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A GRIGEM DOS
FÁRMACOS
A DIVERSIDADE MOLECULAR
DOS PRODUTOS NATURAIS
A importância dos produtos naturais na terapêutica é reconhecida desde tempos
imemoriais. O conhecimento de plantas alucinógenas pelos ameríndios, que as
empregavam em seus ritos pagãos, bem como as propriedades afrodisíacas de
diversas poções preparadas a partir de distintas espécies vegetais, acompanha o
homem desde milénios. A busca do bem-estar e do prazer sempre estimulou o
homem, em todas as épocas, a se aproximar da natureza, ensinando-o a se uti¬
lizar das plantas e de suas substâncias.
PRODUTOS NATURAIS VEGETAIS
Diferentes classes químicas de produtos naturais originaram diversos fármacos,
de distintas categorias terapêuticas, como os alcalóides: quinina (2.1), morfina
(2.2), atropina (2.3) e muitos outros.1
HO,
quinina
(2.1)
*CH,
morfina
(2.2) OH
atropina
(2.3)
72 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
O curare, veneno que os índios da Amazónia usavam na ponta das flechas
para caçar e pescar, composto pelo extrato bruto, cru, de cascas ou raízes de
diversas plantas da região dos rios Amazonas e Orinoco, contém como principal
princípio ativo umalcalóide bisbenziltetraidroquinolínico, complexo, com a pre¬
sença de sal de amónio quaternário, solúvel em água, denominado ( +)-tubocu-
rarina (2.4) (Figura 2.1).Esta substância presente em até 4% do extrato de Chon-
drodendron tomentosum (Menispermacéa) é responsável pelas propriedades para-
lisantes, letais, do curare, especialmente devidas à sua ação sobre os receptores
nicotínicos da acetilcolina nos músculos. A tubocurarina (2.4) inspirou o surgi-
mento da classe terapêutica dos bloqueadores ganglionares, relaxantes muscu-
lares úteis em cirurgias intestinais, tendo como principais representantes o he-
Tubocurarina e sais de xametônio (2.5), succinilcolina (2.6) e pancurônio (2.7) (Figura 2.1).2
amónio quaternários.
hexametônio
(2.5)
(-F)-tuboourarina
(2.4)
pancurônio
(2.7)
succinilcolina
(2.6)
HqC
HoC
pilocarpina
(2.8)
H,CO
HN
emetina
(2.9)
A pilocarpina (2.8),encontrada
em Pilocarpusjaborandi (Rutácea),
com ampla ocorrência no Brasil, é
um alcalóide imidazólico com po¬
tentes propriedades colinérgicas.
Ela atua sobre os receptores mus-
carínicos da acetilcolina com em¬
prego em oftalmologia para o tra¬
tamento do glaucoma.
Outra contribuição relevante
da flora brasileirapara a terapêuti¬
ca está representada pela emetina
(2.9). É um alcalóide tetraidroiso-
QUÍMICA MEDICINAL 73
quinolínico isolado de Cephaelis ipecacuanha e C. acuminata (Rubiácea) com poten¬
tes propriedades amebicidas, largamente empregado no tratamento de desinte-
rias. Este alcalóide possui ainda importantes propriedades eméticas e também
encontrou emprego em preparações expectorantes.
A contínua busca por agentes capazes de permitir o controle do câncer motivou
o National Cancer Institute (NCI) dos Estados Unidos a promover um extenso
programa de pesquisas para investigar propriedades antitumorais em produtos
naturais vegetais que se iniciou em meados dos anos 1950.3 Neste programa
participavam os pesquisadores Monroe E.Wall e Mansukh C. Wani, chefiando o
grupo de pesquisa no Laboratório de Produtos Naturais do Research Triangle
Institute na Carolina do Norte, EUA. Estes pesquisadores deram, certamente, a
maior contribuição para a quimioterapia do câncer, descobrindo duas substâncias
naturais que foram introduzidas na terapêutica. A primeira, o paclitaxel (Taxol®,
2.10), isolado das cascas da árvore Taxus brevifolia Nutt.,com estrutura caracterís¬
tica, atua promovendo a polimerização de tubulinas e a estabilização de micro-
túbulos formados, representando um novo mecanismo farmacológico de inter¬
venção na proliferação celular.4 A descoberta desta substância, a elucidação de
sua original estrutura de biossíntese mista, com esqueleto tetracíclico terpênico
e uma cadeia lateral contento um resíduo de cx-hidroxi-aminoácido, assim como
seu inédito mecanismo de ação, fizeram do paclitaxel (2.10) objeto de inúmeros
estudos e diversas publicações ilustradas no livro The StoryofTaxol, de J. Goodman
e V. Walsh.5 O paclitaxel
(2.10) tem inspirado inú¬
meros projetos de pesquisa
visando a descoberta de
formulação passívelde em¬
prego por via oral, pois esta
substância natural é admi¬
nistrada apenas por via in-
jetável. Ademais, a desco¬
berta do Taxol® representa
relevante exemplo da con¬
tribuição da pesquisa bási¬
ca para o arsenal terapêu¬
tico contemporâneo.6
A Figura2.2 ilustraa se¬
quência cronológica da
descoberta do paclitaxel.7
A segunda contribuição
de Wall e Wani está repre¬
sentada pela camptotecina
(2.11), isolada da árvore
chinesa Camptotheca acumi¬
nata. Em contraste ao pa¬
clitaxel, esta substância al-
caloídica, também de bios¬
síntese mista, possuindo
umtérmino iridóide repre¬
sentado pelo anel lactóni-
co, foi descoberta comcerta
FIGURA 1.55
Sequência cronológica da
descoberta do paclitaxel
(Taxol®).
Bristol-Myers Squibb &
Florida State Un. estabelecem
licensing agreement para uso
pela BMS da semi-síntese
do paclitaxel
BMS e NIH estabelecem
licensing agreement
para uso exclusivo de três
patentes do NIH pela BMS
Monroe E. Wall &
Mansukh C. Wani
identificam o princípio
ativo de T. brevifolia
-T"
BMS patenteia
a marca TaxolNCI inicia Fase I
de ensaios clínicos
NSI (EUA)
descobrem
atividade
antitumoral
em extratos de
Taxus brevifolia
do Pacífico
Susan B. Horwitz
descobre que o
paclitaxel bloqueia
a divisão celular
alterando a dinâmica
microtubular
T
A
X
0
L
1998
NCI e BMS
assinam termo
de colaboração
BMS e NCI
assinam segundo
acordo de
cooperação para
estudo do paclitaxel
NCI inicia Fase II
de ensaios clínicos
BMS lança Taxol®
para tratamento do
câncer de ovário
74 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
dose de "acaso"* no âmbito de um programa de pesquisas do Departamento de
Agricultura dos EUA.3 Este programa, iniciado em 1958, visava, originalmente,
a descoberta de substâncias esteroidais a partir de extratos vegetais, capazes de
representar matérias-primas adequadas para a síntese de cortisona. Em 1960,
muitos dos milextratos estudados foram ensaiados em adrenocarcinomas, resul¬
tando na identificação das propriedades antitumorais da camptotecina (2.11),
que teve sua estrutura elucidada em 1966. Novamente, a exemplo do paclitaxel
(2.10), a descoberta da camptotecina (2.11) permitiu identificar-se um novo
mecanismo de controle da proliferação celular, através de inibição da enzima
topoisomerase-I, alvo terapêutico de ação de 2.11, até então inexplorado.8
OH
CH-
CH.
O-ill
CH-OH
HO
CH.
paclitaxel
(2.10)
vernolepina
(2.14)
* Para exemplos de fármacos descobertos
ao "acaso", vide infra.
camptotecina
(2.11)
Os alcalóides indólicos diméricos vincristina (2.12) e vimblastina (2.13) (Figu¬
ra 2.3) são fármacos eficazes, isolados de Vinca rosea, amplamente empregados
no tratamento de leucemias, especialmente em crianças. Estes fármacos repre¬
sentampoderoso instrumento terapêutico para o combate dessa doença e são obti¬
dos de fontes naturais pela Eli Lylli, que processa cerca de 8.000 kg de flores da
Vinca anualmente para obtê-los em quantidades necessárias ao consumo anual.
O desafio que representa a quimioterapia do câncer tem estimulado diversos
grupos de pesquisa de produtos naturais ao estudo de distintas e inúmeras plan¬
tas. Trabalhos de Morris Kupchan permitiram a identificação das propriedades
antitumorais de dezenas de sesquiterpeno-lactonas isoladas de inúmeras Com¬
postas, exemplificadas pela vernolepina (2.14).9
QUÍMICA MEDICINAL 75
CH
HO
CH
ÿMill
H OHO OH3C CH
vincristina R= H (2.12)
vimblastina R= CHO (2.13)
FIGURA 2.3
Visão estérica da
vincristina (2.12)
(WebLabViewer 2.0) e
estrutura química de 2.12
e vimblastina (2.13).Outros produtos naturais com propriedades antitumorais são a colchicina
(2.15),10 isolada em Colchicum autumnale, Lilliácea e a elipticina (2.16), isolada
de Apocináceas como Ochrosia elliptica."
elipticina
(2.16)colchicina OCH(2.15)
76 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
As raízes de Podophyllum hexandrum Royle, planta encontrada na China, de P.
emodiWall, na índia,e de outras espécies americanas (P. peltatum Linn.) produzem
constituintes lignânicos dos quais se identificou a podofilotoxina (PDT, 2.17),
que corresponde a uma lignana aril-tetralínica comumanel lactônico compondo
umsistema de cinco anéis. Extratos das resinas de Podophyllumspp. eram original¬
mente empregados como purgantes, sendo posteriormente descobertas suas pro¬
priedades citotóxicas. A partir deste padrão molecular "selvagem", impróprio
parauso terapêutico devido a toxicidade, modificações estruturais foram posterio-
mente introduzidas, especialmente em C-4 no anel B,12 levando a descoberta de
novos agentes anticâncer, como o etoposido (2.18).
OH
H3CO
OCH,
podofilotoxina
(2.17)
HO
HO*
OCH,
etoposido
(2.18)
H3CO.
isoquinolina
papaverina
(2.19)
A papaverina (2.19), um alcalóide benzilisoquinolínico encon¬
trado noópio (Papaversomniferum, Papaveracéa) com propriedades
espamolíticas e atividade vasodilatadora, teve seu emprego tera¬
pêutico original como expectorante. Os estudos de suas proprieda¬
des farmacológicas, realizados,em parte,por pesquisadores france¬
ses liderados por Virag, contribuíram para o conhecimento da fi-
siopatologia da disfunção erétil, sendo indicadapara seu tratamen¬
to por injeção intrapeniana.
A ioimbina (2.20), alcalóide indólico-terpenóide de ocorrência
em Rubiáceas (Corynanthe yohimbe) e Apocináceas (Aspidosperma
spp. ) tem sido empregado na medicina popular como afrodisíaco
devido as suas propriedades vasodilatadoras, decorrentes de sua
atividade antagonista ct2-adrenérgica, identificada em 1877. Estruturalmente
semelhante, contendo o mesmo esqueleto carbocíclico, com inversão em dois
centros estereogênicos, e a inclusão de um grupamento metoxila em C-ll, a
QUÍMICA MEDICINAL 77
reserpina (2.21), isolada de Rauwolfiaserpentina (Apocinácea),pode ser considera¬
da um alcalóide da classe dos ésteres trimetoxibenzoila relacionados a ioimbina
(2.20). É empregada como anti-hipertensivo ou tranquilizante brando e atua
modificando a taxa de estoque de catecolaminas. Entretanto, seu emprego conti¬
nuado tem provocado depressão severa em alguns pacientes.
H3CO
ioimbina
(2.20)
H,CO
H,CO
OCH-,
OCHq
reserpina
(2.21)
Inúmeros alcalóides classificados como indólicos-terpenóides, de biossíntese
comum, apresentam potentes propriedades em relação ao sistema nervoso central
(SNC), sobretudo aqueles que ocorrem em diversas plantas das famílias Cory-
nanthe,Aspidosperma, Apocinácea e Iboga,utilizadas pelos ameríndios e pelos povos
africanos como bebidas sagradas em festas pagãs.
A ibogaína (2.22) foi isolada de Tabernanthe iboga (Apocinácea), onde ocorre
com relativa abundância. O extrato desta planta era largamente empregado por
tribos nativas da África, que conheciam suas propriedades psicoativas,para redu¬
zir a fadiga e a fome. Sua estrutura foi definitivamente elucidada em 1958 e
apresenta umaunidadebicíclica nitrogenada, fundida ao anel indólicometoxilado
em C-5. Esta subunidade heterocíclica contém, ligado à posição 3 do núcleo
indólico, um grupo etilamina incluído no sistema bicíclico, que contribui para
sua similaridade estrutural com a serotonina (5-hidroxitriptamina;2.23), impor¬
tante neurorregulador endógeno (Figura 2.4). Esta similaridade estrutural as¬
segura sua ação ao nível dos receptores serotoninérgicos centrais, provocando
seus efeitos alucinógenos.
A Figura 2.4 ilustra a estrutura tridi¬
mensional da ibogaína (2.22) comparan-
do-a com a da serotonina (2.23).
Alguns alcalóides indólicos mais sim¬
ples estruturalmente, encontrados em al¬
gumas espécies de cogumelos, também
apresentam potentes propriedades aluci¬
nógenas. O género Psilocybe, de ampla ocor¬
rência natural, ganhou notoriedade pelas
inúmeras experiências alucinogênicas que
protagonizou, especialmente no Altiplano
mexicano, onde mais de 30 espécies aluci-
tnptamina
nógenas são conhecidas. Dentreestas, des- p 25)
H,C
N
—
CH-.
OH
psilocina
(2.24)
78 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
FIGURA 2.4
Estrutura química e visão
estérica da ibogaína (2.22)
e da serotonina [2.233
[WebViewer 2.0).
H,CO
ibogaína
(2.22)
serotonina
(2.23)
H,CO
harmina
(2.26)
CHi
taca-se a espécie Psilocybe mexicana, conhecida desde o tempo dos Astecas, de
onde se isolaram substâncias estruturalmente relacionadas às triptaminas, des-
tacando-se a psilocina (2.24), responsável por suas propriedades centrais.
Alcalóides P-carbolínicos possuem o sistema triptamínico embutido em seu
esqueleto tricíclico. Dentre os mais ativos no SNC, encontra-se a harmina (2.26),
de ocorrência em Peganum harmala.
A comparação estrutural destes alcalóides P-carbolínicos neuroativos eviden¬
cia significativa semelhança com a serotonina endógena, explicando suas proprie¬
dades centrais.
A mescalina (2.27), substância estruturalmente relacionada à dopamina, im¬
portanteneurotransmissor catecólico produzido pela glândula adrenal, foi isolada
em 1896 como o principal componente químico do peiote, poção sagrada dos
astecas, preparada a partir de cactos (Lophophora williamsii, Cactácea) e muito
utilizadaem cultos religiosos devido às suas potentes propriedades alucinógenas.
Devido ao seu padrão estrutural típico das feniletilaminas, a mescalina (2.27)
atua como agonista de receptores adrenérgicos centrais. Esta substância natural
inspirou a descoberta das anfetaminas (p. ex., 2.28), de emprego terapêutico, bem
como de outras substâncias tóxicas, de uso proibido, como o "Ecstasy" (MDMA,
3,4-metilenodioxi-5-metoxianfetamina; 2.29), desenvolvido como supressor do
apetite e que começou a ser empregado como alucinógeno na década de 1980.13
QUÍMICA MEDICINAL 79
OCH3
Ecstasy
(2.29)
OCH3
(+)-anfetamina
(2.28)
mescalina
(2.27)
Uma substância natural estruturalmente relacionada à adrenalina,
embora não apresente as hidroxilas catecólicas, é a efedrina (2.30). Co¬
nhecida pelos chineses desde há 5.000 anos por suas potentes proprieda¬
des simpaticomiméticas, a efedrina (2.30) encontrou aplicação como
broncodilatador,útilno tratamento da asma, e também como desconges¬
tionante nasal, ambas as ações relacionadas ao seu efeito sobre os vacúolos
de armazenagem de adrenalina. Tem abundância natural de 0,5-2,0% em
Ephedra spp.
A mesembrina (2.31), alcalóide indolinônico isolado de Sceletium ex-
pansum (Aizoácea), é o principal componente químico de outra poção
mágica empregada por tribos africanas e foi objeto de recente patente
para uso como antidepressivo. Esta substância (2.31) apresenta a unida¬
de catecólica das aminas adrenérgicas dimetilada, enquanto a cadeia
etilamínica encontra-se internalizada na subunidade bicíclica indolinô-
nica.
A huperzina-A (2.32),14 alcalóide amídico de estrutura tricíclica
característica, foi isolada da erva rasteira Huperziaserrata (sin. Lycopodium
serratum ) e apresentou potentes propriedades inibidoras da enzima ace-
tilcolinesterase (AChE ),15 caracterizando-se como umautêntico protótipo
natural para o desenvolvimento de substâncias úteis no tratamento da
doença de Alzheimer (DA).16 Outro produto natural de origem vegetal
descoberto com propriedades inibidoras da AChE é a galantamina (2.33 )
(Figura 2.5), alcalóide isolado em 1953 de Galanthus worownii, planta da
família das Amarilidáceas, que foi introduzidona terapêutica sob o nome
Reminyl®, lançado pela empresa Janssen Pharmaceutica.
A busca frenética por novos padrões moleculares capazes de possuir proprieda¬
des inibidoras da AChE levou ao desenvolvimentode testes bioautográficos para
a enzima, possibilitando o ensaio rápido, in vitro, de dezenas de substâncias.
Recentemente, foi relatado por Bolzani e colaboradores,17 no âmbito de um
estudo sistemático dos recursos naturais vegetais remanescentes da mataAtlânti¬
ca brasileira, um alcalóide piperidínico denominado espectalina (2.34), isolado
da Leguminosa Cassia spectabilis (sin. Senna spectabilis) ,18 A inspeção estrutural
permitiuevidenciar sua similaridade em relação à subunidade cíclica (A) com a
acetilcolina, substrato da acetilcolinesterase, indicando a possibilidade de obte-
rem-se, mediante modificações estruturais adequadas, novos inibidores desta
enzima, alvo-terapêutico importante para o tratamento da doença de Alzheimer
(DA). Esta abordagem permitiu a descoberta dos compostos LASSBio-767 e
OH
HN.
„CH,
CHí
efedrina
(2.30)
O
H,CO
CH,
(-)-mesembrina
(2.31)
80 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
FIGURA 2.4
Estrutura química e visão
estérica da huperzina-A
(2.32) e galantamina
(2.33) (WebViewer 2.0).
LASSBio-822, que apresentaram potentes propriedades inibidoras da acetilcoli-
nesterase,19 com elevado padrão de seletividade vis-à-vis a butirilcolinestarease,
responsável por alguns dos efeitos colaterais dos fármacos disponíveis para o
tratamento da DA.
HO,
A
H3co
OH
galantamina
(2.33)
huperzina-A
(2.32)
espectalina
(2.34)
QUÍMICA MEDICINAL 81
A bicuculina (2.35 ), alcalóide tetraidroquinolínico isolado de Dicentracucullaria
(L.) possui importantes propriedades seletivas como antagonista competitivo
de receptores do aminoácido neurorregulador ácido y-aminobutírico (GABA),
especialmente os subtipos GABAa e GABAC, sendo cem vezes mais potente sobre
o primeiro. Emfunção de sua potência e seletividade, a bicuculina (2.35) encon¬
trou aplicação como "marcador" de receptores centrais do GABA, sendo ampla¬
mente empregada em neurofarmacologia.20
O zoapatanol (2.36),diterpeno compadrão estruturalparticular, representante
da classe dos oxepanos, possuindo um anel de sete membros oxigenado, foi
isolado de folhas da plantamexicanaMontanoa tomentosa, empregada namedicina
popular como contraceptiva. Estudos recentes com este terpeno (2.36) evidencia¬
ram suas propriedades espasmogênicas, confirmadas pela contração induzida
em tiras de útero de cobaia in vitro. Estes resultados comprovam, em parte, as
propriedades abortivas do extrato aquoso de "zoapatle".
°ÿy
bicuculina
(2.35)
HoC
zoapatanol
(2.36)
IIIIH
lllltBu
forscolina
(2.37) R= CO(CH2)nCH3 (2.38)
(2.39) Rn = OH; R2= H; R3=H(2.40) R,= OH; R2= OH; R3= H(2.41) R,= OH; R2= OH; R3= OH(2.42) R-|= H; R2= OH; R3= OH
Os diésteres de forbol (p. ex., 2.37), são também diterpenos, com padrão
estrutural diverso, capazes de atuar como indutores da biossíntese de DNA e,
consequentemente, do crescimento celular, através da modulação da enzima
proteína-cinase C. Um outro importante diterpeno com padrão estrutural dis¬
tinto, isolado do extrato da planta indiana Coleusforskohlii é a forscolina (2.38),
que apresenta acentuada atividade inotrópica e vasodilatadora. Esta proprieda¬
de deve-se, essencialmente, à sua capacidade de estimular diretamente a subu-
nidadecatalítica da adenilatociclase, resultando emumaumento da concentração
intracelular do segundo mensageiro AMPc.
82 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
HgC
helmintosporal
(2.45)
A medicina tradicional chinesa21 desde há muito tempo tem contribuído pa¬
ra a descoberta de novos produtos naturais bioativos. Um exemplo clássico des¬
ta importante contribuição pode ser ilustrado pelo isolamento de terpenos po-
lioxigenados do extrato da árvore conhecida como ginkgo, isto é, Ginkgo biloba.
Posteriormente, os trabalhos de Nakanishie colaboradores22 permitiram a eluci¬
dação das estruturas de quatro substâncias complexas denominadas ginkgolídeos
A (2.39), B (2.40), C (2.41) e M (2.42). Estes compostos naturais apresentam
importantes propriedades antitrombóticas, sendo caracterizados como potentes
antagonistas dos receptores do fator de ativação plaquetária ( PAF, 1-O-hexadecil/
0-octadecil-2-(F)-acetil-x«-glicero-fosforilcolina, 2.43). O PAF é umfosfolipídeo
endógeno, bioformado em diferentes células, incluindo os eosinófilos, macrófa-
gos, plaquetas,neutrófilos e o endotélio vascular, atuando como potentemediador
celular, capaz de regular uma gama de respostas biológicas, como broncocons-
trição, hiper-reatividade pulmonar e hipotensão, além de ter sido descrito por
Benveniste e colaboradores como o mais potente indutor da agregação plaque¬
tária.23
Produtos naturais estruturalmente mais simples como o ascaridol (2.44) e o
helmintosporal (2.45) foram isolados e identificadas suas propriedades anti-
helmínticas.
Outras classes químicas de produtos naturais,além dos terpenos, apresentam
importantes propriedades biológicas, como ilustra o gossipol (2.46), derivado
fenólico presente no óleo da semente do algodão (Gossypium sp., Malvácea), que
foi amplamente empregado na China como contraceptivo masculino. Estas pro¬
priedades foram confirmadas em 1980, tendo sido sugerido que o gossipol (2.46)
atua como inibidor reversível da espermatogênese.24
Esta substância natural tem importantes características estruturais, consti¬
tuindo exemplo de atropoisomerismo natural,* com um padrão simétrico bis-
a-naftol funcionalizado que assegura a atividade ótica, embora não possua
nenhum centro estereogênico e apresente um eixo de simetria C2.
O CFF
H3C
*Atropoisomerismo: este tipo de isomeria
é descrito no Capítulo 1.
QUÍMICA MEDICINAL 83
A natureza 2,2-bis-naftalênica 1,3-tetra-substituída de sua estrutura obriga
os anéis aromáticos a adotarem conformações não-coplanares, especialmente
devido a presença dos grupamentos 3- e 3'-metila (Figura 2.6), que "fixam" as
conformações não-planares criando um elemento de dissemetria molecular, res¬
ponsávelpela sua atividade ótica.Ademais, a presença de uma função peri-hidro-
xialdeído a leva à formação de ligação-H intramolecular (Figura2.6), que favorece
a formação de anel lactol (p. ex., 2.47), permitindo que este produto natural
possua três formas tautoméricas. O gossipol (2.46) é umexemplo de polimorfismo
naturale apresenta diferentes estruturas cristalinas dependentes do solvente de
recristalização empregado.
FIGURA 2.4
Visão estérica do gossipol
[2.46] CWebViewer 2.0]
destacando, em vermelho,
o anel lactol [à esquerda),
as ligações de hidrogénio
intramoleoulares indicadas
pelo tracejado verde [à
direita) e em azul e
amarelo os grupamentos
metílicos responsáveis
pela quiralidade do
gossipol. Estrutura
química de 2.46 e do
tautômero 2.47.
H3C CH3 gossipol
(2,46)
gossipol-lactol
(2.47)
Recentemente identificaram-separa o gossipol (2.46) propriedades antivirais,
particularmente contra Herpes genital, atribuídas à sua capacidade de estimular
a biossíntese de interferons.
A hipericina (2.48), derivado fenólico da classe das naftodiantronas, é um
dos componentes químicos do extrato alcoólico de Hypericum perforatum (Hyperi-
caceae),25 utilizado como psicofitofármaco com propriedades antidepressivas.
84 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
hipericina
(2.48)
Este produto natural aromático (2.48), planar, ocorre com outros
dez componentes no extrato da erva de São João, de uso medicinal,
tendo sido, recentemente, atribuído ao derivado de floroglucinol pre¬
miado, hiperforina (2.49), também presente entre os componentes
de H. perforatum, as propriedades antidepressivas do extrato.
A hiperforina (2.49) é uma misturade tautômeros, conforme indi¬
caram os dados espectroscópicos de RMN 'H. Trabalhos recentes de
Verotta e colaboradores25 permitiram a identificação, no extrato das
partes aéreas da planta,de alguns produtos de oxidação da hiperforina
(2.49), demonstrando sua labilidade. A avaliação destes produtos de
oxidaçãoem bioensaios empregando sinaptossomas de cérebro de
ratos permitiu evidenciar uma atividade dez vezes inferior à hiperfo¬
rina (2.49) na inibição da reabsorção de serotonina, sugerindo que a
oxidação do produto natural impede o equilíbrio tautomérico que
parece ser relevante para a atividade do extrato (Figura 2.7).
CH.
CH
.OH CH;
CH-
CH;
CH- CH-
CH-
CH-
CH
CH-
OH CH-
CH CH- hiperforina
(2.49)
CHHOCH; CH-CH-
CHH,C CH.CH-
CH-
CH-
CH;
CH
CH. CH-CH-
produtos de oxidação da hiperforina (2.49)
FIGURA 2.7
Tautômeros da hiperforina
(2.49) e seus produtos de
oxidação.
Apesar de apresentarem reduzido índice terapêutico, os glicosídeos de Digitalis
(2.50) são empregados até hoje como cardiotônicos em virtude de não ter sido
identificado um substituto adequado, ou seja, com a mesma potência e eficácia
farmacológica, porém, com maior índice terapêutico. Os digitálicos podem ser
considerados como "o decano" dos produtos naturais de origem vegetal com
aplicações terapêuticas.26
QUÍMICA MEDICINAL 85
Esta classe milenar de produto natural, terapeuticamente útil, diferencia-se
entre si pela natureza da subunidade lactônica a,p*insaturada em C-17. A clas¬
se dos cardenolidos possuium sistema y-lactona, enquanto aquela dos bufadieno-
lidos,homólogos, possuiumanelS-lactona. Estes compostos apresentam o siste¬
ma ciclopentano-peridrofenantreno, típico dos hormônios esteroidais, comjun¬
ções do tipo A/B-eis e C/l)-eis, diferenciando-se no arranjo conformacional, como
ilustrado quando se compara com a progesterona (2.51), um dos principais hor¬
mônios femininos (Figura 2.8).
FIGURA 2.8
ÿigitálicos cardenolidos e
bufodienolidos,
comparação com o
esqueleto ciclopentano-
peridrofenantreno da
progesterona [2.51).
O0
*A/Vi
bufodienolido
progesterona
(2.51)
cardenolido
Glicósido
cardiotônico
aglicona ou
genina
Inúmeros produtos naturais vegetais possuem importantes propriedades an¬
tioxidantes, antecipando possívelaplicação terapêutica. Dentreas inúmeras subs¬
tâncias conhecidas com estas propriedades, destaca-se o resveratrol (2.52), que
ocorre nos vinhos, sobretudo o tinto, que apresentou importantes propriedades
86 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
resveratrol
(2.52)
penicilina-G
(2.53)
moduladoras do fator de necrose tumoral-a (TNF-a),27 impor¬
tante citocina pleiotrópica sinalizadora de processos inflamató¬
rios. A investigação insilico de seu potencial inibidor da enzima
prostaglandina endoperóxido sintase-2 (PGHS-2 ou COX-2) foi
realizada por Kummerlee colaboradores,28que evidenciaram, por
técnicas de docking molecular, energia de interação favorável ao
reconhecimento do flavonóide (2.52) pela COX-2.
A DIVERSIDADE MOLECULAR DOS
PRODUTOS NATURAIS NÃO-VEGETAIS
Diversos produtos naturais com importantes propriedades far¬
macológicas foram identificados em diversas espécies de fungos,
especialmente agentes quimioterápicos como os antibióticos (3-
lactâmicos,exemplificado pelapenicilina-G (2.53), que serão tra¬
tados com mais detalhes à frente.
A avermectina B, (2.54),29 um macrolido isolado de Strepto-
mycessp., é umpotente agente anti-helmíntico com amplo espec¬
tro de ação, sendo recomendado, inclusive, para o combate ao
Schistosoma mansoni.
avermectina B
(2.54)
Diversos agentes anticâncer, com diferentes mecanismos de ação, são de ori¬
gemnatural,30como os derivados antraciclínicos isolados de Streptomycessp., desta-
cando-se a daunorubicina (2.55) e o análogo hidroxilado doxorubicina (2.56),
potentes fármacos antineoplásicos, assim como a bleomicina A2 (2.57, Blenoxa-
no®), isolada de Streptomyces werticullus por Umezawa em 1965,que ingressou no
arsenal terapêutico mais recentemente.31
QUÍMICA MEDICINAL 87
H,C
daunorubicina
(2.55)
H3C
doxorubicina(2.56)
H, NH
CH. CH;
NH
CH HN
OH
HO' CH
HO. NH
OH
OH bleomicina A2
(2.57)
OHOH
OH
NH,
O mecanismo de ação antineoplásica da daunorubicina (2.55) foi elucidado,
evidenciando que a unidade naftoquinônica deste produto natural é o principal
grupamentofarmacofórico,sofrendo ação de umaquinona-oxidase que leva à forma¬
ção de espécies radicalares reativas responsáveis pela formação de ligações co¬
valentes (Figura 2.9), irreversíveis, que promovem a inibição do crescimento
celular.32
A gliotoxina (2.60), isolada de diversas espécies de Aspergillus, possui uma
estrutura bastante sugestiva, ilustrando a diversidade molecular de substâncias
originárias de fungos. Este composto, com propriedades antibióticas, conhecido
desde 1936, teve sua estrutura elucidada em 1958 e sua síntese descrita em
88 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
H3C
NAPH-quinona
oxidase
daunorubicina
(2.55)
FUC
daunorubicina
hidroquinona
(2.58)
H3C
radical pa/a-benzosemíquinona daunorubicina
(2.59)
FIGURA 2.7
Mecanismo de ação da
daunorubicina (2.55). 1976.Apresenta como característica estruturalmarcante a presença de umauni¬dade diidropirazino[ 1,2-a ]indo1odiona e uma ponte dissulfeto responsável por
sua instabilidade térmica. O mecanismo molecular de ação deste produto na¬
tural parece estar relacionado com a função dissulfeto (Figura 2.10).
FIGURA 2.10
Estrutura química e visão
estérica da gliotoxina
(2.60), indicando a ponte
dissulfeto (em amarelo)
(WebViewer 2.0). HO
HOgliotoxina
(2.60)
QUÍMICA MEDICINAL 89
Fármacos
anticâncer Origem
Plantas
Vincristina
Paclitaxel
Podofilotoxina
Camptotecina
Docetaxel
Irinotecan
Etoposido
Sintéticos
A Figura 2.11 ilustraesquematicamen¬
te a origem dos fármacos anticâncer, isto
é, de fontes naturais (vegetais e microrga¬
nismos), derivados sintéticos ou hemi-sin-
téticos de protótipos naturais "domestica¬
dos", assim como exemplifica alguns dos
principais alvos terapêuticos destes fárma¬
cos. Ressalta-se que a identificação de al¬
guns dos alvos terapêuticos ilustrados na
Figura2.11 somente foipossívelgraças aos
estudos do mecanismo de ação dos protó¬
tipos naturais descobertos como antineo-
plásicos, que em sua maioria compreen¬
dem arquiteturas moleculares excepcional¬
mente características, representando au¬
tênticos quimiotipos inovadores.
O fungo do genêro Clavicepspurpurea fornece os alcalóides do Ergot,conhecidos
desde 1875 por suas potentes propriedades ocitócicas, identificadas pelo farma¬
cêutico francês Charles Tarnet. Graças a este perfil farmacológico, a primeira
edição da Farnracopéia Americana, de 1820, já os incluia como fitofármacos. As
propriedades estimulantes das contrações do miométrio foram, algum tempo
após, atribuídas aos componentes estruturalmente relacionados ao ácido lisérgico
(2.61), principal componente da fração solúvel em água dos alcalóides indólicos
do Ergot, que após praticamente dois séculos ainda integram diversas farmaco-
péias.33 Destes alcalóides prepararam-se a metisergida (2.62), fármaco semi-
sintético originário da ergotamina (2.63), principal representante da fração al-
caloídica do Ergot, insolúvel em água.
As modificações estruturais introduzidas ao nível de C-8 (a) na ergotamina
(2.63 ) modificaramseuperfilde antagonista a-adrenérgico para serotoninérgico,
responsável pela principal indicação terapêutica da metisergida (2.62) no trata¬
mento preventivo da enxaqueca crónica.34 A presença da unidade IV-metilindol
na metisergida (2.62) assegurou a proteção metabólica necessária garantindo
umavida-média adequada nabiofase,por previnir o efeito conjugativo de primei¬
ra passagem, descrito no Capítulo 1.
Os alcalóides do Ergot originaram também o LSD (2.64, dietilamida do ácido
lisérgico), descoberto por Albert Hoffmann nos laboratórios Sandoz em 1943,
quando modificava a estrutura do ácido lisérgicovisando otimizar suas proprieda¬
des ocitócicas. Quando Hoffmann, inspirado naestrutura da niquetamida (2.65),
que possui a unidade dietilamídica, decidiu preparar derivadoanálogo do ácido
lisérgico (2.61), não imaginava que fosse obter uma das drogas alucinógenas
mais potentes (Figura 2.12). Inúmeros relatos das propriedades desta droga foram
feitos, destacando-se seu poderoso efeito "rebote" relacionado à estrutura. Uma
explicação para este efeito decorre de sua natureza amídica que, diferentemente
do ácido de origem, tem maiores propriedades hidrofóbicas que favorecem sua
passagempelabarreira hematoencefálica (BHE) de natureza lipofílica.No sistema
nervoso central, esta substância é reconhecida pelos receptores serotoninérgicos,
visto sua analogia estrutural com a serotonina (2.23), resultando nos efeitos
alucinógenos. Por outro lado, as amidases centrais podem hidrolisar a função
amida liberando o ácido original que, não podendo atravessar de volta à BHE,
acumula-se no SNC, favorecendo o aparecimento dos efeitos alucinógenos tempos
Microrganismos
Doxorubicins
Dactomicina
Bleomicina
Alvos
Topoisomerase I e I
a-tubulina
DNA
Tirosina quinase
PKC
COX
FIGURA 2.11
Origem e alvos
terapêuticos de alguns
fármacos anticâncer.
90 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
FIGURA 2.4
Génese do LSD [2.64] e
estruturas dos alcalóides
ergotamina [2.63] e
metisergida [2.62], ácidos
lisérgico [2.61] e iso-
lisérgico [2.65] e
serotonina [2.23).
depois do uso da droga (efeito "rebote"). Embora de estrutura similar à sero¬
tonina (2.23), o LSD (2.64) não é substrato para a ação da monoaminoxidase
(MAO), principalenzima degradativa da serotonina central (Figura 2.13), o que
contribui para seu acúmulo e potencializa o efeito "rebote".
ácido lisérgico
(2.61)
dietilamina do ácido lisérgico (LSD)
(2.64)
niquetamida
(2.65)
serotonina
(2.23)ácido iso-lisérgico
(2.61a)
metisergida
(2.62)
ergotamina
(2.63)
QUÍMICA MEDICINAL 91
NH
HO
HO. HO.HO, MAOMAO
serotonina
(2.23) écido 3-(5-hidroxi)indolilacética
(2.66)
FIGURA 2.7
A descoberta do LSD (2.64) fez de Hoffmannum dos principais especialistas
em substâncias psicodélicas,35 tendo evidenciado, durante seus estudos com os
alcalóides do Ergot, a isomerização base-catalisada do ácido lisérgico (2.61), que
possui o grupamento ácido carboxílico em configuração equatorial com pka de
7,86, em ácido iso-lisérgico (2.61a) de pKa 8,31, com o grupamento ácido de
configuração epimérica (Figura 2.12).
Outra importantee promissora classe de substâncias de fungos são as toxinas
sesquiterpênicas denominadas tricotecenos, conhecidas desde 1962 e produzidas
por diversas espécies como Fusarium, Myroyhecium, Trichothecium e Trichoderma,
comumente encontradas em cereais e em arroz parasitados. Esta classe de subs¬
tâncias naturais apresentou importantes propriedades antifúngica, antibiótica
e citostática. Constitui-se de quinze dezenas de representantes,alguns identifica¬
dos em Compostas (p.ex.,Baccharisspp.), devido à relação simbiótica destas plantas
com certas espécies de fungos. A verrucarina-A (2.67), facilmente encontrada
como contaminante de algumas comidas, consiste em um tri-éster macrocíclico
com um sistema tricíclico fundido que é o principal grupamento responsável
pela toxicidade desta substância, merecendo a denominação de grupamento toxi-
cofórico. A despeito de
apresentar em sua es¬
trutura uma função
epóxido, lábilem meio
ácido, a verrucarina-A
(2.67)36 apresenta to¬
xicidade por via oral,
embora, seu índice de
letalidade seja inferior
quando administrada
por via venosa em ani¬
mais de laboratório. O
mecanismo de ação
desta substância com¬
preende a inibição da
biossíntese de proteí¬
nas (Figura 2.14).
Mecanismo de ação da
MAO sobre a serotonina.
FIGURA 2.7
Estrutura 20 e 3D da
verrucarina-A (2.67).
verrucarina-A
92 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
epotilona A
(2.68)
CHí
epotilona B
(2.69)
As epotilonas (2.68), (2.69),37 identificadas em
caldos fermentativos de micobactéria Sorangium
cellulosum, apresentaram, em testes de inibição do
crescimento celular, importantes propriedades an-
titumorais, que foram posteriormente identifica¬
das como resultantes do mesmo mecanismo exi¬
bido pelo paclitaxel (2.10), ou seja, atuando ao ní¬
vel dos microtúbulos. Estas substâncias foram ati-
vas em modelos de inibição do crescimento celu¬
lar resistentes ao paclitaxel (2.10), representando,
portanto, importantealternativa para o tratamento
do câncer. São conhecidos quatro representantes
destes macrolidos de 16 membros ilustrados pelas
epotilonas A (2.68) e B (2.69) que se diferenciam
pela presença em 2.68 de um radical metila no
anel macrocíclico ao pé do epóxido, ausente em
2.69. Outras variações estruturais identificadas
nesta classe de macrolidos referem-se ao grau de
oxidação da metila ligada ao sistema tiazólico, que
em alguns representantes ocorre sob a forma de
hidroximelileno.38
Em 1976, o pesquisador japonês Akira Endo,
trabalhando nos laboratórios Sankyo Co., isolou
do fungo Penicilliumcitrinum o derivado policetídeo
ML236B,denominando-o compactina (2.70). Pou¬
co tempo depois, a mesma substância foi identificada em outra espécie de Peni¬
cillium, isto é, P. brevicompactum, por A. G. Browne colaboradores nos laboratórios
Beecham Pharmaceuticals, na Inglaterra.39 Este composto, por possuir em sua
estrutura a função S-lactona-fl-hidroxilada, que em sua forma acíclica pode mi-
metizar o intermediárioenvolvido naredução de HMGCo-ApromovidapelaHMG-
CoAredutase (HMGCo-AR), foi ensaiado, com base nesta similaridade molecular,
como candidato a inibidor desta enzima. De fato, este metabólitonaturalde fungo
apresentou maior afinidade pela enzima que o próprio substrato natural, com K,
= 1,4 nM, configurando-se como inibidor competitivo da HMGCo-AR.
HMGCo-A
(2.70a)
compactina
(2.70)
QUÍMICA MEDICINAL 93
A identificação deste inibidor natural incentivoudiversos laboratórios de pes¬
quisa a dedicarem esforços na busca de outros derivados ativos sobre a HMGCo-
AR, levando à descoberta de uma nova classe de agentes antilipêmicos, as esta-
tinas,40 ilustradas na Figura 2.15, que representamuma autêntica inovação tera¬
pêutica e que serão estudadas em mais detalhes à frente.
co2h
OH
OH
CH. OH
CH;
NH
atorvastatina-Lipitor
(2.72)simvastatina-Zoccor
(2.71)
OH OH
CR
N
I
CH- CH
rosuvastina-Crestor
(2.73)
Outro importante fármaco, considerado uma inovação terapêutica à época
de seu lançamento, originado a partir de modificações em produtos naturais é a
tetraidrolipstatina (2.74), lançada em 1999 pela Hoffmann-LaRoche. Esta subs¬
tância originou-se em um produto natural de fungos (Streptomyces toxytricini
NR0619), a lipstatina (2.75),41 que teve sua estrutura modificada por simples
saturação das ligações duplas de configuração eis presentes no protótipo natural,
originando o derivado tetraidrogenado (Figura 2.16), denominado orlistat (2.74,
Xenical®), indicado para tratamento da obesidade atuando através da inibição
de lipases pancreáticas com valor de IC50 de 1,2 pM, alterando, desta feita, o
padrão de absorção de lipídeos no intestino. Esse fármaco possuiumgrupamento
FIGURA 2.15
Exemplos de inibidores
naturais e sintéticos da
HMGCoA-redutase.
94 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
a-acil-A-formilamino e umanel lactônico de quatro membros ((3-lactona) (Figura
2.16), raramente presentes nas estruturas dos fármacos. O orlistat (2.74) tem
Génese do orlistat (2.74) como principal efeito adverso o inconveniente de provocar graus distintos de
ÿ2 75)r da lipStat'na diarréias em alguns pacientes.
acil-Ot-ZV-formilamino
H3C .CH-
,CH-
,CH- (Streptomycessp.)
2
orlistat-tetraidrolípstatina
lipstatina
(2,75)
FIGURA 2.16
Amanita muscaria.
* O biosisterismo como umaestratégia de
modificação molecular é estudado no
Capítulo 6.
O cogumelo Amanita muscaria, conhecido pelos "hippies" dos
anos 1960por suas propriedades alucinógenas, produz o muscimol
(2.76),amina isoxazólica que apresenta propriedades gabaérgicas
centrais responsáveis pelos efeitos farmacológicos. A similaridade
estrutural entre este produto natural e o ácido y-aminobutírico
(2.77, GABA),que pode ser observada pela linhapontilhadaincluí¬
da naestrutura do GABA ilustradanaFigura2.18, explica a ativida-
de GABA-érgica desse composto que possui a unidade ácido car-
boxílico do GABA "internalizada" noanelheterocíclico,permitindo
que esta substância naturalatravesse a BHE devido às suas proprie¬
dades hidrofóbicas superiores ao bioligante, sendo ummímico na¬
tural do GABA.
O derivado THIP (2.78) foi sintetizado e apresentou potentes propriedades
GABA-érgicas, sendo um exemplo do "mimetismo" do sistema 3-hidróxi-isoxa-
zola e o GABA (Figura 2.18). A presença do ciclo tetraidropiridínico no THIP
(2.78), com dois grupamentos metilênicos a mais do que o muscimol, assegura
propriedades físico-químicas adequadas à sua absorção.
A presença do anel isoxazólico no muscimol (2.76) e a identificação de suas
propriedades psicofarmacológicas vulgarizaram o uso da subunidade 5-(3-hidro-
xi)-isoxazolil, reconhecida como isóstera* de ácidos carboxílicos.
A partir deste sistema, anéis isósteros como os núcleos 1,2,4-oxadiazola (2.79),
1,2,4-tiodiazola (2.80) e 1,2,5-oxadiazola (2.81) foram incluídos nas estruturas
de diversos protótipos e fármacos psicoativos (Figura 2.19).O derivado modifica¬
do pela presença desta subunidade estrutural na cocaína (2.82) ilustra esta es¬
tratégia. Este análogo isoxazólico (2.83) apresentou duas vezes a atividade da
cocaína como ligante de receptores dopaminérgicos (Figura 2.19).
O ABT-418 (2.84), derivado sintético desenvolvido nos laboratórios Abbott
como candidato a fármaco analgésico de ação centralnão-opióide,possuio núcleo
5-(3-metil)isoxazolil em sua estrutura, inspirado no muscimol (2.76) (Figura
QUÍMICA MEDICINAL 95
H,N
muscimol
(2.76)
H,N
ácido V-aminobutírico (GABA)
(2.77)
OH
HN
OH
1 /
ácido y-aminobutírico (GABA)
(2.77)
THIP
(2.78)
FIGURA 2.18
Similaridades entre o
muscimol [2.76], GABA
[2.77) e seu análogo
sintético THIP [2.78).
FIGURA 2.18
Exemplos de protótipos de
ação central apresentando
o anel isoxazólico e
isósteros.
cocaína
(2.82)
análogo isoxazólico
(2.83)
96 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
2.20), substituindo o anel piridínico da nicotina (2.85), e apresenta elevada afi¬
nidade pelos receptores nicotínicos da acetilcolina (nACh).43
O homólogo metilado no anel pirrolidínico (2.86, Figura 2.20) apresentou o
mesmo padrão de atividade, com uma maior vida-média na biofase, devido à
proteção que o grupamento metila introduz vis-à-vis às enzimas oxidativas do
metabolismo hepático.
nAChR
Id= 4.2 riM
(S)-nicotina
(2.85)
FIGURA 2.1G
Génese de ABT-418 (2.84)
a partir da nicotina (2.85). PRODUTOS NATURAIS DE ORIGEM MARINHA
Embora os produtos naturais estejam tradicionalmente envolvidos na origem
de inúmeros fármacos de distintas classes terapêuticas,44 dentre os fármacos
que compõem o arsenal terapêutico moderno para o tratamento do câncer, obser-
va-se uma predominância dos fármacos de origem natural. Esta situação deve
decorrer, possivelmente, do extenso programa patrocinado pelo NationalCancer
Institute (NCI) dos EUA, resultando, após anos de esforços de pesquisa, em
substâncias inovadoras para o tratamento de alguns tipos de câncer. As grandes
empresas farmacêuticas que descobrem fármacos, têm estratégias de pesquisa
mais imediatas, com menos disponibilidade de tempo, o que as afastou, de certo
modo, durante algum tempo, da busca de substâncias naturais como inspiração
para novos fármacos.43
Dentre as distintas fontes de produtos naturais de possível interesse tera¬
pêutico, o mar representa importante depósito natural de extensa quimiodiver-
sidade. Diversosprodutos naturais de origem marinha46apresentam importantes
propriedades farmacológicas.
O manoalido (2.87),um sesterpenóide isolado de espécies de esponja do Pacífi¬
co (Luffariaella variablis) pelo grupo de Scheuer e Faulkner, possui em sua es¬
trutura uma função lactol insaturada, envolvida em um ciclo de seis membros,
e umaunidadey-hidroxibutirolactona, que corrresponde ao lactolde umaldeído-
ácido também insaturado (vide forma "aberta" do manoalido,p. ex., 2.88, Figura
2.21). Estepadrão de funcionalidades dá ao manoalido uma característica estru¬
tural particular (Figura 2.22), tendo sido licenciado para a empresa Allergan e
estudado em ensaios clínicos como AGN-190093, atingindo a fase IIde ensaios
clínicos. Entretanto,a substância naturalnão apresentava propriedades adequa-
QUÍMICA MEDICINAL 97
das para ser empregada em uso tópico, não se tendo logrado sucesso em nenhuma
formulação estudada.47
lactol
HO.
CH'
OH
lactol
manoalído
(2.87)CH
y-hidroxibutirolactona
a, p-insaturada
(y-hidroxibutenolido)
OH
CH;CH;
forma "aberta" do manoalido
Esteprodutonatural (2.87) é uminibidor irreversível de fos-
folipase A2 (PLA2), enzima hidrolítica que libera o ácido ara-
quidônico de fosfolipídeos de membrana, o qual é o principal
precursor de mediadores (logísticos como prostaglandinas e
leucotrienos ( vide infra), sendo, portanto, um adequado alvo
terapêutico para o tratamento de quadros inflamatórios. O
manoalido (2.87) representa importante padrão estrutural
para um novo agente antiinflamatório de uso específico para
o tratamento de psoríase. Esta substância inibe a mobilização
de Ca+2 nas células, sem interferir nos depósitos de cálcio
intracelulares, nem modificar o nível de inositol trifosfato
(IP3), tendo sido sugerido que esta atividade depende, princi¬
palmente, da presença da subunidade y-hidroxibutenolido pre¬
sente em sua estrutura48 (Figura 2.21). Recentemente,o grupo
de pesquisas de Scettripublicouumarota sintética para a cons¬
trução desta subunidade considerada farmacofórica para a ati¬
vidade do manoalido (2.87), atestando a importância deste
FIGURA 2.21
Formas tautoméricas
cíclica (2.87) e nâo-cíclica
[2.88) do manoalido.
FIGURA 2.22
Visão estérica do
manoalido [2.87),
indicando, em lilás, os
anéis do tipo lactol
(WebLabViewer 2.0).
98 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
padrão molecular como moldepara novos derivados mais promissores ao emprego
terapêutico para o tratamento da psoríase.
Da mesma fonte natural, foi isolado o lufarolido (2.89),49 umterpeno estrutu¬
ralmente relacionado ao manoalido (2.87), mas apresentando um distinto grau
de oxidação, com dois grupamentos lactônicos, um a,p-insaturado de seis mem¬
bros (5-lactona) e o correspondente ao sistema y-hidroxibutenolido do manoa¬
lido (y-lactona) saturado em 2.89. O lufarolido (2.89) apresentou propriedades
citotóxicas em células do linfoma humano LI2 10.
CH-
CH-
lufarolido
(2.89)
A espongidina-D (2.90),50 alcalóide piridínico isolado no extrato clorofórmico
da esponja marinha Spongia sp., apresenta em sua estrutura uma curiosa caracte¬
rística representada pela presença da função ácido sulfônico, isóstero do grupa¬
mento ácido carboxílico. Esta substância apresentou potentes propriedades inibi¬
tórias da PLA2humana na concentração de 10 pM, sem, entretanto, apresentar
efeitos citotóxicos.
espongidiria-D
(2.90)
A leucetamina-A (2.91),51 derivado imidazólico natural também isolado de
esponja marinha,apresenta importantes propriedades antagonistas de receptores
de leucotrienos cisteínicos (LTs), com Ki = 1,3 pM, representando um padrão
molecular original com importantes propriedades biológicas. O conhecimento
da participação dos leucotrienos na fisiopatologia da asma alérgica resultou na
recente descoberta do zafirlukast (2.92), antagonista eficiente de receptores de
LTs cisteínicos (p. ex., LTD4, 2.93), recentemente introduzido na terapêutica,
recomendado, inclusive, para uso pediátrico.52
QUÍMICA MEDICINAL 99
u
< N IN— CH3
Ki= 1,3JJ.M Nh2
(2.91)
H,CO
OH
ltd4 h2n
(2.93)
co2h
Zafirlukast
(2.92)
C02H
Outra substância isolada de esponja com propriedades antiinflamatórias é o
contignasterol (2.94) isolado de Petrosia contignata (Thiele). Esta substância teve
sua configuração absoluta elucidada em 2002 e originou o derivado estrutural¬
mente simplificado (IPL-576092 ou HMR-4011, Figura 2.23), que atualmente
se encontra emfase IIde ensaios clínicos, como agente antiinflamatório, atuando
ao nível da liberação de histamina.53
FIGURA 2.IS
Génese do IPL-576092
(2.95) a partir do
contignasterol (2.94).
OH OH
contignasterol
(2.94)
OH
IPL-576092
(2.95)
100 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
Bn
CH,
Br/z. ,jNcl Entre os diversos padrões estruturais de substâncias
de origem marinha, o dactilino (2.96), um monoterpeno
poli-halogenado que possuiumafunção acetilênica termi¬
nalconjugada com uma insaturaçãoeis-, ilustraumpadrão
estrutural original. Esta substância natural foi isolada de
algas vermelhas e apresentou propriedades inibidoras do
Dactilino citocromo P450 (CYP450),provavelmente devido à presença
(2-96) da unidade eno-ino conjugada, eletrofilicamente reativa.
A azidovudina (AZT, 2.97), importanterecurso quimioterápico disponívelpara
o combate ao vírus da síndrome da imunodeficiência adquirida (HIV), foi desco¬
berta a partir das propriedades identificadas em nucleosídeos isolados de algas
marinhas.35Os laboratórios Burroughs-Welcome (atualmente Glaxo Smith-Kline,
GSK) desenvolviam, à época, projetos de pesquisas para busca de novos agentes
antivirais, partindo da premissaque, paraos nucleosídeos apresentarem atividade
biológica, o radical osídico não obrigatoriamente precisaria ser a ribose ou deso-
xirribose, conforme sugeriam os resultados obtidos com o derivado citosina ara-
binosídeo (Ara-C, 2.98), umcomposto com propriedades antileucêmicas lançado
pelaUpjohn (posteriormente Pharmacia e atualmente GSK). Por meio de modifi¬
cações introduzidasna subunidade osídica, pesquisadores da Burroughs-Welcome
chegaram ao AZT (2.97), explorando antivirais naturais de fontes marinhas e
modificados, visando, particularmente, o combate ao Herpes vírus. O AZT (2.97)
foi obtido e ensaiado, mas não se mostrou eficaz contra este tipo de vírus. Com
a descoberta do HIV, esta substância foi reavaliada e apresentou atividade ao
nível da enzima transcriptase-reversa (TR) virai, tornando-se um dos, ainda,
limitados recursos quimioterápicos contra este tipo de retrovirus (Figura 2.24).
FIGURA 2.24
Estrutura química do AZT
(2.97] e Ara-C (2.98) e
visão estérica do AZT
(2.97], em dois formatos,
destacando, em rosa, a
função azido (WLViewer
2.0],
QUÍMICA MEDICINAL 101
O antoptilido-C (2.99) é um diterpeno da classe dos briaranos (Figura 2.25),
isolado de Anthoptilum kukenthalli, um celenterado marinho abundante na costa
australiana. Esteprodutonatural terpênico possuiummacrociclo de dez membros
e mostrou-se um antagonista efetivo de receptores A; da adenosina com IC50 de
3,1 pM.54
CH,
T T
*ÿ*>.
.
FIGURA 2.16
Estrutura 2D e 3D do
antoptilido (2.99).
antoptilido
(2.99)
Substâncias bioativas geralmente nãopossuem a função aldeídica,
hajavista sua fácil oxidação, enzimática ou não. No entanto, deriva¬
dos bis-aldeídicos nor-sesterpênicos da classe do esclerano foram
isolados de esponjas Hyatella intestinalis naAustrália e apresentaram,
para o derivado terpênico mooloolabeno-A (2.100), importantes pro¬
priedades citotóxicas em linhagens de células leucêmicas P388 de
ratos com IC50 na ordem de 3-10 pg/mL.55
A originalidade estrutural da diversidade marinhapode ser cons¬
tatada pelo isolamento da ircinamina (2.101) de esponjas do género
Dactylia. Este produto natural marinho apresenta a função tio-éster,
de ocorrência pouco usual na natureza. Esta substância, até certo
ponto exótica em termos estruturais, apresentou IC50 de 24,9 mg/mL
em bioensaios de proliferação celular em células leucêmicas P388.56
CHO
AcO
CHO
Mooloolabeno-A
(2.100)
H3CO CH-
Ircinamina
(2.101)
102 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
Os corais de Plexaura homomalla, abundantes no mar do Caribe, forneceram
importantes quantidades de prostaglandinas A2 (PGA2) (2.102), que foram isola¬
das por Sppraggins e Weiheimer e se tornaram importante matéria-prima para
a hemi-síntese de PGE2 (2.103) e PGF2a (2.104) (Figura 2.26), consideradas as
PG's primárias de maior importância fisiológica em mamíferos.57 Graças a esta
fonte natural abundante, estudos hemi-sintéticos viabilizaram a obtenção de
quantidades suficientes de PGs primárias necessárias aos estudos farmacológicos,
que evidenciaram as importantes propriedades fisiológicas destes potentes media¬
dores celulares. Estes estudos estimularam a obtenção de análogos modificados
de interesse terapêutico como o misoprostol (2.105, Citotec®),58 fármaco empre-
gado no tratamento da úlcera gástrica (videinfra ) eogemeprost (2.106)59 (Figura
Prostaglandinas naturais e 2.26), derivado prostanoidalestruturalmente relacionado à PGE,, comproprieda-
análogos sintéticos des abortivas.
[misoprostol e gemeprost).
OH
prostaglandina A2 (PGA2)
(2.102)
P/exaura homomalla
Gorgonia sp.
misoprostol
(2.105)
prostaglandina f23(pgf2w)
(2.103)
gemeprost
(2.106)
prostaglandina E2 (PGE2)
(2.103)
QUÍMICA MEDICINAL 103
Entreos produtos naturais de origem marinhacom importantes propriedades
antineoplásicas, encontra-se a briostatina 1 (2.107), macrolido que se mostrou
ativo por via oral contra leucemias (Figura 2.27).
briostatina 1
2.107
FIGURA 2.24
Umadas mais promissoras substâncias de origem marinha tem como peculia¬
ridade sua origem e sua denominação. A ecteinascidina60 - como foi batizada
originalmente- também aparece na literatura como trabectidina (2.108),isolada
de ascidian Ecteinascidia turbinata e descrita em 1980 por dois grupos de pesquisa
de Rinehart e de Wrigth e colaboradores. Foi inicialmente denominada ET-743
(2.108) (Figura 2.28) devido a sua absorção máximanoUV. Possuiumquimiotipo
conhecido em outras classes de substâncias de esponjas como as renieramicinas,
como aquela descrita mais recentemente por Fusetani e colaboradores, a
renieranricina-J (2.1IO)61 que apresenta o sistema pentacíclico bis-
tetraidroisoquinolínico (Figura 2.28).
A principal característica original da estrutura de ET-743 (2.108) consiste na
presença da ponte de enxofre e na subunidade diidroisoquinolínica (Figura 2.28).
Esta substância possuibaixa abundância natural, como muitas substâncias bioa-
tivas de origem marinha. Por esta razão, teve sua síntese totaldescrita em 200062*
pelo grupo de químicos sintéticos do eminente Professor Elias J. Corey, da Univer¬
sidade de Harvard. A substância natural foi licenciada pela Universidade de
Illinnois,EUA,paraumaempresa espanhola, a PharmaMar,com sede emMadrid,
para seu desenvolvimento. Nesta empresa, Manzanares e colaboradores63 desco¬
briram uma elegante hemi-síntese para o ET-743 (2.108), empregando como
matéria-prima uma outra substância natural, mais abundante e de fácil isola¬
mento, a cianosafracina B (2.109) (Figura 2.28), produzida em quantidades
atraentes por via fermentativa com Pseudomonasfluorescens.
Estrutura química e visão
estérica da briostatina 1
(2.107) (WebLabViewer
2.0).
* Para uma síntese mais recente desta
susbtância, veja A. Endo, A. Yanagisawa,
M. Abe, S. Toluna, T. Kan, T. Fukuyama,
J. Am. Chem. Soe. 2002, 124, 6552.
104 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
renieramicina J
(2,110)
cianosafracina-B „7
<2-109> Sios)
FIGURA 2.28
Estruturas dos produtos
naturais cianosafracina B
(2.109), ET-743 (2.108) e
renieramicina J (2.110).
A complexidade estrutural da trabectidina (2.108) (Figura 2.28) motivou o
estudo de análogos sintéticos ou hemi-sintéticos simplificados como a phthalas-
cidina (2.111, Pt 650-2), descrita como umderivadosimplificado estruturalmen¬
te, com propriedades semelhantes ao produto natural (2.108).64
QUÍMICA MEDICINAL 105
phthalascidin (Pt65Q 2)
(2.111)
Estudos iniciais da relação entre a estrutura da trabectidina (2.108) e sua
atividade foram realizados a partir da síntese de inúmeros derivados modificados
naparte sul da molécula por diferentes grupos arila isostéricos (2.112a-g),levando
a derivados ativos, de menor potência.65
iAAj *AA,
c d
«JVU
A empresa espanhola PharmaMarvem estudando outra substância anticâncer
de origem marinha que se encontra em fase IIde ensaios clínicos, visando ao
tratamento do câncer de próstata: o kahalalido-F (2.113 )66 (Figura 2.29), um
depsipeptídeo isolado do molusco Elysia rufescens. Pesquisadores da Universidade
de Barcelona lograram desenvolver um método sintético, em fase sólida, para
este atraente produto natural marinho.
106 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
kahalalido-F
(2,113)
FIGURA 2.16
Estrutura 2D e 3D da
depsipeptidea kahalalida-F qmajs espetacular exemplo de complexidade molecular emumprodutonatu¬
ral não-protéico é a palitoxina (2.114, Figura 2.30), isolada de corais Palythoa
tuberculosa. Esta substância natural tem fórmula molecular C129H227N3O54, com
peso molecular de 2684,20 u.m.a. Possui 64 centros assimétricos e sete insatu-
rações em sua arquitetura molecular. Emconcentrações picomolares, a palitoxina
(2.114) é capaz de modificar significativamente a permeabilidade de cátions
pela membrana celular, atuando, aparentemente, ao nível de uma ATPase de
membrana, inibindoa bomba de Na+/K+- Considerando-se as concentrações mo¬
lares tóxicas de (2.114), pode-se eleger esta substância natural como uma das
mais potentes conhecidas. A despeito de sua complexidade estrutural, a palitoxina
(2.114) teve sua síntese total descrita por Kishi e colaboradores em 1985,67 o que
contribuiu para que subunidades estruturais mais simples pudessem ser bioen-
saiadas quanto às suas propriedades biológicas.
Estudos da biodiversidade naturalcomo fonte de padrões estruturais de inte¬
resse farmacológico vêm observando evolução significativa com a introdução de
novas técnicas, além daquelas de elucidação estrutural sofisticadas, que permitem
trabalhar com quantidades cada vez menores de substâncias, independentemente
de sua complexidade estrutural. Surgiu o uso de abordagens bioquímicas conju¬
gadas, empregando técnicas autobiográficas em cromatografia de camada fina
de afinidade por determinados alvos, com excelente nível de sensibilidade. O
emprego de técnicas combinatórias68 para ampliar a diversidade "natural" de
determinadas classes de compostos e, recentemente, um exemplo do uso de
modelagem molecular para "ancorar" padrões naturais diversos foi descrito por
QUÍMICA MEDICINAL 107
OH OH
HO, lOH
OH
OH
OH
CH
OHHO
OH OH OH
OH
NH.
.OH
HN
OH OH
.OH
.OH
CH- CH;HN OH OH
,OH
HO
HO OH HO,
.OH
OH
HO,
OH
OH
CH; OH
CH; OH
'OH
OH OHOH
OHHO
OH
palitoxina
(2.114)
•£r' ' £K* ÿ
v* t f\*p ÿ*
*
»"*. ÿ.
'l.i • r..
FIGURA 2.30
Estrutura 2D e visão 3D da palitoxina (2.114) (WebViewer 2.0).
108 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
CH,
,CHS
'll
ch2
HY CH,
ácido acantóico
(2.115)
ácido abiótico
(2.116)
penicilina-G
(2.53)
Suh e colaboradores69 da Faculdade de Farmácia da Universida¬
de Nacionalde Seul, Coréia do Sul, que descreveram as proprie¬
dades inibidoras da cicloxigenase-2 (COX-2) para o ácido acan¬
tóico (2.115), sesquiterpeno da classe dos pimaranos, isolado
de plantas medicinais comumente empregadas na medicina
popular localpara tratamento dos sintomas de doenças reumáti¬
cas. A partir dos estudos de modelagem molecular empregando
a COX-2, os autores lograramotimizar as propriedades inibidoras
da substância natural, original, identificando novos análogos
mais potentes.
Outro ácido natural com esqueleto pimarânico que se mos¬
trou ativo em macrófagos na concentração de 50 pM, inibindo
em 18%os efeitos do TNF-a e em 76% a ação da PGHS-2 (COX-
2), foi o ácido abiótico (2.116).70
O ACASO NA DESCOBERTA DE FARMACOS
Dentre os diferentes processos que levaram à descoberta de fár¬
macos, o "acaso", representando fatores circunstanciais, for¬
tuitos, permitiu que algumas classes terapêuticas importantes
fossem descobertas.
ANTIBIÓTICOS p-LACTAMICOS
Os antibióticos, autênticos fármacos "salva-vidas", observaram
umdesenvolvimento ímpar desde a descoberta da penicilina-G
(2.53).
A penicilina-G (2.53) representa um dos mais importantes
exemplos da contribuição do "acaso" para a descoberta de no¬
vos fármacos.
Graças a uma série de fatores fortuitos e à sagacidade de Sir
Alexander Fleming (Figura2.31), então Diretor do Departamen¬
to de Inoculação do Hospital St. Mary em Paddington, Londres,
a ação antibiótica da penicilina-G (2.53) foi reconhecida por
volta de 1930,embora tenha sido descoberta em 1896pelo estu¬
dante francês de medicina Ernest Duchesne.71 Provavelmente
devido à sua instabilidade química, os químicos da época não
lograram caracterizá-la estruturalmente.
Alguns poucos relatos existiam na literatura da época de Fleming sobre a
propriedade antimicrobiana de fungos; entretanto, ainda não haviam sido com¬
provadas suas propriedades terapêuticas.
Em 3 de setembro de 1928, ao retornar de férias, Fleming recebia umvisitan¬
te em seu laboratório, quando observou algumas placas de cultura esquecidas
sobre sua bancada, em vez de estarem acomodadas no incubador térmico. Estas
placas apresentavam-se contaminadas, com reduzido crescimento de colónias
de estafilococos que haviam sido semeados no início do verão. Esta observação
fortuita despertou a sagacidade de Fleming,que, após tratar a placa contaminada
com uma solução de formaldeído, para preservá-la, guardou-a. A posterior cons¬
tatação de que o contaminante era umfungo do género Penicillum foi feita consul-
QUÍMICA MEDICINAL 109
tando o laboratório de vacinas no andar superior. A observação da inibição do
crescimento das cepas de estafilococos e o reconhecimento da presença de meta-
bólitos do fungo Penicillum notatum com propriedades antibacterianas, conduzi¬
ram Fleming a identificar a penicilina (2.53), sendo que seu trabalho completo
sobre o tema foi publicado em 1932. Talvez devido às inúmeras dificuldades de
isolamento do princípio ativo puro, a importância terapêutica da penicilina não
foi reconhecidapor Flemingnempelos membros da Royal Society, que recusaram,
à época, sua candidatura. Alguns anos após, por volta de 1940, o processo de
isolamento da penicilina foi finalmente desenvolvido por Sir Ernst Chain e Lord
Howard Florey, em Oxford, estimulados pela então recente descoberta do pron-
tosil, em 1935.No ano seguinte, dispondo da substância isolada, as propriedades
antibacterianas da penicilina foram comprovadas em animais de laboratório,
evidenciando efeitos adversos causados pela presença de impurezas.Ainda nesse
ano, EdwardAbraham purificoua penicilinacromatograficamente e demonstrou
suas propriedades antimicrobianas por injeção endovenosa em ratos. Estes resul¬
tados foram publicados,e os estudos clínicos comvoluntários se iniciaram,confir¬
mando sua instabilidade ao suco gástrico e sua rápida eliminação renal. Tais
estudos contribuíram decisivamente ao conhecimento de sua melhor forma de
administração, que permitiu a sua primeira utilização em fevereiro daquele ano.
No verão de 1943, nos laboratórios Dyson Perrins da Universidade de Oxford,
Sir Robert Robinson e colaboradores elucidaram a estrutura da penicilina-G
(2.53), viabilizando sua síntese.
A produção de penicilinapor rota fermentativa foi desenvolvida, o que permi¬
tiu seu amplo emprego terapêutico cerca de 12 anos após a identificação de suas
propriedades na colónia de fungo, validando a antiga premissa de Pasteur: "La
vie empeche la vie*", que fundou as bases da quimioterapia.A descoberta da penicilina-G rendeu a Sir A. Fleming, Sir Ernst Boris Chain
e Lord Howard Walter Florey o Prémio Nobel de Medicina em 1945.
Graças à descoberta da penicilina iniciou-se a "antibiotico-
terapia", que teve significativo impacto para o aumento da es¬
perança e da qualidade de vida de homens e mulheres em todo
o mundo e, consequentemente, para a saúde da humanidade.
A penicilina-G (2.53 ) foi a primeira representante da impor¬
tante classe dos antibióticos (3-lactâmicos, onde se encontram
também as cefalosporinas (p. ex., cefalexina, 2.117).72 Atual-
mente, esta classe de quimioterápicos se encontra entre os fár¬
macos mais comercializados no mundo, comprovando sua
excepcional importância terapêutica.
Inúmeros outros antibióticos, de diferentes classes quími¬
cas, descobertos a partir de então por screening randômico,
manifestam suas propriedades através de diversos mecanismos
de ação, distintos daquele pelo qual atuam os p-lactâmicos que são inibidores
da "biossíntese" da membrana celular externa de microrganismos.73
O mecanismo de ação atualmente aceito para os antibióticos p-lactâmicos
consiste na inibição da atividade D-alanina carboxipeptidase (DD-Cbase) do mi¬
crorganismo, prevenindo a inserção da unidade dipeptídica D-Ala-D-Ala naetapa
final da construção de sua membrana celular externa. A unidade p-lactâmica,
eletrofilicamente reativa, é essencial e participa levando à formação de ligações
covalentes, provavelmente irreversíveis,compeptídeos essenciais à correta função
da membranaexterna dos microrganismos.As bases moleculares deste mecanis-
FIGURA 2.31
Sir Alexander Fleming.
CO,H
Cefalexina
(2.117)
* N. de T. "A vida impede a vida."
110 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
mo foram elucidadas por Blumberg & Strominger em 1974, que evidenciaram a
similaridade estrutural entre a penicilina-G e o término D-alauil-D-alanina do
peptideoglicano da membrana de microrganismos suscetíveis.74
A Figura 2.32 ilustra um "recorte" (A) da estrutura da penicilina-G (2.53),
indicando a unidade "dipeptídica" mascarada (C-3/C-8), que comporta o grupa¬
mento farmacofórico (3-lactâmico, comparando-o à unidade dipeptídica terminal
D-alanil-D-alanina do peptideoglicano, evidenciando a similaridade molecular,
que respeita, inclusive, os centros estereogênicos do dipeptídeo terminal (C-3 e
C-6).
anel
tíazolidínico
anel
azetidídico
jG-lactanna
HN 7 >™,
O-Ala-D-Ala
OH
kAAj
I A
1c5\
4 =ÿCOOH
FIGURA 2.32
Ilustração da similaridade
molecular entre a
estrutura da penicilina-G
(2.531 e o dipeptídeo D-
Ala-O-Ala.
Em função de sua natureza peptóide, as penicilinas de primeira geração não
resistiamà acidez do trato gastrintestinal, sendo inativadas quando administradas
por via oral. Entretanto, subsequentes modificações estruturais ou a identificação
de outras estruturas P-lactâmicas em outros fungos levaram a novas gerações
de antibióticos P-lactâmicos que são ativos quando administrados por via oral,
como ilustrado pela tienamicina (2.118), derivado da classe dos carbapenenos,
isolado de fungo, onde o átomo de enxofre não mais compõe o núcleo tiazolidí-
QUÍMICA MEDICINAL 111
nico, sendo substituído por umgrupamento metilênico, represen¬
tando um exemplo de bioisosterismo natural.
A históriada penicilina-G (2.53 ) é umexemplo da possibilidade
de "domesticar-se" a estrutura química natural, "selvagem", após
identificar-se o(s) principal(is) grupamento(s) responsável(is)
pela atividade terapêutica, isto é, o grupamento farmacofórico, de
maneira a superar as eventuais limitações da fase farmacocinéti-
ca e introduzir novas características estruturais que potencializem
sua eficácia terapêutica.
A estrutura originaldapenicilina-G (2.53) foi significativamen¬
te modificada, de forma planejada, levando a novas gerações de
potentes antibióticos p-lactâmicos sintéticos com amplo espectro de ação e ativos
por via oral, como ilustrado pelas monobactamas (2.119 e 2.120),* descobertos
em 1981, simultaneamente, no Japão e nos Estados Unidos, no âmbito de um
screening planejado para identificar, de fontes naturais, protótipos p-lactâmicos.
Esta nova classe de antibióticos, estruturalmente simplificados em relação às
penicilinas originais, foi modificadade maneira a introduzirem-se características
estruturais capazes de assegurar atividade em cepas de microrganismos resisten¬
tes à penicilina que possuem a enzima p-lactamase, uma peptidase, responsável
pela hidrólisedogrupamentofarmacofórico p-lactâmico, bioinativando o antibiótico.
Inúmeros compostos possuindo o núcleo azetidinílico, funcionalizado por
um grupamento ácido sulfônico, foram obtidos, destacando-se o aztreonam
(2.120) como o primeiro representante da classe a ser comercializado, ativo em
cepas gram-negativas, resistentes à penicilina.
monobactama aztreonam
(2-119) (2.120)
Tienamicina
(2.118)
ANSIOLITICOS BENZODIAZEPINICOS
O "acaso" foi também responsávelpela descoberta de importante classe terapêu¬
tica de agentes ansiolíticos: os benzodiazepínicos.75 No início dos anos 1950, o
tratamento da ansiedade e de certas neuroses se fazia pelo emprego de agentes
psicotrópicos com efeitos sedativos que reduziam sua eficácia.
A descoberta dos benzodiazepínicos, exemplificada pelo pioneiro clordiaze-
póxido (2.121) (Librium®), ilustra, também, de forma exemplar, uma das princi¬
pais características da química orgânica medicinal, sintética, em que a identifi¬
cação de um intermediário comum, de fácil acesso e adequadamente funciona¬
lizado se presta à construção de uma ampla série congénere de novos compostos
com um único esforço sintético, explorando sua reatividade.
Esta classe de agentes terapêuticos, que representaram importante inovação
à época, foi descoberta por Leo H. Sternbach,75 nos laboratórios Roche, em Basel,
ÿCH,
clordiazepóxido
(2.121)
* Estadenominação se origina na nature¬
za monocíclica com propriedades bacte-
ricidas possuindo o anel p-lactama.
112 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
Suíça. Segundo seu próprio relato, Sternbach foi contratado pela Roche pouco
tempo após a conclusão de seu doutoramento,para desenvolver novos compostos
neuroativos. Decidiu, então, investigar o sistema heterocíclico benzoeptoxidia-
zínico (2.122), descrito em 1891, que havia atraído seu interesse durante seu
doutoramento (Figura 2.33). A síntese deste núcleo heterocíclico utilizava como
matéria-primaflrfo-aminoacilfenonas (2.123), que por simples condensação com
hidroxilamina fornecia as oximas correspondentes (2.124). Estes compostos,
por sua vez, produziriam o sistema benzoeptoxidiazínico desejado (2.122), por
tratamento com cloreto de cloroacetila e base.
O núcleo heterocíclico eleito por Sternbach possuía as características ideais
para o químico medicinalsintético. Variando-se a natureza de Re do substituinte
W do anelbenzênico naflrfo-aminoacilfenona (2.123) de partida,podia-se prepa¬
rar ampla série congénere de heterocíclicos que, pela presença do grupo cloro-
metilaX (2.122), permitiria inúmeras subsequentes funcionalizações, pelo em¬
prego de diferentes nucleófilos acessíveis, especialmente aminas secundárias
ouprimárias, aromáticas ou alifáticas, assegurando a síntese de numerosos com¬
postos, estruturalmente relacionados, para screening de neuroatividade. A sur¬
presa de Sternbach foi constatar, no início do projeto, que o produto descrito
como sendo formado na etapa de condensação da oxima intermediária com clo¬
reto de cloroacetila em base não correspondia ao anel benzoeptoxidiazínico de¬
sejado (2.122), mas, inesperadamente, conduzia ao sistema 3-óxido-quinazolí-
nico (2.123), funcionalizado com o grupamento clorometila X. Entretanto, o
tratamento, conforme planejado inicialmente, deste intermediário (2.123) com
aminas secundárias e primárias forneceria os derivados aminados corresponden¬
tes (2.126), contendo desta feita o núcleo 3-óxido-quinazolínico(Figura 2.33).
Esta rota sintética permitiu a obtenção de diversos derivados supostos como
sendo 2-A,A-alquil-3-óxido-quinazolinas (2.126), os quais não apresentaram as
propriedades farmacológicas desejadas nos ensaios realizados.
Em face destes resultados frustrantes, o projeto foi abandonado. Entretanto,
o "acaso" fez com que o único produto obtido pelo tratamento do intermediário
2-clorometil-3-óxido-quinazolina (2.127) com amina primária, ou seja,
metilamina, não tivesse sido bioensaiado. Com a mudança de projeto a amostra
correspondente ao suposto 2-A-metil-3-óxido-quinazolina (2.128) ficou esqueci¬
da na bancada de Sternbach por dois anos, quando foi finalmente ensaiada em
novos protocolos farmacológicos então disponíveis na Roche, e apresentou-se
extremamente ativa, suplantando todos os padrões conhecidos à época. Os resul¬
tados farmacológicos reativaram o interesse de Sternbach neste derivado "qui-
nazolínico", cujo espectro de ultravioleta indicavaumcromóforo distinto daquele
típico dos derivados 2-A-A-alquil-3-óxido-quinazolínicos (2.128). Estudos de
elucidação estrutural, incluindodegradação química, identificaramo novonúcleo
1,4-benzodiazepínico (BZD) (2.121), formado por expansão do anelquinazolínico
do derivado clorometilado (2.127) por rearranjobase-catalizado que correspondia
ao clordiazepóxido (2.121).
QUÍMICA MEDICINAL 113
NH,
W
NH,
HoNOH
W
ÿ ÿCl
w
OH
o/ro-aminoacilfenona
(2.123)
W-
oximas
(2.124)
NRR'
© RR'NH W
-77-
-P (NuSn©
x= ch2ci
benzoeptoxidiazina
(2,122)
J
2-/V,/V-alquil-3-óxido-quinazolina
(2.126)
I©
3-óxido-quinazolina
(2.125)
H3CNH2
2-clorometil-3-óxido-quinazolina
(2.127)
clordiazepóxído
(2.121)
(2.128)
FIGURA 2.31
0 "acaso" na descoberta
dos benzodiazepínicos.
114 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
FIGURA 2.31
Exemplos de fármacos
benzodiazepínicos
(2.129-2.133).
O clordiazepóxido (2.121) foi comercializado em 1960 como uma inovação
terapêutica para o tratamento da ansiedade. A partir da identificação de suas
propriedades, dúzias de novos derivados BZD foram comercializados, incluindo
o diazepam (2.129), um dos fármacos mais prescritos mundialmente (Figura
2.34).
novos anéis
funcionalizaçao
pro-quiral
novos
substituintes
funcionalizaçao
H,C
(2.129 2.130)
(2.132)
CO,K
(2.133)
QUÍMICA MEDICINAL 115
FIGURA 2.31
Visão estérioa do
diazepam C2. 129)
[WebViewer 2.0).
NEUROLEPTICOS
Outro importante agente neuroativo, a clorpromazina (2.134), representante
pioneiro da classe dos neurolépticos, também foi descoberto por "acaso", a partir
das observações de Laborit, que, estudando novas estratégias terapêuticas capazes
de prevenir o choque cirúrgico, investigava o emprego de derivados fenotiazínicos,
conhecidos desde 1940.76 Estes trabalhos identificaram as propriedades centrais
do núcleo fenotiazínico, e em 1952 os laboratórios Rhône-Poulanc lançaram a
clorpromazina (2.134), protótipo que originou diversos derivados neurolépticos
e contribuiu sobremaneira para a mudança de perfil do tratamento de pacientes
psiquiátricos. (2 134)
Os estudos estruturais subsequentes com a clorpromazina (2.134) evidencia¬
ram os aspectos conformacionais particulares deste sistema tricíclico que adota
umaconformação descrita como "borboleta", em que os anéis laterais encontram-
se fora do plano do anel central heterocíclico (Figura 2.36).
SULFAS DIURÉTICAS
A descoberta da classe dos fármacos sulfonamídicos com propriedades diuréticas
também foi fruto do "acaso". Com o boom da sulfoterapia, inúmeros derivados
sintéticos foram obtidos e ensaiados quanto às suas propriedades bactericidas.
Durante ensaios realizados in vivo com um derivado 1,3,4-tiadiazólico, o técnico
de laboratório observou que as gaiolas dos animais tratados com esta substância
tinham muito mais urina, que as demais, registrando esta observação no livro
de laboratório.Graças a este registro, fruto do zelo do técnico no trabalho rotineiro,
foram descobertas, por "acaso", as propriedades diuréticas dos compostos sul¬
fonamídicos.
Por volta de 1952, os laboratórios Cyanamid lançaram a acetazolamida (2.135)
(Acetamox®), que representou, à época, uma significativa inovação terapêutica,
pois, quando introduzido na clínica, representava o primeiro fármaco diurético
não organo-metálico ativo por via oral. Esta nova classe de fármacos diuréticos
teve o seu mecanismo de ação identificado, posteriormente, como sendo devido
à atividade inibitória da anidrase carbónica (CA), enzima zinco-dependente res¬
ponsável pela metabolização renal do ácido carbónico e consequente regulação
FIGURA 2.31
Conformação do anel
fenotiazínico.
116 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
da taxa de eliminação/reabsorção de ions HC03"e Na+.Ademais, a presen¬
ça da CA nos olhos regulando a pressão intra-ocular permitiu a posterior
indicação deste fármaco para o tratamento do glaucoma.
acetazoiamída A "PÍLULA" ÿÿ DIA SEGUINTE: MEFIPRESTONA
'2'135' A descoberta da mefiprestona (RU-486) (2.136), primeiro abortivo da classe dos
esteróides, também foi, em parte, obra do "acaso". A exemplo dos benzodiazepí-
nicos, em que o "acaso" esteve presentenaparte química da construção do siste¬
mabenzodiazepínico, neste caso, graças a umcomportamento químico inespera¬
do, Teutsch e colaboradores obtiveram, nos laboratórios Roussel-UCLAF, em
Romainville, França,77 o primeiro composto funcionalizado na posição C-ll do
sistema ciclopentano-peridrofenantreno, precursor do RU-486 (2.136), a partir
do epóxido (2.137) ilustrado na Figura 2.37. Os autores buscavam introduzir o
grupamento metila angular C-19, substituinte típico dos derivados progestagê-
nicos, através de abertura nucleofílicaestéreo e regiosseletiva do epóxido (2.137).
Entretanto, investigando o comportamento químico de diferentes nucleófilos
ante este intermediário-chave, entre eles reagentes dialquil e diarilcupratos de
lítio ou reagentes de Grignard, os autores identificaram a formação estereosseleti-
va de derivados p-C-11 alquilados (p. ex., 2.139), através de processo predomi¬
nante SN2', na presença do composto minoritário (2.138) via mecanismo de aber-
tura nucleofílica em C-10 de 2.137 (Figura 2.37). A partir destas observações e do
"
comportamento farmacológico destes novos esteróides, foi obtido o RU-486 (2.136),
Descoberta da conhecido como a "pílula" do dia seguinte, por suas propriedades abortivas.
mefiprestona (2.136).
O N
—
N
ÿni
'3C H S //<*Q
NuNu
Nu
OH
(2.138)
OH(2.137) (2.139)
Produto Esperado= C-19 funcionalizado
Nu= SR, N3
SN= ataque a
Produto Majoritário= C-11 funcionalizado
Nu= PhjCuLi ou Me2CuLi
SN= ataque b
CH-
h3c HO
QUÍMICA MEDICINAL 117
H,CO
NH2
doxazozin
(2.141)
SILDENAFIL (VIAGRA®):
EXEMPLO ÿÿ "ACASO"
FARMACOLÓGICO
Em meados de 1980, os laboratórios Pfizer da
Inglaterra,em Sandwich, onde já haviam sido
descobertos vários fármacos vasodilatadores,
por exemplo, prazozin (2.140, Minipress®),78
doxazozin (2.141, Cardura®)79 e amlodipina
(2.142, Norvasc®),80 investigavam a possibili¬
dade de terem umagente cardioativo atuando
sobre uma isoforma específica da família de
enzimas fosfodiesterases (PDEs), responsáveis
pela hidrólise de nucleotídeos cíclicos como
AMPc e GMPc. Este alvo terapêutico havia si¬
do validado para o tratamento de cardiopatias,
pelos efeitos vasodilatadores que apresenta¬
vam alguns inibidores de PDE e nitratos orgâ¬
nicos, doadores de óxido nítrico (NO), empre¬
gados na terapêutica. O aumento de NO por
administração de nitratos (p. ex., Isordil®) ou
pela ação inibitória sobre PDE GMPc depen¬
dente favorece a ação vasodilatadora media¬
da pelo NO.
Os pesquisadores elegeram como alvo a iso¬
forma de PDE GMPc dependente (p. ex., PDE-
5) visando ao tratamento da angina. Nesta
época, apenas cinco isoformas de PDE eram
conhecidas - isto é, PDE1-5- sendo as isofor¬
mas 3 e 4 seletivas para AMPc, enquanto a
PDE-1 e PDE-2 não discriminam entre os nu¬
cleotídeos cíclicos AMP e GMP e, por fim, sen¬
do a PDE-5 (enzima Zn++ dependente) seleti-
va para GMPc. Atualmente são conhecidas
onze isoformas de PDEs (PDE1-11),sendo que
algumas possuem subtipos, a exemplo da
PDE-4, que se subdivide em PDE-4A, B, C e D.Dessa forma, combase nas informa¬
ções da época, o time de pesquisadores da Pfizer visava identificar novos inibidores
de PDE-5 como candidatos de fármacos para tratamento da angina.
Na literatura haviam sido relatadas as propriedades PDE-inibidoras para um
derivado heterocíclico com sistema triazolo-pirimidinona (2.143)81desenvolvido
como antialérgico e que apresentava IC50 de 9,4 e 58 pM para as isoformas PDE-
1 e PDE-3, respectivamente. Tendo identificado a presença de PDE-5 nas pla¬
quetas de coelho, os pesquisadores da Pfizer determinaram a concentração ini¬
bitória média deste derivado - denominado zaprinast (2.143) - nesta isoforma,
observando um valor de IC50 de 2,0 pM, significando uma seletividade modesta,
mas promissora. A análise das propriedades moleculares do zaprinast (2.143)
por modelagem indicou extensa similaridade com o substrato natural da PDE-
5, isto é, GMPc (2.144) (Figuras 2.38 e 2.39), sobretudo em nível dos sistemas
heterocíclicos dos dois compostos. A partir deste protótipo (2.143), novos com¬
postos heterocíclicos nitrogenados foram sintetizados e bioensaiados in vitro (p.
O
NHZ
prazozin
(2.140)
HqC
NH;
amlodipina
(2.142)
118 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
isósteros
OH
zaprinast
(2.143) GMPc(2.144) OH
O
FIGURA 2.38
Similaridades entre o
zaprinast (2.143), inibidor
não-seletivo de PDEs, e o
GMPc (2.144) - substrato
natural da PDE-5.
ex., 2.143a-h), destacando-se o derivado isóstero (2.143b) com o sistema pirazolo-
pirimidínico substituindo o anel triazolo-pirimidínico do zaprinast (2.143), que,
após modificações estruturais suplementares visando à otimização de sua po¬
tência inibitória, levou à descoberta de UK-83.405 (2.145); este apresentou IC50
de 0,3 pM para PDE-5 e 3,3 e >100 pM para as isoformas PDE-1 e PDE-3,
suplantando o protótipo inicial zaprinast (2.143) (Figura 2.40).82
O índice de seletividade de apenas 10 vezes sobre a isoforma 1 vis-à-vis a
PDE-5 para o UK-83.405 (2.145) ainda era insuficiente para assegurar seu uso
terapêutico, obrigando o time de pesquisadores da Pfizer, liderados por Simon
Campbell, a introduzir novas modificações estruturais neste derivado. Foram
eleitas modificações que, ao mesmo tempo, pudessem favorecer a hidrossolubi-
lidade dos novos compostos, o que indicou a introdução de subunidade sulfona-
mida, com pontos característicos para interações de hidrogénio (H). Isto contri¬
buiria para o ajuste do coeficiente de partição, além de permitir a introdução de
um grupamento de natureza polar que mimetizaria a subunidade osídica-trifos-
FIGURA 2.31
Visão 3D do zaprinast
(2.143) e do GMPc
(2.144) sobrepostos.
QUÍMICA MEDICINAL 119
(2.143a)
(2.143b)
(2.143f>(2.143d) (2.143e)
(2.143h)
CH.
(2.145)
(2.143)
fatada presente no substrato natural da enzima, isto é, GMPc (2.144). Dessa
forma, nova série de compostos foi sintetizada (p. ex., 2.146-2.150) e avaliada
quanto à atividade PDE-5Í e quanto ao coeficiente de partição (Figura 2.41; entre
parênteses, dados do coeficiente de partição em logD).
A análise da seletividade destes novos derivados sulfonamídicos em face das
isoformas 1, 3 e 5 de PDEs indicou, para o composto V-metilado relacionado a
2.147, isto é, UK-92.480 (2.151, Figura 2.42), valores de IC50 de 360 nM, 65 pM
e 3,6 nM, respectivamente, com índice de seletividade de 100 sobre a PDE-1 vis-
à-vis a PDE-5, sendo batizado como sildenafil (Viagra®).83
FIGURA 2.40
Análogos do zaprinast
[2.143a-h) e seu protótipo
otimizado, UK 83.405
[2.146],
120 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
iC5o(PDE-5)= 18nM
IG|o<PDE-5)« 2,1nM <P=2iIC5o(PDE-5}= 5,7r»M (P-1,5)
(2.146)
IC5o(PDE-5)= 92nM
FIGURA 2.31
Protótipos otimizados
Í2.146-2.150) do
zaprinast (2.143).
FIGURA 2.32
Estrutura química do
sildenafil (2. 151) e sua
potência inibitória sobre
as isoformas de PDE-1, 3
e 5.
CH
ICgQ (PDE-1>=360 nM
ÿCH3 ic50 (PDE-3)=65 JJ.M
IC50 (PDE-5)=3,6 nM
sildenafil
(UK-92.480)
(2.151)
QUÍMICA MEDICINAL 121
O sildenafil (2.151) entrou em uso clínico em 1991, tendo apresentado pro¬
priedades cardiovasculares inferiores ao esperado. Entretanto, inúmeros relatos
de ereções provocadas pelo uso continuado deste fármaco em diversos pacientes
do sexo masculino foram, posteriormente, racionalizadospelos efeitos envolvendo
o NO84 e pela constatação da presença de PDE-5 no músculo cavernoso. Estes
resultados, fortuitos, caracterizamum"acaso farmacológico", visto que até então
nenhumfármaco atuando como inibidor de PDE-5 havia sido demonstrado como
sendo útilpara o tratamento da disfunção erétil (DE). De fato, o sildenafil (2.151)
representou importante inovação terapêutica em termos de mecanismo de ação
e por constituir o primeiro fármaco de uso oral para tratamento da DE, fatos
estes decisivos para determinar a alteração em sua indicação terapêutica.85
FÁRMACOS DESCOBERTOS A PARTIR
DO ESTUDO DO METABOLISMO
Os estudos do metabolismodosfármacos também permitirama descoberta de novos
medicamentos. A oxamniquina (2.152), derivado tetraidroquinolínico com pro¬
priedades esquistossomicidas, originou-se da hicantona (2.153), desenvolvida a
partir dos estudos do metabolismo do precursor, lucantona (2.154), potente anti-
helmíntico da classe das tioxantonas (Figura 2.43).
tetraídroquinolina CH
CH
HO'
.CH-
orto
CH
CHlucantona (2.154)
oxamniquina
(2.152) estudos de metabolismom vivo
hicantona (2.153)
Em 1936, pesquisadores alemães interessaram-se em avaliar as potenciais pro¬
priedades anti-helmínticas, particularmente esquistossomicida, de diversos com¬
postosheterocíclicos sintetizados nabuscade antimaláricos. Dispondo de umméto¬
do de screening em ratos infestados pelo Schistosoma mansoni, ensaiaram diversos
derivados xantônicos funcionalizados que haviam sido sintetizados por H.Mauss a
partir de variações estruturais introduzidas emderivados antimaláricos pertencentes
à classe das acridinas, como a quinacrina (2.155) (Figura 2.44). Estes compostos,
entre os quais destacava-se o "MiracilA" (2.156),mostraram-se ativos; entretanto,
devido aos efeitos tóxicos que possuíam, não puderam ser aproveitados.86
FIGURA 2.43
Metabolismo na
descoberta da
oxamniquina [2.1521.
122 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
Modificações estruturais subsequentes levaram à série isostérica das tioxan-
tonas, dentre as quais o "Miracil D" (2.156) mostrou-se eficaz (Figura 2.44). A
despeito dos efeitos adversos que apresentava esta tioxantona tricíclica, denomi¬
nada lucantona (2.154), foi empregada pelas tropas alemãs na campanha do
norte da África durante a Segunda Guerra Mundial e mantida em segredo até
seu final. Em 1965, pesquisadores da Sterling Winthrop Co., liderados por
Archer,87 identificaram o principal metabólito hepático da lucantona (2.154) co¬
mo sendo idêntico ao produto de oxidação de (2.154) peloAspergillus scleroticum.
Este fungo oxidava a posição benzílica da lucantona (2.154), produzindo o álcool
benzílico correspondente, denominado hicantona (2.153,Etrenol®) (Figura 2.45 ),
que se mostrou mais potente que o precursor. Estes resultados indicavam que a
lucantona (2.154) sofria processo de bioativação oxidativa, in vivo, para transfor-
mar-se na forma ativa, anti-helmíntica, sendo, hoje, um exemplo clássico de
pró-fármaco.88
CH.
CH.
CH.
CH- HNHN
acridina xantona
CH3
quinacrina (2.155) miracil A
(2.156)
CH.
CH.
tioxantona HN
CH3
Miracil D
(2.154)
lucantona
FIGURA 2.44
Génese da lucantona.
QUÍMICA MEDICINAL123
A hicantona (2.153), à época, representava o primeiro recurso terapêutico
para o combate a esquistossomose, que não possuia em sua estrutura nenhum
átomo de metal pesado. À despeito desta inovação, esta classe de tioxantonas
esquistossomicidas apresentava graves efeitos centrais que traziam desconforto
com seu emprego e, sobretudo, reduziam as possibilidades de seu uso como
agente profilático.*
CYP450
lucantona
(2.154) hicantona(2.153)
FIGURA 2.44
O perfil anti-helmíntico superior da hicantona (2.153)**, aliado às suas pro¬
priedades físico-químicas, particularmente sua maior solubilidade em água, e
consequente menor coeficiente de partição, justificavam os reduzidos efeitos
centrais que apresentava em relação ao precursor (2.154). O seu emprego como
esquistossomicida foi autorizado, e estudos posteriores do mecanismo molecular
de ação indicaram que o álcool benzílico era substrato seletivo de enzimas do
parasita, transformando-o em melhor grupo abandonador, favorecendo a forma¬
ção de espécies reativas do tipo azo-quinonas, responsáveis por seus efeitos letais
ao Schistossoma mansoni, que se manifestavampor redução significativa napostura
de ovos e namotilidade do verme. Emnívelmolecular,os derivados tioxantônicos
atuam reduzindo a atividade da serotonina do verme, assim como parecem com¬
petir com a acetilcolina (ACh) em seus receptores.
Na tentativa de se obterem derivados ativos mais toleráveis, a estrutura do
protótipo lucantona (2.154) foi modificada,explorando a estratégia de simplifica¬
ção molecular. Identificandoa presença da subunidade para-toluidina, isto é, para-
metilanilina, na estrutura da lucantona, como sítio farmacofórico, diversos deri¬
vados ÿara-toluidínicos, estruturalmente mais simples que a lucantona (2.154),
foram sintetizados por Mauss e colaboradores e apresentaram a atividade anti-
helmíntica desejada. Esta classe de compostos foi denominada "Mirasans" e,
posteriormente,explorada por pesquisadores da Pfizer,em Sandwich, Inglaterra,
liderados por R.Foster e B. L. Chetham,para descobrirem a oxamniquina (2.152)
(Mansil®).89
A génese da oxamniquina (2.152) foi baseada na introdução de dois grupa¬
mentos metilênicos na estrutura do protótipo mirasan (2.157), explorando o
processo de anelação*** que permitiu evidenciar-se o núcleo tetraidroquinolínico
Oxidação microbiológica e
metabólica da lucantona
(2. 154).
* Como curiosidade vale destacar que, for¬
tuitamente, os estudos do metabolismo
da lucantona (2.154) não foram realiza¬
dos em cobaias, em que verificou-se que
a capacidade enzimática das enzimas he¬
páticas em oxidar posições benzílicas é
limitada.
** Outra curiosidade que cabe destaque é
a origem do prefixohina hicantona, de¬
corrente da presença da hidroxila em sua
estrutura, única diferença em relação à
lucantona.
*** A tática de anelação para modificação
molecular será discutida no Capítulo 6.
124 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
contido na estrutura da oxamniquina (Figura 2.46). Ademais, este processo de
anelação preserva neste fármaco tetraidroquinolínico a relaçãopara- entre as fun¬
ções metila, pré-álcoolbenzílico e amina anilínica existente nas tioxantonas ati-
vas e nos derivados para-toluidínicos protótipos (p. ex., 2.157, Figura 2.46). Este
padrão estrutural encontra-se internalizado no sistema aza-heterocíclico da
oxamniquina (2.152) compondo o anel tetraidroquinolínico. A similaridade estru¬
tural entre estas classes de agentes esquistossomicidas se verifica aindanadistân¬
cia de dois átomos de carbono (a e b, Figura 2.43) entre os dois sítios básicos
alifáticos contidos na cadeia lateraldas tioxantonas e para-toluidinas e no centro
estereogênico do sistema heterocíclico da oxamniquina (2.152). Ademais, neste
último fármaco, o efeito ativador do grupo nitro em C-7, correspondendo ao
átomo de cloro do protótipo toluidínico (2.157), em relação orto ao grupo hidro-
ximetila, em C-6, aumenta a acidez deste álcoolbenzílico, favorecendo sua bioa-
tivação enzimática pelohelminto,o que conduz à formação das espécies reativas,
letais ao verme. O efeito ativador do grupamento nitro foi comprovado quando
análogos erto-substituídos por grupamentos doadores de elétrons foram prepara¬
dos e testados, manifestando reduzido,ou nulo,efeito anti-helmíntico. Finalmen¬
te, na oxamniquina (2.152) a natureza da amina terciária terminal das tioxan¬
tonas foi modificadaparaumaunidade isopropilamina. Esta modificação estrutu¬
ral altera o pKa desta função ao mesmo tempo que, devido à natureza do gru¬
pamento W-isopropila, introduz uma proteção estérica ao efeito conjugativo de
primeira passagem hepática e às reações de dealquilação metabólica que, se ope¬
rassem, reduziriamo tempo de vida-média deste quimioterápico, não permitindo
Génese da oxamniquina seu uso em (jose única ao dia.
(2.152).
iucantona
(2.154)
ÿCH3
para-toluidina
N XH3
mirasan
(2,157)
"anelação"
HO
02N
oxamniquina
(2.152)
Pfizer
H VÿCH3r
ch3
HO
0,N
tetraidroquinolina
N. -CH-;r
CH3
QUÍMICA MEDICINAL 125
Omecanismo de ação da oxamniquina (2.152) ainda não está completamente
elucidado, mas parece não envolver receptores de acetilcolina, a exemplo das
tioxantonas.
O estudo do metabolismo de fármacos tem evidenciado metabólitos ativos
que também ingressamnomercado geralmente com a mesma indicação terapêu¬
tica,90 pois o metabolismo de fase 1,de um modo geral, biotransforma o fármaco
em substâncias ou metabólitos estruturalmente similares, ou seja, com o mesmo
quimiotipo,podendo apresentar,portanto, as mesmas propriedades terapêuticas.
A biotransformação da loratadina (2.158) leva à formação do metabólito ativo
desloratadina (2.159), que assim como 2.158 passou a ser empregado na terapêu¬
tica, constituindo a segunda geração de anti-histamínicos e mantendo o mesmo
quimiotipo do fármaco de origem.91 O mesmo ocorreu com a cetirizina (2.161),
identificada como o metabólito ativo da hidroxizina (2.160),92 empregada
também como anti-histamínico (Figura 2.47).
FIGURA 2.47
Fármacos anti-histamínicos
e seus metabólitos ativos
comercializados como
fármacos.
hidroxizina (Atarax®)
(2.160)
loratadina (Claritin®)
(2.158)
desloratadina (Clarinex®)
(2.159)
cetirizina (Zyrtec®)
(2.161)
A fexofenadina (Allegra®, 2.163 ), fármaco anti-histamínico de últimageração,
foidescoberto como metabólito ativo da terfenadina (2.162), fármaco anti-hista¬
mínico de baixo índice terapêutico, através da oxidação alquílica terminal cata¬
lisada pelo CYP3A4 (Figura 2.48). Este metabólito ativo (2.163) foi investigado
126 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
farmacologicamente, mostrando potência similar ao fármaco original (i.e., 2.162),
porém desprovido dos efeitos tóxicos sobre o sistema cardiovascular relatados
para a terfenadina. Efeitos estes responsáveis pela posterior proscrição da terfe-
nadina (2.162). A maior segurança comprovada para o metabólito ativo de 2.162
(i.e., 2.163) motivou o lançamento da fexofenadina (2.163) no mercado.93
-jO
ch3JL-CH3
CYP3A4 i{ ÿjO
co2hJL-CHspen.
V 7 OH
J
Cl
OH
terfenadina
(2.162)
OH
cr O OH
fexofenadina
(2.163)
FIGURA 2.44
Fexofenadine (2.163): FÁRMACOS SINTÉTICOS
metabólito ativo da
terfenadina (2.162). De uma maneira geral, os fármacos disponíveis na terapêutica moderna são, em
sua ampla maioria, de origem sintética (ca. 85%). Se considerarmos ainda aqueles
oriundos de processos de hemi-síntese, como muitos antibióticos obtidos a partir
de intermediários homoquirais, preparados em processos fermentativos, este
percentual pode superar os 85% mencionados, em um mercado que em junho
de 2006 totalizava 600 bilhões de dólares para o último período de 12 meses, o
que corresponde ao montante de US$ 510 bilhões em fármacos de origem sinté¬
tica.
Em sua maioria, os fármacos sintéticos são aquirais e possuem,não raramente,
mais de um heteroátomoentre átomos de nitrogénio, enxofre e oxigénio, predo¬
minantemente,além de cloro e flúor. Se os classificarmos pelo tipo de mecanismo
de ação que apresentam, observar-se-á que em sua maioria são substâncias sin¬
téticas com propriedades inibidoras de enzimas e antagonistas de receptores
seletivos, sendo menos numerosos aqueles que atuam como agonistas de recepto¬
res e, menos ainda, aqueles que atuam ao nível de canais iónicos.
Estima-se que os fármacos contemporâneos atuem sobre não mais do que
cerca de 482 alvos terapêuticos, em sua maioria enzimas (Tabela 2.1).94' 95
A Figura 2.49 ilustra os cinco fármacos líderes de vendas em 2006. Observan-
do-se as estruturas destas substâncias bilionárias, veremos que todos são
sintéticos e juntos totalizam 142 átomos de carbono, 303 de hidrogénio, 24 de
oxigénio, 7 de nitrogénio, 3 de enxofre, possuindo apenas mais dois elementos:
1 cloro e 4 flúor. Em conjunto, totalizam 2716,5 u.m.a. (unidades de massa
atómica), o que corresponde a US$ 37,3 bilhões em vendas naquele ano.96 Estes
cinco fármacos mais vendidos em 2006 representam três classes terapêuticas,
com predominância (03) para aqueles indicados para doenças cardiovasculares
(p. ex., clopidogrel [2.164], atorvastatina [2.165] e simvastatina [2.166]). As
classes dos fármacos antiúlcera (esomeprazola,2.167) e antiasmáticos ( Seretide®)
completam a listagem das moléculas mais valiosas. Ressalta-se que o Seretide®
QUÍMICA MEDICINAL 127
TABELA 2.1
PRINCIPAIS ENZIMAS E RECEPTORES EXPLORADOS COMO ALVOS TERAPÊUTICOS
Aluas enzimáticos
17a-Hidrolase/C17.20-Liase Fosfodiesterases
2,3-Epoxi-esqualeno lanosterol-ciclase Fosfolipase As
5a-Redutase Fosfolipase C
A-14 redutase GABA transaminase
Acetilcolinesterase Gelatinase
Adenosina cinase Glicinamida ribonucleotídeo formiltransferase
Aldeído desidrogenase Glutationa-S-transferase
Aldose redutase GTPases
Anidrase carbónica H+/K+-ATPase
Aromatase HIV protease
Citocromo P450 oxidase HMG-CoA-reductase
Colagenase Inosina 5'-monofosfato desidrogenase
Colesterol acil-transferase Lanosterol 14a-desmetilase
ÿiidrofolato redutase Leucotrieno A4 hidrolase
Oiidroorotato desidrogenase Lipoxigenases
ÿNA girase Lisil oxidase
ÿNA pclimerase (3 Manosidase
Elastase Monoaminoxidase A
Encefalinase Monoaminoxidase B
Endopeptidase neutra 06-Alquilguanina-DNA-alquiltransferase
Enzima conversora de angiotensina Ornitina descarboxilase
Enzima conversora de endotelina Prolil 4-hidroxilase
Espermidina/Espermina-N'-acetiltransferase Prolil endopeptidase
Esqualeno monooxigenase Prolilpeptidil isomerase
Esqualeno sintase Prostaglandina endoperóxido sintase I
Esteróide A"-redutase Prostaglandins endoperóxido sintase II
Estrona sulfatase Prostaglandina endoperóxido sintase III
Farnesiltransferase Protease
Fator Vila Proteína quinase C
Fator Xa Purina nucleosídeo fosforilase
Fator Xllla Ribonuclease
Folilpoliglutamato sintase Ribonucleotídeo-difosfato redutase
Fosfatidilinositol cinase RNA-polimerase (Continua)
128 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
TABELA 2.1 (continuação)
PRINCIPAIS ENZIMAS E RECEPTORES EXPLORADOS COMO ALVOS TERAPÊUTICOS
S-Adenosil-L-metionina descarboxilase Uridina fosforilase
Tirosina quinase Xantina oxidase
Topoisomerase 1 xido nítrico sintase
Topoisomerase II a-Glicosidase
Transcriptase reversa p-lactamase
Trombina y-Glutamilcisteína sintetase
Uracil desidrogenase
Receptores alvos
5-Hidroxitriptamina
[5-HT,a / 5-HT1c / 5-HT1D / 5-HT2 / 5-HT3 / 5-HTJ
Acetilcolina muscarínicos (M, / M2 / M3)
Acetilcolina nicotínico
Adenosina (A,/A2]
Aminoácidos excitatórios (NMOA/AMPA/kainato)
Angiotensina CAT,/AT2)
Bradicinina (B2)
Colescitocinina (CCK-A/CCK-B)
ÿopamina (Dí/De/Os/OJ
Endotelina (ETA/ETB)
Estrogênio
Fibrinogênio (gpllb/llla)
GABA (GABAa/GABAbI
Histamina (HVHe/Hg)
Interleucina [ITi/IT2]
Leucotrienos [BVCVOU
Opióides C8, x. |D
PAF
Prostanóide (PGE2/TXA2/PGI2)
Sigma ta)
Taquicinina CNKVNKe/NKJ
Trombina
a-Adrenoceptores [<xi/a2)
p-Adrenoceptores (PVPe/Ps)
corresponde a uma inovação incremental, ou seja, associação de dois fármacos
já conhecidos (salmeterol [2.168] e fluticasona [2.169]), em geral indicados
isoladamente para o tratamento da asma brônquica, que foram formulados em
um único medicamento. Esta inovação incremental assegurou ao Seretide® a
quarta posição em vendas mundiais em 2006.
Esta estratégia de associações de fármacos conhecidos em novas formulações
conjugadas tem sido atualmente bem explorada, como ilustra o exemplo do
Caduet®, associação de dois fármacos da Pfizer - indicados para tratamento de
doenças cardíacas - atorvastatina (2.165) e amlodipina (2.142) que representa
outra recente inovação incremental. Esta estratégia tem promovido a formação
de joint-ventures de distintas Big-Pharmas, como ocorreu com a Shering-Plough
e a Merck, que introduziram nova associação contendo dois agentes antilipêmi-
cos, atuando por meio de distintos mecanismos farmacológicos de controle das
taxas de colesterol plasmático, a saber: simvastatina e fibrate.
QUÍMICA MEDICINAL 129
esomeprazola NexiunV
(2.167)
clopidogrel Plavir*
(2.164)
US$ bilhões H0 atorvastatina
(2.165)
salmetereol
(2.168)
simvastatina Zoccor(
(2.166)
fluticazona
(2.169)
FIGURA 2.44
Umbreve retrospecto da cronologia da descoberta dos fármacos (Figura 2.50)
desde o ácido acetilsalicílico (2.170, AAS, Aspirina®), primeiro fármaco sintético
desenvolvido em 1889, ao vorinostat (2.171, Zolinza®, Merck),97 lançado em
2006 para o tratamento de linfomacutâneo, observa-se que a maioriaesmagadora
das inovações terapêuticas compreende ou relaciona-se a fármacos de origem
sintética. Deve-se registrar, entretanto, que alguns biofármacos, isto é, de origem
biotecnológica, ingressaram no mercado nos últimos anos, a exemplo do inflixi¬
mab (Remicade®),98 indicado para o tratamento de quadros inflamatórios cróni¬
cos, inclusive da doença de Chron, e do panitumumab (Vectibix®, Amgen),99 anti¬
corpo capaz de atuar sobre o receptor do fator de crescimento da derme (EGFR),
indicado para o tratamento do câncer colorretal.
Cinco fármacos líderes em
vendas em 2006 (em US$
bilhões).
CO,H
2.170
vorinostat
(2.171)
130 capítulo 2 A ORIGEM DOS FÁRMACOS
FIGURA 2.44
Árvore cronológica da
descoberta de fármacos.
AAS
Ácido barbitúrico
Cloroquina
Sulfonamidas
Penicilinas
Nitrofuranos
Progesterona
Talidomida
Haloperidol
Verapamil
Indometacina
Propranolol
Salbutamol
Oxamniquina
Nifedipina
Cimetidina
Captopril
Oxicams
Praziquantel
Aciclovir
Ranitidina
2004
Mefloquina
Azidovudina, lovastatina
Mifepristona, fluoxetina
Amiodipina
Fanciclovir
Indinavir
Saquinavir
Atorvastatina, olanzapina
Infliximab
Celecoxib, sildenafil
Galantamina
Imatinib
Etoricoxib
Apomorfina, voriconazol
Vardenafil
Aripripazola
Rosuvastatina
Pregabalin, udenafil
Caduet
Ranolazina
Vorinostat
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