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Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 1 www.cursoenfase.com.br Sumário 1. Bem jurídico e Constituição (continuação) ................................................................. 2 2. Princípios ..................................................................................................................... 4 2.1 Princípio da legalidade .......................................................................................... 4 2.1.1 Desdobramentos ............................................................................................ 4 2.1.1.1 As medidas provisórias e a legislação penal ........................................... 5 2.1.1.2 A Constitucionalidade das leis penais em branco ............................... 6 2.1.2 O princípio da legalidade e a taxatividade da lei penal ................................. 8 2.1.3 Conceitos normativos e descritivos e as limitações da precisão ................... 9 3. Analogia .................................................................................................................... 12 Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 2 www.cursoenfase.com.br 1. Bem jurídico e Constituição (continuação) Pode o legislador estar obrigado a castigar lesões a bens jurídicos constitucionalmente protegidos, como o aborto? Em outras palavras, a Constituição estabelece obrigações de tutela penal? A consequência prática seria considerar uma lei inconstitucional por proteção deficiente a um determinado bem jurídico. Há um tempo atrás houve essa discussão, mas o STF não se posicionou sobre esse tema. O MPF ajuizou uma ADI para questionar a extinção de punibilidade pelo pagamento nos crimes contra a ordem tributária. Isso porque, na previsão de extinção de punibilidade, que hoje está revogada - não é mais assim- se podia pagar o tributo a qualquer tempo, ou seja, haveria a extinção da punibilidade caso houvesse o pagamento do tributo, mesmo, após confirmação da condenação pelo juízo ad quem. Atualmente, só se extingue a punibilidade se a pessoa pagar até o recebimento da denúncia. Quando houve essa previsão, o MPF avaliou que estava sendo dada uma proteção deficiente a questão tributária e, portanto, usou essa tese para questionar a constitucionalidade daquela lei nova. O STF não se posicionou e, implicitamente, não aceitou essa tese, porque aplicou reiteradamente o dispositivo legal em inúmeros habeas corpus. Qual seria a repercussão de admitir uma tese como essa? Diminuir a esfera de atuação e discricionariedade do Legislativo e ampliar a do Judiciário, porque se vai cada vez mais permitir que o Judiciário se intrometa ou participe (de forma negativa) das escolhas feitas pelo legislador. Se o legislador quer dar um determinado benefício aos sonegadores isso estaria, em tese, dentro da sua esfera de discricionariedade legislativa. Se entender, admitir a tese da proteção deficiente se estará dizendo que o Judiciário vai poder restringir essa discricionariedade também nesse ponto. Frise-se que essa tese mexe com o jogo entre os poderes. Existem duas correntes a esse respeito: 1ª corrente (corrente da possibilidade): Luciano Feldens, sustenta que é possível defender a tese da proteção deficiente e inconstitucionalidade das normas que protejam, de forma débil, bens jurídicos que estejam na Constituição como importantes e passíveis de tutela, inclusive penal. Como argumento, trouxe que há na Constituição previsões de tutela penal obrigatória. Nossa CF estabelece algumas obrigações de penalização (ex. 5º, XLII, XLIII, dentre outros). Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 3 www.cursoenfase.com.br Art. 5º, XLII, CRFB - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; Art. 5º, XLIII, CRFB - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; Observação: Se o legislador, no futuro, descriminaliza completamente o racismo, isso seria inconstitucional, porque a Constituição manda criminalizar. Ele poderá mudar o tratamento, mas não pode determinar que deixe de ser crime, pois está previsto na Constituição. Das obrigações de penalização se extrai: 1) A proibição do abolicionismo penal; Significa dizer que deve existir um direito penal, então a tese do abolicionismo não seria compatível com a Constituição. A tese de um Estado sem direito penal, no Brasil não é possível. Também não há como descriminalizar totalmente essas hipóteses em que a Constituição exige a criminalização. Mas não é disso que se está falando, fala-se de hipóteses em que a Constituição não exige explicitamente a proteção penal. Ela só exige a proteção daquele bem jurídico (a exemplo, a vida). Essas hipóteses é que estão em discussão. O racismo não está em discussão, por ser óbvio que a Constituição exige e que não pode ser descriminalizado. 2) A impossibilidade de revogação das normas que incriminam as condutas tratadas na CF; 3) Da necessária penalização de condutas como a retenção dolosa de salário (art. 7º, X), extrai-se que, implicitamente, se deseja também a proteção do próprio trabalhador e de seus direitos mais valiosos, os direitos fundamentais1. Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; Da previsão da criminalização da retenção dolosa de salário, Luciano Feldens conclui que se existe a imposição de penalização de uma situação como essa, implicitamente, da própria vida do trabalhador, é claro que não poderia haver uma descriminalização completa, pois isso seria contraditório com os próprios termos da Constituição. 1 Se retira implicitamente dessa previsão a ideia de proteção deficiente. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 4 www.cursoenfase.com.br Todas as demais situações em que se tivesse um plus em relação a essa lesão se poderia extrair daí uma obrigação de penalização também. Existe um outro fundamento, que é o da eficácia objetiva dos direitos fundamentais, da questão deles se irradiarem pelo ordenamento jurídico como um todo e se interpretar a legislação a partir desses direitos previstos na CF. Uma forma de interpretar seria a da proteção deficiente. Se o legislador protege um determinado direito fundamental, ele tem que implementar essa proteção e interpretar a legislação de acordo com a necessidade de proteção. Essa primeiracorrente defende que a partir da constatação de que determinados direitos fundamentais estão na Constituição, haveria uma obrigação de tutela penal desses direitos, que decorrem não só desse raciocínio de menos para mais (se há uma obrigação de penalização do menos, que é a retenção dolosa de salário, tem que haver uma obrigação de penalização implícita do mais, que são os direitos fundamentais). Ademais, como segundo raciocínio, mais sofisticado, o próprio efeito de irradiação dessas normas Constitucionais no sistema jurídico como um todo. Se há uma previsão constitucional de um determinado direito, todo o sistema jurídico tem que ser interpretado a partir dessa previsão. 2ª corrente: Dolcini e Marinucci, entendem que a CF apenas prescreve o dever de proteção aos bens jurídicos, mas não o modo de proteção destes mesmos bens. Cabendo ao legislador a escolha dos meios adequados, se será pelo direito penal, pelo direito civil, enfim. 2. Princípios 2.1 Princípio da legalidade Tem como origem histórica a Magna Carta Inglesa – 1215, as Declarações dos Direitos do homem e do cidadão e, no século XIX, com Feuerbach. Art. 5º, XXXIX, CF Art. 5º, XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; O princípio da legalidade, com o formato que se conhece hoje, foi verdadeiramente cunhado no Século XIX por Feuerbach. Ele tem suas raízes na Magna Carta, mas o formato de hoje foi no Século XIX com Feuerbach. 2.1.1 Desdobramentos Nullum crimen, nulla poena sine lege Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 5 www.cursoenfase.com.br O primeiro objetivo do princípio da legalidade é exigir que toda conduta criminosa esteja prevista em lei. Esse é o primeiro objetivo. Outro ato normativo, que não a lei formal, não pode criminalizar condutas. Isso no Brasil é tranquilo. Houve uma única tentativa, com Fernando Collor, de criminalizar condutas através de medidas provisórias, mas que foi unanimemente rechaçada pela comunidade jurídica. Isso no Brasil é uma questão tranquila. É interessante que se saiba que essa ideia do princípio da legalidade, que exige criminalização de condutas através de lei formal, que ela vem ganhando importância inclusive nos países da Common Law. Assim, na Inglaterra e nos EUA está em franca decadência a possibilidade de criminalização de condutas através ora da jurisprudência ora dos costumes. Essa é uma ideia que aos poucos vai se impondo na comunidade jurídica ocidental. Tem que existir lei formal para a criminalização de condutas. Essa ideia depois vai sendo desdobrada: 1) Praevia; Lei prévia: não basta que seja uma lei, ela tem que ser uma lei prévia à conduta criminosa. A lei entra em vigor e a conduta tem que ser posterior. 2) Scripta; Lei escrita: no sistema brasileiro não é possível criminalizar ou descriminalizar condutas através dos costumes. A tese de que o jogo do bicho é tolerado pelas autoridades e de sua suposta descriminalização não é possível no direito brasileiro. 3) Stricta; Lei estrita: essa lei não pode ser estendida por analogia. No nosso sistema não é possível colmatar lacunas do legislador através de analogia. O que não está previsto, o que não cabe na descrição, é lícito. 4) Certa. É a lei precisa, exige-se uma descrição exaustiva da conduta proibida. 2.1.1.1 As medidas provisórias e a legislação penal Com efeito, medida provisória não pode criminalizar condutas, o que não se discute. O que já se discutiu foi a possibilidade de medidas provisórias criarem causas de extinção de punibilidade, ou seja, de tratarem da matéria penal, de forma benéfica. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 6 www.cursoenfase.com.br O princípio da legalidade é uma garantia do cidadão, ele pode se planejar, organizar a vida tendo em vista a legislação penal e saber que, considerando que o que está posto, fora dali a conduta é lícita. Isso é uma garantia, que está ligada a ideia de segurança jurídica. Por essa razão, como o objetivo do princípio da legalidade é esse, ele não pode ser invocado para impedir a utilização de medidas provisórias para criar institutos ou hipóteses que beneficiem o agente. Recentemente, a lei do REFIS ou do PAES foram medidas provisórias, depois convertidas em lei, que criaram causas de extinção de punibilidade nos casos de pagamento do tributo nos crimes contra a ordem tributária. O MPF questionou isso, o princípio da legalidade não pode ser o fundamento. Pode se encontrar um outro fundamento na constituição para dizer que medida provisória não pode tratar de matéria penal, mas não o princípio da legalidade, porque aquelas eram normas benéficas. 2.1.1.2 A Constitucionalidade das leis penais em branco Relacionada à necessidade de que condutas estejam descritas em lei. A Norma Penal em Branco é, na verdade, uma forma, uma técnica legislativa. Ela funciona da seguinte maneira: o legislador descreve a conduta, mas algum dado daquela descrição precisa ser complementado por uma outra norma, que pode ser uma outra lei ou, como normalmente acontece, um outro ato normativo do Executivo. Pode ser que essa outra norma seja uma lei também, por exemplo: art. 237, CP. Rol de Drogas Vender drogas Art. 33 lei de Drogas Ato normativo do Ministério da Saúde Norma Penal em branco Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 7 www.cursoenfase.com.br Conhecimento prévio de impedimento Art. 237 - Contrair casamento, conhecendo a existência de impedimento que lhe cause a nulidade absoluta: Pena - detenção, de três meses a um ano. Esses impedimentos estão no Código Civil, que é uma lei. O complemento dessa norma penal em branco é uma outra lei. Como funciona a dinâmica da norma penal em branco? Para se compreender a proibição em sua inteireza, tem que conjugar a norma penal com outro ato normativo. Esse outro ato normativo pode ser uma lei, mas isso é exceção. Como regra, será um ato do Poder Executivo. De fato, o princípio da legalidade exige que a criminalização de condutas se dê através de lei, embora existam normas penais em que o complemento não é uma lei, mas um outro ato normativo do Executivo. Porque se utiliza dessa técnica cada vez mais? Porque o Direito Penal saiu da esfera do direito penal clássico que tratava dos bens jurídicos individuais (vida, patrimônio) e começou a tratar de atividades muito complexas (direito penal do ambiente, direito penal que trata dos crimes financeiros, por exemplo). Sobre essas atividades complexas, de que o direito penal também trata, sobre esses bens jurídicos que são protegidos pelo direito penal, é comum que se tenha atividades humanas altamente regulamentadas. Exemplo: extração de petróleo. Para que não haja danos ambientais a extração de petróleo é altamente regulamentada e essa regulamentação é muito dinâmica, porque a técnica evolui com muita rapidez. Como explorar petróleo hoje é diferente de como explorar petróleo há 20 anos atrás,porque a técnica mudou e a cada mudança a regulamentação precisa mudar rapidamente. Isso é assim não só quanto a este tema, mas com relação a questões financeiras, com a rapidez dos fluxos de comunicação, etc. Como o direito penal - que é um instrumento lento, porque a atividade legislativa é lenta, e é bom que seja, porque precisa discutir as matérias para se usar um remédio como o direito penal -, vai regulamentar essas atividades tão dinâmicas que demandam um tratamento rápido? A única forma é usar a técnica das normas penais em branco. Como isso funciona? Cabe ao legislador descrever o núcleo da proibição, ou seja, a conduta. Ele não pode delegar isso, ele tem que descrever o verbo e o núcleo da proibição. As circunstancias periféricas e dados complementares podem ficar para a norma complementar. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 8 www.cursoenfase.com.br Com isso, se combina o princípio da legalidade com a necessidade de regulamentação administrativa que o direito penal não pode substituir, porque não tem rapidez para isso. Essa necessidade de regulamentação administrativa precisa ser tão rápida quanto a dinâmica dessas atividades. Como se justifica isso à luz do princípio da legalidade? Será constitucional a norma penal em branco se a lei penal reservar para ela a descrição do núcleo da proibição, da conduta e dos seus elementos essenciais, só dados complementares serão passíveis de tratamento pela norma complementar. Se a norma complementar for outra lei (exemplo: art. 237, CP) não há problema com o princípio da legalidade. Haverá um problema com o princípio da legalidade quando a norma complementar não for uma lei e o legislador delegar para essa outra fonte, que não é uma lei, a descrição da conduta, do verbo que descreve a conduta criminosa ou de outros dados diretamente ligados a esse verbo. Essa é a posição predominante. Nilo Batista, por exemplo, é um crítico das normas penais em branco, mas essa posição é minoritária. 2.1.2 O princípio da legalidade e a taxatividade da lei penal A lei penal tem que ser prévia, escrita (não existe a criminalização de condutas através de costumes e nem a descriminalização, essa não é uma fonte normativa válida em matéria penal), estrita (não pode ser ampliada através de analogia) e certa (Precisa. Daqui se extrai um subprincípio da legalidade que é o princípio da taxatividade). O princípio da taxatividade é importante porque sem ele o próprio princípio da legalidade não faz sentido. A Constituição exige que só o legislador possa criminalizar condutas, para oferecer segurança, havendo uma lei que dispõe quais são as condutas criminosas. Porém, se essa previsão legal for tão vaga que tudo couber ali dentro, essa necessidade perderá a razão de ser. Imagine-se que o legislador, para economizar todos os artigos da parte especial, que tratam dos crimes contra o patrimônio dissesse que é crime qualquer atentado ao patrimônio, de fato estaria economizando artigos, mas com isso ficaria sem saber qual a conduta criminosa e o juiz poderia colocar ali dentro tudo o que ele quisesse, não haveria uma limitação da atuação do Judiciário em relação a do Legislativo. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 9 www.cursoenfase.com.br O princípio da taxatividade é importante em termos de segurança jurídica. Precisa ter ideia dos contornos da proibição. Na prática, é muito difícil usar o princípio da taxatividade, porque se utiliza nas normas, de forma geral, de palavras e as palavras, esses conceitos que elas traduzem, nunca são completamente precisos. Não existe uma precisão absoluta nunca, só os números são precisos. 2.1.3 Conceitos normativos e descritivos e as limitações da precisão Quando se descreve uma conduta através de um tipo penal, se utiliza de conceitos descritivos e de conceitos normativos. Descritivos – apreendidos pelos sentidos Conceitos Normativos – feito juízo de valor Vai se usar essa ideia, essa diferença, em toda teoria do delito. O legislador se utiliza de conceitos descritivos e normativos, e não é só o legislador penal. Conceitos descritivos são aqueles que se apreende através dos sentidos. Como se sabe que está diante de uma coisa, do tipo penal de furto, “coisa alheia móvel”? Pode-se ver, tocar, cheirar. Um conceito descritivo é aquele que pode ser constatado através da verificação sensorial (dos sentidos). Para os conceitos normativos é preciso fazer um juízo de valor, não vai percebê-los cheirando, tocando, olhando. Exemplo: No furto, a “coisa” se conceitua pelo modo descritivo, mas “alheia” é pelo modo normativo. Exemplo: se o copo de água pertence à Ana Paula, porque o Curso Ênfase disponibiliza, é necessário fazer um juízo de valor? Esse copo já pertence a ela porque está lá? Ou é necessário que haja uma explícita manifestação? Não basta olhar o copo, cheirar, tocar, para avaliar se é dela ou não, terá que fazer uma valoração de cunho jurídico. A questão de propriedade é jurídica, mas poderia ser uma valoração de cunho social. Exemplo: mulher honesta, bons costumes, etc. Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 10 www.cursoenfase.com.br Costuma-se acreditar que só os conceitos normativos têm uma margem de imprecisão, mas isso não é verdade. Todos os conceitos, descritivos e normativos, têm uma margem de imprecisão que impacta a taxatividade, não só os normativos. Exemplo: art. 121, CP Homicídio simples Art. 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. São dois conceitos descritivos: “matar” e “alguém”. “Alguém” é pessoa viva. Pode ser percebida uma pessoa viva olhando, tocando, pela verificação sensorial. “Alguém”, apesar de ser um conceito descritivo, tem importantes margens de imprecisão. Tem-se um núcleo de significado que é inquestionável. Exemplo: Ana Paula que está falando é uma pessoa viva. Mas todo conceito, alguns mais, outros menos, têm margem de imprecisão, um halo marginal de imprecisão. Exemplo: Alguém, no homicídio, pessoa viva. Há alguns atrás discutiu-se se a pessoa que o cérebro já tinha parado, mas que o coração ainda pulsava, era viva ou morta. Isso é importante para fins de transplante. Pode-se abrir o peito dela e arrancar o coração? Com efeito, uma lei veio para autorizar. Assim, o conceito de pessoa viva também pode apresentar uma margem considerável de imprecisão. Outro exemplo é o abortamento de fetos anencefálicos. Discutia-se se havia vida ou não. Todos os conceitos, não só os normativos, que dependem de um juízo de valor e os juízos de valor são, normalmente, imprecisos (exemplo: o que é bonito para Ana Paula pode CONCEITO Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 11 www.cursoenfase.com.brnão o ser para José), são imprecisos, os descritivos também. Todos eles têm uma margem de imprecisão, seja ela menor ou maior. Como o legislador trabalha com palavras, a precisão absoluta nunca será encontrada. Não existe precisão absoluta; só existe através de números, nunca através de palavras. O que se pode admitir é que a precisão tem graus. Existe uma hipótese de imprecisão total (qualquer atentado ao patrimônio) e uma hipótese utópica (que não existe), de precisão absoluta. E então tem-se os graus. Para se trabalhar o princípio da taxatividade precisaria descobrir a partir de que momento nessa linha uma norma se torna excessivamente imprecisa. Precisão absoluta nunca haverá, então deve-se admitir que alguma imprecisão é normal e não viola o princípio da taxatividade, senão o “matar alguém” é inconstitucional. Para trabalhar com o princípio da taxatividade e exigir precisão do legislador é preciso admitir que em algum momento o legislador exagera nessa imprecisão e estabelecer um limite para essa tarefa, o que é muito difícil. Por paradoxal que seja, o próprio princípio da taxatividade também é vago e os critérios também são vagos. Não havendo um critério que não gere dúvida. Para se ter uma ideia, na Europa e até nos EUA admite-se que a precisão de um dispositivo legal é fruto da previsão do legislador + jurisprudência. No Brasil não há a adoção dessa ideia explicitamente. Seria como se perguntar se o conteúdo da lei é claro. Avalia-se: soma-se à lei ao que a jurisprudência diz sobre ela. Se isso é claro, está atendido o princípio da taxatividade. Como avaliar se uma determinada lei é excessivamente vaga e viola o princípio da taxatividade? Isso é complexo. Não há acordão conhecido no STF declarando a inconstitucionalidade de uma lei por excessiva vagueza. * Imprecisão total (qualquer atentado ao patrimônio) Precisão absoluta Graus Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 12 www.cursoenfase.com.br Será trazido o pensamento de Roxin: um preceito será claro e determinado na medida em que do mesmo se possa deduzir o fim de proteção do legislador e sejam marcados limites a uma extensão arbitrária da interpretação. Roxin quis dizer que todas as previsões legais têm uma margem de imprecisão e não necessariamente haverá inconstitucionalidade. Só haverá inconstitucionalidade quando essa previsão legal for tão vaga que não permitir que se enxergue qual o fim da proteção e que não seja possível demarcar o limite entre a atividade do legislador e a do juiz. Quando não ficar claro um limite entre interpretação e analogia. A lei tem que ser capaz de oferecer um limite entre o que é puramente interpretar o que está nela e o que é analogia, porque na analogia se coloca algo que não está na lei. Se a descrição é tão vaga que se permite colocar ali o que não está, porque a descrição é muito aberta, haveria, então, inconstitucionalidade. 3. Analogia Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio. Analogia versus interpretação – limite: o sentido literal possível segundo a linguagem corrente. Diferenças entre: interpretação analógica, extensiva e analogia. Inadmissibilidade de normas que prevejam cláusulas genéricas do tipo “e casos similares” ou “e casos análogos”, salvo quando precedidas de uma série de casos homogênea sob a qual se reconduza um gênero identificável ou a um critério unívoco legislativamente prefixado. Conceito Legal * Interpretação Analogia DOCUMENTO Direito Penal – Parte Geral O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 13 www.cursoenfase.com.br Alguns anos atrás houve uma investigação muito grande em São Paulo, chamada de Operação Anaconda, que atingiu uma parte do judiciário paulista, inclusive o judiciário federal. Foi preso um juiz federal criminal e uma das condutas atribuídas a esse juiz foi a de subtrair fitas cassete de interceptações telefônicas que corriam na vara dele, porque aquelas conversas incriminariam policiais que estariam ligados a ele e a condutas dele. Na época, as interceptações telefônicas eram feitas por fita cassete, o que não existe atualmente. Ele foi acusado do crime do art. 314, CP (subtração de documento), porque fez desaparecer essas fitas-cassete. Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento Art. 314 - Extraviar livro oficial ou qualquer documento, de que tem a guarda em razão do cargo; sonegá-lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente: Pena - reclusão, de um a quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave. Fita cassete, como documento, é analogia ou interpretação?
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