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O Ambiente Na Obra De Winnicott Teoria E Pratica Clinica

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O AMBIENTE NA OBRA DE WINNICOTT: TEORIA E 
 PRÁTICA CLÍNICA 
 
 
 
Conceição A. Serralha de Araújo 
 
 
Resumo 
 
Este texto, com base na obra de Winnicott, discute a importância para a 
clínica psicanalítica de se buscar as características gerais e específicas do trabalho 
desse autor com crianças, no qual se verifica a participação dos pais. Enfatiza, 
também, a necessidade de discriminar os cuidados inerentes aos papéis da mãe e do 
pai, nas diferentes fases do amadurecimento da criança, uma vez que fundamentam 
tal trabalho. 
 
 
 
A psicanálise, desde o início de sua instituição como método 
investigativo e de tratamento psíquico, por Freud, sofreu vários acréscimos 
e alterações, feitos por ele e outros estudiosos, que mostram um progresso 
considerável desse método. 
É notório, entretanto, que a idéia de um progresso da psicanálise não é 
unanimemente aceita. Existem aqueles que não a vêem como ciência, 
aproximam-na das artes e da filosofia, e, sendo assim, não caberia falar em 
evolução. 
Para Freud, a idéia desse progresso era plenamente aceitável, apesar 
de que, em “Um estudo autobiográfico” (1925 [1924]), ele comentou como 
era-lhe impossível falar disso na fase em que a psicanálise já era praticada 
por outras pessoas, da mesma forma que pôde falar da ascensão gradativa 
desse método, quando as atividades deste eram, ainda, exercidas apenas por 
ele próprio. 
Contudo, pode-se perceber que Freud não só considerava a psicanálise 
passível de sofrer progressos, mas, também, como um método de valor 
terapêutico, o que alguns autores, principalmente de abordagem lacaniana, 
 2 
não reconhecem, alegando que a psicanálise tão somente amplia o 
conhecimento sobre si mesmo. Ele escreveu: 
 
Como método de tratamento é um método como muitos, 
embora seja, para dizer a verdade, primus inter pares. Se não 
tivesse valor terapêutico não teria sido descoberto, como o foi, 
em relação a pessoas doentes, e não teria continuado 
desenvolvendo-se por mais de 30 anos.” (Freud 1933 [1932], 
p. 154). 
 
 Winnicott, pediatra, psiquiatra infantil e psicanalista, pensava como 
Freud: via a psicanálise como uma ciência que se desenvolve. Em Natureza 
Humana, comentou: 
 
Os leitores habituados à leitura psicanalítica poderão ficar 
impacientes se considerarem um enunciado da teoria 
psicanalítica e o tratarem como se fosse uma formulação final 
que não deverá jamais ser modificada. A teoria psicanalítica 
está em permanente desenvolvimento, e deve desenvolver-se 
num processo natural e um tanto semelhante às condições 
emocionais do ser humano que esteja sendo estudado. (1988, 
p. 46, apud Loparic 2001). 
 
 No início de sua formação, ainda muito ligado às formulações 
freudianas e desconhecendo o pensamento de teóricos como Melanie Klein 
e Anna Freud, Winnicott, diante de inúneras histórias clínicas de neurose, 
psicose, distúrbios psicossomáticos e anti-sociais, encontrava dificuldades 
emocionais em seus pacientes, que pareciam ter se iniciado nos primeiros 
dias de vida e que não conseguiam ser explicadas pela teoria do complexo 
edipiano, a psicanálise de Freud. Segundo ele, “algo estava errado em algum 
lugar.” (Winnicott 1965va [1962], p. 157). 
As oportunidades que a pediatria lhe deu de observar os bebês com 
suas mães e, em muitos casos, conseguir que elas descrevessem o modo de 
vida de seus bebês no início, antes que os contatos mais íntimos caíssem no 
 3 
esquecimento, aliadas à sua análise pessoal, que o remeteu à sua própria 
infância, foram ampliando a sua visão das condições infantis precoces. 
Mesmo tomando contato com teorias desdobradas da teoria freudiana, não 
conseguia concordar com elas, já que estavam todas centradas no complexo 
de Édipo. 
Assim, ao definir a sua teoria do amadurecimento pessoal, ou 
teoria do desenvolvimento emocional do ser humano, Winnicott enfatizou 
que esta inclui “a história total do relacionamento individual da criança até 
seu meio ambiente específico.” (Winnicott 1971b, p. 14) É uma história que 
compreende o crescimento emocional do bebê e da pessoa cuidadora 
desse bebê, daquela que atende às suas necessidades específicas, ou seja, da 
mãe como “ambiente suficientemente bom” – a pessoa responsável pelas 
condições facilitadoras para que o crescimento do bebê se efetive. Deste 
modo, essa teoria acaba por compreender, também, o que acontece diante 
das interferências que dificultam ou impedem a suficiência do ambiente e, 
conseqüentemente, o crescimento do bebê. 
Desde muito cedo, Winnicott já verificava que, ao se estudar o 
adoecimento psíquico de uma pessoa, o curso da enfermidade ficaria 
compreensível como uma expressão das dificuldades próprias da vida, quer 
sejam nas tendências herdadas, quer sejam na influência do ambiente, quer 
sejam na interação de ambas. 
Ao reformular a teoria sobre os primórdios da vida psíquica, 
Winnicott criou novos conceitos, recusou conceitos tradicionais como 
“pulsão”, “representação mental”, “sujeito”, entre outros, inserindo a teoria 
psicanalítica do complexo edipiano num momento do amadurecimento 
mais distante do início deste. Ele partiu de bases distintas de Freud e outros 
autores psicanalíticos para formular a sua teoria do amadurecimento pessoal. 
Loparic (2000), teórico estudioso da obra winnicottiana, acredita que 
“a recorrente tese de Winnicott de que o ser humano, além de crescer 
fisicamente, vai resolvendo sucessivamente as mais diversas tarefas de 
integração, entre elas a unidade do si mesmo e do mundo em que habita”, 
aproxima Winnicott da ontologia de Heidegger da constituição do si 
mesmo cotidiano. E mais: 
 4 
 
O paralelo entre a transposição heideggeriana da psicologia 
psicanalítica de Freud e os resultados da redescrição 
winnicottiana da mesma abre campo para articulações futuras 
de um novo paradigma para a psicanálise, livre da tutela da 
metafísica da subjetividade objetificada. Além de ser 
filosoficamente mais genuíno, esse paradigma pós-metafísico, 
proposto nos escritos do filósofo alemão e do psicanalista 
inglês, parece conforme indicam as pesquisas de Winnicott e de 
seus seguidores, ser também mais eficiente do que o paradigma 
ottocentista de Freud na resolução de problemas clínicos.” 
(Loparic 1999, p. 137). 
 
Apoiado em Kuhn, Loparic (1996b) vê a psicanálise como uma 
ciência orientada por paradigmas e acredita que a teoria winnicottiana é 
responsável por progressos nessa ciência, tendo produzido uma revolução 
dentro desta ao promover uma mudança de paradigma. Essa mudança 
acontece quando Winnicott desloca o complexo edipiano do centro, ou do 
ponto de partida para a constituição do si mesmo e coloca em seu lugar a 
relação com a mãe. O problema edipiano, que era central na teoria 
psicanalítica tradicional, cede lugar ao problema do amadurecimento 
pessoal, sendo este último a identificação primária mãe-bebê. A matriz 
disciplinar da teoria tradicional, a teoria do desenvolvimento sexual, é 
também substituída na teoria winnicottiana pela teoria do amadurecimento 
pessoal, que será utilizada na solução de problemas tanto novos quanto 
antigos. Segundo Loparic (1996), “a teoria tradicional da progressão das 
zonas erógenas perde o status da teoria fundante e fica redescrita em termos 
da teoria do amadurecimento humano” (p. 46). 
 Para Winnicott (1987b), depois de conseguir pôr em evidência os 
aspectos intrapsíquicos, a psicanálise tinha, então, “condições de dar 
importância aos fatores externos, tanto bons quanto maus” ( p.122 ). 
Não era mais possível pensar em trabalho isolado com a criança, ou 
estudar a etiologia de uma doença tendo como objeto de estudo apenas o 
indivíduo afetado pelos sintomas da doença. Era preciso também um estudo5 
de seu ambiente e das relações com este ambiente, para compreender a 
natureza do problema e desenvolver um trabalho realmente alterador das 
condições da criança. 
Em seu trabalho clínico, Winnicott interessava-se em saber como 
foram os acontecimentos até então, que só poderiam ser conhecidos 
mediante o relato dos pais. Contudo, lembra Winnicott: "O relato dos pais, 
[...] é altamente suspeito como avaliação objetiva e na obtenção de 
resultados..." (1971b, p. 16). E mais: 
 
Não podemos chegar aos detalhes da história passada de uma 
criança através de questionamentos e de uma inquirição 
brusca. As mães precisam criar confiança no investigador e, 
depois talvez consigam relatar os detalhes de seu 
relacionamento com o bebê, na medida em que isso for 
relevante na etiologia do transtorno da criança. (1996c [1966], 
p. 191).
 
 
Em relação ao tratamento de crianças, Freud comentou: 
 
Se os pais são aqueles que propriamente se constituem em 
veículos de resistência, o objetivo da análise – e a análise 
como tal – muitas vezes corre perigo. Daí se deduz que muitas 
vezes é necessária determinada dose de influência analítica 
junto aos pais.” ( 1933 [1932], p. 146) 
 
Freud, entretanto, não explicitou como se daria essa influência, o que 
muitos clínicos acreditaram que viria num corolário aos resultados positivos 
obtidos durante a análise. 
Melanie Klein, por exemplo, acreditava ser importante manter os pais 
afastados do tratamento. Para ela, qualquer encontro com os pais era 
considerado uma invasão do espaço psíquico da criança, o que fazia 
aumentar as ansiedades paranóides desta, em número e intensidade, 
interferindo no trabalho analítico. Por entender que tudo eram manifestações 
do mundo interno da criança, ela acreditava também que a análise desse 
 6 
mundo, ou seja, das fantasias da criança, modificaria o seu meio familiar. Os 
pais eram recebidos anualmente, o que impedia o acesso deles ao que se 
passava no tratamento. Pode-se perceber, contudo, que as fantasias 
persecutórias geradas por sentirem-se excluídos, não lhes permitiam 
interpretar qualquer resultado como positivo, aumentando a resistência ao 
trabalho. 
Para Winnicott, no tratamento de muitas crianças, seria necessário ir 
além da influência analítica mencionada por Freud, qualquer que fosse a 
forma por meio da qual esta se desse. No caso Piggle, por exemplo, ele 
tentou analisar a sua própria maneira de trabalhar com os pais da criança e 
acabou sugerindo uma nova modalidade. Anotou: “dividir o material com os 
pais – terapia de família não – estudo de caso não – psicanálise partagée 
(compartilhada)” (p. 10). Ao finalizar o tratamento, percebeu que o 
desenvolvimento do relacionamento da paciente com seus pais fez parte do 
processo terapêutico total, e a participação dos pais no trabalho, bem como o 
intervalo entre as sessões, enfraqueceram o sentimento possessivo, 
viabilizando esse desenvolvimento. 
Desse modo, percebe-se que a consideração do ambiente, por 
Winnicott, não seria de valor apenas para o estudo da constituição saudável, 
ou não, de uma pessoa, mas também, como elemento participativo de uma 
prática clínica. Ele reconhece um lugar para os pais no trabalho analítico 
com as crianças e, na atualidade, quando os clínicos concluem sobre a 
impossibilidade de uma ajuda efetiva à criança sem um trabalho junto ao seu 
ambiente, torna-se essencial aprofundar o conhecimento acerca da 
especificidade do trabalho de um clínico que há muito tempo já se dera 
conta desse fato. Um estudo da especificidade de seu trabalho com os pais 
na análise da criança, faz-se não só interessante, mas fundamental. 
Além disso, discutir o âmbito de aplicação de uma psicanálise 
compartilhada, como também as mudanças que ocorreram de Freud a 
Winnicott na teoria dos distúrbios psíquicos e da relação terapêutica, que 
viabilizassem e apontassem a necessidade de uma psicanálise desse tipo, 
poderia conduzir, quem sabe, ao reconhecimento de mais um progresso da 
psicanálise. 
 7 
 O destaque da ênfase de Winnicott aos cuidados do ambiente, na fase 
inicial de vida, para a constituição saudável do ser humano como identidade 
unitária, tem sido feito por vários autores (Loparic 1996b, 2000; Dias 1998; 
Araújo 2002). 
Nas referências a uma adequação do ambiente, Winnicott quis 
transmitir a idéia de um ambiente que, no início, devido à dependência 
extrema do bebê, conseguisse adaptar-se totalmente às suas necessidades e 
que à medida em que o bebê fosse amadurecendo, conseguisse desadaptar-
se de acordo com a capacidade crescente do bebê de utilizar seus próprios 
recursos. Ao cometer falhas, esse ambiente seria capaz, então, de repará-las 
em tempo hábil, ou seja, num tempo que o bebê poderia suportar sem viver 
uma agonia impensável. Impensável, por não existir ainda ali uma pessoa 
integrada capaz de experienciar essa situação. 
Na teoria winnicottiana, sabe-se que a vida do ser humano é uma 
busca da continuidade de ser e a ameaça, que envolve todo o processo de 
desenvolvimento do indivíduo, é a possibilidade de não se integrar e de não 
continuar sendo. 
A doença psíquica, para Winnicott (1965b), não tem o mesmo 
sentido de doença dado pela psiquiatria, a qual lhe atribui um caráter 
hereditário ou constitucional; trata-se de um tipo de imaturidade, uma 
parada no continuar-a-ser do indivíduo por defesa ou reação contra a 
angústia que emerge diante de uma invasão, ou diante do impedimento de 
algo que precisava ter acontecido e não aconteceu. (Winnicott 1989vb 
[1965], p. 118). 
 
 
Deste modo, as conseqüências da falha ambiental para a saúde 
psíquica da criança podem ser relacionadas de acordo com o momento em 
que a falha acontece, na linha de evolução, que parte da dependência 
absoluta rumo à independência. (Winnicott 1965vc [1962]). 
Dentro dessa perspectiva, no estado de dependência absoluta, onde 
o amor é expresso por meio de um “holding” físico, se houver fracasso do 
ambiente, pode-se ter, como conseqüência, a paralisação ou interrupção do 
processo de amadurecimento; essa paralização se manifesta como uma 
deficiência mental independente de qualquer problema orgânico, ou uma 
 8 
esquizofrenia da infância (autismo), ou, ainda, uma predisposição para a 
doença mental mais tarde. 
Se o bebê é bem cuidado, ele amadurece recursos próprios que vão lhe 
permitindo uma dependência relativa. Ele vai percebendo os cuidados 
maternos e se percebendo como um Eu separado de um Não-Eu. Se houver 
fracasso do ambiente nessa fase, já haverá a “pessoa” do bebê passível de 
sofrer as conseqüências de uma falha. O resultado, então, poderá ser uma 
predisposição a distúrbios afetivos e tendência anti-social. 
 
 Caso a criança já seja capaz de experimentar momentos de 
independência, haverá situações em que ela vai precisar retornar à 
dependência e este retorno deverá lhe ser possível. Se houver fracasso nesse 
período, a criança pode desenvolver uma dependência patológica. Se os 
momentos de independência forem predominantes, um fracasso do ambiente 
pode resultar em surtos de violência e arrogância. 
Na fase em que a criança já é capaz de cuidar de si mesma e o 
ambiente já está internalizado, se houver fracasso do ambiente, este já não 
será tão desastroso, do ponto de vista da estrutura da personalidade. Quando 
já existe a identificação do indivíduo com os adultos, com grupos e com a 
sociedade, sem que ele perca a originalidade e conservando um certo 
quantum de impulsos agressivos e destrutivos, o fracasso do ambiente 
poderá resultar em “falta parcial de res ponsabilidade do indivíduo como pai 
ou mãe ou como figura paterna na sociedade.” (Winnicott 1965vc [1962], p. 
64). 
Percebe-se, então, que Winnicott, mesmo nos casos em que 
reconhecia a importância dos conflitosinternos no indivíduo, sabia que, em 
nenhum caso, o fator ambiental seria totalmente eliminado. 
 Este modo de ver a etiologia dos distúrbios psíquicos, pode parecer 
uma teorização muito determinista, de causa e efeito, no sentido de que se 
possa saber, com certeza, a partir de um determinado acontecimento na vida 
do indivíduo, o que lhe advirá. No entanto, o que faz o isolamento de um 
bebê, por exemplo, ser compreendido como efeito de uma incapacidade da 
mãe identificar-se com ele e, com isso, não conseguir atender às suas 
necessidades urgentes, é a análise retrospectiva, na qual percebe-se um 
 9 
padrão de falhas, uma não conscientização dessas falhas e, 
conseqüentemente, uma não possibilidade de reparação, fazendo a criança 
reagir aos sentimentos de aniquilação provenientes. É importante 
compreender que, sendo possível a conscientização das falhas e sua pronta 
reparação, as relações podem se alterar e condições desfavoráveis podem se 
reverter. 
Assim, parece ser de extrema importância explicitar os cuidados 
básicos tanto da mãe quanto do pai, constatados, por Winnicott, como 
necessários em cada um desses momentos do amadurecimento, quando se 
procura evitar as condições que contribuem para o adoecimento psíquico da 
criança, ou seja, quando se procura evitar um padrão desfavorável. 
Esses cuidados, certamente, têm diferenças conforme se dêem antes, 
durante, ou após o Édipo e têm especificidades também devido às 
características individuais. Estas especificidades, por sua vez, não têm como 
ser identificadas a priori, apenas ser consideradas como "algo" passível de 
acontecer, ou seja, uma possibilidade. 
Por outro lado, se a doença já estiver presente na criança, o saber 
acerca desse cuidados básicos e da possibilidade desses cuidados específicos 
pode contribuir para um tratamento mais eficiente, uma vez que muitos 
casos requerem o fornecimento da provisão adequada que faltou ao paciente 
num determinado tempo. 
Desse modo, se se pretende desenvolver uma clínica psicanalítica 
baseada na teoria do amadurecimento pessoal de Winnicott, é preciso pensar 
na necessidade do paciente em cada momento de seu amadurecimento 
pessoal, já que da necessidade primeira de existir surgem todas as outras 
necessidades. Com isso, a participação dos pais na análise infantil 
provavelmente teria variações consideráveis; essas diferenças não estariam 
relacionadas ao diagnóstico psiquiátrico, como fazem outras práticas, mas, 
sim, à idade emocional da criança no momento. Por conseguinte, mesmo no 
caso de uma criança não psicótica, os pais poderiam ter uma participação na 
análise, o que outros modelos psicoterapêuticos só implementam nos 
quadros de psicose. 
 
 10 
 
Referências bibliográficas 
 
Araújo, C. A. S. 2002: Contribuições de D. W. Winnicott para a etiologia 
 e a clínica do autismo. Dissertação de Mestrado em Psicologia 
 
 Clínica. PUC-SP. 
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 Doutorado em Psicologia Clínica. PUC-SP. 
Freud, S. 1925 [1924]: “Um estudo autobiográfico.” Edição Standard 
 Brasileira, vol. XX. Rio de Janeiro: Imago, 1976. 
_____ 1933 [1932]: “Novas conferências introdutórias sobre psicanálise.” 
 Edição Standard Brasileira, vol. XXII. Rio de Janeiro: Imago, 1976. 
Loparic, Z. 1996: “Winnicott e o pensamento pós -metafísico.” In: D. 
 
 W. Winnicott na Universidade de São Paulo: O verdadeiro e o falso. 
 
 Catafesta, I. (org.) São Paulo: Instituto de Psicologia da USP. 
_____ 1996b: “Winnicott: uma psicanálise não edipiana”. Percurso, ano IX, 
n. 17. 
_____ 1999: “Heidegger and Winnicott”. Natureza Humana, v. 1, n. 1. 
_____ 2000: “O ´animal humano´.” Natureza Humana, v. 2, n. 2. 
_____ 2001: “Esboço do paradigma winnicottiano.” Cadernos de história e 
filosofia da ciência, Série 3, v. 11, n. 2. 
Winnicott, Donald. W. 1965b:
 O ambiente e os processos de maturação: 
estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre: 
Artes Médicas, 1983. 
_____ 1965va [1962]: “Enfoque pessoal da contribuição kleiniana.” In: 
 1965b. 
_____ 1965vc [1962]: “Provisão para a criança na saúde e na crise.” In: 
 1965b. 
_____ 1971b: Consultas terapêuticas em psiquiatria infantil. Rio de 
 Janeiro: Imago, 1984. 
_____ 1977: The Piggle: relato do tratamento psicanalítico de uma 
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_____ 1987b: O gesto espontâneo. São Paulo: Martins Fontes, 1990. 
 11 
_____ 1989vb [1965]: “Notas sobre o retraimento e regressão.” In: 
 Winnicott, Clare, Shepherd, Ray e Davis, Madeleine (org.) 1989a: 
Explorações psicanalíticas: D. W. Winnicott. Porto Alegre: Artes 
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_____ 1996a: Pensando sobre crianças. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. 
_____ 1996c [1966]: "Autismo". In: 1996a.

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