Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
JUIZADOS ESPECIAIS GISELE LEITE - 1 JUIZADOS ESPECIAIS Gisele Leite, professora universitária, pedagoga, bacharel em Direito UFRJ, mestre em Direito UFRJ, mestre em Filosofia UFF, Doutora em Direito USP. Pesquisadora Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Articulista e colunista dos sites www.invetidura.com.br www.netlegis.com.br www.jusvi.com possuindo vasta produção acadêmica publicada nos sites www.ibdfam.org.br http://egov.ufsc.br/portal/buscalegis www.abdpc.org.br ww.ambito-juridico.com.br www.abdir.com.br www.jurid.com.br . GISELE LEITE - 2 JUIZADOS ESPECIAIS Sumário 1 Unidade 1: Precedentes históricos.........................................................8 1.1 Precedentes históricos....................................................................8 2 Unidade 2: Princípios informativos do processo nos Juizados Especiais..................................................................................................16 2.1 Princípios informativos do processo nos Juizados Especiais......16 2.2 A competência territorial dos Juizados Especiais Cíveis conforme o artigo 4º da Lei 9.099/95...................................................................30 3 Unidade 3: Sujeitos do processo nos Juizados Especiais Cíveis........33 3.1 Sujeitos do processo nos Juizados Especiais Cíveis...................33 4 Unidade 4: Pluralidade subjetiva no processo dos Juizados Especiais. ..................................................................................................................46 4.1 Pluralidade subjetiva no processo dos Juizados Especiais.........46 5 Unidade 5: Atos processuais................................................................53 5.1 Atos processuais...........................................................................53 6 Unidade 6: A invalidade dos atos processuais.....................................55 6.1 A invalidade dos atos processuais................................................55 7 Unidade 7: Procedimento sumariíssimo..............................................56 7.1 Procedimento sumariíssimo..........................................................57 8 Unidade 8: Da prova pericial................................................................75 8.1 Da prova pericial...........................................................................75 9 Unidade 9: Inspeção Judicial...............................................................76 9.1 Inspeção Judicial...........................................................................76 10 Unidade 10: Sentença........................................................................77 10.1 Sentença.....................................................................................77 10.2 Casos especiais de sentença terminativa...................................81 11 Unidade 11: Recursos.........................................................................82 11.1 Recursos......................................................................................82 11.2 Recurso extraordinário................................................................91 11.3 Querella nullitatis.........................................................................92 11.4 Execução nos Juizados Especiais Cíveis...................................95 11.5 Tutela Cautelar............................................................................97 11.6 Execução da sentença nos Juizados Federais.........................116 12 Exercícios de Fixação de aprendizagem..........................................117 GISELE LEITE - 3 JUIZADOS ESPECIAIS 1. Programa da disciplina 1.1.Ementa: Abordagem sobre as Leis 9.099/95 e a Lei 10.259/01 que formam o Estatuto dos Juizados Especiais Cíveis; Princípios informadores; competência; sujeitos do processo; atos processuais; procedimento sumariíssimo; sentenças; recursos e outros meios impugnativos; execução de títulos extrajudiciais e de sentença nos juizados especiais; tutela de urgência. 1.2 Carga horária total: 1.3 Objetivos: Prover atualização e informação sobre o Direito Processual Civil, particularmente sobre o Estatuto dos Juizados Especiais. Questões controvertidas abordagem doutrinária e jurisprudencial. 1.4 Conteúdo programático: 1. Precedentes históricos 2.Princípios informativos do processo nos Juizados Especiais 3.A competência territorial dos Juizados Especiais Cíveis conforme o artigo 4º da Lei 9.099/95. 4.Sujeitos do processo nos Juizados Especiais Cíveis 5.Pluralidade subjetiva no processo dos Juizados Especiais. 6.Atos processuais 7.A invalidade dos atos processuais 8.Procedimento sumariíssimo. 9.Da prova pericial. 10. Inspeção Judicial. GISELE LEITE - 4 JUIZADOS ESPECIAIS 11.Sentença. 12.Casos especiais de sentença terminativa. 13.Recursos. 14.Recurso extraordinário. 15.Querella nullitatis 16.Execução nos Juizados Especiais Cíveis 17.Tutela Cautelar 18.Execução da sentença nos Juizados Federais 19. Exercícios de Fixação de aprendizagem 1.5 Metodologia: Exposição audiovisual, tarefas coletivas e individuais, realização de casos concretos; 1.6 Critérios de avaliação: Será realizada verificação de aprendizagem com peso 10 (dez) e, terá o aluno direito a participação em sala de aula mediante realização e aproveitamento de exercícios de fixação de aprendizagem que serão aplicados em sala de aula. Provendo a aplicação prática em casos concretos e questões contemporâneas sobre o tema. 1.7 Bibliografia recomendada: CARNEIRO, Paulo. Acesso à Justiça: Juizados Especiais Cíveis e Ação Civil Pública. São Paulo. Editora Forense.2000 RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. Execução Provisória (Coleção Arruda Alvim) São Paulo. Editora Método. 2006. PELUSO, Cezar e Morgana Richa. Conciliação e Mediação. Estruturação da Política Judiciária Nacional. São Paulo. Editora Forense.2011 GISELE LEITE - 5 JUIZADOS ESPECIAIS SALOMÃO, Luis Felipe. Roteiro dos Juizados Especiais Cíveis. São Paulo, Editora Forense.2009 CAMARA, Alexandre Frietas. Juizados Especiais Cíveis. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2008. BORRING, Felipe Rocha. Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2007. LIMA, Marcelo Polastri. Sheila Bierrenbach. Juizados Especiais criminais. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2009. Curriculum resumido do professor Nome bibliográfico: Gisele Leite Mestre em Direito pela UFRJ, Mestre em Filosofia pela UFF, Doutora em Direito pela USP, Pedagoga e advogada. Conselheira-chefe no INPJ – Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Vencedora do prêmio Brazilian Web Corporation em primeiro lugar como a doutrinadora brasileira mais lida na Internet (na área de artigos jurídicos) em 2003; Ganhadora do Prêmio Pedro Ernesto do 43º Congresso Científico do Hospital Universitário Pedro Ernesto na qualidade de coautora do trabalho sob o título “A terceira idade e a cidadania com dignidade: Reflexões sobre o Estatuto do Idoso”, em 26/08/2005; Articulista de vários sites jurídicos, www.jusvi.com. www.uj.com.br, www.forense.com.br, www.estudando.com, www.lex.com.br, www, netlegis.com.br. Revista Justilex, Revista Consulex. Revista Eletrônica Forense. Revista Jurídica da Presidência da República, www.planalto.gov.br. Professora universitária há mais de dezoito anos. Professora da EMERJ – Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. GISELE LEITE - 6 JUIZADOS ESPECIAIS 1 Unidade 1: Precedentes históricos 1.1 Precedentes históricos A origem do procedimento sumaríssimo jaz no artigo 98 da Constituição Federal de 1988 queprevê a criação dos juizados especiais compostos por juízes togados ou leigos competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo. Verifica-se nessa fase contemporânea do processo civil que o código não é mais o centro do sistema jurídico, pois vivenciamos a era da descodificação ou era dos estatutos. E muitos desses estatutos civis como o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, Lei de Locações, além dos aspectos substanciais também endossam normas processuais civis, bem como as leis que compõem o estatuto do mandado de segurança onde temos a Lei 1533/51, 4.438/64 e, ainda, o Estatuto dos processos coletivos onde se destacam a Lei 7.347/85 e o Código de Defesa do Consumidor. Evidentemente com a existência dos estatutos, modificou-se a função dos códigos que como depositário de normas comuns aplica-se subsidiariamente a todos os estatutos. O Estatuto dos Juizados Especiais que cria um sistema processual próprio e adequado para as causas cíveis de menor complexidade. Forma microssistema, seguem os princípios e regras próprios. GISELE LEITE - 7 JUIZADOS ESPECIAIS É preciso esclarecer que formam o Estatuto dos Juizados as Leis 9.099 de 1995 e a Lei 10.259/2001. Desta forma, não há razões para não se aplicar nos Juizados Especiais as conquistas e inovações contidas na Lei de Juizados Federais, sempre que entre esses dois diplomas não houver qualquer incompatibilidade. Procura-se mitigar o usado mandado de segurança como recurso em face as decisões interlocutórias em sede da Lei 9.099/95, mas ocorre que na Lei dos Juizados Federais permite a interposição de recurso contra a decisão interlocutória que defere ou indefere medidas de urgência. Constata-se a influência recíproca entre os Juizados Estaduais e os Juizados Federais, e repisando pois o tal afamado “diálogo das fontes”, devendo a interpretação de todo o microssistema normativo. Bom frisar que a missão específica dos juizados é ampliar o acesso à justiça, e eliminar a litigiosidade contida. Porém vem contribuir para a chamada litigiosidade exacerbada, o que tem sido um problema para as pessoas jurídicas demandadas pois não terão que se fazer representar por advogado, e ainda apresentar preposto. Mesmo saindo vencedora a pessoa jurídica demandada terá gastos com o processo, o que tem levado muitas empresas preferirem o acordo como forma de se evitar o processo, diminuindo o gasto que teriam. O microssistema dos juizados especiais é comandado por princípios gerais constantes no artigo 2º da Lei 9.099/95. Faz-se necessário prover o esclarecimento sobre o conceito de princípio e regra. Primeiramente pela extrema generalidade GISELE LEITE - 8 JUIZADOS ESPECIAIS daqueles e, dos valores que privilegiam enquanto que as regras são específicas e, constituem vetores preceituais. Importante também se destacar que ante o conflito de princípios, deve-se usar a ponderabilidade, buscar o valor mais relevante axiologicamente. Já quanto ao conflito de normas de diferentes hierarquias, onde prevalece a regra hierarquicamente superior. Exemplifique-se quando no plano processual se conflitua o princípio do contraditório com o acesso à justiça. Quase sempre ocorre quando se obtém o resultado justo no processo através de medida liminar inaudita altera parte. Curial é a aplicação do princípio da proporcionalidade onde se procura o menor prejuízo possível, onde se busca proteger o interesse juridicamente mais relevante, principalmente em face da essencialidade da dignidade da pessoa humana. Os princípios do artigo 2º da Lei 9.099/95 são informativos do microssistema, são vetores hermenêuticos genéricos. E, são estes: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Além de outro relevante vetor hermenêutico que impõe a incessante busca da autocomposição. “Processo Resp. 705269 / SP RECURSO ESPECIAL 2004/0166580-2 Relator(a) Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA (1123) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 22/04/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 05.05.2008 GISELE LEITE - 9 JUIZADOS ESPECIAIS Ementa PROCESSO CIVIL. PROCEDIMENTO SUMÁRIO. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO E JULGAMENTO. COMPARECIMENTO PESSOAL DO AUTOR. COISA JULGADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. REALIZAÇÃO DE NOVA AUDIÊNCIA. ART. 23 DO CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA DA OAB. INAPLICABILIDADE. 1. A teor do disposto no art. 277, § 3º, do CPC, na audiência de conciliação e julgamento promovida no procedimento sumário, a parte autora não necessita comparecer pessoalmente, sendo bastante a presença de seu advogado dotado de poderes expressos para transigir. 2. Em respeito ao postulado do respeito à coisa julgado, não mais pode ser revista no julgamento da apelação a matéria decidida pelo Tribunal a quo em sede de agravo de instrumento. 3. As disposições inscritas no art. 38 do CPC, com a redação dada pela Lei nº 8.952/1994, não exigem o reconhecimento da firma do outorgante na hipótese de concessão poderes gerais ou especiais para o foro. Precedentes. 4. Em não havendo o comparecimento pessoal do autor na audiência de conciliação no procedimento sumário, deve o magistrado, ao invés de extinguir o feito, determinar a realização de nova audiência com base no disposto no art. 331, §§ 1º e 2º, do CPC. 5. As disposições inscritas no art. 23 do GISELE LEITE - 10 JUIZADOS ESPECIAIS Código de Ética e Disciplina da OAB – regulamento destinado a firmar as normas de conduta dos advogados, sobretudo no âmbito no âmbito administrativo da OAB –, não tem o condão de afastar a possibilidade prevista na legislação processual civil de regência (CPC, art. 267, § 3º, do CPC) de autor fazer-se representar pelo seu patrono. 6. Recurso parcialmente conhecido e provido.” Os princípios informativos dos Juizados Especiais Cíveis são os da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Como podem ser confirmados pelos julgados abaixo: “Processo Resp. 2319 / RJ RECURSO ESPECIAL 1990/0001870-6 Relator(a) Ministro CLAUDIO SANTOS (1087) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 08/05/1990 Data da Publicação/Fonte DJ 04.06.1990 p. 5059 / RT vol. 657 p. 197 Ementa PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. INTERPOSIÇÃO VERBAL. AUDIENCIA. PRINCIPIO DA ORALIDADE.O AGRAVO RETIDO PODE SER INTERPOSTO VERBALMENTE EM AUDIENCIA E CONSTARA DO PROPRIO TERMO DAQUELE ATO PROCESSUAL. PREVALENCIA DO PRINCIPIO DA ORALIDADE. Acórdão GISELE LEITE - 11 JUIZADOS ESPECIAIS POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO PELO DISSIDIO E DAR-LHE PROVIMENTO, NOS TERMOS DO VOTO DO SR. MINISTRO RELATOR.” [grifos nossos] “Processo CC 56786 / DF CONFLITO DE COMPETENCIA 2005/0193315-0 Relator(a) Ministra LAURITA VAZ (1120) Órgão Julgador S3 - TERCEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 27/09/2006 Data da Publicação/Fonte DJ 23.10.2006 p. 256 Ementa CONFLITO DE COMPETÊNCIA. VIOLAÇÃO DO SÍTIO DA EMBAIXADA DOS EUA.POSSÍVEL CRIME DE DANO. AUTORIA DESCONHECIDA. PEDIDO DE QUEBRA DE SIGILO DE DADOS. COMPLEXIDADE. INCOMPATIBILIDADE COM OS PRINCÍPIOS QUE REGEM O JUIZADO ESPECIAL. 1. O caso em tela não se subsume a nenhuma das hipóteses descritas nos incisos do art. 109 da Constituição Federal. Incompetência da Justiça Federal. 2. Há evidente necessidade de diligências de maior complexidade para apuração dos fatos e da autoria, providênciasessas que incluem, aliás, o pedido em questão de quebra de sigilo de dados. Nesse contexto, muito embora o crime de dano, por definição legal, esteja enquadrado como de GISELE LEITE - 12 JUIZADOS ESPECIAIS menor potencial ofensivo, dada as circunstâncias, incompatíveis com os princípios que regem os Juizados Especiais, mormente o da celeridade e o da informalidade, deve o feito ser processado perante o Juízo de Direito Comum. 3. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 3.ª Vara Criminal da Circunscrição Especial de Brasília/DF. Acórdão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal de Brasília - DF, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Maria Thereza de Assis Moura, Felix Fischer e Paulo Gallotti. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Nilson Naves e Paulo Medina e, ocasionalmente, o Sr. Ministro Hamilton Carvalhido.” [grifos nossos] O princípio da oralidade impõe um modelo oral de processo que se contrapõe ao processo escrito. Frise-se que oralidade e escritura dizem respeito à prevalência de uma forma sobre a outra. Nos processos dos juizados há prevalência da palavra sobre a escrita. GISELE LEITE - 13 JUIZADOS ESPECIAIS O processo pode ser oral desde a fase postulatória, bem como a resposta do réu, que também pode ser oferecida oralmente. Ensinava Chiovenda que tal princípio se baseia em cinco postulados fundamentais: 1. a prevalência da palavra falada sobre a escrita; 2. concentração dos atos processuais em audiência; 3. imediatidade entre o juiz e a fonte da prova oral; 4. identidade física do juiz; 5. irrecorribilidade das decisões interlocutórias. Podem ser interpostos oralmente a demanda, a contestação, os embargos de declaração, o requerimento da execução. Apesar de que no plano fático não seja exatamente o que ocorre, pois na maioria das vezes ocorre que, o ajuizamento é escrito, apesar da incredulidade de Alexandre Freitas Câmara mesmo ante a alegação do magistrado Eduardo Oberg. É bom saber que o processo dos Juizados Especiais Cíveis deveria ser diferente do processo comum, e é nesse sentido que representa um novo modelo processual. O que certamente aproxima mais as partes do juiz, o que facilita a busca da autocomposição. GISELE LEITE - 14 JUIZADOS ESPECIAIS 2 Unidade 2: Princípios informativos do processo nos Juizados Especiais 2.1 Princípios informativos do processo nos Juizados Especiais Enumerados no artigo 2º da Lei 9.099/95, os princípios são como normas jurídicas e, também por isso, dotados de coercibilidade. Surgindo conflito de princípios, não é o critério hierárquico ou da especialidade que trará a solução. A solução virá da ponderação dos interesses e dos valores em colisão e, da análise no caos concreto a determinar qual princípio é melhor em proteger o valor mais relevante. Quando por exemplo, colidem o princípio do contraditório com o do acesso à justiça, precisamos identificar qual deles é mais apropriado para se alcançar um resultado justo. O que às vezes justifica a concessão de liminar inaudita altera parte, onde é mais relevante naquele caso sacrificar o contraditório para assegurar a obtenção de resultado útil e hábil do processo. Os princípios elencados no artigo 2º da Lei 9.099/95 são efetivamente princípios efetivos gerais e informativos do microssistema dos Juizados Especiais. Enquanto vetores hermenêuticos guiam toda a interpretação sobre os Estatutos dos Juizados Especiais. São estes, os princípios da oralidade, o da simplicidade, o da GISELE LEITE - 15 JUIZADOS ESPECIAIS informalidade, o da economia processual e o da celeridade. Além da autocomposição que é veramente um importante vetor hermenêutico na jurisdição de causas de menor complexidade. Princípio da oralidade vem inicialmente se contrapor ao processo escrito, o que não dispensa inteiramente o uso da palavra. Na verdade ao se cogitar de oralidade, significa na prevalência de uma forma sobre a outra. Prevalentemente nos Juizados Especiais temos o processo oral, onde a palavra verbal prevalece sobre a escrita. Ensina Cappelletti que o processo moderno se manifesta como oral na fase instrutória. Ao passo que no microssistema dos Juizados Especiais o processo pode ser oral desde a fase postulatória e, também a resposta do réu. Chiovenda aponta que o processo oral se baseia em cinco postulados básicos: a prevalência da palavra falada, a concentração dos atos processuais em audiência, imediatidade entre o juiz e a fonte da prova oral, identidade física do juiz e na irrecorribilidade das decisões interlocutórias. Pode a demanda ser oral como também a resposta do réu e, até mesmo a interposição de embargos declaratórios, o requerimento da execução de sentença. Infelizmente não é o que nos revela a prática, o que faz com que se pareça muito com o processo comum. No processo oral, os atos processuais devem ser concentrados em audiência. Referencialmente uma só audiência. GISELE LEITE - 16 JUIZADOS ESPECIAIS Na primeira ocorre a tentativa de conciliação das partes, e que deveria ser uma sessão de conciliação. Em não se galgando a autocomposição realiza-se uma segunda audiência que será de instrução e julgamento. Nada obsta que o julgador venha convolar a primeira audiência, que é de conciliação, em Audiência de instrução e julgamento, desde que não haja prejuízo para a defesa. Infelizmente a concentração dos atos processuais em audiência não pe respeitada no processo executivo nos Juizados Especiais. Pois a maioria dos atos processuais de execução têm se realizado sem audiência, o que contraria o princípio da oralidade. É o que acontece quando a lei estabelece (art. 52, VII) a oitiva das partes sobre a possibilidade de alienação de bem penhorado por preço inferior ao da avaliação, isto deveria ocorrer em audiência e, não por meio de petições. Obviamente não há processo oral que não implique em contato imediato e direto entre o juiz e as fontes da prova oral (sejam partes ou testemunhas). O que exige a presença do magistrado às audiências, dá-se o exame indireto das perguntas feito pelo juiz. Daí, inexoravelmente somente o juiz que presidiu a audiência de instrução e julgamento pode valorar as provas que tenham sido produzidas. Por essa razão, sustenta Alexandre Freitas Câmara que não se pode nesse microssistema processual se reexaminar provas pois o recurso contra a sentença só pode dirigir-se às GISELE LEITE - 17 JUIZADOS ESPECIAIS questões de direito. Ressalte-se que a turma recursal não trava nenhum contato direto com as fontes de prova oral, recebendo somente o termo escrito dos depoimentos. De sorte que há nos Juizados Especiais espaço dos exames de questões de direito, mas apenas uma só fase para exame das questões de fato. A identificação física do juiz traz a vinculação do julgador ao processo para proferir a sentença. Não há relevância nessa vinculação pois a própria Lei 9.099/95 afirma que a sentença é proferida em audiência de instrução e julgamento, o que faz com que teoricamente não haja possibilidade de se ter a audiência presidida por um magistrado e a sentença proferida posteriormente por outro julgador. Oque significa um desrespeito ao artigo 28 da Lei 9.099/95. A fim de justificar a não prolatação de sentença em audiência tem sido aplicado subsidiariamente o artigo 132 do CPC, o que é incompatível com tal microssistema. Portanto o dispositivo legal ao estabelecer a oralidade, impôs naturalmente a identidade física do juiz nesses processos. Assim, qualquer exceção admitida viola frontalmente o princípio da oralidade. De maneira que colhida a prova em AIJ, resta vinculado o juiz para proferir a sentença, mesmo que a posterior, salvo no caso de aposentadoria ou morte do magistrado. A irrecorribilidade das decisões interlocutórias, onde, aliás, são raras de ocorrerem. Portanto, não se admite agravo. GISELE LEITE - 18 JUIZADOS ESPECIAIS Aplica-se a máxima de Liebman para o Processo Civil comum italiano: os vícios do processo, uma vez proferida a sentença, transformam-se em razões de apelação. Apesar de irrecorrível a decisão interlocutória, a matéria sobre a qual versa, não fica coberta pela preclusão. Tal fato gera problemas de difícil solução pois como os Juizados Especiais também são competentes para atividade executiva stricto sensu (com base em título executivo extrajudicial) as decisões interlocutórias costumam ser importantes. Pois no processo executivo a sentença é mero ato formal de encerramento do processo, enquanto que as decisões interlocutórias proferidas são relevantes, como a que anula penhora, e defere ou indefere adjudicação de bens. Lembre-se que tais decisões não admitem recurso. Teria sido mais salutar apenas prever a irrecorribilidade quando as decisões tratassem de atividade cognitiva, permitindo-se recurso quando no processo executivo (seja em título judicial ou extrajudicial). O manejo do mandado de segurança tem sido frequente como sucedâneo de agravo de instrumento. Na lei que rege os Juizados Especiais há hipótese de cabimento de recurso em face de decisão interlocutória: é aquela que defere ou indefere liminar (arts. 4º e 5º da Lei 10.259/01). O princípio da informalidade ou simplicidade propõe a desformalização do processo o que não significa acabar com as formas dos atos processuais. GISELE LEITE - 19 JUIZADOS ESPECIAIS A forma é apenas instrumento destinado a assegurar a obtenção do resultado a que se dirige o ato jurídico (seja processual ou não). Com isso, o princípio da instrumentalidade das formas (art. 154 do CPC), vem ressaltar que sempre que for alcançado o resultado pretendido deve tal ato ser refutado válido ainda que praticado em forma diversa do previsto. Essa é a norma básica do processo desformalizado. E a Lei 9.099/95 repisa a idéia em seu art. 13, onde identificamos uma relativa desformalização. Curial aduzir que tal informalidade é essencial para que logre os Juizados êxito para aproximar os jurisdicionados dos órgãos destinados a prestar a jurisdição. Considera Alexandre Freitas Câmara que o princípio da informalidade é incompatível com a utilização de toga pelo juiz. É a informalidade que também permite que nas causas de até 20 salários mínimos possam as partes comparecer sem advogados. Pois como sói obvio, não há informalidade onde alguém veste toga, e mais, a própria exigência dos advogados vestirem terno e gravata parece inapropriada. O mesmo se diga dos tratamentos formais dispensados ao juiz e aos advogados. O processo em sede de Juizados Especiais deve ser um processo desformalizado despido de formalidades exacerbadas, considerando-se válido o ato processual sempre que atingir a sua finalidade originalmente prevista. GISELE LEITE - 20 JUIZADOS ESPECIAIS Ademais é essencial a proximidade entre o jurisdicionado e o órgão jurisdicional. O princípio da economia processual consiste em se extrair do processo o máximo de proveito mediante mínimo de dispêndio de tempo e de energias. A conversão da audiência de conciliação em AIJ, a colheita de prova pericial simplificada, a oitiva de perito em audiência, a possibilidade de inspeção judicial em audiência, são todos bons exemplos da aplicação do princípio da economia processual. Tal enumeração é meramente exemplificativa. Há vários institutos inspirados na economia processual e curiosamente proibidos em Juizados Especiais, como é o caso da reconvenção, sendo permitido com tal índole somente pedido contraposto. É o que se dá, por exemplo, com a intervenção de terceiros também terminantemente proibida pois inviabilizaria a adoção de simplicidade e celeridade nos Juizados Especiais. Por outro lado, esclarece Alexandre Freitas Câmara, nas modalidades de intervenção de terceiro cuja proibição não se justifica é o caso do recurso de terceiro, da nomeação à autoria (acertamento de legitimidade) e o chamamento ao processo (principalmente nos casos do artigo 101, II do CDC). Todavia é justíssima a vedação da denunciação da lide pois esta causaria mais inconvenientes do que vantagens. O quarto vetor do microssistema dos Juizados Especiais é o da celeridade processual pois que existe um razoável tempo do processo que deve ser o mínimo possível. GISELE LEITE - 21 JUIZADOS ESPECIAIS O grande drama do processo é justamente equilibrar dois valores igualmente relevantes: a celeridade e a justiça. É herdeiro desse princípio a possibilidade de convolação da audiência conciliatória em AIJ, a diminuição dos prazos processuais (menor prazo para interposição de recurso contra sentença). Também a tutela antecipada perfeitamente cabível nos Juizados Especiais. Mas o exagero na celeridade processual não pode impedir a prática de atos processuais extremamente relevantes produzindo o insanável cerceamento de defesa que inquina todo o processo de nulidade fatal. É uma característica a mais como a busca da autocomposição que não se exaure na audiência de conciliação. A busca de soluções consensuais característica da chamada justiça coexistencial traz a pacificação social que é um notável objetivo do Estado Democrático de Direito. A autocomposição tem sido prestigiada até mesmo pelas recentes reformas sofridas pelo CPC, o que fez surgir a audiência preliminar (art. 331) e, ainda somou poderes ao juiz (art. 125) o de convocar as partes, a qualquer tempo, para tentar a autocomposição. Também na execução de sentença, oferecidos os embargos do executado, deverá haver a audiência de conciliação. Mesmo na execução com base em título extrajudicial, uma vez efetivada penhora, só as partes podem ser chamadas para audiência conciliatória. A competência dos Juizados Especiais possui caráter GISELE LEITE - 22 JUIZADOS ESPECIAIS opcional, e decorre propriamente da opção do autor. Principalmente porque se sustentarmos o caráter obrigatório incorreríamos em inconstitucionalidade. Observe-se que em tais processos não cabe recurso especial e suas decisões, não se submetem ao controle do STJ. Assim, se a decisão proferida por turma recursal violar lei federal, não fica sujeita ao controle do STJ. E também não se sujeitam a ação rescisória. Outro aspecto é que nesses processos cada parte só pode arrolar três testemunhas, o que poderá significar que a demanda implique em sucumbência. Deste modo, seria preciso que o demandante fosse antes do Juizado Especial, mesmo sabendo que não galgaria êxito, para que só depois fosse ao juízo comum. O sistema processual dos Juizados Especiais Cíveis se destina a permitir a concessão de tutela jurisdicional diferenciada, um modelo diferente do procedimento comum. É diferenciada, portanto, a tutela jurisdicional que seobtém através de modelos processuais que se afastem do standard. Tal diferenciação decorre das peculiaridades do direito material deduzindo em juízo, é o que ocorre, por exemplo, com os procedimentos especiais. Porém há casos em que não há peculiaridade no direito material a justificar a criação de procedimento diferenciado, são as razões de política legislativa que determinam os modelos diferenciados, é o caso do procedimento monitório ou no mandado de segurança. No caso dos Juizados Especiais todas as causas podem GISELE LEITE - 23 JUIZADOS ESPECIAIS também ser levadas a juízo pelas vias ordinárias e só depende da opção do demandante. Os Juizados Especiais outrora chamados de Juizados de Pequenas Causas são órgãos competentes para julgar causas de pequeno valor econômico e causas de menor complexidade (o que nem sempre está ligado ao seu valor). Revogou-se a Lei 7.244/84 e criou-se um só órgão denominado de Juizado Especial Cível, que é regido pela Lei 9.099/95. Há de se perceber a nítida distinção entre Juizado de Pequenas Causas e Juizados Especiais Cíveis pois há causas de pequeno valor e, ainda as de menor complexidade. O art. 3º da Lei 9.099/95 preceitua que o demandante que busca tutela para direito substancial cujo valor ultrapasse aos 40 salários mínimos, está com sua opção renunciando ao que exceder ao valor de alçada. Percebe-se que tal dispositivo refere-se somente às pequenas causas, mas não as causas de menor complexidade. Pequenas causas são aquelas arroladas nos incisos I ou IV do artigo 3º da Lei 9.099/95 e, cujo valor, não exceda a 40 salários mínimos vigentes, e ainda, as demandas possessórias cujos imóveis não ultrapassem esse mesmo valor. No entanto, há causas que não tem conteúdo patrimonial determinável e, deva se atribuir qualquer valor, podendo o autor fixá-lo livremente. É o que ocorre com a ação declaratória de autenticidade do documento. GISELE LEITE - 24 JUIZADOS ESPECIAIS Portanto, ter-se-á pequena causa por vontade do demandante. Não há conceito uniforme para o que chamamos de pequena causa. As leis 9.099/95 e 10.259/01 fixam diferentes alçadas (uma a de 40 salários mínimos e, outra de 60 salários mínimos). O CPC prevê o procedimento sumário para causas cujo valor não ultrapasse 60 salários mínimos. Na execução provisória, dispensa-se caução a fim de se levar o bem penhorado a leilão ou praça, cujo crédito não seja superior a sessenta salários mínimos. E, por fim, não há reexame necessário das sentenças contrárias a Fazenda Pública quando a condenação não for superior a sessenta salários mínimos. Então, podemos concluir que pequena causa é aquela cujo valor não seja superior a sessenta salários mínimos. Foi dissonante a esse conceito a Lei 9.099/95 que mantém o limite de quarenta salários mínimos, nos casos ratione valores. Pode ocorrer que embora as causas sejam de pequeno valor, sejam também de grande complexidade jurídica ou fática e, que estão excluídas da competência dos Juizados Especiais. Enumera tais causas o § 2º do artigo 3º da Lei 9.099/95, são as de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, as relativas aos acidentes de trabalho, aos resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, bem como, as de interesse da Fazenda Pública, ainda que de caráter patrimonial. É certo que desde 2001 com a criação dos Juizados Especiais Federais pela Lei 10.259/01, as causas de interesse da GISELE LEITE - 25 JUIZADOS ESPECIAIS Fazenda Pública passaram a ser deduzidas perante estes órgãos jurisdicionais, limitada à órbita federal, não incluindo o plano estadual. Com a Lei 10.259/01 entenderam alguns doutrinadores que se revogou a proibição quanto às demandas que envolviam a pessoa jurídica de direito público estadual, distrital ou municipal, principalmente quando tratasse de causas cíveis de menor complexidade. Também são de grande complexidade as demandas coletivas sejam para tutela de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Incluem-se também nesse rol as causas que exigem o uso do procedimento especial. Não poderão tramitar perante os Juizados Especiais, causas como despejo por falta de pagamento, condenatória em pagamento, prestação de contas, procedimentos monitórios e mandados de segurança. Só é admissível nos Juizados Especiais um único procedimento que é sumariíssimo. A opção por esse procedimento importa em renúncia ao crédito excedente à alçada estabelecida, exceto no caso de conciliação. Assim, permite que uma grande causa (de expressivo valor econômico) torne-se uma pequena causa. Não se aplica o disposto no artigo 3º, § 3º da Lei dos Juizados Especiais Estaduais às causas cíveis de menor complexidade nos casos de competência ratione materiae, onde se poderá demandar sem que isso acarrete implícita renúncia ao valo excedente a quarenta salários mínimos. GISELE LEITE - 26 JUIZADOS ESPECIAIS Convém ainda lembrar do artigo 3º da referida lei que aponta a ineficácia da sentença do que exceder a alçada. Pois nesse caso, haveria sentença ultra petita, pois o demandante renunciou ao valor excedente. Frise-se que não há renúncia ao excedente no caso de conciliação, essa renúncia ocorre precisamente quando o demandante manifesta-se no sentido de prosseguir o feito em face da frustrada conciliação. Deve o juiz que preside a audiência informar ante a negativa de conciliação alertar ao demandante que prosseguir no feito significa renunciar ao valor que exceder a alçada aplicando-se o valor de artigo 21. Confirmando-se que quer o prosseguimento do feito, haverá ocorrido a renúncia ao que exceder a alçada dos Juizados Especiais. Poderá obviamente o autor desistir da ação, o que, não dependerá da concordância do réu e, assim, não terá havido renúncia, extinguindo-se o processo sem resolução do mérito. Novamente poderá o autor recorrer ao juízo comum. As causas cíveis de menor complexidade em razão da matéria são enumeradas no artigo 3º, II e III da Lei 9.099/95 e são as referidas no artigo 275, II do CPC e a ação de despejo para uso próprio. Arrola o artigo 275, II do CPC as causas em que será observado o procedimento sumário qualquer que seja seu valor. Causas que versam sobre arrendamento rural e parceria rural, cobrança de taxas condominiais, ressarcimento de danos em GISELE LEITE - 27 JUIZADOS ESPECIAIS prédio rústico ou urbano, por acidente de trânsito por veículo terrestre, cobrança de seguro, danos oriundos de acidente de veículo, cobrança de honorários dos profissionais liberais ressalvando a legislação especial e outros casos como ação revisional de aluguel e ação de adjudicação compulsória. Nota-se que a Lei 8245/91 que trata de locações somente há quatro anos anteriores à Lei 9.099/95 já antevendo a criação do microssistema especial dos Juizados Especiais fixou em seu artigo 80 que, todas as ações de despejos podem ser consideradas causas cíveis de menor complexidade. Curioso é notar que a hipótese permitida que é a de despejo para uso próprio, ou por analogia, para retomada do imóvel para ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, não é de fato de pouca complexidade, pois impende analisar a sinceridade do pedido. E pode acarretar instrução probatória laboriosa. Porém a chamada denúncia vazia ou imotivada não está incluída na Lei 9.099/95. A competência dos Juizados Especiais Cíveis para execução conforme prevê o artigo 3º, I da Lei 9.099/95. Há duas diferentes situações para analisar: a execução das própriasdecisões dos juizados e, a execução de títulos executivos extrajudiciais. No primeiro caso, a execução se processa de forma autônoma em relação a fase cognitiva. Desmoralizada a clássica dicotomia cognição/execução fixou a Lei dos juizados pelo critério funcional, optando pela competência do juízo do processo de conhecimento. A execução da sentença contemporaneamente é fase GISELE LEITE - 28 JUIZADOS ESPECIAIS complementar do processo que produziu sentença condenatória. A execução como segunda fase do processo vem caracterizar processo misto ou sincrético. As Leis 10.444/02 e 11.232/05 reforçam tal entendimento. Mesmo com a mudança de modelo processual o CPC achou necessário dispositivo que se refere a competência para execução da sentença ( artigo 475-P). No microssistema dos Juizados Especiais, a execução jamais fora processo autônomo, e, sim somente fase executiva (artigo 52 da Lei 9.099/95). A execução dos títulos extrajudiciais essa está restrita ao limite de quarenta salários-mínimos. Não havendo conciliação, o executado poderá oferecer seus embargos. Antes deverá o juiz, ou o conciliador, advertir que decidindo prosseguir na execução isso importará renúncia ao que exceder de quarenta salários mínimos. E, nada impede que ocorra execução perante juízo comum para pleitear a integralidade da obrigação. Novamente observe que a competência para execução de título extrajudicial trata-se de opcional. 2.2 A competência territorial dos Juizados Especiais Cíveis conforme o artigo 4º da Lei 9.099/95. O foro competente pela regra geral é a sede do demandado. Podendo este ter várias residências, ou vários domicílios quando poderá ser demandado em qualquer deles (artigo 71 do CPC). GISELE LEITE - 29 JUIZADOS ESPECIAIS Com relação às atividades profissionais mais será domicílio aonde tais atividades são exercidas (artigo 72 do CPC). Já se o demandado for pessoa jurídica de direito privado seu domicílio será o lugar de sua sede ou o fixado em seu ato constitutivo social. É competente também o foro do lugar onde a obrigação deve ser cumprida (art. 327 do CC), salvo se as partes convencionarem diversamente. Em regra normalmente as obrigações são quesíveis onde o lugar de pagamento é o domicílio do devedor. Mas poderá haver convenção das partes, e tornar-se obrigação portável aonde o lugar de pagamento for o domicílio do credor. O inciso III do artigo 4º da Lei 9.099/95 fixa a competência dos Juizados Especiais o foro do domicílio do autor ou do local do ato ou fato no caso de ação de reparação de dano de qualquer natureza. Afasta-se então do sistema comum do CPC, isso, pois o artigo 100, V do CPC atribui competência territorial ao foro do lugar do ato ou fato. É prestigiado o foro do demandante no microssistema dos Juizados Especiais Cíveis principalmente nas demandas de reparação de dano de qualquer natureza, o que evidencia uma competência mais ampla do que o sistema comum do CPC. Poderá o demandante livremente escolher o foro do domicílio do demandado, do lugar do cumprimento da obrigação ou, sendo reparação de dano, também o foro do seu domicílio ou do lugar do ato ou fato. GISELE LEITE - 30 JUIZADOS ESPECIAIS Registre-se que o critério territorial é um critério relativo, fixada na forma do artigo 4º da Lei 9.099/95 e visa atender imediatamente aos interesses das partes. O descumprimento dessa regra gera somente a incompetência relativa que não pode ser decretada de ofício. Conforme, aliás, o verbete cumulado pelo STJ nº 33. Alexandre Freitas Câmara faz destacar que muitos Juizados têm reconhecido de ofício a incompetência relativa (artigo 51, III da Lei 9.099/95) o que acarreta a extinção do feito sem resolução do mérito. É falsa a idéia de que toda causa de extinção do processo sem resolução do mérito é matéria de ordem pública, podendo ser reconhecida de ofício. Nada impede que possa ser invocada pela parte interessada, é o que se dá no caso de convenção de arbitragem, e o mesmo se dá com a incompetência relativa dos Juizados Especiais Cíveis. Não tem aplicação nos Juizados Especiais Cíveis o parágrafo único do artigo 112 do CPC que permite a declaração ex officio da nulidade da cláusula de eleição de foro incluída em contrato de adesão. A declaração de incompetência produz a remessa dos autos ao juízo competente. A incompetência absoluta pode e deve ser reconhecida de ofício pelo juiz e torna nulos todos os atos decisórios praticados pelo juízo incompetente. Já na incompetência relativa não há invalidação de qualquer ato, nem mesmo os decisórios. GISELE LEITE - 31 JUIZADOS ESPECIAIS Tanto no sistema comum como no sistema dos Juizados Especiais Cíveis a incompetência absoluta deve ser reconhecida de ofício enquanto a incompetência relativa só pode ser reconhecida mediante provocação do demandado. Mas diferem quanto aos efeitos da declaração de incompetência, pois uma vez reconhecida a incompetência o processo será extinto sem resolução do mérito (artigo 51, II e III da Lei 9.099/95). E a diferença dos efeitos é justificável pois não poderia determinar a remessa dos autos ao juízo competente, simplesmente porque nesse caso não há autuação (artigo 16 da Lei 9.099/95), em razão de sua simplicidade. Deveria o processo ser reduzido em ficha impressa onde consta o termo da resposta e o da sentença. Na prática, porém, os processos de Juizados Especiais Cíveis têm sido autuados, exatamente do mesmo modo como se dá nos processos dos juízos comuns, o que torna injustificável os efeitos da declaração da incompetência. 3 Unidade 3: Sujeitos do processo nos Juizados Especiais Cíveis 3.1 Sujeitos do processo nos Juizados Especiais Cíveis Intrinsecamente o processo se revela em uma relação jurídica, uma relação entre pessoas. A relação jurídica processual se forma entre o Estado-Juiz e GISELE LEITE - 32 JUIZADOS ESPECIAIS as partes, é de configuração mínima (Estado-Juiz, o demandante e o demandado). Mas pode ocorrer pluralidade de partes cujas principais manifestações são o litisconsórcio e a intervenção de terceiros. O Estado como sujeito do processo não se confunde com a pessoa natural do juiz, mero agente público. Nesse sujeito do processo não só se inclui o juiz, mas também seus auxiliares, como o juiz leigo e o conciliador. Os demais auxiliares da justiça tais como o escrivão e o oficial de justiça aplicam-se as regras comuns do CPC, salvo quando houver incompatibilidade com o microssistema dos Juizados Especiais. Dedica a Lei 9.099/95 os seus artigos 5º e 6º para tratar da proeminência do juiz impondo-lhe a direção e condição do processo, a fim de determinar as provas a serem produzidos, apreciá-las e valorá-las conforme as regras de experiência comum. Tem o juiz o poder de determinar quais provas que serão produzidas, o que implica, evidentemente, o poder de indeferir aquelas que sejam inúteis meramente protelatórias. Tais dispositivos são compatíveis com a visão moderna do processo civil que reconhece o interesse público no conhecimento da verdade e na solução dos casos concretos conforme o direito. Mesmo no juízo comum possuem os juízes poderes instrutórios. A rigor quanto às provas produzidas pelas partes devem GISELE LEITE - 33 JUIZADOS ESPECIAIS atender a celeridade processual que se desenvolve através de um procedimento de audiências, devendo ser proferida finda a AIJ, sendo esta o primeiro e único momento em que o juiz tem contato com a causa. É possível que o juiz determine de ofício, o depoimentopessoal das partes em audiência de instrução e julgamento, já que ambas estão presentes. Terá ainda o juiz a liberdade na apreciação da prova em equivalência harmônica com o artigo 131 do CPC. O sistema de valoração segue o mesmo critério do sistema comum do CPC que é o da persuasão racional ou livre convencimento do magistrado. Contrabalançando a liberdade de apreciar a prova, tem o juiz o dever de fundamentar sua decisão apontando os fatores formadores de seu convencimento. É certo que tal critério em certas e expressas situações cede a vez para o critério d prova legal que apesar de arcaico é ainda usado. Como por exemplo, quando se trata de provar a veracidade da alegação de que foi celebrado negócio jurídico cujo valor ultrapasse o décuplo de salário-mínimo. Onde a prova exclusivamente testemunhal não tem valor, não podendo o juiz valorá-la livremente (artigo 227 do CC). Assim, o artigo 5º da referida Lei declina que o juiz dará valor às normas de experiência comum ou técnica em equiparação ao que prevê o 335 do CPC. Não traz o artigo 5º a relevante ressalva nos casos em que seja necessária prova pericial. GISELE LEITE - 34 JUIZADOS ESPECIAIS O juiz pode e deve aplicar as regras de experiência comum ou técnica independentemente de existir ou não norma jurídica aplicável ao caso. Regras de experiência são aquelas que, conforme estabelece o artigo 335 do CPC, decorrem da observação ordinária que acontece, id quod plerumque accidit. E além da regra de experiência técnica que qualquer pessoa pode ter, e que independe de maior aprofundamento técnico. O artigo 6º aduz que escolherá o juiz a decisão que reputar mais justa e equânime atendendo aos fins sociais da lei e às experiências do bem comum. Há certa equivalência com o artigo 5º da LICC onde expressamente aduz que o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Impõe o artigo 6º da Lei 9.099/95 interpretação teleológica, mas o busilis está que a Lei dos Juizados impõe que se dê uma solução justa e equânime, o que não significa decidir por equidade. A regra geral no direito processual civil brasileiro é a jurisdição de direito onde decisão é preconizada a luz do direito objetivo vigente. E só em casos excepcionais há a expressa disposição legal na forma do artigo 127 do CPC autorizando o juiz decidir por equidade, livrando-se então dos estritos limites e ditames da legalidade positivada. É o que ocorre, por exemplo, nos processos de jurisdição voluntária por força do artigo 1.109 do CPC. Exerce-se nos Juizados não a jurisdição de equidade, mas de GISELE LEITE - 35 JUIZADOS ESPECIAIS direito a que é também reforçado por Cândido Rangel Dinamarco. Equânime revela equanimidade, etimologicamente descende do latim aequanimis, ou aequanimus, o que tem espírito moderado, benevolente, calmo. Oriunda da locução aequo animo = com ânimo igual, de boa mente, resignadamente. Portanto, equânimo é justo, imparcial, moderado, ponderado. Repisa, então o artigo 6º ao impor que o juiz decida com imparcialidade. Mas a solução do conflito pode advir do árbitro (artigo 25 da Lei 9.099/95). Espera-se do juiz atuante no microssistema dos Juizados Especiais uma postura moderna, principalmente no sentido de promover a autocomposição do conflito, e só em sendo inexitosa a conciliação dos interesses, buscar a solução heterocompositiva sintetizada pela sentença. Convém salientar que quando a Lei 9.099/95 refere-se a juiz muitas vezes, o adjetiva chamando-o de “juiz togado” o que não significa que literalmente deva o julgador envergar a toga pois de todo incompatível com os princípios da informalidade e simplicidade. A expressão quer indicar o magistrado concursado e titular das garantias constitucionais de vitaliciedade, irredutibilidade de vencimentos. O artigo 7º da Lei 9.099/95 refere-se ao juiz leigo e ao conciliador que são auxiliares da justiça recrutados preferencialmente entre os bacharéis em Direito e os GISELE LEITE - 36 JUIZADOS ESPECIAIS advogados com mais de cinco anos de tarimba profissional. O juiz leigo não tem ainda existência efetiva ao menos na maioria dos Estados da Federação Brasileira. No julgamento de causas de pequeno valor ou de menor complexidade a atuação do juiz leigo pode ser utilíssima além de aproximar a justiça do comum do povo. Sendo advogados tarimbados jamais poderiam ser chamados de “leigos” pois se o vocábulo nos remete ao comum do povo, dotado de senso comum de justiça. É importante frisar que o advogado atuante como juiz leigo fica impedido de exercer a advocacia perante o mesmo Juizado aonde atua. Por outro lado, o conciliador é presença constante e atuam no sentido de promover autocomposição participando ativamente das negociações entre as partes. A formação do conciliar deve ser adequada para mediar conflitos e, não necessariamente formação jurídica, o que demonstra um pecado infeliz da lei. Vejam que o advérbio “preferencialmente” permite que os conciliadores não tenham formação jurídica, sendo muitas vezes, estudantes de Direito. Além do Estado-Juiz, temos as partes. E há dois distintos conceitos sobre partes. O conceito de partes da demanda (o demandante ou autor e o demandado ou réu). Aquele que atua em nome próprio e em face daquele de quem a tutela jurisdicional é pleiteada. Por outro lado, há o conceito de partes do processo que corresponde a todos aqueles que participam, em contraditório, GISELE LEITE - 37 JUIZADOS ESPECIAIS da relação processual. Adquire-se essa qualidade pela demanda (é o caso do demandante), pela citação (o demandado e terceiros intervenientes) no de demanda forçada como a que se dá no chamamento ao processo, pela intervenção voluntária (como na pela intervenção voluntária como na assistência) ou pela sucessão processual seja mortis causa ou por ato inter vivos. Partes da demanda nos Juizados Especiais Cíveis sofrem série de importantes disposições da Lei 9.099/95, expressando quem não pode ser parte em qualquer dos polos da demanda e quem pode ser demandante (artigo 8º). Não podem ser partes perante os Juizados Especiais o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil. É por diversas razões que se ligam aos princípios formadores da Lei dos Juizados especiais. O incapaz não pode fazer concessão de seus direitos, posto que são indisponíveis, inviabilizando de plano a autocomposição. Todavia os relativamente incapazes com faixa etária de 18 a 21 anos podem atuar como demandantes embora tal previsão seja inócuo devido ao vigente ordenamento jurídico pátrio pois a maioridade pelo CC de 2002 é atingida aos dezoito anos completos. Alexandre Freitas Câmara antes da vigência do CC de 2002 acusou o art. 8º do referido diploma legal de inconstitucional por violar o princípio da isonomia. Tal dispositivo dava tratamento desigual a pessoas GISELE LEITE - 38 JUIZADOS ESPECIAIS juridicamente iguais. Sendo assim, incapazes, sejam de forma absoluta ou relativa, não podem figurar como partes perante os juizados. Também os presos e pouco importa a razão ou a natureza da prisão posto que impossibilitado de comparecer pessoalmente perante os juizados. Frise-se que a presença pessoal da parte é obrigatória nas audiências, ademais sendo uma das partes presa seria necessária a criação de segurança que não justifica em função de ser seara de causas de pequeno valor e de reduzida complexidade. Também são vedadas pessoas jurídicas de direitopúblico, posto que sua presença impeça por vezes (como no caso da União e das autarquias federais) que o órgão jurisdicional estadual conheça da causa, devendo o mesmo se desenvolver perante a Justiça Federal (art. 109, I CF/88). Por outro lado, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias ficam impedidos de atuar como partes nas demandas dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais. Apenas causas envolvendo interesses privados podiam ser deduzidas, mas com a aprovação da Lei 10.259/2001 que regulou os Juizados Federais passou a ser possível a presença da União e das autarquias federais no pólo passivo das demandas ajuizadas. Tal restrição, portanto, torna-se injustificável e significa um obstáculo ao acesso à justiça além de violar o princípio da isonomia. Exemplifica Alexandre de Freitas Câmara que na hipótese de GISELE LEITE - 39 JUIZADOS ESPECIAIS um acidente de trânsito provocado por culpa do motorista de um Ministério da Saúde, poderá a vítima pleitear a reparação de dano sofrido se o valor não ultrapassar a 60 salários mínimos em um dos Juizados Federais. Mas, se o motorista culpado do acidente fosse da Secretaria Estadual de Saúde, não se poderia levar a causa para os Juizados Especiais Cíveis Estaduais. Por isso, entende-se que em vigor a Lei 10.259/01 revogou-se a proibição quanto à presença de pessoas jurídicas de direito público das esferas estadual, distrital e municipal no polo passivo das demandas a serem ajuizadas nos Juizados Especiais. Permanecendo, porém a vedação de origem constitucional quanto à presença das pessoas jurídicas de direito público na órbita federal. Também não ser parte a empresa pública da União apesar de sua natureza da pessoa jurídica de direito privado, pois que acarretam a competências da Justiça Federal (art. 109, I da CF/88). No entanto, as empresas públicas estaduais e municipais podem perfeitamente participar de tais demandas bem como as sociedades de economia mista (inclusive a federal). Não podem ser partes ainda a massa falida e o insolvente civil, pois são administrados pelo síndico e administrador e estes não podem celebrar livremente acordos, senão com a participação de todos os credores da massa ou da concordata civil. O que dificulta bastante a autocomposição. A lei aponta que somente as pessoas naturais capazes podem GISELE LEITE - 40 JUIZADOS ESPECIAIS ser demandantes perante os Juizados Especiais Estaduais. Não podem demandar também os cessionários de pessoas jurídicas o que serve para evitar a cessão de direitos com único intuito de ter acesso aos Juizados Especiais. Não é verdade absoluta que somente as pessoas naturais podem demandar perante os Juizados Especiais, isto porque os microssistemas e empresas de pequeno porte também poderão fazê-lo, é o que decorre do art. 74 da Lei Complementar 123/2006. Também a Lei 10.259/01 tornou possível a participação das empresas de pequeno porte. Em resumo podem as pessoas naturais, as microempresas e as empresas de pequeno porte demandar perante s Juizados Especiais Cíveis, e acredita-se que se deve repensar a vedação quanto aos cessionários de direitos das pessoas jurídicas. Polêmica há quanto à possibilidade da demanda ser ajuizada por condomínios edilícios, muitos têm admitido seja na doutrina, seja na jurisprudência, usando por base no art. 3º, II da Lei 9.099/95 combinado com o artigo 275, II b do CPC. Outros, no entanto, lembram a natureza jurídica dos condomínios edilícios que são entes despersonalizados. Alexandre Freitas Câmara aponta enfaticamente que não podem, e expõe as razões: Primeiro, a lei expressamente cogita que somente as pessoas naturais capazes podem demandar e as únicas exceções são as microempresas e as empresas de pequeno porte. E evidentemente, condomínios não são pessoas naturais. GISELE LEITE - 41 JUIZADOS ESPECIAIS Há quem alegue por ser o condômino não exatamente pessoa jurídica corresponde a congregação dos interesses dos condôminos, que são pessoas naturais e, por esse entendimento, seria preciso demonstrar que todos os condôminos são pessoas naturais e capazes, o que dificultaria, seria de extrema complexidade. Ademais o art. 3º da Lei 9.099/95 combinado com o art. 275, II do CPC prever a possibilidade de cobrança ao condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio o que não implica necessariamente que seja perante os Juizados Especiais. Na lei civil pátria, existem dois tipos de condomínios, o comum ou geral e o especial (ou edilício). O condomínio comum pode incidir tanto sobre bens móveis como imóveis, em ambos tipos devem os condôminos contribuir para as despesas comuns. No condomínio edilício a obrigação tem abrigo legal no art. 1.336, I do CC e, o seu descumprimento gera a demanda a fim de cobrar tais quantias devidas e não pagas. O condomínio edilício por força do art. 12, IX do CPC tem capacidade processual sendo, porém pessoa natural, não sendo porém pessoa natural capaz, o que o impossibilita de demandar perante os Juizados Especiais. No caso de condomínio comum, este não possui capacidade para ser parte, assim deverá a cobrança ser ajuizada por algum condômino em face do inadimplente. E, nesse caso, sendo o condômino pessoa natural e capaz poderá demandar perante os Juizados Especiais Cível. A capacidade postulatória que é exercida por advogado por conta de comando constitucional do art. 133 da CF/88 que é GISELE LEITE - 42 JUIZADOS ESPECIAIS essencial ao funcionamento da justiça, o que é reforçado pelo art. 36 do CPC. Cabe também exceção a essa regra que é quando a parte postula em causa própria ou quando o processo tramitar onde não haja advogado, ou todos que houver, forem impedidos ou recusarem a causa. Essa é a única exceção a regra do sistema processual comum. Lembremos que em sendo a parte advogado, atuando em causa própria, não se afasta a incidência da regra geral. No microssistema dos Juizados Especiais não sendo o valor da causa maior de vinte salários mínimos a presença do advogado é facultativa (art. 9º da Lei 9.099/95). Sustenta com razão Alexandre Freitas Câmara que tal dispensa é inconstitucional, pois o advogado é indispensável à administração da justiça daí não ser possível admitir ser facultativa sua presença. Contudo o STF já se pronunciou em controle direto de constitucionalidade que não há qualquer incompatibilidade entre o art. 9º da Lei 9.099/95 e o art. 133 da CF/88. Sendo a causa superior a vinte salários mínimos, a presença do advogado é obrigatória e, se faltar, acarretará a falta de capacidade postulatória que é pressuposto processual. Por outro lado faltando ao demandado capacidade postulatória, será este revel com suas clássicas consequências. É possível que o juiz em face da miserabilidade do demandado recorra ao Defensor Público. GISELE LEITE - 43 JUIZADOS ESPECIAIS De qualquer maneira só no primeiro grau de jurisdição é que temos nas causas abaixo de 20 salários mínimos a dispensa do advogado, pois em grau de recurso, qualquer que seja o valor da causa, este será obrigatório. Indo o demandante a juízo sem ser assistido por advogado e, por outro lado, estando o demandado devidamente aparelhado por profissional habilitado, seja pessoa jurídica ou empresário individual. Poderá o demandante se quiser obter assistência judiciária por órgão instituído junto ao Juizado Especial Cível (art. 9º, § 1º da Lei 9.099/95). Deve essa norma ser interpretada extensivamente e, é importante frisarque dependerá da vontade da parte. Não existe no microssistema dos Juizados a figura do advogado dativo, que é aquele nomeado pelo juiz para patrocinar os interesses da parte que não se fez representar por advogado. Deverá o juiz alertar a parte que esta tem direito a um advogado e que este lhe prestará gratuitamente seus serviços. Não se trata de assistência judiciária gratuita ao hipossuficiente econômico e, sim, ao hipossuficiente jurídico. Relevante aduzir que sendo a causa de pequeno valor a exigência de advogado remunerado implica em obstrução do acesso à justiça. O acesso à justiça é garantia fundamental instituída pela CF/88, é dever do Estado assegurá-lo, desta forma, é igualmente dever prover advogado ou defensor público para atuar. GISELE LEITE - 44 JUIZADOS ESPECIAIS Se ambas as partes (pessoas naturais) estão sem representação de advogado e verificando o juiz que a causa exibe certa complexidade, o que vem a exigir advogado. Deverá o julgador advertir as partes sobre a conveniência do patrocínio de advogado e, se as partes quiserem, serão representadas por advogado custeado pelo Estado em atuação em órgão instituído por Juizados Especiais Cíveis (art. 9º, § 2º da Lei 9.099/95). O conceito de pequena causa é definido pelo valor que não ultrapasse a quarenta salários mínimos. Já o conceito de causa de menor complexidade não se confunde com o conceito de pequena causa. Também é curial alertar que nem toda causa de valor necessariamente de menor complexidade. É a matéria posta em debate no juízo que traduzido a complexidade da causa e da pretensão exigida pela exordial. Permite a lei que haja o mandato verbal ao advogado (art. 9, § 3º), dispensando-se a procuração escrita quando se limitar a conferir poderes gerais para o foro (cláusula ad judicia). Todavia se a parte pretende outorgar poderes especiais ao advogado, terá que o fazer por procuração formal (escrita). 4 Unidade 4: Pluralidade subjetiva no processo dos Juizados Especiais. 4.1 Pluralidade subjetiva no processo dos Juizados Especiais. GISELE LEITE - 45 JUIZADOS ESPECIAIS É sabido que a configuração ordinária da relação jurídica processual é tríplice formada por três sujeitos a saber: Estado- Juiz, o demandante e o demandado. Mas é possível surgir outros sujeitos que vem a incorporar-se a essa relação e pode vir acontecer por meio de intervenção de terceiros e a intervenção do MP, e litisconsórcios. O litisconsórcio pode ser ativo (vários demandantes) ou passivo (vários demandados) e, ainda misto (vários demandantes e vários demandados). Poderá ser o litisconsórcio necessário ou facultativo. Será necessário quando sua formação é essencial para que o processo venha compor a lide. Tal fenômeno está ligado diretamente à legitimidade das partes. E, é correto afirmar que em alguns casos a legitimidade é conferida a um conjunto de pessoas, de sorte que só se pode preencher essa condição da ação se todos os membros do conjunto estiverem presentes no processo. Pode ainda ser a necessidade dos litisconsórcios ser imposta expressa disposição de lei (como acontece por exemplo, na ação de usucapião entre aquele e, em cujo nome está registrado o imóvel e os proprietários dos imóveis confinantes) ou da natureza incindível da relação jurídica material deduzida no processo. De qualquer forma e, seja qual for a causa da necessidade do litisconsórcio só é possível no polo passivo, tendo em vista, que no polo ativo é inadmissível na sistemática processual vigente. Será facultativo o litisconsórcio quando sua formação depender exclusivamente da vontade de quem ajuíza a GISELE LEITE - 46 JUIZADOS ESPECIAIS demanda. É o caso dos credores solidários que se reúnem em face de devedor comum. Por outro critério poderá o litisconsórcio ser unitário ou simples será unitário quando o provimento de mérito tiver que ser comum obrigatoriamente a todos os litisconsortes, por causa da natureza incindível da relação jurídica de direito material. Será simples o litisconsórcio quando o resultado do provimento de mérito pode variar para cada litisconsorte, e independente do resultado em relação aos demais. O litisconsórcio simples implica existirem as demandas, quantos sejam os litisconsortes. No litisconsórcio unitário será um só resultado para todos os litisconsortes, devendo ser tratados no processo como se fosse uma só parte. Já no litisconsórcio simples por serem várias as demandas, que merecerá julgado separado, tanto assim que, a sentença será proferida em vários capítulos. Poderá o litisconsórcio ser inicial ou ulterior. Será inicial quando existir desde a formação do processo e, será ulterior ou superveniente quando se formar no curso do processo, no prazo da resposta. Todas as espécies de litisconsórcio poderão se manifestar nos processos que tramitam nos Juizados Especiais Cíveis. O art. 10 in fine solenemente expressa ser admissível o litisconsórcio de qualquer espécie. Porém o litisconsórcio simples por resultar a cumulação de demandas, só será admissível, nos casos em que a GISELE LEITE - 47 JUIZADOS ESPECIAIS competência é fora da em razão do valor, não excedente a quarenta salários mínimos. Não se aplica aos casos em que a competência dos Juizados Especiais se determina em razão da matéria pois nesse caso, o valor, da causa não tem qualquer relevância para a determinação da possibilidade de utilização do microssistema processual. A intervenção de terceiro é ingresso de um terceiro em um processo. Terceiro significa, no plano processual, todo aquele que não é parte do processo. A intervenção de terceiro poderá ser voluntária ou forçada. Será voluntária quando terceiro intervém por sua própria vontade, requerendo seu ingresso no processo. Já a intervenção voluntária pode ocorrer por três maneiras distintas: assistência, oposição e o recurso de terceiro. Na oposição que a rigor tem natureza de processo incidental autônomo onde terceiro ajuíza demanda em face das partes da demanda principal a fim de buscar o reconhecimento de que é seu o direito sobre o qual as partes litigam. No recurso de terceiro alguém que não é parte impugna através de recurso decisão proferida no processo de que não participa, mas que segundo alega, é capaz de produzir efeitos diretos sobre sua esfera jurídica. Na intervenção forçada, o terceiro é trazido ao processo por meio da citação, que o torna sujeito do processo do qual anteriormente não participava. Pode ocorrer em três modalidades distintas: nomeação à GISELE LEITE - 48 JUIZADOS ESPECIAIS autoria, denunciação à lide e chamamento ao processo. Na nomeação à autoria, o demandado indica o terceiro imputando-lhe a responsabilidade pelo fato descrito pelo demandante como sendo sua causa de pedir. Aceita a nomeação, cita-se o nomeado que passa a ocupar lugar do denominado original. Na denunciação da lide uma das partes da demanda ajuíza em face de terceiro, demanda regressiva condicional, alegando uma relação de garantia (própria ou imprópria) que geraria para o denunciado o dever jurídico de indenizar o denunciante no caso de sucumbência. Desta forma, essa demanda regressiva só será apreciada se o denunciante sucumbir na demanda principal. Só tem natureza de intervenção de terceiro quando ajuizada por demandado. No chamamento ao processo, o demandado provoca a intervenção de terceiro, nos casos em que tenha deduzido no processo uma relação obrigacional ou quando exista também uma garantiasimples. Além do devedor principal há o garantidor do credor que tem o dever jurídico de pagar em caso de não o fazer o devedor principal. Realizado o chamamento ao processo a sentença poderá condenar tanto o demandado original quanto o chamamento ao processo. Sendo o garantidor o pagante da dívida poderá valer-se da sentença como título executivo em seu favor para demandar a execução em face do outro condenado (devedor). GISELE LEITE - 49 JUIZADOS ESPECIAIS A partir do momento que o terceiro intervém, deixa de ser terceiro e passa a ser parte do processo, participando do contraditório. O art. 10 da Lei 9.099/95 alega que não se admite modalidade de intervenção de terceiro que deve ser interpretada de forma ponderada. Que na verdade só alcança as intervenções stricto sensu e alcançam a oposição e denunciação da lide. Não obstante a vedação há duas modalidades de intervenção de terceiro que devem ser admitidas, a nomeação à autoria e o recurso de terceiro são hipóteses especialíssimas que devem ser aceitas sob pena de corromper o acesso à justiça. No recurso de terceiro precisa ser admitido pois o recurso é interposto por quem deveria ter participado do processo, como litisconsórcio necessário. A não se permitir o recurso de terceiro cria-se um problema enorme pois que transitada em julgado a sentença contra esta não será possível a ação rescisória. A nomeação à autoria deve ser admitida nas causas a que se refere o art. 3º, IV da Lei 9.099/95 (demandas possessórias) cujos imóveis não ultrapasse a 40 salários mínimos. É possível que a demanda possessória seja ajuizada em face do detentor em vez de o ser em face do possuidor. Não se admite a intervenção de terceiro de qualquer modalidade. A intervenção do Ministério Público é prevista no art. 11 da Lei 9.099/95 que atua como parte da demanda ou como fiscal da lei (custos legis). GISELE LEITE - 50 JUIZADOS ESPECIAIS É de se excluir do processo dos Juizados Especiais na modalidade de parte pois as hipóteses cabíveis são incompatíveis com o microssistema. A legitimidade ativa do MP referente a causas que envolvam direitos indisponíveis, como é sua legitimidade ativa extraordinária para as ações investigatórias de paternidade. Por envolver o estado a capacidade das pessoas são causas de grande complexidade. Por outro lado, possui o MP legitimidade para demandar tutela coletiva para proteger interesses supraindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), tais causas igualmente excluídas do microssistema, não obstante o silêncio da lei. Porém revelador foi o art. 3º, § 1º da Lei 10.259/01 que expressamente excluiu dos Juizados Federais. Evidencia-se, portanto que o MP não pode ser demandante nos Juizados Especiais Cíveis. Quanto a atuação como custos legis previsto no art. 82 do CPC nas causas onde há interesses de incapazes, mas que tratam do estado da pessoa, poder familiar, tutela, curatela, interdição, casamento, ausência e testamento. As primeiras hipóteses do art. 82 do CPC são causas de grande complexidade. Por ser incompatível com a simplicidade, celeridade e economia processual típicas do microssistema dos Juizados Especiais resta afastada a intervenção do MP, sobrando apenas a possibilidade de atuação do MP em razão da matéria ou da qualidade da pessoa. Sustenta Alexandre Freitas Câmara que com a entrada em GISELE LEITE - 51 JUIZADOS ESPECIAIS vigor da Lei 10.259/01, revogou-se a proibição da presença das pessoas jurídicas de direito público estaduais, distritais ou municipais. Dificilmente se verá na prática a participação do MP nos processos em que tramitam perante os Juizados Especiais Cíveis Estaduais. 5 Unidade 5: Atos processuais 5.1 Atos processuais O processo é procedimento que se desenvolve em contraditório. E em sendo procedimento é composto por sequência de atos, atos processuais que recebem disciplina especial pela Lei 9.099/95. Na sistemática comum prevê o CPC que os atos processuais são praticados entre as seis e as vinte horas. Porém o art. 12 da Lei 9.099/95 prevê que os atos processuais podem ser praticados conforme as regras de organização judiciária. Merece destaque a existência de Juizados Especiais Cíveis itinerantes que possam ir até o local do acidente permitindo que o judiciário possa se aproximar do jurisdicionado. Quanto ao lugar dos atos processuais aplicam-se subsidiariamente as regras previstas no CPC. Mas em regra são praticados na sede dos Juizados Especiais Cíveis. Serão realizados fora dali, a vistoria, a inspeção judicial e a colheita das pessoas enumeradas pelo art. 411 do CPC. GISELE LEITE - 52 JUIZADOS ESPECIAIS Se precisar citar o demandado em outra Comarca, se valerá de carta precatória, mas segundo o art. 12, § 2º da Lei 9.099/95 tais atos serão requisitados por qualquer meio idôneo de comunicação. A rigor, não se expede carta precatória nos processos dos Juizados. A comunicação poderá ser feita via telefone, correio eletrônico e, isso corresponde à aplicação do princípio da informalidade e simplicidade do art. 2º da Lei 9.099/95. E que ficou mais evidente com a Lei 11.419/2006, que tratou da informatização do processo judicial. Os atos processuais são normalmente de forma livre, só sendo vinculada quando expressamente previsto na lei (CF art. 154, 1ª parte do CPC). Mesmo havendo a forma vinculada, e não sendo observada, ainda assim será válido quando atingir sua finalidade essencial conforme o princípio da instrumentalidade das formas. São públicos os atos processuais praticados nos Juizados mas há diferença quanto a documentação dos atos processuais, pois se o CPC impõe que todos os atos sejam documentados seja em mídia expressa ou digital, no microssistema vigora o artigo 13, § 3º da Lei 9.099/95 onde prevê documentação somente dos atos considerados essenciais. Os demais atos poderão ser gravados em fita magnética ou equivalente que será inutilizada após o trânsito em julgado da sentença. Frise-se que o processo dos Juizados não é autuado. Os atos GISELE LEITE - 53 JUIZADOS ESPECIAIS essenciais são: a demanda, a resposta do réu, a sentença que devem ser registrados por escrito, valendo-se fichas ou formulários. Nos demais atos podem ser gravados, como por exemplo o depoimento das testemunhas. O art. 36 da referida lei claramente aduz que a prova oral não será reduzida por escrito devendo a sentença relatar e fundamentar essencialmente sobre o que trouxe esclarecimento sobre o processo. A lei local disporá sobre a conservação das peças processuais. E qualquer destruição destas só é legítima quando dada a oportunidade das partes obterem cópias das mesmas. É possível a prática de atos processuais por meios eletrônicos desde que atendidos os princípios Infra Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil (Lei 11.419/2006). 6 Unidade 6: A invalidade dos atos processuais 6.1 A invalidade dos atos processuais. A invalidade é, pois a consequência de não se praticar o ato processual na forma prevista na lei. É, em outras palavras, o prejuízo decorrente do descumprimento do ônus de praticar o ato processual conforme o tipo previsto em lei. Pode-se pois dizer que ato processual inválido é o ato processual atípico. Há três tipos de invalidade processual, primeiramente se GISELE LEITE - 54 JUIZADOS ESPECIAIS violada a norma cogente que se destina a proteger interesse público, estar-se-á diante de nulidade absoluta (como se dá, por exemplo, quando se profere sentença não fundamentada).
Compartilhar