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1 Considerações sobre o teatro contemporâneo. Peter Brook MISSÃO DO TEATRO O desafio do teatro é ser vivo, interessante e tocar as pessoas; ultrapassar o nível banal que assola o mundo inteiro, ir além da facilidade do sórdido. "FRAGMENTS" "Fragments" é uma unidade, não fragmentos; é um conjunto em que há tanto alegria e afirmação do lado luminoso da existência quanto verdade trágica sobre a inevitável morte. O que fiz, com a anuência da mulher de Beckett, foi simplificar: com isso, pudemos ir ainda mais longe na pureza, para trazer à tona o verdadeiro Beckett. Há sempre que reatualizar as coisas, trazê-las para o presente, mas não pelo exterior -inserindo celulares ou ambientando a história em Bagdá para sublinhar o lado moderno. É preciso tirar o que nos impede de mergulhar a fundo. BECKETT LUMINOSO Tenho uma imensa afeição por Beckett desde os anos 60. Não me interessava em montar estas peças curtas porque buscava outras coisas na direção teatral e não via interesse em me submeter à disciplina aterradora de um Beckett. Tudo mudou quando vi a peça "Dias Felizes" nos EUA e na França. Senti que ele saía da prisão do pessimismo, de autor sombrio. Trabalhando na minha montagem de "Dias", percebi que Beckett via com lucidez a que ponto as pessoas são infelizes e como boa parte da humanidade vive numa prisão psicológica exterior ou interior. E senti a presença de um Beckett luminoso. SIMPLES PARA NÃO CORRER RISCOS? Se você for olhar todos os riscos que já corri... se hoje sinto que é mais correto fazer isso [buscar a simplicidade], não posso me importar com esses comentários. Gosto de falar antes de estrear as peças, apenas para não decepcionar as pessoas: quando usam o meu nome, algumas pessoas podem ter a impressão de que vamos em direção a algo espetacular. Digo que isso hoje não me interessa. INFLUÊNCIAS Aquele que não aceita influências é burro e pretensioso. Estamos envoltos em influências e criamos algumas. Dizer que isto é minha idéia, esta é a minha 2 assinatura é nojento. Por outro lado, acho que tudo o que dizemos na teoria sobre o teatro não tem valor algum se não é [dito] após um longo período de descoberta pessoal por meio de experiências. Sou contra os professores que ensinam o teatro por diagramas, flechas e teorias sociológicas. Os pobres estudantes começam a estudar o teatro pelas idéias; só depois colocam-nas em prática. CENA CONTEMPORÂNEA Por ter seguido um determinado caminho há 30, 40 anos, vejo que hoje tenho uma liberdade que, infelizmente, não existe para a grande maioria dos encenadores, pois a pressão econômica é tamanha que o diretor deve buscar fazer sucessos, coisas extraordinárias. Não há mais espaço para esforços que sejam parcialmente bem-sucedidos. É preciso emplacar 100%. Isso cria gente muito brilhante, mas que sofre a cada vez a pressão de estourar. Nunca aceitei essa pressão. MULTICULTURALISMO E CRÍTICAS Hoje, na Inglaterra e na França, há muitos grupos com atores de raças diferentes, totalmente integrados às trupes. Acho que o Centro Internacional de Criação Teatral influenciou de certa maneira nisso. O teatro é um lugar onde, apesar de todas as divisões, discussões e ódios, as pessoas de raças, culturas e religiões diferentes podem trabalhar tranqüilamente juntas para um projeto específico. Tudo o que se diz [a respeito de um suposto viés perverso do multiculturalismo, que banalizaria costumes de países subdesenvolvidos ao se apropriar deles] é um sentimento de intelectuais se masturbando por nada. REGRESSO AO ARTESANAL Nos anos 60, havia um movimento de esquerda que dizia que o teatro era elitista. Começaram então a surgir espetáculos encenados para 2.000, 3.000 pessoas. Hoje, é preciso reconhecer: por causa do cinema, da televisão e da internet, o elitismo cultural não mais existe. Tudo é acessível via iPod, internet. Isso permite ao teatro reencontrar sua verdadeira natureza, que não é elitista, mas é pequena, circunscrita. Podemos reencontrar o artesanato. Extraído da entrevista concedida a LUCAS NEVES São Paulo, quinta-feira, 03 de julho de 2008
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