uma boa olhada na cidade; sentar-se para apreciar a vista ou o tempo bom. A maior parte das atividades urbanas mais atrativas e populares pertence ao grupo de atividades opcionais e por isso uma boa qualidade urbana é pré-requisito. Se as condições externas, como uma tempestade, tornam impossível o cami- nhar e a recreação, quase nada acontece. Se as condições são toleráveis, cresce o rol das atividades necessárias. Se as condições para permanência ao ar livre forem boas, as pessoas se entregam a muitas atividades necessárias e também a um número crescente de opcionais. Os pedestres ficam tentados a parar para apreciar o tempo, os lugares e a vida na cidade, ou as pessoas saem de seus edi- fícios para ficarem no espaço urbano. Cadeiras são levadas para frente das casas, e as crianças saem à rua para brincar. atividades necessárias - sob todas as condições atividades opcionais - sob boas condições 20 cidades para pessoas uma vida urbana versátil depende basicamente de convites Com razão, o clima é mencionado como importante fator para o alcance e o cará- ter das atividades ao ar livre. Se estiver muito frio, muito quente ou muito úmido, as atividades ao ar livre são reduzidas ou tornam-se impossíveis. Outro fator muito importante é a qualidade física do espaço urbano. Plane- jamento e projetos podem ser usados para influenciar o alcance e o caráter de nossas atividades ao ar livre. Convites para uma atividade ao ar livre que vá além de uma simples caminhada incluem proteção, segurança, um espaço razoável, mobiliário e qualidade visual. Os estudos mencionados sobre a vida na cidade t a m b é m documentam as grandes oportunidades para, de fato, convidar as pessoas não só para caminhar, mas também a participar de uma vida urbana versátil e variada. vida urbana diversificada - como uma velha tradição e como política urbana contemporânea As cidades e áreas urbanas criam o cenário para atividades específicas. Nas ruas mais centrais deTóquio, Londres, Sydney e Nova York, as pessoas caminham: não há lugar para mais nada. Nas áreas de férias e de turismo, onde passar o tempo, consumir e alegrar-se são prioridades, as pessoas são convidadas a passear e per- manecer por algum tempo. Em cidades tradicionais como Veneza, são estimula- das a uma vida urbana complexa e versátil onde há boas condições tanto para movimentação de pedestresquanto em espaços de permanência. Encontram-se padrões similares de atividades em Copenhague, Lyon, Melbourne entre outras cidades, grandes e pequenas que, nas últimas décadas, melhoraram expressi- vamente as condições para a vida nos espaços urbanos. Cresceu a circulação de pedestres e ampliou-se o número de atividades recreativas opcionais. interação entre a vida na cidade e a qualidade do espaço urbano. Ex.: Nova York Em Nova York, embora a circulação de pedestres tenha tradicionalmente domi - nado as ruas de Manhattan, em 2007 foi lançado um amplo programa para esti- mular maior versatilidade na vida urbana 2 0 . A ideia era permitir mais opções para recreação e lazer como complemento à ampla e obrigatória circulação de pedestres. Por exemplo, a ampliação de calçadas na Broadway criou espaço para ambiente físico alta qualidade ambiente físico baixa qualidade Representação gráfica da ligação entre qualidade de ambientes externos e ativi- dades ao ar livre. Um aumento na qua- lidade do ambiente externo estimula, em especial, as atividades opcionais. O aumento no nível de atividade é, portanto, um convite a um substancial aumento das atividades sociais. atividades necessárias ri atividades opcionais y a dimensão humana 21 interação entre espaço da cidade e vida da cidade - exemplo Nova York Em 2009, em Nova York, a Broadway foi fechada ao tráfego nas praças Times e Herald, obtendo-se com isso silêncio, dignidade e mais de 7000 m2 de vida na cidade. O nível de atividade nos novos espaços foi impressionante desde o pri- meiro dia2'. À esquerda: Times Square antes e logo depois da mudança. mesinhas de cafés e locais de permanência; também na Madison Square, Herald Square e Times Square os automóveis foram retirados, criando várias áreas e oportunidades para permanência. Em todos esses casos, as novas oportunida- des foram adotadas imediatamente. Quase diariamente, novos convites enri- quecem a vida na cidade, tornando-a ainda mais multifacetada. Até mesmo em Nova York, há uma necessidade óbvia de espaço urbano e grande interesse em participar mais da vida da cidade agora que existem mais oportunidades e con- vites concretos. atividades necessárias e opcionais como pré-requisito para atividades sociais É, em si mesmo, uma conexão importante o fato de tanto o caráter quanto a gama da vida urbana serem dramaticamente influenciados pela qualidade do espaço público. A conexão torna-se ainda mais interessante se olharmos as rela- ções entre as atividades necessárias, opcionais e o significativo grupo de ativi- dades sociais. Se a vida na cidade é reforçada, criam-se as pré-condições para fortalecer todas as formas de atividade social no espaço urbano. atividades sociais - a cidade como Atividades sociais exigem a presença de outras pessoas e incluem todas as for- lugar de encontro mas de comunicação entre as pessoas no espaço público. Se há vida e atividade no espaço urbano, então também existem muitas trocas sociais. Se o espaço da cidade for desolado e vazio, nada acontece. As atividades sociais incluem uma extensa gama de atividades diversas. Há muitos contatos passivos de ver e ouvir: observar as pessoas e o que está acon- tecendo. Essa modesta e despretensiosa forma de contato é a atividade social urbana mais difundida em qualquer lugar. Há contatos mais ativos. As pessoas cumprimentam-se e conversam com os conhecidos. Há encontros casuais e bate-papos em mercados, bancos de praça e em todos os lugares onde as pessoas tenham que esperar algo. As pessoas fazem perguntas sobre localizações e rotas e trocam breves comentários sobre o tempo ou o horário do próximo ônibus. Às vezes, desses rápidos cumprimentos pode surgir um contato mais amplo. Novos assuntos e interesses comuns são discuti- dos. Novas amizades podem desabrochar. Imprevisibilidade e espontaneidade 22 cidades para pessoas são palavras-chave. Entre os con ta tos mais a m p l o s contam-se as br incade i ras infant is o u jovens q u e saem j u n t o s e u t i l i zam o espaço da c idade c o m o p o n t o de encon t ro . Por f i m , há u m g r ande g r u p o de at iv idades c o m u n s mais ou menos p lane ja - das: ida a mercados , festas de rua, encont ros , desfi les e manifestações políticas. C o m o já m e n c i o n a d o , as at iv idades de ver e ouv i r são as pr inc ipais categorias de c o n t a t o social . São também as fo rmas de c o n t a t o que mais p o d e m ser i n f l u e n - ciadas pe lo p l a n e j a m e n t o u rbano . Os conv i tes bas i camente d e t e r m i n a m se os espaços da c idade têm a v i t a l idade que favorece o e n c o n t r o en t re as pessoas. A questão é i m p o r t a n t e p o r q u e esses con ta tos passivos - de ver e ouv i r - f u n c i o - n a m c o m o p a n o de f u n d o e c o m o t r a m p o l i m para as out ras f o rmas de con ta to . Através da observação, d o ouv i r e exper ienc iar os ou t ros , j u n t a m o s informações sobre as pessoas e a soc iedade e m t o r n o de nós. É u m princípio. Exper ienciar a v ida na c idade é t ambém u m e n t r e t e n i m e n t o e s t i m u l a n t e e d i v e r t i do . As cenas m u d a m a cada m i n u t o . Há m u i t o a se ver: c o m p o r t a m e n t o s , rostos, cores e s en t imen tos . E essas experiências estão re lac ionadas a u m dos mais i m p o r t a n t e s t emas da v ida h u m a n a : as pessoas. - : - = Essa declaração - "o h o m e m é a ma io r a legr ia d o h o m e m " - v e m de Hávamál, u m p o e m a épico islandês de mais de mil anos que , sucintamente, descreve 0 e n c a n t o e interesse h u m a n o p o r ou t ras pessoas. Nada é mais i m p o r t a n t e o u fasc inante 2 2 . M e s m o de seus berços, os bebés esrorçam-se para ver o mais possível e mais t a rde , e n g a t i n h a m pe la casa t o d a para a c o m p a n h a r o m o v i m e n t o . Crianças mais velhas t r azem seus b r i n q u e d o s até a sala o u a coz inha para f i ca rem o n d e a ação acontece . As br incadeiras externas a con tecem não necessar iamente nos playgrounds o u e m áreas livres de automóveis, mas mais f r e q u e n t e m e n t e nas ruas, es tac ionamentos ou e m f ren te às portas de ent rada , o n d e estão os adu l tos . Os jovens encontram-se p e r t o das ent radas o u nas esquinas para a c o m p a n h a r - e ta lvez par t i c ipar - dos a con tec imen tos . madores de tam-se para ia na cidade a dimensão humana 23 24 c idades para pessoas Garotas olham para garotos e vlce-versa - durante toda a vida. Os mais velhos acompanham a vida e as atividades da vizinhança através de suas janelas, saca- das e bancos. Por toda a vida, temos uma constante necessidade de novas informações sobre as pessoas, sobre a vida, à medida que ela acontece, e sobre a sociedade em torno de nós. Novas informações são conseguidas não importa onde as pes- soas estejam e, portanto, em grande parte no espaço comum da cidade. a maior atração da cidade: as pessoas Estudos de cidades do mundo todo elucidam a importância da vida e da ativi- dade como uma atração urbana. As pessoas reúnem-se onde as coisas aconte- cem e espontaneamente buscam outras pessoas. Entre escolher caminhar por uma rua deserta ou uma rua movimentada, a maioria das pessoas escolheria a rua cheia de vida e atividade. A caminhada será mais interessante e segura. Estudos de ruas comerciais no centro de Copenha- gue mostram como acontecimentos, eventos e canteiros de obras, locais onde se pode observar as pessoas trabalharem, agirem, tocarem música ou construí- rem casas, atraem muito mais gente para permanecer e observar do que lojas ao longo das fachadas dos edifícios. Estudos de posicionamento de bancos e cadeiras noespaço da cidade mostram igualmente que assentos com a melhor visão da vida na cidade são usados com muito mais frequência do que aqueles que não oferecem a visão de outras pessoas23. A localização e o uso de cadeiras dos cafés contam uma história parecida. A mais importante atração em um café de calçada sempre é a calçada e, portanto, a visão da vida urbana; a maioria das cadeiras dos cafés é disposta para tal. Nada fala mais alto sobre a "vida entre edifícios" como um atrativo do que as perspectivas dos arquitetos. Não importa se a dimensão humana, nos projetos, é tratada com cuidado ou completamente negligenciada; os desenhos estão cheios de pessoas alegres e animadas. As pessoas ali retratadas emprestam aos projetos uma aura de felicidade e atratividade, enviando um sinal de que ali são encontradas boas qualidades humanas em abundância, seja esse o caso ou não. É evidente que as pessoas constituem a maior satisfação das pessoas - pelo menos nos desenhos! Ao longo da história, o espaço da cidade funcionou como ponto de encontro para os moradores, em vários níveis. As pessoas se encontravam, trocavam novi- dades, fechavam acordos, arranjavam casamentos - artistas de rua as entreti- nham, havia compra e venda de mercadorias. As pessoas compareciam aos grandes e pequenos eventos da cidade. Realizavam-se procissões, o poder se manifestava, festas e castigos eram publicamente realizados - tudo acontecia à vista do público. A cidade era o ponto de encontro. No século XX, o espaço da cidade continuou a funcionar como importante lugar de encontro social, até o triunfo dos ideais de planejamento do modernismo, o que coincidiu com a invasão dos automóveis. A discussão sobre a "morte e vida" nas cidades, desafiadoramente levantada, em 1961, pelo livro de Jane Jacobs, em grande parte lidava com a gradual perda de oportunidades dos espaços urba- nos de funcionarem como pontos de encontro24. Ainda que a discussão tenha satisfação com a vida na cidade - em desenhos de perspectiva a cidade como local de encontro - em uma perspectiva histórica sob pressão da invasão do automóvel e da ideologia modernista de planejamento a dimensão humana 25 continuado desde então, em muitos lugares a vida na cidade continuou a ser espremida para fora do espaço da cidade. Ideologias dominantes de planejamento rejeitaram o espaço urbano e a vida na cidade como inoportunos e desnecessários. O planejamento dedicou-se intensamente ao ideal de desenvolver um cenário racional e simplificado para as atividades necessárias. O aumento do tráfego de automóveis tirou de cena a vida na cidade ou tornou completamente impossível os deslocamentos a pé. As funções comerciais e de serviços concentraram-se, principalmente, em grandes e fechados centros de compras. as cidades negligenciadas - e a vida Podemos ver os resultados dessas tendências em muitas cidades, em especial na cidade anulada! no sul dos Estados Unidos. Em muitos casos, as pessoas abandonaram as cida- des e é praticamente impossível chegar aos vários equipamentos nelas presente sem carro. O pedestrianismo, a vida urbana e a cidade como local de encontro, todos foram anulados. a cidade como ponto de encontro - O acesso à informação indireta e os contatos explodiram em anos recentes. A TV, a no século XXI internet, o email, o celular possibilitam um amplo e fácil contato com pessoas do mundo todo. De tempos em tempos, surge a questão: a função de ponto de encon- tro do espaço da cidade pode ser assumida pelo conjunto de opções eletrônicas? Nos últimos anos, o desenvolvimento da vida nas cidades sugere um qua- dro totalmente diferente. Aqui os contatos indiretos e o conjunto de imagens retratando o que as outras pessoas fazem em outros lugares não compete com a vida nos espaços públicos; ao contrário, estimula as pessoas a se juntarem e a desempenharem um papel ativo. As oportunidades para estar lá em pessoa, para encontros olho no olho, e o caráter de surpresa e imprevisibilidade das expe- riências são qualidades vinculadas ao espaço da cidade como local de encontro. É interessante observar que nessas mesmas décadas, nas quais a vida na cidade sofreu um notável renascimento, os meios eletrônicos de contato foram introduzidos. Precisamos de ambos. Cidades vazias, sem a presença de pes- soas, são um fenómeno disseminado no sul dos Estados Unidos. A vida na cidade e os pedestres desistiram e tudo tem que ser feito de carro (Clarksdale, Mississippi). r Muitas mudanças sociais, em especial nas partes mais ricas do mundo, expli- cam o interesse crescente em se locomover e permanecer nos espaços comuns da cidade. A maior longevidade, mais tempo livre e melhores condições econó- micas, em geral, têm trazido mais tempo e mais recursos para recreação e lazer. Até 2009, metade dos domicílios de Copenhague era habitada por apenas um morador25. A retração do número de moradores aumenta a necessidade de con- tatos sociais fora de casa. Como resultado das inúmeras mudanças na maneira em que a sociedade e a economia são organizadas, muitas pessoas agora vivem uma vida cada vez mais privada com residências particulares, carros particula- res, equipamentos domésticos particulares e escritórios particulares. Com essa situação percebe-se um sólido aumento no interesse em reforçar os contatos com a sociedade civil em geral. Caminhar na cidade estimula experiências diretas de todos os nossos sentidos, bem como oportunidades atrativas para troca de sorrisos e olhares. (Robson Street, Van- couver, Canadá). a dimensão humana a dimensão democrática O espaço público tem um importante signi- ficado social como fórum para troca de ideias e opiniões. Essas novas opor tun idades e necessidades expl icam, e m ampla med ida , o dra - mático a u m e n t o no uso d o espaço c o m u m , ev idente e m todas as cidades que, nos últimos anos, vêm t raba lhando para recuperar o estímulo a uma vida na cidade. cidade como local de encontro - do ponto de vista social Em u m a dimensão m u i t o ma io r d o q u e a das arenas comerc ia is part iculares, o espaço público da c idade d e m o c r a t i c a m e n t e g e r i d o ga ran te acesso e o p o r t u - n idades de expressão de t o d o s os g rupos da soc iedade e l i be rdade para ativi- dades a l ternat ivas. A gama de at iv idades e atores demons t ra as o p o r t u n i d a d e s d o espaço público de reforçar a sus ten tab i l idade social. É s ign i f i ca t i vo que t o d o s os g r u p o s sociais, i n d e p e n d e n t e m e n t e da idade, renda, sfafus, religião o u etn ia , possam se e n c o n - t rar nesses espaços, ao se des locarem para suas a t i v idades diárias. Essa I u m a boa f o r m a de fornecer informação geral para qua lque r u m sobre a composição e un ive rsa l idade da soc iedade. Além disso, faz c o m q u e as pessoas sintam-se mais seguras e conf iantes q u a n t o a expe r imen ta r os valores h u m a n o s c o m u n s r ep roduz idos e m di ferentes con tex tos . Jornais eTV representam o o p o s t o dessa inequívoca o p o r t u n i d a d e de as pes- soas expe r imen t a r em e m pr ime i ra mão a v ida cot id iana da c idade. A Informação dada por esses meios de comunicação concentra-se, sobre tudo , e m repor tagens de ac identes e assaltos ou outras formas de agressão e apresenta u m q u a d r o d is - t o r c i do d o que rea lmente ocorre na sociedade. M e d o e generalizações grosseiras a b u n d a m nesse t i p o de a tmosfera . É interessante perceber c o m o as estratégias de prevenção ao c r ime en fa t i zam o reforço dos espaços c o m u n s para q u e o e n c o n t r o en t re vários g rupos sociais seja par te rot ineira da vida cot id iana . Pode-se p e n s a r e m p rox im idade , confiança e consideração mútua c o m o es tando e m d i re ta oposição a muros , portões e ma io r presença pol ic ia l nas ruas. a dimensão democrática O interesse público d e t e r m i n a as regras d o j o g o n o espaço c o m u m da c idade e assim ajuda a garant i r às pessoas as o p o r t u n i d a d e s para o intercâmbio de m e n - sagens pessoais, cu l tura is e políticas. 28 cidades para pessoas A importância do espaço da cidade é destacada na Primeira Emenda à Cons- tituição dos Estados Unidos, que estabelece para seus cidadãos a liberdade de expressão e o direito de reunir-se em assembleia. Essa importância também é sublinhada pelas frequentes proibições de reuniões públicas nos espaços da cidade por parte de regimes totalitários. Como interface aberta e acessível entre as pessoas, o espaço urbano garante uma importante arena para grandes encontros, manifestações e protestos polí- ticos, bem como para atividades mais modestas, por exemplo, coleta de assina- turas, distribuição de folhetos, realização de happenings ou protestos. a cidade como lugar de encontro - Sustentabilidade social, segurança, confiança, democracia e liberdade de expres- pequenos eventos e grandes são são conceitos-chave para descrever as perspectivas da sociedade vinculadas perspectivas à cidade como local de encontro. A vida no espaço da cidade é abrangente: de olhares momentâneos a eventos menores ou a grandes manifestações coletivas. Caminhar pelos espaços comuns da cidade pode ser um objetivo em si mesmo - mas também um começo. cidades pelas pessoas e para as Diferentemente do espaço urbano de Veneza, o espaço reconquistado em Cope- pessoas nhague, Melbourne e Nova York não representa um tradicional e nostálgico idí- lio. São cidades contemporâneas com economias sólidas, grandes populações e funções urbanas versáteis. O admirável é que elas refletem uma compreensão crescente de que as cidades precisam ser pensadas para enviar convites à circu- lação de pedestres e à vida na cidade. Elas reconhecem a importância dos pedes- tres e dos ciclistas para a sustentabilidade e saúde da sociedade, e reconhecem a importância da vida urbana como um ponto de encontro atrativo, informal e democrático para seus residentes no século XXI. Depois de quase cinquenta anos de negligência com a dimensão humana, agora, no início do século XXI, temos necessidade urgente e vontade crescente de, mais uma vez, criar cidades para as pessoas. a dimensão humana 29 s Sentidos e a Escala sentidos, movimento e espaço O cliente: um ser humano de orientação horizontal, frontal, linear, que anda no máximo a 5 km/h. (Laura, i ano de idade.) Os elementos básicos da arquitetura da cidade são espaços de movimento e espa- ços de experiência. A rua reflete o padrão de movimento linear dos pés e a praça representa a área que o olhar pode abar- car (Cidade de Pedra de Zanzibar e Ascoli Piceno, Itália) Essa pequena cidade está aninhada na baía como um sofá de canto numa sala. As cos- tas estão protegidas e o cenário está numa escala humana. É um bom lugar para se estar - e também um bom lugar para uma cidade (Portofino, Itália). 32 c idades para pessoas 2.1 Os sentidos e escala _ m namífero de orientação linear, O natural ponto de partida do trabalho de projetar cidades para pessoas é a frontal, horizontal caminhando a mobilidade e os sentidos humanos, já que estes fornecem a base biológica das E ocidades máximas de 5 km/h atividades, do comportamento e da comunicação no espaço urbano. Os pedestres urbanos do século XXI resultam de milhões de anos de evolu- ção. O Homem evoluiu para mover-se lentamente e a pé e o corpo humano tem orientação linear. Embora nossos pés possam andar ou correr facilmente para frente, para trás ou para os lados eles se deslocam com grande dificuldade. Nossos sentidos tam- bém se desenvolveram de modo a permitir movimentos lentos em superfícies principalmente horizontais. Nossos olhos, ouvidos e nariz voltam-se para frente para nos ajudar a perceber perigos e oportunidades na rota adiante. Os bastonetes e cones na camada fotor- receptora dos olhos organizam-se de modo correspondente ao nosso campo de experiência horizontal, terrestre. Podemos ver claramente à frente, perifericamente para os lados, para baixo em certa extensão e muito pouco para cima. Nossos braços também apontam para frente e são bem posicionados para tocar algo ou afastar galhos em nosso caminho. Em suma, o Homo sapiens é um mamífero ereto de orientação horizon- tal, frontal e linear. Caminhos, ruas e bulevares são todos espaços para movimen- tação linear, projetados com base no sistema humano de locomoção. Um dos momentos mais memoráveis da vida é quando uma criança fica de pé e começa a andar: a vida, agora, começa para valer. Eis, então, nosso cliente, um pedestre com todos os seus atributos, potenciais e limitações. Trabalhar com a escala humana significa, basicamente, criar bons espaços urbanos para pedestres, levando em consideração as possibilidades e limitações ditadas pelo corpo humano. distância e percepção Em seus livros The Silent Language (1959) e The Hidden Dimension (1966), o antro- pólogo americano Edward T. Hall faz um excelente levantamento da história da evolução humana e uma introdução aos sentidos humanos, suas características e sua importância1. O desenvolvimento sensorial está intimamente ligado à história evolutiva e pode ser classificado simplesmente conforme os sentidos de "distância" - visão, audição e olfato - e os sentidos de "proximidade" - tato e paladar - relacionados à pele e músculos e, assim, à capacidade de sentir frio, calor e dor, bem como texturas e for- mas. No contato entre pessoas, os sentidos são ativados a distâncias muito díspares. os sentidos e a escala 33 Podemos ver pessoas a 100 metros de dis- tância e se a distância for menor, pode- mos ver um pouco mais. Mas a experiência somente se torna interessante e emocio- nante a uma distância de menos de dez metros, e de preferência a distâncias ainda menores, quando podemos usar todos os nossos sentidos2. A visão é o mais desenvo l v ido de nossos sent idos. Pr imeiro reg is t ramos o u t r o ser h u m a n o c o m o u m a f o r m a ténue à distância. D e p e n d e n d o d o f u n d o e da luz, p o d e m o s reconhecer pessoas c o m o seres h u m a n o s e m vez de arbustos o u an i - mais a uma distância de 300 a 500 met ros . Somente q u a n d o a distância d i m i n u i r para cerca de 100 met ros p o d e m o s ver m o v i m e n t o e l i n g u a g e m corpora l e m l inhas gerais. Género e idade p o d e m ser ident i f i cados c o n f o r m e o pedest re se ap rox ima e n o r m a l m e n t e r econhecemos uma pessoa à distância de 50 a 70 met ros . A cor d o cabe lo e a l i n g u a g e m c o r p o - ral característica também p o d e m ser perceb idas a essa distância. A u m a distância de 22 a 25 me t ros , p o d e m o s ler c o r r e t a m e n t e expressões faciais e emoções d o m i n a n t e s . A pessoa está fel iz, t r is te , e m o c i o n a d a o u brava? Con fo rme a pessoa se ap rox ima , mais deta lhes tornam-se visíveis, e o c a m p o de visão d o obse rvador se d i r i ge para a par te super ior d o co rpo , depo is só para o rosto e f i n a l m e n t e somen te para par te d o rosto. Enquan to isso, a pessoa já está há t e m p o s d e n t r o d o c a m p o de audição. A 50-70 met ros , p o d e m o s ouv i r g r i tos cid de ajuda. A 35 metros, podemos usar a comunicação unilateral em voz alta, como a usada em púlpitos, palcos ou auditórios. A uma distância de 20 a 25 metros, podemos trocar mensagens curtas, mas uma conversa de verdade só é possível quando se está a menos de 7 metros um do outro. Quanto mais curta a distân- cia, nafaixa de 7 metros a meio metro, mais detalhada e articulada pode ser a conversa3. Os outros sentidos também podem entrar em jogo conforme a distância dimi- nui: podemos perceber o suor ou perfume. Podemos sentir diferenças de tempe- ratura na pele, um importante meio de comunicação. Rubores, olhares afetuosos e a raiva cega são trocados de perto. Afeto físico e toques também se limitam a essa esfera íntima. :ampo social de visão Podemos resumir essas observações sobre distância, sentidos e comunicação dizendo que muito pouco ocorre a distâncias de 100 a 25 metros, após o que a riqueza de detalhes e a comunicação se intensificam dramaticamente, metro a metro. Finalmente, entre 7 e o metros, todos os sentidos podem ser usados, todos os detalhes percebidos e os mais intensos sentimentos podem ser partilhados. No contexto do planejamento urbano, onde a relação entre sentidos, comu- nicação e dimensões é um tema importante, falamos de campo social de visão. O limite desse campo é de 100 metros, quando podemos ver as pessoas em movimento. Outro limiar significativo é o de 25 metros, quando podemos começar a deco- dificar emoções e expressões faciais. Não é de se surpreender que essas duas dis- \ tâncias sejam a chave de muitas situações físicas em que o objetivo seja observar pessoas4. : cservação de eventos Arenas construídas para eventos com espectadores, como concertos, desfi- les e esportes envolvem novamente a distância dos 100 metros. Para jogos esportivos e competições atléticas, quando os espectadores precisam man- ter os olhos não somente na situação geral, mas também na bola, pessoas e movimentos, essa é aproximadamente a distância do meio de campo até os assentos mais distantes. As arenas são projetadas para que os assentos fiquem acima do nível do campo. Dessa forma, os espectadores podem ver tudo um pouco de cima, o que normalmente não é um problema para esportes, onde os padrões gerais de atividade são parte da atração. Permite-se a venda de ingressos desde que os assentos fiquem mais ou menos dentro dessa faixa mágica, a distância na qual se pode ver pessoas em movimento. Essa distância de 100 metros também implica um limite superior de lotação dos estádios. Mesmo as maiores arenas só podem acomodar um número l imi- tado de espectadores, com um máximo de cerca de 100. 000 assentos, como o estádio de futebol Camp Nou, em Barcelona (98.772) ou o estádio Olímpico em Pequim (91. 000). O que temos aqui é um "alcance de visão" muito efetivo, de 100 metros, um limite biológico para o tamanho dessas instalações. Se o número de espectado- res aumentar, o foco de sua visão deve ser ampliado. Em concertos de rock, a ima- gem e o som são ampliados em telões adaptados ao tamanho total da área do espaço dos espectadores. Em cinemas do t ipo drive-in, os filmes são projetados ala 35 para ver eventos n u m a tela g igan te , para q u e os espectadores possam seguir a ação, m e s m o a certa distância. experiência da emoção O s e g u n d o l imiar aparece e m tea t ros e salas de ópera: trata-se d o va lor de 25 met ros a pa r t i r d o qua l expressões faciais, canto bem articulado Ç ZQfíKfffi p o d e m ser percebidas. Tanto n o t ea t ro c o m o na ópera, o ob j e t i vo primário da comunicação é evocar emoções e estados de ânimo. Os rostos d e v e m ser visí- veis e deve ser possível ouv i r variações de t o m vocal . Se obse r va rmos casas de espetáculos e m t o d o o m u n d o , e n t r e t a n t o , ve re - mos q u e a distância crítica en t re pa lco e os assentos mais d i s tan tes é de 35 e não 25 met ros . O m o t i v o dessa ampliação da distância c o m o espec tador p o d e ser e n c o n t r a d o na l i n g u a g e m corpora l , m a q u i a g e m e projeção de voz dos ato- res. A m a q u i a g e m acentua e exacerba as expressões faciais, os m o v i m e n t o s cor - porais são h a b i l m e n t e enfa t izados , a l i n g u a g e m corpora l torna-se " t e a t r a l " e a l i n g u a g e m e m si é m o d u l a d a pela articulação e pe lo exagero : o q u e se chama de "sussurro de pa l co " p o d e ser o u v i d o a 35 me t ros . Todos esses recursos dão aos espectadores de t ea t ro uma sensação f o r t e das emoções e m j o g o , m e s m o q u a n d o o pa lco está a 35 met ros de distância. Esse é o l im i t e d o q u e é possível. Salas de espetáculo e teatros também a m p l i a m a quan t i dade de assentos para c ima e para os lados, buscando a capac idade máxima. C o m p l e m e n t a m os assen- tos da plate ia , e m f ren te ao placo, u m , dois o u três balcões local izados ac ima d o nível d o palco, c o m o é o caso também dos balcões laterais. Os mágicos 35 metros são o d e n o m i n a d o r c o m u m que nos pe rm i t e sent ir e exper imenta r . U m espaço p o d e a c o m o d a r ce r to número de espectadores , mas a q u a l i d a d e da experiência varia d r a m a t i c a m e n t e e essa diferença se ref lete de f o r m a igua l - men te dramática nos preços dos ingressos. Os maiores preços co r r espondem aos assentos n o m e i o da plate ia , mais próximos ao palco, nas pr imei ras filas o u nas pr imeiras filas dos balcões. Desses assentos, o espectador pode ver o espetáculo de f rente , de p e r t o e de c ima, e mais o u menos ao nível dos o lhos . É aí que as experiências são mais for tes . Os assentos cus tam menos q u a n t o mais para trás cada experiência t e m seu preço 36 c idades para pessoas expenenciar emoções se localizam, porque a experiência é menos intensa, apesar de ainda ser frontal e ao nível da visão. Mais acima, mais longe e mais para os lados, a experiência se torna mais distante e a visão mais desconfortável , e os preços dos Ingressos são proporcionalmente mais baixos. E, finalmente, há assentos ainda mais bara- tos nos balcões superiores e laterais. Na verdade, não se pode realmente ver o espetáculo desses assentos, apenas as perucas dos atores e sua movimentação. Em compensação, os detentores desses ingressos podem ouvir as falas e ter uma boa visão dos bastidores. Os assentos dos teatros e os preços dos ingressos nos dizem algo importante sobre nosso equipamento sensorial e a comunicação humana. As palavras-chave para os assentos mais atraentes são: proximidade, posição frontal e no mesmo nível do palco. As palavras-chave para os assentos menos atraentes são: maior distância e visão lateral. A visão menos atraente, com certeza, é a de cima. Dessa perspectiva, o espectador tem uma visão ampla, mas não pode ver rostos ou emoções. \osso sentido da visão desenvolveu-se Dara que pudéssemos ver e compreender : zje acontece no plano horizontal. Se vir- :Í oessoase eventos a partir de cima ou :-: 73ÍXO, é difícil perceber a informação essencial. os sentidos e a escala 37 O c a m p o de visão social de cerca de 100 me t ros também se ref lete n o t a m a n h o da ma io r pa r t e das praças de c idades ant igas . A distância de 100 me t ro s per - m i t e q u e os observadores fiquem e m u m can to e t e n h a m u m a visão geral d o que acontece na praça. Ao caminhar a lguns passos para d e n t r o da praça, a 60-70 metros , já p o d e m começar a reconhecer as pessoas e ver q u e m mais está lá. Mu i tas praças ant igas da Europa estão d e n t r o dessa fa ixa de dimensão. As praças ra ramente têm mais de 10.000 m 2 , sendo q u e a maior ia t e m ent re 6.000 a 8.000 m 2 , e mu i tas são b e m menores . Se obse rva rmos as dimensões, ve remos q u e são raras as distâncias maiores q u e 100 met ros , e as distâncias mais c o m u n s vão de 80 a 90 m 2 . A largura varia desde praças g e o m e t r i c a m e n t e quadradas até aquelas que têm o mais c o m u m f o r m a t o retangular , e uma m e d i da típica p o d e ser 100x70 met ros . Numa praça desse t a m a n h o , é possível observar todas as ati- v idades. Ao se atravessar a praça, pode-se ver a maior ia dos rostos d e n t r o de 25 metros , o q u e pe rm i t e perceber expressões e deta lhes faciais. As dimensões d o espaço o fe recem o m e l h o r de dois m u n d o s : visão geral e deta lhes. Na c idade toscana de Siena, a praça pr inc ipa l , Piazza dei Campo, é u m espaço grande . É mais longa d o lado da Prefeitura, 135 met ros , e t e m 90 me t ros na ou t ra dimensão. Uma fila de bal izadores ao longo do perímetro M&n0 Ód píÕÇã UÍÕ u m n o v o espaço, c o m a p r o x i m a d a m e n t e os 100 me t ros mágicos da distância da experiência. O m e i o da praça, a f u n d a d o c o m o u m a bacia, ga ran te uma visão per fe i ta e espaço para a t i v idades . O C a m p o de Siena d e m o n s t r a q u e grandes áreas também p o d e m ter uma dimensão h u m a n a , desde que cu idadosamen te pro je tadas . Ao passo que , na seção anter ior , descrevemos c a m i n h o s e ruas c o m o espaços para movimentação cuja f o rma está d i r e t a m e n t e re lac ionada c o m o m o v i m e n t o l inear dos pés, as praças e largos, e m sua f o r m a espacial , p o d e m i g u a l m e n t e estar re lac ionados ao o lhar e a sua po tenc ia l percepção de eventos d e n t r o de u m raio de 100 met ros . Enquan to a rua sinaliza movimeTto-- "(w&n<ar, í ^ j f . w f ren te "- , ps i co log i camente a praça sinaliza a permanência. Enquan to o espaço de m o v i m e n t o diz "vá, vá, vá", a praça diz "pare e veja o que acontece aqui" . Pés e o lhos de ixa ram uma marca indelével na história d o p l a n e j a m e n t o u rbano . Os c o m p o n e n t e s básicos da a rqu i t e tu ra u rbana são o espaço de m o v i m e n t o , a rua, e o espaço de experiência, a praça. o apare lho sensorial hor izonta l Já m e n c i o n a m o s q u e o preço dos ingressos de t e a t r o cai d r a m a t i c a m e n t e q u a n d o o espetáculo não pode ser v isto ao nível dos o lhos - sendo a visão menos d i spu tada aquela d o balcão mais a l to . A explicação está no apare lho sensorial h u m a n o , desenvo l v ido h o r i z o n t a l m e n t e . C o n f o r m e o h o m e m evo lu iu , a visão, os ou t ros sent idos e o c o r p o adaptaram-se a uma situação na qua l seus p r o p r i e - tários movem-se linear e horizontalmente ao r i t m o d o caminhar . No início de nossa história, era i m p o r t a n t e que os caminhan tes pudessem detec ta r per igos e i n im igos escond idos no c a m i n h o , e de tec ta r esp inhos e escorpiões n o t ra je to à sua f r en te . Também era crucia l p o d e r f icar de o l h o no que acontecesse nas laterais d o c am inho . O o lho p o d e ver de fo rma mais clara e precisa e a uma distância maior q u a n d o vo l t ado d i r e t a m e n t e à f rente . Além disso, cones e bastonetes na camada fotor- receptora dos o lhos estão o rgan izados , p r i n c i p a l m e n t e , de f o r m a ho r i zon t a l , escala, sent idos e dimensões d o espaço u rbano a praça - o espaço para permanência e para a t i v idade e m proporção à capac idade d o o lhar 38 cid oas aparato sensorial horizontal 50 -55 70°-80° : sso sentido da visão desenvolveu-se de ~:-~a a nos permitir caminhar no plano -orizontal. Não vemos muito para cima e ::-enas um pouco mais se olharmos para : : • o, o suficiente para evitar obstáculos i • -^osso caminho. Além disso, normal- nente inclinamos a cabeça para baixo - r, dez graus quando andamos5. Bd -'dos baixos estão de acordo com o r::relho sensorial horizontal humano, n as os edifícios altos não (Bo 01 e Turning ~: rso, Malmo, Suécia). - ocalização de verduras e legumes na (rente da loja diz muito sobre o nosso campo de visão. permitindo ver movimentos na lateral do campo de visão, perpendicular à dire- ção da caminhada. Entretanto, nossa visão para baixo e para cima desenvolveu-se de forma dife- rente. Para baixo, onde é importante ver onde pisamos, podemos ver de 70 a 80 graus abaixo da linha do horizonte. Para cima, onde nas fases posteriores de nossa história evolutiva encontramos poucos inimigos com que nos preocupar, o ângulo de visão é limitado a 50-55 graus acima do horizonte. Além disso, podemos mover nossa cabeça de um lado para outro para obser- var algo que acontece à beira do caminho.Também é fácil inclinar a cabeça para baixo, e de fato nossa cabeça já se inclina cerca de 10 graus para baixo durante uma caminhada normal, para melhor avaliar a situação no caminho. Já levantar a cabeça é bem mais difícil6. Nossos sentidos e nosso aparelho locomotor dão uma imagem clara de um pedestre extremamente alerta que olha para cima e para baixo, mas tem um campo de visão limitado para cima. Por isso, sempre foi uma boa ideia se os sentidos e a escala 39 sentidos e prédios altos 40 c idades para pessoas Esquerda: o contato entre os edifícios e a rua é possível nos primeiros cinco anda- res. O contato com a cidade rapidamente se dissipa a partir do quinto andar, com a interface de contato passando para vistas, nuvens e aviões. Nosso campo horizontal de visão implica que ao andarmos ao longo de fachadas de edifícios, somente os andares térreos nos trazem interesse e intensidade. Se as fachadas dos térreos forem ricas em variações e detalhes, nossas caminhadas urbanas serão igualmente ricas em expe- riências {rua em Gamla Stan, Estocolmo, Suécia, e andares térreos em Dublin, Irlanda). esconder nas árvores. Olhar para baixo é bem mais simples, mas olhar para cima é outra história: precisamos, literalmente, "esticar o pescoço". Todo esse relato sobre o aparelho sensorial horizontal é a chave para enten- der como experimentamos o espaço, por exemplo, qual parte dos edifícios os pedestres experimentam ao andar pelas ruas. Naturalmente isso também gera impacto na percepção de edifícios altos e baixos das cidades. Em geral, os anda- res mais altos dos edifícios da paisagem urbana podem ser vistos somente à dis- tância e nunca de perto. Eventos que ocorrem no espaço urbano ou nas portas e janelas dos andares térreos podem ser vistos à distância de até 100 metros. Nessas situações, também podemos nos aproximar e usar todos os nossos sentidos. Da rua, temos dificul- dade para perceber eventos que ocorrem nos andares mais altos. Quanto mais alto, maior a dificuldade de enxergar. Temos de recuar cada vez mais para ver, as distâncias se tornam cada vez maiores e o que vemos e percebemos diminui. Gritos e gestos não ajudam muito. De fato, a conexão entre o plano das ruas e os edifícios altos efetivamente se perde depois do quinto andar7. os sentidos e a escala 41 tempo para olhar Da mesma forma, a comunicação entre edifícios altos e seus arredores é exce- lente a partir dos dois andares inferiores e possível a partir dos terceiro, quarto e quinto andares. Podemos, então, ver e acompanhar a vida da cidade; podemos perceber a fala, gritos e movimentos de braços. Estamos realmente participando da vida na cidade. Acima do quinto andar, a situação muda drasticamente. Os detalhes não podem mais ser vistos, as pessoas no nível do solo não podem ser reconhecidas nem contatadas. Pela lógica, escritórios e residências acima do quinto andar deveriam pertencer ao âmbito das autoridades de tráfego aéreo. Pelo menos, não pertencem mais à cidade. 42 cidades para pessoas percepção e velocidade - uma criatura que vive a 5 km/h também pode fazê-lo a 15 km/h Nosso aparelho locomotor e nossos sistemas de interpretação de impressões sensoriais estão adaptados para caminhar. Quando andamos na nossa veloci- dade normal de 4 a 5 km/h, temos tempo para ver o que ocorre à nossa frente e onde colocamos nossos
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