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Compêndio de análise institucional e outras correntes: teoria e prática

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Compêndio de análise institucional e outras 
correntes: teoria e prática
Gregorio F. Baremblitt 
 
5ª.ed. 
Belo Horizonte, MG: Instituto Felix Guattari, 2002 (Biblioteca Instituto Félix Guattari; 2) 
Baremblitt, Gregorio F. (2002) Compêndio de análise institucional e outras 
correntes: teoria e prática, 5ed., Belo Horizonte, MG: Instituto Felix Guattari 
(Biblioteca Instituto Félix Guattari; 2)
Copyright 1992 by Gregorio Baremblitt 1 ª edição: Editora Record, 1992
4 
SUMÁRIO 5
INTRODUÇÃO.............. 11 
CAPÍTULO I: O movimento institucionalista, a auto-análise e a autogestão..............13 
CAPÍTULO 11: Sociedades e instituições..............25 
CAPÍTULO III: As histórias..............37 
CAPÍTULO IV: O desejo e outros conceitos no institucionalismo..............53 
CAPÍTULO V: As tendências mais conhecidas do institucionalismo..............71 
CAPÍTULO VI: Roteiro para uma intervenção institucional padrão..............90 
CAPÍTULO VII: O institucionalismo na atualidade..............108 
GLOSSÁRIO..............133 
APÊNDICE..............174 
POST-SCRIPTUM..............195 
BIBLIOGRAFIA BÁSICA..............205 
BIBLIOGRAFIA DE CONSULTA..............207 
AGRADECIMENTOS 
No referente à primeira edição deste livro, o autor dá 
aqui testemunho de sua profunda gratidão: ao Dispositivo 
Instituinte de Minas Gerais, Escola de Saúde Pública de 
Minas Gerais, João Bosco Castro Teixeira, Cibele Ruas de 
MeIo, Alfredo Martin e alunos do curso do qual o livro foi 
uma versão. 
Nesta quinta edição, o autor exprime seu 
agradecimento à Margarete A. Amorim, que realizou 
inúmeras tarefas que possibilitaram sua publicação e 
distribuição, assim como à Luisella Ancis, que fez a tradução 
de novos capítulos, Nina Rosa Magnani, que colaborou com 
a revisão, e Luciana Tonelli, que fez a revisão final. O autor 
também agradece aos membros e funcionários do Instituto 
Félix Guattari de Belo Horizonte pelas diversas contri-
buições. Todos eles aportaram sua ajuda generosamente. 
O autor é grato a todos os amigos: professores universitários, 
pesquisadores, profissionais, estudantes e militantes da 
autogestão que colaboraram na distribuição das diversas 
edições deste escrito. 
9▲
INTRODUÇÃO 
Este livro corresponde à versão escrita de um curso proferido em Belo Horizonte no 
decorrer de 1990, organizado pelo Movimento Instituinte de Minas Gerais. Curso que, por sua vez, 
foi requerido para atender ao crescente interesse pelo Movimento Institucionalista ou Instituinte no 
Brasil e facilitar o acesso aos textos dos fundadores das diferentes correntes. Os seis primeiros 
capítulos correspondem às seis aulas que compuseram o curso, enquanto o último foi escrito como 
artigo independente, ainda inédito. 
O Movimento Institucionalista é um conjunto heterogêneo, heterológico e polimorfo de 
orientações, entre as quais é possível se encontrar pelo menos uma característica comum: sua 
aspiração a deflagrar, apoiar e aperfeiçoar os processos auto-analíticos e autogestivos dos coletivos 
sociais. 
Essa vocação libertária, o estatuto epistemológico e jurídico absolutamente singular e a 
infinita variedade de tendências que compõem o Movimento tornam extremamente difícil a tarefa 
de ensiná-lo. Se se deseja ser coerente com os valores do Movimento, sua Pedagogia exige uma 
originalidade da qual já existem muitas tentativas, mas que, ao mesmo tempo, ainda está para ser 
produzida. 
11▲
Este curso, proferido com uma metodologia tradicional, tem apenas o propósito de 
aproximar os leitores das finalidades e recursos mais conhecidos e do panorama atual do 
Institucionalismo. Mais informativo que formativo, foi inspirado pelo desejo de estender e facilitar 
um saber e um fazer complexo e arriscado, mas, no meu entender, importantíssimo para o povo 
brasileiro. 
Apesar da superficialidade e rapidez com que os densos temas são apresentados, acredito 
que este livro seja estimulante, discretamente esclarecedor e ainda minimamente instrumental para 
os futuros institucionalistas. Para quem decidir continuar, ou, sejamos realistas, começar 
verdadeiramente sua formação nesta fascinante proposta, a bibliografia final, integrada predo-
minantemente por textos em português e castelhano encontráveis no Brasil, proverá boa parte da 
diretriz indispensável para tal fim. 
Entre as escolas não-incluídas neste volume devido à sua proposta introdutória, devo 
destacar as correntes latino-americanas de Pichón-Riéver, Bleger, Ulloa, Malfe, Bauleo, Kaminsky, 
Pavlovsky, De Brasi, Matrajt, Scherzer e tantos outros aos quais me proponho a destinar, em algum 
momento, um livro especial. 
12 ▲
Capítulo I 
O MOVIMENTO INSTITUINTE, A AUTO-ANÁLISE E A AUTOGESTÃO 
No início devemos esclarecer que esse livro não terá o nível que alguns esperariam, pois se 
procura apresentar uma exposição de nível médio, para ser entendida pelo maior número possível 
de pessoas. 
Vamos tratar do chamado Movimento Institucionalista ou Instituinte que, como o nome 
aproximativamente indica, é um conjunto de escolas, um leque de tendências. Não existe nenhuma 
escola ou tendência que possa dizer que encarna plenamente o ideário do Movimento Instituinte. 
Contudo, pode-se encontrar em diversas dessas escolas algumas características em comum. E é a 
essas características em comum que eu gostaria de referir-me agora, da maneira mais simples e mais 
didática possível. Em capítulos sucessivos, teremos ocasião de complicar as coisas... Agora, a 
intenção é, predominantemente, simplificá-las. 
Entre as características presentes em todas as tendências do Movimento Instituinte, há 
algumas que são relativamente fáceis de se colocar. Eu diria que existe o que se chama de "ideais 
máximos" do Movimento. Podemos chamar a isto também de 
1 3 ▲
propósitos mais importantes, os objetivos mais ambiciosos dessas escolas. Os mesmos podem 
ser enunciados através de duas palavras aparentemente simples, mas que são, como veremos 
depois, muito complexas. 
As diferentes escolas do Movimento Instituinte se propõem a propiciar, apoiar e 
deflagrar nas comunidades, nos coletivos e conjuntos de pessoas processos de auto-análise e 
de autogestão. O que significam essas palavras? 
Depois, compreenderemos com mais detalhes que os processos de interação humana, 
os processos de funcionamento social, têm sido sempre muito complexos. Mas em nossa 
civilização chamada industrial, capitalista ou tecnológica, a complexidade da vida social 
atingiu seu máximo expoente em toda a história da humanidade. Se compararmos, por 
exemplo, uma organização social dita "primitiva", ou uma organização imperial, despótica, ou 
uma medieval com a nossa sociedade moderna, o grau de complexidade, de diversidade que as 
sociedades modernas atingem é infinitamente superior ao daquelas civilizações, apesar delas 
não serem nada simples. Acontece, então, que nossa época, nossa civilização, além de se 
caracterizar por uma grande diversidade, uma grande complicação interna, caracteriza-se 
também por, de fato, ter produzido uma soma de saberes que propiciou, nesses últimos 
duzentos anos, uma "evolução" maior do que a humanidade havia conseguido em dois mil 
anos; ou seja, houve um processo de produção de conhecimento e de aplicação do mesmo 
muito intenso. 
Esse saber, como ninguém ignora, resultou em aplicações tecnológicas que aceleraram 
o chamado "progresso" em igual proporção. E o progresso trouxe uma grande complexidade. 
Além desses conhecimentos produzidos pelas ciências da natureza, ciências formais, 
aplicações tecnológicas, existem disciplinas que versamsobre a organização social em si 
mesma. Ou seja, nossa civilização tem produzido um saber acerca de seu próprio 
funcionamento como objeto de estudo e tem gerado profissionais, intelectuais, experts que são 
os conhecedores dessa estrutura e do processo dessa sociedade em si. Esses conhecedores têm-
se colocado, em geral, a serviço das entidades e das forças que são dominantes em nossa 
sociedade. Por exemplo, a serviço daquela instituição que representa o máximo 
14 ▲
da concentração de poder, o extremo de concentração de controle e de hegemonia sobre a 
sociedade, que é o Estado. Além disso, por outro lado, já dentro da sociedade civil, esses 
experts têm-se colocado a serviço das grandes entidades proprietárias da riqueza, do poder, do 
saber e do prestígio, que são as organizações corporativas, as empresas nacionais e 
multinacionais etc. Essa situação, em que os "sábios", os conhecedores da estrutura e do 
processo da vida social estão predominantemente a serviço do Estado e das empresas, tem tido 
como conseqüência que os povos – em sentido amplo, a sociedade civil – têm-se visto 
despossuídos de um saber que tinham acumulado através de muitos anos acerca de sua própria 
vida, de seu próprio funcionamento. Esse saber, criado e acumulado pelas comunidades 
sociais durante tantos anos de experiência vital, a partir do surgimento do saber científico e 
tecnológico, fica relegado, colocado em segundo plano, como se fosse rudimentar e 
inadequado. Tanto é assim que temos técnicos que costumam chamá-lo de ideologia, num 
sentido vago, geral, visando a qualificá-lo como um falso conhecimento, pobre, infundado ou, 
no melhor dos casos, insuficiente. Então, as comunidades de cidadãos têm visto esse saber 
subordinado ao saber dos experts. Junto com seu saber, elas têm perdido o controle sobre suas 
próprias condições de vida, ficando alheias à espacidade de gerenciar sua própria existência. 
Elas dependem, então, quase incondicionalmente, dos organismos do Estado, empresariais, do 
saber e de serviços dos experts . E a quais experts refiro-me? Aos dos ramos produtivos, 
primários, secundários e terciários, aos especialistas de produção de bens materiais, ou seja, 
comida, vestuário, moradia, transporte: aqueles bens materiais indispensáveis à sobrevivência. 
Toda a produção desses bens está dirigida, gerenciada por "especialistas". Mas noutro plano, 
refiro-me aos problemas de saúde, de educação, aos assuntos familiares, aos psicológicos e 
subjetivos, em geral; às questões relativas ao lazer, às que atingem a comunicação de massa, 
aos assuntos próprios da religião. Cada um desses campos, cada um dos serviços que se 
prestam nessas áreas, os bens que se produzem e administram nesses territórios, ou seja, sua 
quantidade, sua qualidade, sua necessidade, sua conveniência, tudo é decidido pelos experts , é 
arbitrado por quem se supõe que saiba e conheça sobre o assunto. O mesmo acontece no plano 
de administração da justiça, nos tribunais, com os 
15 ▲
advogados, despachantes, registros civis, leis: tudo i sso feito por experts e administrado por 
eles. E o que falar do exercício da força, no sentido literal, porque todas essas outras 
entidades também usam da força, senão da força física, da força da persuasão, da força da 
sedução, mas o uso da força física está reservado a organizações como a polícia, as forças 
armadas, que também têm seus especialistas, oficiais, delegados, guardas etc. É claro que os 
experts conhecem e decidem prevalentemente segundo os interesses das classes, níveis 
hierárquicos e grupos dominantes aos quais pertencem parcialmente. Mas não se deve 
sempre supor uma intenção deliberada dos técnicos nesse sentido. Acontece, como veremos, 
que seu saber em si mesmo já está produzido por instrumentos e gera resultados que 
privilegiam os interesses e desejos citados. 
Então, o que acontece? 
Há um conceito básico que vamos ver depois, na Análise Institucional e em outras 
escolas do Institucionalismo, que se chama demanda. É possível afirmar que as comunidades 
ou coletividades têm necessidades básicas indiscutíveis e universais. Essas necessidades são 
colocadas diariamente através de demandas espontâneas, através da exigência de produtos e 
de serviços correspondentes. Essa idéia é uma das tantas que vai ser questionada pelo 
Institucionalismo, porque ele vai tentar mostrar que em todas as épocas da história, mas 
particularmente na nossa, não existem necessidades básicas "naturais"; não existem 
demandas "espontâneas", pois em todas e em cada uma dessas organizações que acabamos 
de descrever, a noção das necessidades é produzida, assim como a demanda é modulada; 
isto é, aquilo que os povos pensam que todos os membros de uma população e todos os 
povos do mundo precisam como "mínimo" não existe. Esse "mínimo" é gerado em cada 
sociedade e é diferente para cada segmento da mesma. Mas ainda dentro do 
condicionamento histórico, as comunidades que têm alguma noção vivencial acerca de suas 
necessidades a perdem, de modo que já não sabem mais do que precisam e não demandam o 
que "realmente" aspiram, mas acham que necessitam daquilo que os experts dizem que elas 
necessitam e acham que pedem o que querem e como querem, mas, na verdade, precisam, 
querem e pedem o que lhes inculcam que devem necessitar, desejar e solicitar. É, então, 
muito evidente que nossos coletivos estão, 
16 ▲
atualmente, nas mãos de um enorme exército de experts que acumulam o saber que lhes 
permite fazer com o que as pessoas achem que precisam e solicitem aquilo que os experts 
dizem que precisam e que os grupos e as classes dominantes lhes concedem. Então, os 
coletivos têm perdido, têm alienado o saber acerca de sua própria vida, a noção de suas reais 
necessidades, de seus desejos, de suas demandas, de suas limitações e das causas que 
determinam essas necessidades e essas limitações. Eles têm perdido um certo grau de 
compreensão e o controle sobre que tipos de recursos e formas de organização devem dispor 
para colocar e resolver seus problemas. Mal podem organizar-se para resolver seus 
problemas se não conseguem saber, com precisão, quais são seus verdadeiros problemas e o 
que se requer para resolvê-los. 
Falei que poderíamos enunciar dois objetivos básicos do Institucionalismo, um deles 
seria a auto-análise e o outro a autogestão. Agora já podemos explicar um pouco melhor em 
que consistiria o primeiro deles. A auto-análise consiste em que as comunidades mesmas, 
como protagonistas de seus problemas, necessidades, interesses, desejos e demandas, 
possam enunciar, compreender, adquirir ou readquirir um pensamento e um vocabulário 
próprio que lhes permita saber acerca de sua vida, ou seja: não se trata de que alguém venha 
de fora ou de cima para dizer-lhes quem são, o que podem, o que sabem, o que devem pedir 
e o que podem ou não conseguir. Este processo de auto-análise das comunidades é 
simultâneo ao processo de auto-organização, em que a comunidade se articula, se 
institucionaliza, se organiza para construir os dispositivos necessários para produzir, ela 
mesma, ou para conseguir os recursos de que precisa para a manutenção e o melhoramento 
de sua vida sobre a terra. Na medida em que essa organização é conseqüência e, ao mesmo 
tempo, um movimento paralelo com a compreensão dada pela auto-análise, ela também não 
é feita de cima para baixo, nem de fora, mas elaborada no próprio seio heterogêneo do 
coletivo interessado. Essa auto-análise e essa autogestão não significam necessariamente que 
os coletivos devam prescindir por completo dos experts porque, sem dúvida, com sua 
disciplina e seus instrumentos, eles têm acumulada uma quantidade de conhecimentoimportante e não inteiramente alienado, não necessariamente distorcido, ou seja: produtivo. 
Mas os experts 
17 ▲
devem submeter seu saber, suas glórias, seus métodos, suas técnicas, suas inserções sociais 
como profissionais a uma profunda crítica que os faça separar, dentr o dessas teorias, métodos e 
técnicas, dentro dos organismos aos quais pertencem, o que é produto de sua origem, de sua 
pertença ao bloco dominante das forças sociais e o que pode ser útil a uma auto-análise, a uma 
auto gestão, da qual os segmentos dominados e explorados sejam protagonistas. Para poderem 
efetuar essa autocrítica, os experts não podem fazê-lo no seio de suas torres de marfim, não 
podem fazê-lo nas academias ou exclusivamente nos laboratórios experimentais. Eles têm que 
entrar em contato direto com esses coletivos que estão se auto-analisando e autogestionando 
para incorporar-se a essas comunidades desde um estatuto diferente daquele que tinham. Esse 
estatuto deve resultar de uma crítica das posições, postos, hierarquias que eles têm dentro dos 
aparelhos acadêmicos ou jurídico-políticos do Estado, ou ainda das diretivas das grandes 
empresas nacionais e multinacionais. Eles têm de reformular sua condição profissional, seu 
saber específico. E só conseguirão reformulá-los numa gestão, num trabalho feito em conjunto 
com essas comunidades e na mesma relação de horizontalidade com que qualquer membro 
dessa comunidade o faz. Isso permitirá que, eventualmente, os experts, quando a comunidade 
conseguir organizar-se, tenham algum lugar dentro das organizações específicas que a 
comunidade se deu a si mesma para esses fins. Então seu saber, sua capacidade e sua potência 
produtiva estarão plenamente integrados ao movimento de auto-análise e auto gestão dessa 
comunidade. Eles poderão assim reformular, aprendendo e ensinando seu saber e sua eficiência 
nessa nova e inédita situação. À parte dessa reinvenção de sua disciplina, os experts poderão 
aprender como eles serão capazes de propiciar outros movimentos autogestivos e auto-
analíticos quando forem chamados a participar. 
Esta é uma explicação sucinta dos propósitos fundamentais do Movimento 
Institucionalista que são sistematicamente compartilhados por todas as tendências que o 
integram. Ao mesmo tempo em que são os objetivos principais das propostas instituintes, eles 
são também os próprios meios para realizá-las. Por isso, é importante que esses dois objetivos e 
meios sejam não apenas superficial, mas profundamente conhecidos pelos leitores. 
1 8 ▲
É óbvio que autogestão e auto-análise são dois processos simultâneos e articulados. Por 
quê? Porque auto-análise, para as comunidades, significa a produção de um saber, do 
conhecimento acerca de seus problemas, de suas condições de vida, suas necessidades, 
demandas etc., e também de seus recursos. Mas até para que a auto-análise seja praticada pelas 
comunidades, elas têm que construir um dispositivo no seio do qual essa produção seja 
realizável. Elas têm que organizar-se em grupos de discussão, em assembléias; elas têm que 
chamar experts aliados para colaborarem; elas têm que se dar condições para produzir esse 
saber e para desmistificar o saber dominante. Ao mesmo tempo, tudo o que elas descobrirem 
neste processo de auto-conhecimento só terá uma finalidade: a de auto-organizar-se para que 
possam operar as forças destinadas a transformar suas condições de existência, a resolver seus 
problemas. Mas não pode haver uma organização sem um saber; não pode haver um saber sem 
uma organização. São dois processos diferenciados, mas eles são concomitantes, simultâneos, 
articulados. 
Costuma-se crer que os processos autogestivos implicam uma falta completa de 
denominações, hierarquias, quadros, especificidades etc. Na realidade, é difícil pensar qualquer 
processo organizativo que não inclua uma certa divisão do trabalho e que não implique uma 
certa hierarquia de decisão, de deliberação. Esses são funcionamentos inerentes a qualquer 
processo produtivo. Deverão, então, existir hierarquias, gerências. Mas a existência de 
hierarquia não implica diferença de poder; não equivale a privilégio ou arbitrariedade na 
capacidade de decidir. Implica apenas uma certa especialização em algumas tarefas, porque 
estes dispositivos estão feitos de tal maneira que as decisões de fundo são tomadas 
coletivamente. Em todo caso, os quadros hierárquicos não são mais que expressão da vontade 
consensual. São executores. Mas não são executores do mandato das elites mediatizado por 
organismos burocráticos, por correias de transmissão. Na autogestão os coletivos mesmos 
deliberam e decidem. Eles têm maneiras diretas de comunicar as decisões. Existem hierarquias 
moduladas pela potência, peculiaridades e capacidade de produzir; mas não há hierarquias de 
poder, ou seja, a capacidade de impor a vontade de um sobre o outro. 
Contudo, é evidente que o Institucionalismo, tanto quanto os processos auto-analíticos, 
são produtores de conhecimentos, 
1 9 ▲
e que todo saber envolve, necessariamente, um poder, e ambos não são homogeneamente 
distribuídos. Mas este saber é um saber coletivo, produzido, distribuído e exercitado na vida 
coletiva. Na topografia deste saber, existem alguns elementos essenciais que são 
compartilhados por todo mundo. Então, quando esse saber compartilhado é delegado a 
alguns que se especializam nessa questão, já não é um saber produzido fora dos interesses e 
desejos do coletivo, já não é um saber que vai cair de cima para baixo, de fora para dentro. É 
já uma delegação, porque foi produzido dentro, por alguns especialistas no assunto, em 
estreita colaboração com os diretamente interessados nos benefícios que esse saber e suas 
aplicações terão, uma vez realizados. 
Isso garante que esses especialistas são verdadeiramente "especiais": delega-se a eles 
um saber que é a expressão dos interesses e das capacidades essenciais do coletivo. O 
coletivo conserva um saber básico acerca de seu campo que lhe permite julgar quando o 
especialista está exercitando o seu poder com sentido instituinte-organizante, e então a 
serviço do coletivo, ou, pelo contrário, de ambições de segmentos individualistas etc. Vou 
dar um típico exemplo da medicina, embora haja mil exemplos, muitos dos quais não 
poderemos mencionar aqui porque são muito complexos e extensos para expor. Quem 
conhece a situação da saúde no Brasil sabe perfeitamente que nosso país não precisa 
prioritariamente de, digamos, tomógrafos computadorizados, pelo menos a nível de sua 
problemática prevalente atual. O que o Brasil precisa é de uma política de saúde que não 
começa nem acaba no campo da medicina. Seus problemas, que têm efeitos médicos, têm 
suas causas diretas nos problemas de habitação, alimentação, vestuário e saneamento básico. 
Disso todos os experts sabem, o que não impede que a ênfase da política de saúde no Brasil 
esteja colocada na assistência e não na prevenção, principalmente se por prevenção entende -
se algo que modifique radicalmente as condições de vida da população. Entretanto, há 
muitos centros paulistas e cariocas que se orgulham de ter os mais modernos aparelhos para 
resolver ou diagnosticar uma problemática altamente específica, circunscrita, que afeta 0,5% 
da população. Acontece que o povo, as organizações de base, não podem questionar de 
maneira eficiente as políticas médicas do Brasil porque a primeira coisa 
20 ▲
que lhes seria respondida é que não sabem. Mas o que acontece quando o coletivo revitaliza 
seu saber, revaloriza o saber espontâneo que ele tem acerca do que preci sa? Os índios têm, 
as comunidades negras têm, as comunidades das montanhas têm, as comunidadesda 
planície têm, todo mundo tem um saber espontâneo acerca de quais são os sofrimentos, 
quais são as enfermidades e como devem ser tratadas, pelo menos, basicamente. Assim, 
também eles sabem quais problemas devem ser abordados – mesmo que não se exprimam 
em sofrimento, ou quando o sofrimento ainda não tenha se tornado doença, não devendo ser 
tratado como tal. Desde logo este saber também desconhece muita coisa, mas isso não pode 
afirmar-se a priori. Só que esse saber é permanentemente desqualificado pelo saber 
acadêmico, que atua predominantemente a serviço de interesses estatais, nacionais e 
multinacionais dominantes – um saber consubstancial com esses interesses. 
A primeira operação que as comunidades devem fazer é recuperar, revalorizar o saber 
espontâneo que elas têm sobre seus problemas; a segunda operação deve ser feita em 
conjunto com os experts, ajudando-os a criticar essa orientação – essa medula dominante 
reacionária-que o saber médico (nesse caso) e suas técnicas têm. Sobretudo em termos de 
hierarquização de prioridades: o que vem primeiro e o que vem depois, o que é prioritário e 
o que é secundário. Uma vez que o expert , integrado à comunidade, demonstra a capacidade 
de contribuir, em pé de igualdade, para este trabalho de reformulação, pode-se delegar a ele 
algumas áreas do saber com menos perigo de que ele o transforme em poder, e não numa 
potência de colaboração com o coletivo. Nesse caso, o coletivo já não está desqualificado – 
ele sabe julgar o que se faz e o que se acha que se sabe. Isso não descarta que possam 
acontecer novamente problemas de concentração de saber e de poder, porque este processo 
de auto-conhecimento e autogestão é interminável. Provavelmente, haverá necessidade de 
muitas gerações autogestivas e auto-analíticas para que o processo possa exercitar-se em sua 
plenitude. Se bem que este caminhar está orientado por uma Utopia Ativa que não está 
colocada num futuro longínquo, senão em cada ato do cotidiano. Como já dissemos, 
existiram e existem numerosas tentativas auto-analíticas e autogestivas que não apresentam 
o caráter purista que a gente pode imaginar em sentido abstrato. Por exemplo, as 
comunidades 
21 ▲
eclesiásticas de base: pode-se dizer que têm um espírito institucionalista complexamente 
integrado a aspectos libertários do Cristianismo, embora limitados pelos processos 
burocráticos da Igreja Católica. Isso abre um tema que eu teria gostado de tratar neste 
primeiro capítulo, mas acho que vai complicar um pouco as coisas, porque eu queria 
enfatizar os conceitos essenciais básicos. Mas, enfim, em que consiste o tema aqui 
levantado? O Movimento Institucionalista reconhece uma gênese histórico -social e uma 
gênese conceitual. A primeira é a história de todas as tentativas que houve na história da 
humanidade e as que hoje existem e exercitam um Institucionalismo espontâneo. Um desses 
movimentos é o das comunidades eclesiásticas de base no Brasil e em outros países. Mas 
muitas iniciativas autogestivas já existiram, existem e vão existir, e não precisam do 
Institucionalismo para se desenvolverem. O Institucionalismo é alguma coisa assim como o 
resultado do ensinamento dessas iniciativas históricas sobre os próprios experts. Nós, os 
experts – médicos, engenheiros, advogados, comunicólogos, psicólogos etc –, temos 
aprendido que isso existe e que poderíamos colaborar para seu desenvolvimento a partir das 
experiências históricas que já existiram neste sentido e das que estão existindo e se 
desenvolvem perfeitamente ou dificilmente sem a nossa participação. Por outro lado, a 
gênese conceitual refere-se ao campo das idéias, conceitos e funções: todas aquelas teorias, 
conceitos, idéias, categorias que têm sido produzidas pela humanidade no decorrer da 
história do conhecimento e podem contribuir para dar base, para fundamentar a proposta 
institucionalista. 
Agora, gostaria de referir-me à última questão, muito importante. Os leitores 
compreenderão que esses processos auto -analíticos e autogestivos se dão em condições 
altamente desfavoráveis, severamente contraproducentes. Por quê? Naturalmente porque os 
coletivos em questão não são donos do saber, não são donos da riqueza, não são donos dos 
recursos que são propriedade e servem ao poder dos organismos e entidades de classe alta e 
grupos dominantes. Então, a consecução dos objetivos tem graves impedimentos que vão 
desde a privação de recursos (que são propriedade a serviço do poder dos organismos e 
entidades de classe dominante) até a morte física repressiva. Esses processos autogestivos e 
auto-analíticos são, para a 
22 ▲
organização do sistema, um câncer, uma peste. Não há nada que seja mais temido e mais 
odiado pelo sistema social, porque os movimentos instituintes têm esse intuito: que os 
coletivos presidam a definição de problemas, a invenção de soluções, a colocaçã o dos 
limites do que é possível, do que é impossível e do que é virtual, o que normalmente é feito 
pelas instituições, organizações e saberes de grupos e outros segmentos dominantes. Por isso 
a autogestão não é tarefa fácil: a prova está em que as iniciativas auto-analíticas e 
autogestivas não se caracterizam por seu sucesso. Elas têm aparecido muitas vezes na 
história e muitas vezes têm sido destruídas ou sufocadas. E as que hoje insistem em existir 
lutam duramente contra um conjunto de imensas forças históricas que tentam destruí-las. E 
quando não conseguem eliminá-las, tentam recuperá-las, incorporá-las. Isso faz com que os 
objetivos últimos do Institucionalismo – a auto-análise e a autogestão – não sejam atingidos 
nunca de forma definitiva. Eles são atingidos sempre na base da tentativa, do ensaio, da 
procura. Em geral têm maiores ou menores graus de fracasso. Mas isso não quer dizer que 
não sejam possíveis ou inventáveis. Então, esta última afirmação que faço refere-se ao 
seguinte: as diferentes escolas do Institucionalismo se distinguem entre si pelas teorias, 
pelos métodos, pelas técnicas com que elas tentam introduzir estes objetivos últimos, e pelo 
grau de realização com o qual se conformam. Quer dizer: há correntes, escolas" 
maximalistas", que buscam a instalação plena da autogestão e da auto-análise. Há outras que 
se satisfazem com a introdução relativa de alguns mecanismos, de alguns espaços, de alguns 
temas de auto-análise e autogestão. Ou seja, no Institucionalismo, como na política, existem 
correntes reformistas e existem correntes ultra-revolucionárias. De qualquer maneira, nada 
disso impede que as agrupemos em torno desses dois objetivos e recursos. Eles as 
diferenciam claramente da enorme maioria das propostas políticas, tanto das extremistas 
quanto das propostas social-democráticas. Provavelmente a tendência política tradicional 
que mais se aproxima das propostas institucionalistas, e com a qual o Institucionalismo está 
mais que em dívida, seja a de certas orientações do anarquismo. 
2 3 ▲
PERGUNTAS REFERENTES AO CAPÍTULO I 
1) Por que o Institucionalismo é um movimento e não uma ciência, uma disciplina ou uma 
tecnologia? 
2) O que aconteceu com o saber e o saber-fazer que as comunidades primitivas ou os povos 
e grupos leigos em geral produziram e acumularam durante sua experiência de vida? 
3) O que significa" divisão social e técnica do trabalho e do saber", e por que se diz que as 
ciências, as disciplinas e seus experts estão em geral a serviço das classes e grupos 
dominantes? 
4) Existem "necessidades mínimas naturais" cuja satisfação é demandada pelas populações, 
ou é a oferta de bens e serviços que produz certas necessidades e desejos (e não outros) e 
modula as demandas? 
5) O que significaauto-análise e autogestão? 
24 ▲
Capítulo II 
SOCIEDADES E INSTITUIÇÕES 
O Institucionalismo, à sua maneira, tem uma concepção própria do que é a Sociedade 
e do que é a História, a Sociedade como forma organizada de associação humana e a 
História como o devir da Sociedade no tempo. O Institucionalismo, sem considerar no 
momento as diferenças doutrinárias de escola para escola, afirma que a sociedade é uma 
rede, um tecido de instituições. E que são as instituições? 
As instituições são lógicas, são árvores de composições lógicas que, segundo a forma 
e o grau de formalização que adotem, podem ser leis, podem ser normas e, quando não estão 
enunciadas de maneira manifesta, podem ser hábitos ou regularidades de comportamentos. 
Alguns autores sustentam que leis, normas e costumes são objetificações de valores. As leis, 
em geral, estão escritas; as normas e os códigos também. Mas uma instituição não necessita 
de tal formalização por escrito: as sociedades ágrafas também têm códigos, só que eles são 
transmitidos verbal ou praticamente, não figurando em nenhum documento. 
O que essas lógicas significam? Significam a regulação de uma atividade humana, 
caracterizam uma atividade humana e se pronunciam valorativamente com respeito a ela, 
esclarecendo 
2 5 ▲
o que deve ser, o que está prescrito, e o que não deve ser, isto é, o que está proscrito, assim corno o 
que é indiferente. Essas lógicas, esses corpos discriminativos, são vários, e é curioso que os 
institucionalistas têm dificuldades para chegar a um acordo acerca de quais e quantos são. 
Vamos examinar algumas ilustrações mais ou menos indiscutíveis. Um exemplo de urna instituição: 
a instituição da' linguagem. Ela caberia nesta definição que formatamos quando a pensamos em 
termos gramaticais. A gramática não é nada mais que um conjunto de leis, de normas que regem a 
combinatória de elementos fônicos, de unidades de significação na linguagem. Com a combinação 
desses elementos, conforme indicado por essas leis, pode construir-se um infinito número de 
mensagens, de tal modo que estas mensagens são compreensíveis para qualquer falante ou ouvinte 
dessa língua. Então, corno se pode ver, no final das contas, urna gramática é urna instituição que 
explicita as opções de acordo com as quais se vão produzir mensagens, consideradas gramaticais ou 
agramaticais, os prescritos ou os proscritos. É claro que, no caso da língua, não estarão estipulados 
também os prêmios e os castigos para quem usa de forma correta ou incorreta a língua, que é o que 
acontece em outros tipos de instituição. Mas o preço de seu desconhecimento ou transgressão é 
óbvio: a incomunicabilidade dentro do universo humano, pelo menos dentro desse universo humano 
em particular. 
Outro exemplo são as instituições de regulamentação do parentesco, as que definem os lugares tais 
corno: pai, mãe, filho, nora, genro etc. Elas são as que prescrevem entre quais membros dessa 
classificação podem se dar uniões, entre quais membros não podem se dar uniões e que tipo, que 
característica de vínculo. de descendência e aliança relaciona cada uma destas posições com a outra. 
Isso também é um código que, formalizado ou não, regula a relação de parentesco e tem prescrições 
– o que é indicado; e também proscrições – o que é proibido; assim como o que é indiferente ou não 
abrangido por essa lógica. Outra instituição pouco discutível entre os institucionalistas é a da 
divisão do trabalho humano. O trabalho humano está dividido segundo os momentos e as 
especificidades de cada tipo de produção e tarefa (divisão técnica). Mas, por outro lado, essa divisão 
vem acompanhada de urna hierarquia que institui diferenças de poder, 
26 ▲
prestígio e lucro – não necessariamente justificadas pela importância produtiva daqueles que detêm 
esses lugares (divisão social). Por exemplo: trabalho manual e intelectual, do campo e da cidade, 
assalariados e autônomos, feminino e masculino etc. 
Há também as instituições da educação, isto é, aquelas leis, normas e pautas que prescrevem 
corno se deve socializar, instruir um aspirante a membro de nossa comunidade para que ele possa 
integrar-se à mesma com suas características efetivas. 
Ternos também a instituição da religião, que é a que regula as relações do homem com a 
divindade, divindade sobrenatural para uns ou imanente à vida terrena para outros, mas com 
respeito à qual existe toda urna série de comportamentos indicados e toda urna série de 
comportamentos contra-indicados. 
Ternos também as instituições de justiça, as instituições da administração da força, e assim 
por diante. Em um plano formal, urna sociedade não é mais que isso: um tecido de instituições que 
se interpenetram e se articulam entre si para regular a produção e a reprodução da vida humana 
sobre a terra e a relação entre os homens. Agora, entendidas assim, as instituições são entidades 
abstratas, por mais que possam estar registra das em escritos ou conservadas em tradições. 
Para vigorar, para cumprir sua função de regulação da vida humana, as instituições têm de 
realizar-se, têm de "materializar-se". E em que elas se materializam? Em dispositivos concretos que 
são as organizações. As organizações, então, são formas materiais muito variadas que 
compreendem desde um grande complexo organizacional tal como um ministério Ministério da 
Educação, Ministério da Justiça, Ministério da Fazenda etc. – até um pequeno estabelecimento. Ou 
seja, as organizações são grandes ou pequenos conjuntos de formas materiais que concretizam as 
opções que as instituições distribuem e enunciam. Isto é, as instituições não teriam vida, não teriam 
realidade social senão através das organizações. Mas as organizações não teriam sentido, não teriam 
objetivo, não teriam direção se não estivessem informadas como estão, pelas instituições. 
Por sua vez, urna organização (que, como insisti, costuma ser um complexo grande, vultoso) 
está composta de unidades menores. Estas são de naturezas muito diversas e é difícil enunciá-las 
todas. Mas, pelo menos, há algumas que são muito 
27 ▲
características, como, por exemplo, os estabelecimentos. Estabelecimentos seriam as escolas, 
um convento, uma fábrica, uma loja, um banco, um quartel. Há diversos tipos de 
estabelecimentos, de características muito diferentes. Mas é um conjunto de estabelecimentos 
o que integra uma organização. 
Os estabelecimentos, em geral, incluem dispositivos técnicos cujos exemplos mais 
básicos são a maquinaria, as instalações, arquivos, aparelhos. Isso recebe o nome de 
equipamento. O equipamento pode ter uma realidade material que coincide com o 
estabelecimento, ou seja, as máquinas de um estabelecimento – ou pode ter uma realidade 
muito mais ampla, de maneira que forme um grande sistema de máquinas, um grande 
equipamento. Isso é o que acontece, suponhamos, com os equipamentos das organizações da 
comunicação de massa, que, por sua vez, são organizações que realizam as prescrições de 
uma grande instituição que é a instituição da Comunicação Social. 
Instituição – Organização – Estabelecimento – Equipamento. Tudo isso, naturalmente, só 
adquire dinamismo através dos agentes. Nada disso se mobiliza, nada disso pode operar senão 
através dos agentes. Os agentes são "seres humanos", são os suportes e os protagonistas de 
toda essa parafernália. E os agentes protagonizam práticas. Práticas que podem ser verbais, 
não-verbais, discursivas ou não, práticas teóricas, práticas técnicas, práticas cotidianas ou 
inespecíficas. Mas é nas ações que toda essa parafernália acaba por operar transformações na 
realidade. Então, estas unidades (instituição – organização – estabelecimento – equipamento 
– agente – práticas) não podem ser confundidas.Mas, infelizmente, com freqüência isso 
ocorre. E não são confundidas apenas pelos leigos, mas também pelos institucionalistas. 
Então, quando se estuda uma escola institucionalista, esta escola pode chamar de instituição 
às organizações; de organização a um estabelecimento. Isso não é nada recomendável porque 
a primeira coisa a se fazer para se entender este complexo panorama é criar uma 
nomenclatura mais ou menos universal e compartilhada. A que proponho aqui é a que grande 
parte dos institucionalistas aceita. 
Isso não é apenas o exercício de um desafio, mas algo importante. Se começamos a 
dizer, por exemplo, que essa escola é uma instituição, o assunto se complica, pois essa escola 
não é 
28 ▲
uma instituição, e sim um estabelecimento que faz parte de urna grande organização – 
provavelmente do Ministério da Educação, que, por sua vez, realiza uma grande instituição: a 
instituição da Educação, que é uma lógica, uma série de prescrições ou leis. 
Em uma instituição podem-se distinguir duas vertentes importantes. Uma é a vertente 
do instituinte, e outra a do instituído. Apesar de as origens das instituições serem muito 
difíceis de se determinar – ou seja, fazer a história de uma instituição, particularmente a de 
seu começo, é urna tarefa às vezes impossível, corno se costuma dizer, "perde-se no começo 
dos tempos". Inclusive há muitas instituições, como a instituição da língua, das relações de 
parentesco, da religião e da divisão do trabalho, das quais não se pode dizer qual veio 
primeiro e qual veio depois. Mas podemos afirmar que para uma sociedade humana existir é 
preciso haver no mínimo essas quatro instituições humanas, ou seja, humanidade é sinônimo 
de coletivo regido por essas instituições, e essas instituições são sinônimo de existência de 
um coletivo humano. Então, é difícil saber como eram os coletivos antes que aparecessem 
essas instituições. É o mesmo que perguntar como era o homem antes de ser homem, pelo 
menos como o entendemos. Então, situar a origem dessas instituições é muito difícil. Só se 
pode dizer que uma instituição supõe outra, precisa da outra, e o seu conjunto é o que 
constitui uma civilização ou uma sociedade humana. Agora, se freqüentemente não se pode 
dizer como essas grandes instituições começaram, sem dúvida se pode distinguir nelas uma 
potência, um movimento de transformação constante que tende a modificar, a operar 
mutações nas suas características. Em poucas ocasiões privilegiadas pode-se assistir 
historicamente ao nascimento de uma grande instituição. Mas, em geral, não é isso o que 
acontece. O que se pode presenciar são grandes momentos históricos de revolução de uma 
instituição, de profundas transformações de urna instituição. Então, a esses momentos de 
transformação institucional, a essas forças que tendem a transformar as instituições ou 
também a estas forças que tendem a fundá-las (quando ainda não existem), a isso se chama o 
instituinte, forças instituintes. São as forças produtivas de lógicas institucionais. 
Este grande momento inicial do processo constante de produção, de criação de 
instituições, tem um produto, geram 
29 ▲
um resultado, e este é o instituído. O instituído é o efeito da atividade instituinte. Se vocês 
prestarem atenção a esses nomes, eles mesmos já estão dizendo alguma coisa com relação à 
diferença entre o instituinte e o instituído. O instituinte aparece como um processo, enquanto 
o instituído aparece como um resultado. O instituinte transmite uma característica dinâmica; o 
instituído transmite uma característica estática, estabilizada. Então, é evidente que o instituído 
cumpre um papel histórico importante, porque as leis criadas, as normas constituídas ou os 
hábitos, os padrões, vigoram para regular as atividades sociais, essenciais à vida da 
sociedade. Mas acontece que essa vida é um processo essencialmente cambiante, mutante; 
então, para que os instituídos sejam funcionais na vida social, eles têm de estar 
acompanhando a transformação da vida social mesma para produzir cada vez mais novos 
instituídos que sejam apropriados aos novos estados sociais. Tem-se que evitar uma leitura do 
tipo maniqueísta, que pensa que o instituinte é bom e o instituído é ruim, embora seja verdade 
que o instituído apresente, por natureza, uma tendência à resistência, uma disposição que se 
poderia chamar a persistir em seu ser, a não mudar, que quando se exacerba, se exagera, se 
conhece politicamente pelo nome de conservadorismo, reacionarismo. Pelo contrário, o 
instituinte aparece como atividade revolucionária, criativa, transformadora por excelência. Na 
realidade, não é exatamente assim, porque o instituinte careceria completamente de sentido se 
não se plasmasse, se não se materializasse nos instituídos. Por outro lado, os instituídos não 
seriam efetivos, não seriam funcionais, se não estivessem permanentemente abertos à 
potência instituinte. 
Por sua vez, o mesmo acontece a nível organizacional. Existe o organizante e o 
organizado. Há uma atividade permanentemente crítica e transformadora, otimizadora das 
organizações – o organizante. E há o organizado, que se pode ilustrar com o famoso 
organograma ou fluxograma, que é necessário, mas que tem uma tendência "natural" a 
cristalizar-se (entre aspas porque nada tem a ver com o natural), uma tendência histórica a 
esclerosar-se e a adotar uma série de vícios, entre os quais o mais conhecido é a burocracia, 
embora não seja o único. Então, é importante saber que a vida social – entendida como o 
processo em permanente transformação que deve tender ao aperfeiçoamento e visar a maior 
felicidade, maior realização, 
30 ▲
maior saúde e maior criatividade de todos os membros – só é possível quando ela é regulada 
por instituições e organizações e quando nessas instituições e organizações a relação e a 
dialética existentes entre o instituinte e o instituído, entre o organizante e o organizado 
(processo de institucionalização-organização) se mantêm permanentemente permeáveis, 
fluidas, elásticas. 
Outra maneira de referir-se a isso é dizer que nas instituições, organizações, 
estabelecimentos, agentes, práticas, pode-se distinguir uma função e um funcionamento. Para 
poder entender essa terminologia, tem-se que compreender que nas civilizações e nos 
conjuntos humanos, e na vida humana tomada num sentido muito amplo, há a tendência a 
adquirir sempre características históricas que comprometem este objetivo utópico ativo. Essas 
características históricas, muito diferentes de uma sociedade para outra, de uma fase histórica 
para outra, podem ser resumidas em três grandes situações viciosas conhecidas por todo 
mundo: são os processos de exploração, de dominação e de mistificação (desinformação ou 
engano). Essas são as deformações do percurso da vida social e de seus objetivos mais 
nobres, de suas finalidades mais altas, que cada sociedade coloca à sua maneira, e que são 
chamadas de utopias sociais: como uma sociedade tenta, deseja, deve chegar a ser. É claro 
que, à exceção de algumas sociedades em particular, desde que existem sociedades, as utopias 
sociais incluem diferentes formas de liberdade, diferentes formas de igualdade, diferentes 
formas de veracidade e fraternidade, apesar de eu estar usando, para referir -me a isso, a 
utopia da Revolução Francesa, chamada de revolução burguesa, que não é nem a única nem a 
melhor das utopias, mas é a mais conhecida por nós. Então, cada sociedade, em seus aspectos 
instituintes e organizantes, sempre tem uma utopia, uma orientação histórica de seus 
objetivos, que é desvirtuada ou comprometida por uma deformação que se resume em: 
exploração de algunshomens pelos outros (expropriação da potência e do resultado produtivo 
de uns por parte de outros); 
dominação, ou seja, imposição da vontade de uns sobre os outros e desrespeito à vontade 
coletiva, compartilhada, de consenso; e mistificação, ou seja, uma administração arbitrária ou 
deformada do que se considera saber e verdade histórica, que é substituída por diversas 
formas de mentira, engano, ilusão, sonegação de informação etc. Assim, se se compreende 
esta oposição entre a 
31 ▲
utopia, o aperfeiçoamento da vida social e suas deformações exploração, dominação, mistificação-, 
então se pode compreender mais facilmente uma divisão que se estabelece entre função e 
funcionamento. O dito não significa que as utopias sejam sempre inocentes e acabem traídas, mas 
em geral elas são mesmo traídas. 
As instituições, organizações, estabelecimentos, agentes e práticas desempenham uma 
função. Esta função está sempre a serviço das formas históricas de exploração, dominação e 
mistificação que se apresentam nesta sociedade. Toda instituição, toda organização, todo 
estabelecimento apresenta esta função a serviço dos exploradores, dos domina dores, dos 
mistificadores. Só que esta função raramente se apresenta como ela é, justamente por causa da 
questão da mistificação... A função apresenta-se deformada, disfarça da, mostra-se como o objetivo 
natural, desejado e lógico das instituições e das organizações. Isto é, não se manifesta claramente ao 
nível do instituído e do organizado. Ou seja, os instituídos e os organizados apresentam, 
predominantemente, freqüentemente, funções a serviço da exploração, da dominação, da 
mistificação. E as exprimem de tal maneira que as fazem parecer "naturais", desejáveis e eternas, ao 
passo que o instituinte e o organizante são sempre inspirados pela utopia, estão sempre a serviço 
dos objetivos que, provisoriamente, chamamos de Justiça, de Igualdade e Fraternidade. Podem ser 
chamados de outra maneira. Essas forças, esses processos, recebem o nome de funcionamento. 
Então, o funcionamento é sempre instituinte, é sempre transformador, é justiceiro e tende à utopia': 
A função, ela é predominantemente reacionária, conservadora, a serviço da exploração, da 
dominação e da mistificação, e se apresenta aos olhos não atentos como eterna, natural, desejável e 
invariável. 
Agora, pode-se definir outros termos que temos aqui presentes. O instituído, o organizado, 
enquanto produtivo, enquanto expressão apropriada, enquanto recurso operante o instituinte, é claro 
que é necessário. Acontece que, rapidamente, tendem a cair fora do seu sentido de funcionamento 
para adotar a característica da função, coisa que se compreenderá melhor quando se entender que a 
característica essencial do instituinte, do organizante e dos seus produtos operantes é serem 
propícios à produção, produção que é a geração do novo, daquilo que 
32 ▲
almeja a utopia; funcionamento e produção são a mesma coisa. Função é sinônimo de reprodução: é 
a tentativa de reiterar o mesmo, de perpetuar o que já existe, aquilo que não é operativo para 
propiciar as transformações sociais. Então: instituinte e instituído, organizante e organizado, 
produção contra reprodução, funcionamento contra função. 
Para concluir, exporemos definições que são um pouco áridas, abstratas, mas necessárias 
para entender os passos seguintes que vamos dar: digamos em que consiste, como entender, como 
analisar cada instituição, cada organização, e como intervir para favorecer a ação do instituinte e do 
organizante. Não se pode fazer este trabalho sem ter claras estas definições. Para concluir, os 
instituintes-instituídos, organizantes-organizados que constituem a malha, a rede social, não atuam 
separadamente, mas sim em conjunto. E essa atividade em conjunto pode ser enunciada com uma 
fórmula pedagógica: cada um deles atua no outro, pejo outro, para o outro, desde o outro. Essa é 
uma tentativa de enunciar o entrelaçamento, a interpenetração que existe entre todos os instituintes 
e instituídos, entre todos os organizantes e organizados. Esta interpenetração acontece ao nível da 
função e ao nível do funcionamento; ao nível da produção e ao nível da reprodução; ao nível 
daquilo que funcionará a favor da utopia e ao nível daquilo que está contra. Então, essa 
interpenetração ao nível da função, do conservador, do reprodutivo, chama-se atravessamento. Essa 
interpenetração ao nível do instituinte, do produtivo, do revolucionário, do criativo chama-se 
transversalidade. Para dar apenas um exemplo, vou mostrar-lhes um caso de atravessamento de 
funções a nível organizacional. Nós dizemos, por exemplo, que uma escola é um estabelecimento 
das organizações do ensino, que por sua vez são uma realização da instituição da educação. 
Acontece que uma escola não só alfabetiza, não só instrui, não só educa dentro dos objetivos 
manifestos do organizado e do instituído, mas também prepara força de trabalho (alienado), ou seja, 
uma escola também é uma fábrica. Por outro lado, uma escola, de acordo com a concepção de 
ensino que ela tenha, também consegue manter os alunos presos durante seis a oito horas por dia, e 
além de ensiná-los a ler e escrever, o que fundamentalmente lhes ensina é a obedecer, e o que 
basicamente lhes transmite é um sistema de prêmios e punições, especialmente 
33 ▲
de punições. Neste sentido é que uma escola é também um cárcere. Mas, além disso, o que a escola 
ensina é uma série de valores do que deve ser construído, do que deve ser destruído, ensina formas 
de exercício da agressividade. Então, de alguma maneira, também se pode dizer que uma escola é 
um quartel ou uma delegacia de polícia. Então, vocês vão vendo como uma escola, ao nível do 
instituído, do organizado, ao nível da função, ao nível da reprodução, está atravessada pelas outras 
organizações. Existe uma estreita colaboração na tarefa de reproduzir o que está, tal como está, e 
dessa maneira colaborar para a perpetuação da exploração, da dominação e da mistificação. Mas 
uma escola também é um âmbito onde se tem a ocasião de formar um agrupamento político-
escolar,um clube estudantil; uma escola também é um lugar onde se pode aprender a lutar pelos 
direitos; uma escola também é um lugar onde se pode integrar um sistema de ajuda mútua entre os 
alunos; uma escola também é um lugar onde se pode adquirir elementos para poder materializar as 
correntes instituintes, produtivas; numa escola também se pode aprender a lutar contra a exploração, 
a dominação, a mistificação. Então, uma escola tem um lado instituinte, um lado organizante. Neste 
sentido, a escola pode ser também, por exemplo, uma frente de luta revolucionária, de luta sindical, 
um lugar de doutrinamento para a revolução, um lugar de exercício da solidariedade. Neste sentido 
é que uma escola tem também um funcionamento articulado, interpenetrado com muitas outras 
organizações, instituições, com muitos outros instituintes e organizantes da sociedade que atuam 
nela, através dela, para ela, por ela, e ela por outras, e ainda entre os diversos· quadros e segmentos 
desse mesmo estabelecimento. Essa interpenetração chama-se transversalidade. A interpenetração 
ao nível da função, da reprodução, como já vimos, chama-se atravessamento. A interpenetração a 
nível instituinte, produtivo, chama-se transversalidade, e esta se define também como uma 
dimensão da vida social e organizacional que não se reduz à ordem hierárquica da verticalidade 
nem à ordem informal da horizontalidade. Os efeitos da transversalidade caracterizam-se por criar 
dispositivos que não respeitam os limites das unidades organizacionais formalmente constituídas, 
gerando assim movimentose montagens alternativos, marginais e até clandestinos às estruturas 
oficiais e consagradas. 
34 ▲
Com isso temos definida, até certo ponto, a concepção institucionalista da sociedade. A sociedade é 
uma rede constituída pela interpenetração de forças e entidades reprodutivas e antiprodutivas cujas 
funções estão a serviço da exploração, dominação e mistificação (atravessamento), assim como 
também está constituída pela interpenetração das forças e entidades que estão a serviço da 
cooperação, da liberdade, da plena informação, ou seja, da produção e da transformação afirmativa 
e ativa da realidade (transversalidade). 
35▲
PERGUNTAS REFERENTES AO CAPÍTULO II 
1) O que são, para o Institucionalismo, as sociedades? 
2) O que implica dizer que as instituições são lógicas e que podem estar formalizadas em leis 
ou normas ou que se manifestam em hábitos? 
3) Quais seriam exemplos de instituições? Que são as organizações, os estabelecimentos, 
equipamentos, agentes e práticas? 
4) O que é o instituinte e o instituído, o organizante e o organizado, a função e o 
funcionamento, a produção, a reprodução e a antiprodução? 
5) O que é o atravessamento e a transversalidade? 
6) De que está composta a rede social? 
36 ▲
Capítulo III 
AS HISTÓRIAS 
o que é para o Institucionalismo o termo "história"? Nós temos, empiricamente, alguma 
noção aproximada do que é história. Numa primeira instância, é importante diferenciar 
História de Historiografia. A historiografia é o registro dos fatos históricos que a gente 
encontra nos arquivos e, geralmente, é uma versão que foi conservada e foi publicada porque 
coincide com os interesses do Estado, das classes dominantes, do instituído e do organizado, 
que têm recursos para resgatar e promover estes documentos. Naturalmente, registram aquilo 
que lhes convém. Então, historiografia é esta versão que, em geral, se apresenta como sendo 
objetiva, neutra, impessoal e que, a rigor, é apenas uma versão tão interesseira, tão 
tendenciosa quanto qualquer outra, mas que aparece como descritiva, como meramente 
narrativa. Agora, História, propriamente, não é isso. 
Historiar é um processo de conhecimento que pretende reconstruir os acontecimentos 
nos tempos, mas que o faz assumindo que qualquer reconstrução é feita desde uma 
perspectiva, que qualquer registro inclui os desejos, os interesses, as tendências de quem faz 
História. Porque a versão que se tem da História é sumamente importante, enquanto justifica 
as ações 
37 ▲
e paixões que se protagonizam no presente e, geralmente, justifica e propicia um projeto 
futuro para a vida social, ou seja, todos os movimentos sociais que se deflagram, que se 
impulsionam para chegar a este porvir. Algumas coisas que o Institucionalismo tem a dizer 
com respeito à História podem ser resumidas em poucas palavras: 
Primeiro: o Institucionalismo afirma que a História não é, apenas, a reconstrução do 
que já aconteceu e que já está, de alguma maneira, morto, obsoleto, definido – "o que foi, já 
foi"-, mas consiste em uma localização daquilo que, de alguma forma, começou, teve início 
em um passado. Mas o interesse da História institucionalista é o de reconstruir o passado 
enquanto ele está vivo no presente, enquanto ele está atuante e pode determinar ou já está 
determinando o futuro. Passado e futuro se constroem e reconstroem incessantemente desde 
os valores que inspiram a um presente crítico e revolucionário. 
Segundo: o Institucionalismo afirma que não existe uma História, uma História que seja 
como uma espécie de mangueira, de modo que totalize todo o devir da vida social em um 
espaço e em um tempo só; mas diz que existem "histórias" – multiplicidades econômicas, 
culturais, ideológicas, do desejo, da afetividade, da vontade, histórias raciais, histórias das 
gerações. Cada uma delas transcorre num tempo próprio que não se pode uniformizar, que 
não se pode totalizar, globalizar em um tempo único; de modo que não se pode estudar uma 
época como se essa época fosse um corte transversal, que se faz num único fluxo da História, 
como se faria no fluxo de um rio. Trata-se de tentar articular os diferentes tempos dos 
diferentes processos históricos em alguns momentos, eras ou etapas, que são localizáveis 
como tais, cronológica ou conceitualmente, no século XVI, no século XI, ou na Idade Antiga 
etc. Mas isso não significa que este seja o único tempo em que se transcorreram todos os 
processos. Quer dizer, os processos que constituem a História são processos policronológicos, 
cada um em sua duração, e é preciso ver como cada um se "adianta" ou se "atrasa" em relação 
aos outros. Outro aspecto importante da leitura institucionalista do tempo é que não é o 
passado que engendra o presente, mas o passado está composto de uma série de 
potencialidades que o presente ativa, que o presente ilumina, que o presente deflagra. Não é o 
passado que gera o presente, e sim o presente que explora, que aproveita 
38 ▲
ou atualiza as potencialidades do passado para construir u m porvir. Por outro lado, a História 
não é uma série de etapas fatais, ou mais ou menos determinadas, cada uma das quais origina 
a seguinte, que começam do zero e vão acabar em dez, cem ou qualquer número final. Não 
existe uma progressão predeterminada das etapas históricas e, por conseguinte, não existe um 
apogeu final dos tempos. O Institucionalismo não aceita a idéia de uma escatologia histórica, 
isto é, um final que pode ser entendido como final feliz – e que nesse caso confirme uma 
escatologia positiva, ou um final catastrófico ou apocalíptico. Não existe finalidade da 
História. O que pode ocorrer no dia-a-dia não está inteiramente predeterminado no passado e 
nem é certo que vá acontecer no futuro. Segundo alguns institucionalistas, o tempo, sempre 
policronológico, se produz, devém desde um presente em direção ao passado e ao futuro. 
Finalmente, outra afirmação importante que o Institucionalismo pode aportar à teoria 
da História é que nós, com uma explicação claramente mecânica, baseada em paradigmas de 
ordem que se desenvolveram do século XVII em diante – que têm como modelo a mecânica 
celeste com suas trajetórias, suas parábolas, suas órbitas, e como correlato à máquina do 
relógio –, com este metamodelo mecanicista, tendemos a pensar a História em função de suas 
leis, sendo que os enunciados legais supostamente dão conta dos processos repetitivos que 
transcorrem na realidade. Somos levados a pensar que a História se desenvolve segundo uma 
ordem de características mais ou menos maquinais, que tende a repetir-se e que, em todo 
caso, quando não se repete é porque tem conseguido produzir alguma diferença em relação a 
uma provável repetição do idêntico ou do igual. Então, esta concepção da História que faz da 
diferença uma variação análoga ou semelhante do igual, ou do idêntico, não é compartilhada 
pelo Institucionalismo. O Institucionalismo diz que o que, predominantemente, retoma na 
História, não é o igual, não é o idêntico, não é o regular, não é aquilo que se pode captar por 
leis típicas da mecânica física ou da mecânica celeste, do relógio ou do calendário, mas que o 
que se repete na História é a diferença, é o acaso, é o inesperado, o acontecimento, o 
imprevisível, o aleatório. E que são estes grandes ou pequenos momentos de repetição do 
diferente (por exemplo: do instituinte) que depois 
39 ▲
vão tentar ser capturados pelo instituído, pelo organizado e repetidos como idênticos. 
Bem, esta concepção da História que estou sintetizando ao máximo, com contribuições de 
diferentes tendências institucionalistas, não é apenas um exercício acadêmico, mas está estritamente 
relacionada com a concepção da práxis, da atividadepolítico-social desejante que o 
Institucionalismo tem, e com a utopia ativa, quer dizer, o propósito, o objetivo, a finalidade e os 
recursos do Institucionalismo. Porque se bem o Institucionalismo interessa-se em estudar as leis do 
que tende a repetir-se, ele está mais implicado em assumir uma práxis que propicie o advento do 
inesperado, do acontecimento, da inovação absoluta. Então, trata-se de entender como a História é 
não apenas uma atividade ilustrativa, uma investigação erudita, mas uma tentativa de reconstruir os 
grandes momentos de imprevisto, os grandes momentos de acaso que transformaram o curso da 
humanidade, para a partir desses ensinamentos, produzir estratégias que permitam propiciá-los 
novamente. A História se estuda para aprender como militar a favor da transformação, não de uma 
transformação previsível, não de uma transformação pré-figurada, mas da transformação em direção 
ao radicalmente novo e, portanto, absolutamente desconhecido. Tentemos agora definir outros 
conceitos importantes. 
O termo molar, outro termo que tínhamos de comentar e que se entende em contraposição 
ao termo molecular, é uma contribuição feita por algumas escolas institucionalistas e que vou tentar 
explicar brevemente. 
Para os institucionalistas não existe uma separação radical entre vida econômica, vida política, vida 
do desejo inconsciente, vida biológica e natural. O que existe são imanências – isto é, a inerência, a 
posição intrínseca de cada um destes campos em relação aos outros, que só se podem separar de 
uma maneira artificial para a finalidade de seu estudo. A rigor funcionam sempre, por assim dizer, 
um "dentro" do outro, incluindo-se no outro. Então, dentro desta concepção da vida social como 
uma rede, em que os diversos processos são imanentes um ao outro, pode se distinguir o molar, que, 
dito de uma maneira simples, é aquilo que é grande, que é evidente, que tem formas objetais ou 
formas discursivas, visíveis e enunciáveis. Por outra parte temos o molecular, que é o que na física 
se costuma chamar micro, por 
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oposição a macro, isto é, o mundo atômico e subatômico, o mundo das partículas, enquanto o 
mundo macro por excelência seria, por oposição, o universo, o cosmos, que é composto de grandes 
corpos. Então, tomando esses ensinamentos da microfísica, da microquímica, da microbiologia, da 
biologia molecular, o Institucionalismo afirma que as grandes mudanças históricas, as 
macromudanças, são sempre resultado de pequenas micromudanças, e que os grandes poderes em 
vigor na sociedade são apenas forças resultantes de pequenas potências que se chocam e conectam 
em espaços microscópicos de uma sociedade. Como até mesmo a física, a biologia e a química 
descobriram que as leis que regem os processos e as entidades macro não são capazes de dar conta 
da dinâmica que acontece nas micro. O macro é o lugar da ordem, é o lugar das entidades claras, 
dos limites precisos, é o lugar da estabilidade, da regularidade, da conservação. O micro, dito tanto 
no sentido físico, químico, biológico quanto no sentido social, político, econômico e desejante, é o 
lugar das conexões anárquicas, insólitas, impensáveis. O macro é o lugar da reprodução, e o micro é 
o lugar da produção; o macro é o lugar da conservação do antigo ou da propiciação do novo 
previsível, e o micro é o lugar da eclosão constante do novo; o macro é o lugar da regularidade e 
das leis, o micro é o lugar do aleatório e do imprevisível. Esta diferenciação também é importante 
porque, em geral, o Institucionalismo confia em analisar e propiciar as mudanças locais, as 
transformações microscópicas, as conexões circunstanciais, porque espera delas efeitos à distância 
que, ao generalizarem-se, resultam nas grandes metamorfoses, do instituído e do organizado, o 
detectável e consagrado. Dito com outras palavras, o Institucionalismo pensa que as pequenas 
conexões locais são o lugar do instituinte, e entendê-lo assim está estritamente relacionado com as 
estratégias de intervenção nos âmbitos, nos espaços de atuação que o Institucionalismo vai tentar 
propiciar. Eles são os pequenos lugares intersticiais da vida natural-social-técnica e subjetiva, e não 
os grandes blocos representativos dos territórios constituídos. 
Finalmente, é importante definir o termo antiprodução. Se não me engano, já tentamos 
reiteradamente definir e redefinir o termo produção. Produção é aquilo que processa tudo que 
existe, natural, técnica, subjetiva e socialmente. É a permanente 
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geração, enquanto não se cristaliza; é o devir, é a metamorfose, é o que, com uma terminologia 
ainda religiosa, chamaríamos de criação. Mas no momento em que as forças produtivas entendidas 
de maneira muito ampla, as forças instituintes-organizantes, são capturadas em grandes organismos 
reprodutivos como o Estado ou o mercado capitalista, vigora a antiprodução. Por exemplo, elas são 
voltadas contra si mesmas, de maneira que a produção, as energias não orientadas, as matérias 
produtivas ainda não formadas são retidas pelos mecanismos, pelos equipamentos, pelos 
organismos e forças de toda ordem que propiciam a reprodução do mesmo, o impedimento ou a 
destruição do novo, elas tornam-se antiprodutivas, elas se destroem a si mesmas. É o que subjaz a 
grandes processos sociais como as guerras; é o que subjaz a célebres atitudes sociais como a de 
destruir os produtos porque o preço caiu no mercado; é o que subjaz à geração de enormes 
contingentes sociais que estão destinados a morrer, e que morrem não apenas por deficiência da 
provisão ou da organização, mas por atitudes ativas do poder destinadas a destruí-los, como é o caso 
da marginalidade, da mortalidade infantil, dos preconceitos sexuais e raciais, do alcoolismo, da 
tóxico-dependência, dos genocídios coloniais, neocoloniais e planetários contemporâneos etc. Essas 
são potências, são forças singulares, produtivas, que a sociedade não está em condições de 
incorporar porque não pode transformá-las em mercadoria, seres, bens, valores, serviços – não pode 
assimilá-las à lógica do sistema. Então, ou as deixa morrer, ou as mata por meio de mecanismos 
mais ou menos deliberados, mais ou menos premeditados. Esse processo de autodestruição das 
forças produtivas naturais, sociais, subjetivas e tecno-industriais que a sociedade faz chama-se 
antiprodução. Um desses processos característicos é o problema ecológico, que só agora se está" 
descobrindo", enquanto já era evidente desde meados do século passado com o processo produtivo 
industrial' mercantil baseado na geração de mercadorias, de bens de troca e não de bens de uso, que 
vem destruindo o reservatório fundamental de matéria-prima e de vida que é a natureza. Agora, isso 
se torna moda; mas foi sempre assim, e é uma das expressões mais radicais da capacidade 
antiprodutiva do sistema dominante no mundo. 
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Para qualquer tendência sociológica, científica-política ou econômica clássica, já é 
completamente evidente que não se pode pensar os processos característicos de cada área – não se 
pode conceber o que acontece em economia, em política ou sociologia – com independência do 
psiquismo dos homens, prescindindo do que antigamente se chamava as almas dos homens. Ou 
seja, apesar de se poder acreditar que é o econômico que determina, em última instância, as 
características da vida e da morte social, ou que se possa supor que é o político o tal determinante, 
hoje se sabe, e ninguém pode negá-la, que por mais determinados, por mais submetidos às leis 
econômicas e políticas que estejam os homens, eles só entram nesses processos de dominação, de 
exploração, de mistificação ou, pelo contrário, em processos revolucionários, se estes, de algum 
modo, coincidemcom suas crenças, representações, convicções acerca da vida social. E também 
não entram se suas expectativas, suas vontades, seus desejos não se encaminham nessa direção. Isso 
é claríssimo. O Institucionalismo tende a não privilegiar a priori nenhuma determinação mais que 
outra, isto é, são tão importantes as vontades, os desejos e as representações com que os homens 
entram nos processos históricos quanto as estruturas "materiais", econômicas, políticas ou naturais 
que os determinam. Mas a isso temos de acrescentar que a partir da contribuição psicanalítica, sabe-
se que as vontades, os desejos mais potentes que dirigem a conduta ou a vida dos homens, são 
inconscientes, isto é, não fazem parte de seu saber, de seu querer deliberado. Em última instância, 
os homens entram nos processos históricos e sociais determinados por forças desejantes, por 
vontades que eles não controlam e não conhecem, mas que têm a ver com o prazer, que têm a ver 
com o sofrimento e têm a ver com vivências e mecanismos subjetivos ainda mais profundos. Hoje, 
por exemplo, está cada vez mais evidente para os economistas que o "melhor" plano econômico não 
funciona se não se consegue mobilizar as forças desejantes dos integrantes de uma população, não 
só seus interesses, para provocar o consenso dos agentes em torno deste plano; e ainda mais, que o 
"pior" dos planos é capaz de funcionar quando se consegue essa mobilização. E não se trata apenas 
de conseguir uma adesão consciente ou uma credibilidade voluntária, mas de mobilizar forças 
inconscientes às quais se apela, ainda passando por cima das crenças e convicções dos agentes 
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sociais. Isso também não é novidade. Já a partir de Reich, o grande psicanalista marxista, nós nos 
interrogamos constantemente porque, em lugar de colocar-se o problema de que ocasionalmente os 
operários estejam em greve ou que circunstancialmente os soldados se rebelem contra seus 
superiores, não nos perguntamos porque os operários não estão sempre em greve, porque os 
soldados não se unem para executar definitivamente seus superiores. Por que os povos atuam contra 
seus reais interesses e vontades? Então, não se trata apenas de dizer que o fazem por medo, porque 
os acontecimentos históricos demonstram que os povos quando se mobilizam, quando as forças 
inconscientes se ativam, não têm medo de nada e têm como se fosse uma plena consciência de sua 
potência. Eles correm perigos tremendos ou – combatem lutas desiguais, mas eles operam as 
transformações sociais. Não se trata também de dizer apenas que os povos são ignorantes, porque se 
é certo que o sistema se ocupa de manter os povos ignorantes ou erradamente informados, já se tem 
visto processos históricos em que os povos são capazes de produzir um saber acerca de suas 
condições de existência que não precisa, passar pelo saber transmitido pelos meios de divulgação, 
nem necessita submeter-se ao saber acadêmico. Os povos checam seu próprio saber sobre suas 
condições de vida na luta cotidiana pela transformação desses campos de existência e levam à frente 
movimentos de imenso poderio, de incalculável potência social, sem apelar para os saberes 
instituídos e estabelecidos. Então, o importante a ser reconhecido é a existência dessas forças 
inconscientes que o Institucionalismo denomina desejo, por ressonância ou por uma re-elaboração 
do conceito de desejo inconsciente da Psicanálise. A diferença consiste em que o desejo 
inconsciente em Psicanálise está sempre relacionado com uma estrutura chamada Complexo de 
Édipo: é um desejo que atua primeiro na vida familiar, nas relações ou nas fantasias incestuosas ou 
parricidas do inconsciente infantil e que, depois, se translada para a vida social com as mesmas 
características. O desejo segundo a Psicanálise é um impulso que tende a reconstituir estados 
perdidos a se realizarem em fantasmas imaginários, é uma tendência reprodutiva, é um anseio que 
tende a restaurar o narcisismo, que supostamente, em algum momento, foi o estado em que o proto-
sujeito esteve integralmente. O desejo no Institucionalismo não tem essas peculiaridades. O desejo 
do 
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Institucionalismo é imanente à produção, é (digamos provisoriamente) o aspecto subjetivo (mas não 
apenas psíquico) da mesma força que no social é o instituinte. É uma força que tende a criar o novo, 
entendido como o imprevisível, é uma força de conexões insólitas, é uma força de invenção e não é 
uma força restauradora de estados antigos. Mas é inconsciente. Só que este inconsciente não se 
entende exclusivamente como um inconsciente edipiano, familiarista, repetitivo, mas também como 
um inconsciente pré-pessoal, pré-social e pré-cultural, objeto de um saber que toma elementos de 
todos saberes existentes; trata-se de matérias não-formadas e energias não-vetorizadas que são 
capazes de gerar transformação. A força desse inconsciente não está submetida apenas por um 
recalque psíquico, mas por um recalque complexo que é simultaneamente político, libidinal, 
semiótico etc. Então, para o Institucionalismo não existe o que seria um homem universal, não 
existe uma estrutura, uma essência-homem. Também não existe uma estrutura, uma essência-
sujeito, um sujeito psíquico que seria o mesmo em todas as sociedades, em todos os momentos 
históricos, em todas as classes sociais, em todas as raças etc. O que se passa é que esse sujeito 
psíquico, mesmo que se aceite como sendo universal, teria representações ou teria recursos que 
variariam segundo a sociedade, segundo a classe social ou o grupo a que pertencesse. Para o 
Institucionalismo não existe esse sujeito eterno e universal, apenas preenchido com conteúdos 
históricos sociais variáveis. Para o Institucionalismo, o que existe são processos de produção de 
subjetivação ou de subjetividade. Mais adiante explicarei em que consistem essas duas 
denominações, mas essa produção é absolutamente contingente, é absolutamente própria de cada 
lugar, de cada momento, de cada conjuntura histórica etc. Ou seja, produzem-se sujeitos em cada 
acontecimento-devir-sujeitos para esse acontecimento-devir, sujeitos variavelmente protagonistas 
desse acontecimento, ou, se pode dizer, é o acontecimento-devir que os produz. E podem existir 
analogias, podem existir semelhanças entre esses sujeitos. O que importa não é a produção das 
semelhanças ou de analogias entre os sujeitos, mas a produção de diferenças, a singularidade de 
cada sujeito produzido em cada lugar, a cada momento. Então, quando nessa produção predomina o 
instituído, a reprodução de um sujeito do desejo assujeitado aos interesses dominantes, aos 
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interesses exploradores, aos interesses mistificantes, ele adota as características de um sujeito 
mais ou menos universal e eterno. A isto se chama produção de subjetividade assujeitada, 
subjetividade submetida. Quando o que predomina neste processo é a geração do novo 
absoluto, de subjetivação absolutamente original, absolutamente singular, absolutamente 
instituinte, absolutamente contingente, circunstancial e gerada pelos eventos revolucionários, a 
isto se chama produção de subjetivação livre, não assujeitada, primigênia, produtiva, 
revolucionária, em que o desejo se realiza em conexões locais, micro, e se efetua gerando o 
novo, não se concretiza restituindo o antigo, processa-se não reproduzindo o instituído, o 
organizado, o estabelecido, mas se realiza gerando o instituinte e o organizante. 
Por que esta discriminação é importante? Porque na leitura que o Institucionalismo vai 
fazer de cada organização, de cada estabelecimento, movimento ou proposta, ele vai 
privilegiar a intelecção de dispositivos que são capazes de produzir subjetivações.

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