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Amazônia Sustentável

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~ .~'.
-::-:o"
Visite_nos em
WWW.garamond.com.br
Martin (oy e Gerd Kohlhepp (coords.)
Amazônia sustentável
Desenvolvimento sustentóvel entre políticas públicas,
estratégias inovadoras e experiências locais
~ 'J' •.•',.r.i':';.. ': ~
...
Coleção
• A D'Fic'L SUSTENTA81L1DADE
Política energética e conflitos ambientais
Mareei BlIrsz/yn (org.)
• AGRICULTURA FAMILIAR •.: REFORMA AGR ..\RIA "'O Sf:Cl"I.O XXI
Carlos Guaflziroli/ Ademar Romeiro/ Antônio 8uaina;1I
Alberto Di Sabbotol Gilson Bitteneourt
• BIO(sóclO) D'VERSIDADE
e empreendedorismo ambiental na Amazônia
Joseli/o Santos Abrantes
• CONFLITOS [ Uso SUSTENTÁVEL DOS RECURSOS NATURAIS
Suzi Huff Theodoro (org)
• CONSTRUINDO o DESENVOLVIMENTO SOCIAL SUSTENTÁVEL
Metodologia de planejamento
Sergio C. Buarque
• DILEMAS DO CERRADO
Entre o ecologicamente (in)correto e o socialmente (in)justo
Suti Huff Theodoro (org)
• O VALOR DA N '\TliREZA
Economia e política dos recursos ambientais
José Arouelo Alota
• Ái\1A7.ilNlA
Geopolítica na virada do II1 milênio
Berla K. Bccker
Martin (oy e Gerd Kohlhepp
(c-.ls.) .
AMAZÔNIA SUSTENTÁVEL
Desenvolvimento sustentóvel entre políticas públicas,
estratégios inovodoras e experiências locais
Garamond
Copyrlght odos autores. 2005
Direitos cedidos pata esta edição à
Editora Garamond Ltda.
Caixa Postal 16.230 C.p 22.222-970
T.I.rax: (21) 2224-9088
E-mail: garamond@garamond.com.br
Co-editor:
TOBINGER GEOGRAPIIISCIIE STUDIEN
Herausgegeben von
D. Eb.rl.' 11.FOrSl'" G. Kohlh.pp' K.-II. pr.rr.r
Schriftleitung H. Eck
lI.ft 145
Sond.rband 20
Tübinger Beitrll.ge zur Geographischen Lateinamerika-Forschung
Herausgegeben VOR Gerd Kohlhepp
lI.ft 28
Diagramação
Maíra Alves
Capa
Estúdio Garamond
Revisão
Laura ZúiHga
Miche1le Strzoda
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS. RJ.
Sumário
In/rodução
Mar/in Coye Gerd Koh/hepp 7
Primeira parte
AMAZÔNIA NO ÁI\1BITO DAS rOliTICAS PÚBLICAS
Amazônia: perdida no rumo da história
Lúcio F/ávio Pin/o.......................................... 15
Amazônia: nova geografia, nova polllica regional e nova escala de ação
Bertha K. Becker 23
A Amazônia lfsustentávelU de ft-far;nQ e Lula
Neli Aparecida de Mel/o. Richard Pasquis e Hervé Théry ,.. 45
Análise das principais grandes obras de infra-estrutura
do P/alio P/uriallua/ (PPA) 2004-2007110 Amazônia
Roberto Smeraldi 63
Desenvolvimento sustentável lia Amazônia?
Dúvidas fia consolidação do Programa Piloto,
as recentes estratégias e a realidade amazônica
Gerd Koh/ hepp 75
A527
Amazônia sustentável : desenvolvimento sustentável entre politicas publicas, estraté.
gias inovadoras e experiências locais I Martin Coy e Gerei Kohlhepp (coord.). - Rio de
Janeiro: Garamond : TGbinger, Alemanha: Geographischen Instituis der UniversítlU
TGbingen. 2005
332p.
ISBN 85.7617-082-5
1. Projetos de desenvolvimento integrado. Amazônia. 2. Amazônia - Condições
sociais. 3. Amazônia - Condições econômicas. 4. Recursos naturais - Conservaçao -
AmazOnia 5 Desenvolvimenlo sustentavel • AmazOnia I. Coy, Martin. 11. Kohlhepp,
Gerd
05-3697. coa 338.9811
COU 33828(811)
ilfAP: uma sigla de esforço e colaboração
na região da Amazônia sul.ocidelltal
EIsa R. Alcnrfoza, Guillermo Rioja. Foster Brown,
Flavio Rio,,,, Alollica de los Rios e Ernesto Raez 97
l'o/ít;cas públicas l'o/ratlas para a a~t:,.icllftllrafamiliar e desenvo/vimellto
local .Hl!:;(elltál'l-'/ como desafio t' c//(lI1Cl' para a ai/ministração
1I11I11ici"al: " ca.\'() de Seio /)omiugo." do Capim (Pará)
/)ijrlc! Segebarr e José Cn.Hilll/O ,\!(lrlius Nunes 111
Todos os lIireitos reservados. A reprodução não.autorizada desta publicação, por
qualquer meio, seja tola I ou parcial, constitui violação da Lei nO9.61 0/98.
.'
Segunda parle
AMAZÔNIA ENTRE PROCESSOS GLOBAIS E DESENVOLVIMENTO LOCAL
O desenvolvimento entre tensões globais e locais:
uma leitura preliminar da Amazônia
A Iberlo A cosia 127
Projetos econômicos com povos ittdigenas:
experiências "acionais e internacionais
Pelei" Sc II,.oder 155
A 111fapela ferra 110Brasil: conflito,
sobrev;l'ê"cia e a interface rUr;al-lIrbaIlQ
A1// 1101/)' Ha li ,........... 1TI
A agricultura moderna em J,;[ato Grosso: riqueza e pobreza
João Ca rIos 8a rrazo ooooooooo. o. oo........ .•.•.•.•..•.. ••••••••••••. •••• .•• •••••......•.....•..•...... 189
CIJancese riscos de um desellvolvimellto slIstelltál-'el
regional lia Amazônia boliviana
Freddy lleinric!l e Marlilla Nellburger 197
O cllltivo de coca lia Amazônia colombialla:
l'isão dos produtores e implicações políticas
Cesal' Enrique Ortiz Guerrerro : 205
O sistema l/e assentamentos humanos na Amazônia colombialla
lar/n" .,..1rie/ Salazar 215
E~.tlI(IO!!ii"legratln,\' tio território e ecologia tia paisagem:
perspecti""s tle aplicação para a região amazônica
Lu;s Alberto Vil/a Durúu 223
Introduçõo
Martin Coyl e Gerd Kohlhepfl
A presente publicação é um trabalho conjunto da Rede Susam. A Rede
Amazônia Sustentável (Sustainable Amazonia - Susam) é truta dc um longo
trabalho científico de um grupo de pesquisadores de universidades do Brasil,
da Bolívia, de alguns países europeus e de organizações não governamentais
(ONGs) sobre a região amazônica com a temática "desenvolvimento susten-
tável", O objetivo foi. e continua sendo. unir os contatos existentes em uma
rede multilateral e interdisciplinar, e pôde ser realízado com o apoio financeiro
da Comissão Européia, no âmbito do Programa Inco.
Durante anos, a temática "desenvolvimento sustentável" tem de-
sempenhado um papel muito importante dentro da política de pesquisas
da União Européi~ (UE), revelando-se no empenho da UE e de alguns
países membros no Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropi-
cais do Brasil (PPG7).
Os parceiros da rede Susam são:
O Instituto de Geociências, Laboratório de Gestão do Território - Depar-
tamento de Geografia, Universidade l'ederal do Rio de Janeiro;
A ONG Amigos da TelTa - Amazônia Brasileira. cm São Paulo;
O Instituto Latinoamericano de Invcstigaciones Socialcs (lIdis) dn
Fundação Friedrich Ebert em La Paz. flolí"ía:
O gJUpo de trabalho do proressor l'c1ipe ~'iaI1silla. em La Paz, 1301í"ia;
- O Departamento de Políticns Sociais, London School ofEconomics
and Political Sciencc. 110 Reino Unido:
O Departamento de Geogratia. École Normale Supàicurc. em Pa-
ris. França;
- O Centro de Pesquisas sobre a Américl Latina ~. [nslillllo d\;.'(jeo-
grafia, Universidade de °l"libingen. na Alemanha. como coord~nn~
dor do projeto.
Pflll.~s~or litular lltl Dl:parlaJl1~lll(l lk G~ogr~(;:J tia Ul\i\<;..ISlll~úçlk Innshnll:k. ,-\uslri:J.
I'rllkssol lilul~r 110Dl:pal'l:l111l,'11l0tle G':(lgr:lJiJ tI:J lJl1i\ l'rsid:ld •..\k Tuehing..-n. ,\lcl11:Jllha
o objetivo central do trabalho da rede é a discussão e a elaboração de
estratégias e instrumentos de regulação, no sentido de contribuir para o
desenvolvimento regional sustentável da Amazônia. Para tal feito, é impor-
tante o diálogo intensoenlre a pesquisa aplicadanas diferentes disciplinas, as
políticas públícas, o planejamentoregional,maSsobretudo, como aspecto nm-
damental, considerar os interesses e as necessidades da população regional.
Para promover este diálogo, dois workshops, um, de 15 a 18 de junho
de 2003, e outro, de 3 a 5 de novembro de 2003, foram realizados em Belém
(PA).O motivo dos encontros foi o interessedos participantes da rede Susam
na discussão sobre estratégias de desenvolvimento sustentável. Os eventos
contaram com peritos oriundos da ciência e da prática e com representantes
dos mais diferentes grupos sociais das diferentes sub-regiões da Amazõnia
que realizam análise comparativa in loco.
A consolidação e a ampliação de uma rede como esta têm como meta
a intensificação das relações entre Europa e América Latina emuma
ne/work de pesquisas. Dessa forma, podem ser alcançados importantes
efeitos sinergéticos de modo a possibilitar a transformação dos resultados
obtidos em prática regional.
Nos últimos trinta anos, houve uma profunda mudança estrutural social,
econômica e espacial na Amazônia devido a processos de colonização e
urbanização naquela região. A esperança de muitos migrantes que vinham
para esta região, com perspectivas de lá pennanecer uma vida inteira, muitas
vezes foi desiludida. As cidades pioneiras, com rápido crescimento nos
últimos anos, e as'metrópoles regionais da Amazônia mostraram-se como
meta final, mas provisória para muitos migrantes. Condições de
desenvolvimento sustentável nas regiões rurais e urbanas são imprescindíveis
para a preservação dos recursos naturais e para o combate á pobreza
nesta região.
Não há dúvidas de que, nos últimosanos, a política de desenvolvimento
regional aprendeu experiências negativas de programas passados e tenta.
por conseguinte, uma retomada ao desenvolvimento sustentável. Isto está
sendo alcançado com grandes esforços por parte das organizações não
governamentais, principalmente na implementação de conceitos de
desenvolvimento sustentável.Querer-se-ia,pois, a proteção do meio ambiente
e dos territórios indígenas c dar incentivo às iniciativas locais para assegurar
fundamentos vitais da população regional.
INTlCOOÇlo
No âmbito das inieiativas estatais, o leque entre bes/ e wors/ prac/ices
era muito extenso. Isto porque, entre os atores estatais, dos mais diferentes
níveis, há conflitos de interesse e contradições entre programas de ideologia
de exclusivo crescimento econômieo eom medidas abrangentes de infra-
estrutura e a tradicional e desrespeitosa exploração de recursos naturais e
programas para o fomento regional de princípios de sustentabilidade.
Quem analisa os inúmeros programas e projetos realizados chegará à
conclusão de que justamente nas regiões mais problemáticas da Amazônia,
sob o ponto de vista ecológico e social, até hoje qoase não são praticados
modelos com orientação duradoura de desenvolvimento nos objetivos de
sustentabilidade. Isto se refere especialmente ás áreas de pequenos colo-
nos, às regiões de pecuária extensiva em latifúndios, à frente pioneira da
soja, avançando cada vez mais nas florestas tropicais, e à região urbana, na
qual vivem hoje cerca de 70% da população regionaL
Assim, os objetivos da rede Susam abrangem, sobretudo, a análise
das interações entre os meios rurais e urbanos e suas implicações para as
estratégias de desenvolvimento regional sustentáveL Continua a corrente
migratória de zonas rurais para áreas urbanas de desenvolvimentos dife-
rentes. De acordo com o meio ambiente de cada região, diferenciam-se
fundamentalmente os tipos de lugarejos da zona rural e os das áreas urba-
nas devido ao desenvolvimento demográfico, ao potencial econômico e ás
estruturas socioculturais.
Dois objetivos gerais uniram os membros da rede Susam nos dois
lI'orksllOps em 2003. Sobo ponto de vista científico, os resultados dos trabalhos
empiricos dos participantes do projeto foram apresentados, analisados
comparativamente e examinados quanto á sua aplicabilidade no âmbito de
conceitos estratégicos paraum desenvolvimento sustentável. A discussão foi
fundamcntada em bases teóricas diversas e métodos de trabalho da análise
dos diferentes aspectos das interações entre cidade e campo.
O lema da aplicahilidade dos resultados científicos na prática foi
discutido entre 1)"; particlpalltes do projeto. pessoas de poder de decisão.
locaiS e rL'gioll:.lis. 1..'lilfcl\.'ntL's s{akellOlders, Desta fomla, 0$ resultados da
pcsquis:.l eicntirlL'j (oralll colocados à disposição das instituições de
planejamento. a fim de dcspcrtar maior consciência para a relevância da
politica regional na.• rcb";I~\L'S entre cidade e campo. Tentaram-se avaliar
modelos de desennlh.in,,'nlu rural e urbano com base na sustenlabilidade.
Além disso, os obstáculos políticos, institucionais e financeiros para a
implementação de conceitos de desenvolvimento sustentável tiveram de ser
identificados e analisados segundo o ponto de vista dos user groups, de
forma a obter informações sobre pesquisas adicionais necessárias, orientadas
à aplicabilidade.
Nesse contexto, devem-se comparar o desenvolvimento nos setores
urbano e regional e as formas econômicas em diferenles partes da Amazônia,
e examiná-los quanto ao seu potencial para um desenvolvimento regional
sustentável.
Por esse motivo, os seguintes pontos foram acentuados:
A transformação da estrutura tradicional de desenvolvimento ur-
bano e regional e sua relação entre si;
Processos de desenvolvimento urbano como conseqüência da
interação rural-urbana;
Desenvolvimento rural em dependência do espaço urbano e
periurbano;
Políticas públicas, processos decisórios e planejamentos para regiões
urbanas e rurais;
Possibilidades de transferência de estratégias e políticas públicas
entre 0$ diferentes países amazônicos.
A análise das relações funcionais entre regiões rurais e urbanas e en-
tre os atores envolvidos deve servir para definir e categorizar as interações
socioeconômicas, espaciais e setoriais. Esta será a base para o conceito
teórico das relações rurais-urbanas.
Além do mais. deve ser elaborada a base teórica para estratégias adap-
tadas ao desenvolvimento regional sustentável e às relações rurais-urbanas
como sua parte integral.
Os princípios existentes de planejamento regional ecologicainente COI11-
patin'l, com base na sllstelltabilidade, devem ser avaliados e analisados quanto
ao sell \'alor c Ú Sll<ltransmissibilidade às regiões da Amazôni<t.
1J~\'er~()ser deSCIl\'oh'iJas estrat~gias de :,olw.';io par<teliminar obstá-
elll\l~ cqrllturais c políticos na implemcntaçào llL' Jl..'sclln}l\'imcnto susten-
tá\'cl em Ji\'crsas regiües da Amazônia.
O trabalho da rede SlISi.tl11 de\'e ser compreendido como medida par<tlela
às pesquisas indi\'iduais existcntcs c serve para apl\\ÜmJar o rdacionamento
hmoou(lo
europeu-latino-americano no campo da pesquisa e possibilitar, amédio prazo,
ativídades conjuntas em prol daAmazônia. Tudo isso com a esperança de que
projetos de desenvolvimento sustentável na Amazônia restituam estratégias
até então existentes, mas que, sob o ponto de vista ecológico e social, tinham
conseqüências destruídoras.
A publicação Amazônia sustentável apresenta, com uma série de con-
tribuições, na primeira parte, críticas, dúvidas, inovações e novas iniciativas
quanto aos princípios para a suslentabilidade das politicas públicas. Na se-
gunda parte, são analisados processos de desenvolvimento na Amazônia
que oferecem as chances e os riscos da suslentabilidade confOlme causas
globais ou regionais, locais, diferentes. O enfoque das exposiç.ões está na
Amazônia brasileira, mas algumas contribuições, com fins de avaliação com-
parativa, dedicam-se às regiões amazônicas nos países vizinhos: Peru, Bolí-
via e Colômbia.
O agradecimento dos editores é dedicado aos autores das contribui-
ções e aos colaboradores do Centro de Pesquisas sobre a América Latina,
na Universidade de Tübingen, em especial à doutora Martina Neuburger e
à geógrafa Elke Neudert, que muito se empenharam na realização dos
workshops e na preparação da impressão deste livro.
11
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Amazônia: perdida no rumo do história
Lúcio Flávio Pintol
A grande imprensa não se preocupa e não assume sua função na
tarefa de aproximar a agenda do cidadão da agenda da história. Principal-
mente a elite local, em sua mente colonizada, aeha que estar na Amazônia
é uma coisa sacrificante, provinciana. Nós estamos aqui porque nós não
eonseguimos sair, porque não eonseguimos ir para São Paulo, Rio de Janei-
ro, Brasília, Nova York ou Paris. No entanto, aqui é um lugar maravilhoso,
privilegiadopara o inteleetual. Porque aqui se faz história e a gente vê a
história surgir, se desenvolver, às vezes consumar o seu ciclo e terminar.
Eu, por exemplo, vi o ciclo do manganês no Amapá. Eu tinha 7 anos
quando navios carregados de minério começaram a sair do porto de Santana
e vi se exaurir, meio século depois, uma das mais ricas jazidas de um dos
mais estratégicos minerais do mundo. Os Estados Unidos, a mais poderosa
nação do- planeta, não tem auto-suficiência de manganês e por isso tem
uma política nacional, anual, para definir como obter esse elemento para
alimentar os altos fomos do parque siderúrgico americano.
Minha geração formou a sua consciência revoltada contra os embar-
ques de matéria-prima no porto de Santana para ser estocada nos EUA
como reserva estratégica. Achávamos que ali estava a personificaçno do
velho enclave colonial, que transfere as riquezas e deixa os ossos do ban-
quete. Desgraçadamente, agora que a Icomi (fruto da associação do grupo
nacional Caem; com a multi nacional americana Bethlehem Sleel) encerrou
o eiclo do manganês, a gente verifica que este modelo de enclave colonial
de velho estilo, apesar de tudo, ainda é melhor do que o atual. O alual é pior
do que aquilo que nos parecia a fáce velha do colonialismo espoliado!'. Se a
gente hoje compara o que foram os cinqüenta anos da CX3ust£in d...., uma da",
melhores jazidas de manganês do mundo e 31l11lisa o início da explon.1ÇÜO L'
Jornalisl:l, UelClll.
"
AlIi1âM SlISIlHT.bll.
alguma exaustão que já está ocorrendo nas áreas novas (como no caso do
estanho), chega-se à triste constatação de que nós andamos para trás.
A Icomi construiu a Vila Amazônia. Uma excelente vila, ainda que
segregacionista. Já a vila residencial para a fábrica que fornece a maior quan-
tidade de alumínio para o Japão (15% do total), a Albrás - maior do Brasil e
segunda do continente latino-americano - quem construiu foi uma empresa
estatal, a Codebar. O porto foi uma empresa estatal, a Portobrás (já extinta),
embora aquele terminal sirva quase exclusivamente apenas à Albrás, uma
empresa privada. Quando.se faz essa comparação, com todo rigor, chega-se
a um resultado que se conlTapõeá retórica do momento, do desenvolvimen-
to auto-sustentável. Realmente, a consciência social sobre as agressões
ecológicas, sobre relações de trocas desiguais, sobre a camuflagem do va-
Iar das mercadorias, estabelecido em mercados abertos ou fechados, tudo
isso não está em consonância, não tem coerência com a realidade fática.
Nós não temos essa percepção porque a agenda do cidadão é vazia.
A Amazônia é um capítulo extremamente complexo da história da
humanidade. Não é simples, embora se possa falar no velho colonialismo,
na velha relação de troca desigual do pobre com o rico. As formas de
consolidar esses mecanismos de exploração são extremamente sofistica-
das, é o que há de mais avançado na inteligência, seja de Estados nacionais,
seja de corporações econômicas de grande porte. Essas unidades de poder
podem cometer erros inacreditáveis e impensáveis. Como os grandes pro-
jetos de produção de celulose e de arroz do milionário norte-americano
Daniel Ludwig, no vale do rio Jari, entre o Pará e o Amapá, entre as
décadas de 1970 e 1980, que fracassaram por concluir que, trazendo uma
espécie vegetal de outra região tropical, essa espécie se reproduziria sem
problemas. Os responsáveis pelo empreendimento nem mesmo fizeram
um estudo elementar do solo. O projeto fracassou por ineficácia do em-
preendimento colonial.
Uma das maiores dificuldades da Amazônia é conhecê-Ia. É uma difi-
t:uldaue enorme, porque às vezes o conhecimento que nós temos é visual,
t.'mpírico. ou baseado nas teorias mais sofisticadas, que por vezes dispen-
SJm a realidade. Ainda mais agora, com as matrizes de computador.
A Amazônia está sujeita a um processo irracional, um processo que
lail'ez seja mais bem percebido por escritores, poetas, romaneistas que por
sociólogos, antropólogos e geógrafos. Ilá um momento em que a irracionalidade
parece que é um Behemoth, ou um Leviatã. Ela é autofágica, febril, delirante.
É concebível que se comece a construir uma hidrelétrica com um orçamento
de pouco mais de dois bilhões de dólares e se chegue ao fim com um custo de
dez bilhões de dólares? É concebível que você implante uma das maiores
fábricas de alumínio do mundo e no perlodo de vinte anos você entregue, só
de subsídio tarifário da energia, uma nova fábrica de graça, sem considerar a
relação de troca desfavorável entre exportar lingote de aluminio e no primei-
ro beneficiamento do valor agregado multiplica por quatro, sendo que o
beneficiamento é fora da região e do pais?
Quando se analisa o PAS(PlanoAmazônia Sustentável, lançado em abril
de 2003 pelo presidente Lula), e vê logo no início do plano o que diz quanto foi
investido na Amazônia nas últimas quatro décadas, o valor é chocante. Segun-
do os números do plano, tem sido seis bilhões de dólares por ano de investi-
mento. Em qualquer região do mundo, haveria desenvolvimento. Constrói-se
uma obra pública de dez bilhões de dólares sem que a região onde essa obra se
encontra se desenvolva. Como isso não acontece, é possível que se chegue á
conclusão de que não há vida inteligente nesse lugar, não há vontade nesse
lugar, esse lugar é destituído de gente e de história. Só num lugar onde não há
gente e não há história se pode admitir que um empreendimento de vinte anos
não tenha devolução do subsídio de energia, sendo a energia 30% do custo do
alumínio, que é o bem omais eletrointensivo domundo industrial.
Isso é um atestado da impotência da Amazônia. Em parte, a impotên-
cia dos que participam do processo, que poderiam perceber essa realidade
e transformá-Ia, em parte do Estado nacional e em parte daquela unidade
do poder público que tem poder arbitral.
Tenho convicção de que não existe Estado nacional no Brasil. E que a
forma federativa brasileira é a moldura da falência da Amazônia. A organi-
zação jurídica do pais jamais vai permitir que nós desfaçamos a realidade
dos eteitos mais importantes do processo de desenvolvimento da Amazô-
nia. que gera, PI,X perversidade inevitável, o subdesenvolvimento d:1 região.
Resultados qUl: contradizt:m {} enunciado do lllod('lo. dI..'ttldo ..•o.• modelos
formulados desde 1953. :mo cUl1siJ~rado 1I111111:.1rco. o inki~)do ma i."'; antigo
pklllcjamcnlo rc:gioll:.li do Brasil, ate hoje.
O Atlas do Desenvoh'imento - elaborado pelo I'NUD. Ipe" c pela
Fundação Joaquim Nabuco, com base no [ndice de D<~scn\'ol\"llll\:nto flu-
mano (lDH). mostra essas duas realidades claras. Apesar de lodo esse
•
investimento, nós, da Amazônia, crescemos menos do que o Brasil. A Amazô-
nia, que deveria ser a região com desenvolvimento mais acelerado para suple-
mentar a insuficiência da poupança nacional, cresceu menos. A nossa renda
per capita é pouco mais da metade da renda per capita nacional. A Amazônia
tem 61% do território brasileiro, 12% da população e SÓ 6,5% do PID. Nem
aritmeticamente o nosso perfil econômico corresponde à nossa realidade
demogràfica. A concentração da renda gerada na Amazônia é maior do que
no Brasil. a sonho de que aqui é a !Tonteira brasileira acabou. a sonho de que
aqui poderíamos realizar uma realidade diferente do Brasil continua.
Na década de 1970, quando começaram a ser rasgadas as grandes
estradas de integração nacional da Amazônia, a região não tinha ligação
física nem histórica com o Brasil. Somos a região tardia do Brasil, somos os
brasileiros atrasados (alguns gostariam de dizer: retardados). Nós não fa-
zemos parte da história brasileira. Dela, somos apêndice ou resíduo.
Temos um cxemplo dessa situação na documentação, encontrada
recentemente nos arquivos do Foreign affíce, em Londres, sobre a corres-
pondêncía entre a Arrnada inglesa baseada em Barbados, o embaixador da
Inglaterra no Brasil e o Ministério das Relações Exteriores, na época che-
fiadopor Lord Palmerston. A correspondência inforrna sobre o pedido do
regente na época da minoridade de d. Pedro lI, o paulista Diogo Antônio
Feijó, para que os ingleses invadissem a Amazônia para controlar uma situa-
ção dc revolta. a governo imperial tãria de conta desconhecer os fatos até
que a revolta fosse sufocada e os estrangeiros se retirassem. Mas a Ingla-
terra não aceitou a proposta, mesmo em caráter confidencial. O motivo
principal era que, para rln. não interessava naquele momento explorar a
Amazônia com ocupação colonial. Era mais rentável explorar a região por
intennédio do governo brasileiro.
Esse episódio é importante, pois temos aí todos os componentes da
hislÚri<l amazõnicn posterior. O Estado nacional dizendo que defende a
..\nKlzônia, que ~ o int~rprete da Amazônia. Os estrangeiros apontados como
Ih \.'\lhh;auorcs. explorando os recursos (1<.1t\mazôni3. Mais uma conivên-
1.'1;1. 1;;\"'l!:1. implíL'ilaOlllISlell~I\"a entre ambos para rcalizar um objetivo co-
IlHllll" [Irar pro\"CllO d:l rc,giJo.
()s resultados mais oslensi\'OS da "integração" da Amazônia são a des-
In:II;.ld dos rccursos naturais dJ rcgião e a drcnagem e concentração da
rl..'n~l.l~craJapela atividade eCllllômica. Por isso a fronteira cresce menos do
lA
1
;
que o próprio país. Apenas dois estados da Amazônia, depois de cinqüenta
anos de desenvolvimento regional, fazem parte do segundo Brasil (do primei-
ro Brasil, todos estão excluídos). a restante dos estados integra o terceíro
Brasil, na companhia dos estados nordestinos mais pobres (como o Maranhão,
de José Sarney, e Alagoas, de Fernando Collor de Mello), o que é um atesta-
do da falência das elites locais como atores para o desenvolvimento.
a presidente Lula lançou, em abril de 2003, em Rio Branco, uma pro-
posta de revolução, por meio do Plano Amazõnia Sustentàvel, para mudar o
modelo agrário até agora prevalecente pelo modelo florestal. E tudo () que
acontece na Amazõnia é devido à matriz do modelo agricola. Ainda não
surgiu o Iwmo florestal, só o !lama agrícola. Nós somos um povo
desmatador, de lenhadores.
Até recentemente, a frente de expansão na Amazônia seguia uma
irracionalidade com uma determinante muito clara: a floresta nada vale.
a conceito de valor era o VTN (valor da terra nula). Por quatro décadas,
foi esse o combustível da expansão da fronteira da Amazônia, da integração
da Amazônia ao Brasil.
a presidente propôs então que coloquemos o eixo no aproveitamento
da floresta, desenvolvimento sustentável, modelo agro-florestal. Em vez do
colono agncola, o colono florestal. Mas se nós analisarrnos a história recente
(os últimos cinqüenta anos na Amazônia), vemos que nenhum povo destruiu
mais floresta na. Amazônia que o brasileiro nesse periodo. Nós Jestruímos
17% da Amazônia, uma área equivalente a duas vezes o Estado de São
Paulo, que concentra 1/3 da riqueza nacional.
Um episódio importante aconteceu em 1976, quando o satélite Skylah
fotografou o maior incêndio que um satélite já tinha registrado. praticado
pela Volkswagel1, em Santana do Araguaia. A tecnologia mais sofisticada.
a do satélite, registrava a mais primitiva tecnologia do homem em aç:io, n
fogo. A Volkswagen se instalou na Amazônia não para montar n:ículos
automotores, que é sua especialidade, a única, mas para criar hoi. P1.'1:J
primcira vcz na sua história. E fracassou complctJlllenle.:\ indú ...ln;! Illol.
demo. no Illundo foma-sc anacrônica quando pcnelra na li.olllL'lr:1;111l;I/Ú.
nica. Rcgride décaJas. Ou séculos.
Apcs3rde se poder dizer que a Amazônia é vítima (k UI11\"dllll 1Il1)liL'-
lo de exploração colonial, as formas Je consolidação Jcssc l11\1lkl" ..,i"
sofisticadas. Por exemplo: esta fábrica da Albrús, que eSlã J cll1qiknla
quilômetros de Belém e que fornece 15%de todo o aluminio consumido no
Japão, é a maior fábrica japonesa de alumlnio do mundo, embora esteja a
vinte mil quilômetros do território japonês. Essa fábrica, para dar ao Japão
ganhos maiores do que recebeu, adotou uma nova forma financeira, que foi
a dupla paridade cambial. No auge da guerra comercial com os EUA, o
Japão praticamente tinha o seu câmbio controlado pelo Banco Central ame-
ricano. E para se proteger das imposições cambiais dos EUA, o Japão
adotou a dupla qualidade cambial a seu favor nos financiamentos que con-
cedia, como o da Albrás, no valor de oitocentos milhões de dólares. Quando
perde em dólar, o agente financeiro japonês transforma o contrato com a
Albrás para o iene e quando perde em iene transforma em dólar. É um
custo financeiro tão violento que, em 1987, apenas a variação cambial desse
empréstimo significou três vezes mais do que o orçamento do Estado do
Pará; ou seja, todos os gastos do governo mais os seus investimentos.
Esse exemplo nos mostra que essas unidades produtivas têm um po-
der imensamente maior do que o próprio Estado. E como nós não temos um
conhecimento do processo e nossa vida está desligada dos fatos concretos,
nós ficamos impotentes e incapazes de compreender o que está acontecen-
do diante dos nossos olhos. Somos meros espectadores da nossa história.
No momento em que o Japão fecha todas as fábricas em território
japonês e transfere para o Brasil a maior dessas fábricas, garantindo que
o Japão mantivesse sua infra-estrutura industrial, temos um periodo opor-
tuno para o Brasil. E que deveria ter sido de mobilização dos intelectuais.
Um momento para preservar e preparar a Amazônia a fim de entrar na
nova divisão internacional do trabalho. Estas são as possibilidades que a
história oferece, e não conseguimos aproveitá-Ias por despreparo.
Essas possibilidades estão se renovando sempre. Iniciamos um pro-
cesso, de/lagrado em 2004, com o inicio da produção de cobre. Inúmeras
tarefas que poderiam ser desempenhadas pela sociedade estão fora de seu
alcance porque a sociedade não vê. Hoje temos cobre, mas não temos
política para o cobre, sendo o Brasil um dos maiores importadores de cobre
do mundo. E mesmo produzindo cobre, vamos acabar tendo de continuar
importando cobre, poís não existe mais o arbitramento do Estado nacional
nesse setor da economia.
O presidente atual fez boas promessas, mas até agora realizou muito
pouco de concreto para cumpri-Ias. Temos uma continuação do modelo do
lúoo Fúm PIml
antecessor. E parece que a Amazônia só serve para gerar divisas, gerar
dólares para pagarmos a dívida pública. Assim, teremos uma retórica com
uma dissonância cada vez maior da realidade. Seja na direção que faz o
caminho da soja, ou o dos minérios.
Um fato relevante me ocorreu a partir de uma entrevista não publicada
que recebi, anonimamente, de alguém importante na região, o doutor Eliezer
Batisla. Na entrevista, concedida a duas pesquisadoras, ele afirmou que se
não tivesse ocorrido corrupção na construção da hidrelétrica de Tucuruí,
não teria sido preciso subsidiar a energia para o pólo de aluminio montado
em Belém e em São Luís do Maranhão (com a Alumar, da Alcoa e da
Billiton). Tentei, com a publicação da entrevista e com um deputado fede-
ral, que essa questão fosse pauta em Brasília. Mas ela acabou sendo arqui-
vada pelo Tribunal de Contas da União, sob a alegação de que já se tinha
passado muito tempo. Conto essa história para mostrar o dilema da região,
entre a história e a anti-história, entre a condenação a repetir o passado
colonial de todos os outros povos e a perspectiva do desenvolvimento sus-
tentável, do modelo /lorestal, da Amazônia identificada com a sua vocação,
com a sua determinação geográfica.
!
;1
"
11,.
j Amazônia: nova geografia, nova política
regional e nova escala de ação
Benha K. Becker1
Certamente a Amazônia brasileira hoje não é mais a mesma dos anos
1960. Intensas transformações ocorreram na região, mas esse fato é apreen-
dido de forma variada segundo motivações e interesses de diferentes ato-
res, ou nem mesmo é percebido por grande parte da própria nação brasilei-
ra. Perduramimagens obsoletas sobre a região, verdadeiros mitos. Não
apenas os mitos tradicionais da terra exótica e dos espaços vazios, mas
também mitos recentes que obscurecem a realidade regional e dificultam a
elaboração de politicas públicas adequadas ao seu desenvolvimento.
Historicamente, a ocupação da Amazônia se fez em surtos a partir da
valorização de produtos extrativos no mercado internacional. As metrópo-
les e o poçer econômico comandaram esses surtos. Inicialmente Portugal e
as companhias de comércio, a seguir a Inglaterra e depois os Estados Uni-
dos na passagem da mercantilização para a industrialização.
Uma primeira mudança no processo de ocupação só passou a ocorrer a
partir de 1960. A ocupação passa a ser continua no tempo e em maior exten-
são, rompendo O padrão em surtos e em áreas localizadas. O comando do
processo passa a ser do Estado brasileiro, com uma politica deliberada de
integração regional.
Em todos esses séculos, até então, o paradigma da relação sociedade-
natureza foi a economia de fronteira, em que o progresso é entendido como
linear e infinito, baseado na incorporação contínua de terras c recursos
nalurilis igualmente percebidos como inlinilos.
Nas duas últimas décadas do sécult> X.\.. Illudanças b('/l1 mais Jrásti.
cas ocorreram na r~gião, tanto em termos políti .....os c ~coJlômic{)s (('omo os
atores em cena, com suas múltiplas demanda:;;)L1l1anlo das politicas j1libli-
PeS4UIS3d'lra e pwfcssora emérl1a d,l lahllral,'orj" dc" \ i,;~!.i,' .~,' r."tntúrw .- Ocpart:1Il1enlll
de Geografia da Uni"ersidade Federal do Rio.te h!lell.l li 'I iV.
caso As populações tradicionais se organizam e se tornam atores políticos
significativos, a cooperação internacional financeira e tecnocientífica assu-
me influência crescente, e o terceiro setor emerge Como mediador de inte-
resses diversos, reduzindo o papel do Estado.
Hoje, novas e diversificadas tendências se confrontam na região, ge-
rando uma teia complexa de atores e relações que dificultam a compreensão
do processo de mudança e da ação política. Um esforço para desvendar tal
complexidade é, portanto, crucial.
Este texto tem, assim, como objetivo, contribuir para lima maior aproxi-
mação da realidade contemporànea da Amazônia, Segundo uma abordagem
geopolitica, e baseado em reflexões e pesquisas de campo sistemáticas, ana-
lisa, numa primeira seção, as profundas mudanças estruturais verificadas no
final do século XX, decorrentes da politica de ocupação do território
implementada nas décadas de 1960 a 1980, Em seguida, aponta tendências
de redefinição regional contemporânea referentes a uma nova geografia
amazônica e à superação da política de ocupação do território. Na terceira e
última seção, apresenta as novas políticas direcionadas à região e a uma nova
escala de ação, a Amazônia continental.
Ocupalãa da territ6ria e mudanlas
estruturais regionais em fins da século XX
As mudanças estruturais verificadas na região foram forjadas no bojo do
projeto nacional para acelerada modemi7.ação da sociedade e do território nacio-
nais implementado entre 1960 e 1985, em que a Amazônia assumiu prioridade,
sendo foco de uma politica de rápida ocupação de seu território que alterou
profundamente a região. Bases institucionais implantadas no periodo anterior
foram resgatadas, alteradas em suas funções, e novas foram criadas.
Projeto nacional e ocupação do território
Somente entre 1966 e 1985 se iniciou o planejamento regional efetivo
da região. O Estado tomou para si a iniciativa de um novo c ordenado ciclo
Lic devassamento amazônico num projeto geopolítico para a modernidade.
Nesse projeto, a ocupação da Amazônia assumiu prioridade por várias ra-
zões. Foi percebida como solução para as tensões sociais internas decor-
rentes da expulsão de pequenos produtores do Nordeste e do Sudeste pela
modernização da agricultura, Sua "eupação também foi percebida como
I
'\
"
BElTIlI K. BElXII
prioritária em face da possibilidade de nela se desenvolverem focos revolu-
cionários. Em nível continental, duas preocupações se apresentavam: a mi-
gração nos países vizinhos para suas respectivas Amazônias que, pela di-
mensão desses países, localizam-se muito mais próximos dos seus centros
vitais, e a construção da Carretera Bolivariana Marginal de la Selva, artéria
longitudinal que se estende pela face do Pacífico na América do Sul, signifi-
cando a possibilidade de vir a capturar a Amazônia continental para a órbita
do Caribe e do Pacífico, reduzindo a influência do Brasil no coração do
continente. Finalmente, em nivel internacional, vale lembrar a proposta do
Instituto Hudson de transformar a Amazônia num grande lago para facilitar a
circulação e a exploração de recursos, o que certamente não interessava ao
projeto nacional (Becker, 1982 e 1990).
Para acelerar a ocupação regional, modernizaram-se as instituições.
Em 1966 o Banco de Crédito da Borracha é transformado em Banco da
Amazônia S/A (Basa), que se tomou alicerce fundamental para a politica
de incentivos fiscais de crédito para a ocupação regional, e que permanece
até hoje; a SPVEA em 1966 é transformada na Superintendência de Desen-
volvimento da Amazônia (Sudam), recém-reformulada; em 1967 é iniciada
efetivamente a Zona Franca de Manaus, um enclave industrial em meio à
economia extra ti vista e próximo às fronteiras do norte.
Entre 1968 e 1974, o Estado brasileiro implantou uma malha tecoo-política
na Amazônia, visando completar a apropriação fisica e o controle do território
(Becker, 1990), Redes de circulação rodoviária, de telecomunicações, urbana
etc; subsidios ao fluxo de capital por meio de incentivos fiscais e crédito a juros
baixos, indução de fluxos migratórios parapovoamento e fommção de um mer-
cado de trabalho regional, inclusive com projetos de colonização, e superposição
de territórios federais sobre os estaduais compuseram a malha tecnopolitica,
A primeira crise do petróleo, em 1974, reduzindo a disponibilidade de
recursos. alterou a geopolitica regional, que se voltou para a exportação de
recursos naturais explorados em grandes projetos com financiamentos ex-
ternos, como o projeto hidrelétrico de Tucunlí, projetos minerais, cuja maior
expressão é Carajás, transformando assim a Amazônia numa grande fron-
teira de recursos nacional e mundial. O segundo choque do petróleo c a
súbita elevação dos juros no mercado internacional levando ti escalada da
divida externa esgotaram esse modelo, cujo último grande projeto foi o Calha
Not1e (1985), Esta fase foi marcada por intensos conllilos sociais e impactos
BI'TH.l K. Blo", .
I. A conectividade foi crucial para uma reglao que permanecera ate
enlão isolada como uma grande "ilha" voltada para o exterior. Estabeleceu
uma articulação do território, interna e sobretudo externa por meio das re-
des, em que sobressaem as de telecomunicações e as rodovias. Se e~tas
últimas estimularam a imigraç:"io e () destlorestamcnto, as telecomUnica-
ções permitiram forjar aliath;a..; l' parcerias.
2" :\ im/uslriali:,/rtio l'lllblllui uma importante mudança na estrutura
da ,,:col1omiu. De uma r":~I:iol'xtrativista, a Amazônia passou a ocupar o
secundo IU~~1I'110pais no \.~llor total na produ~'jo mineral. e o terceiro lugar
IlU'- \":1lor to~al na produl.;;:h1 d....b....ns de consumo duráveis, decorrência da
Zona Franca de: ~ 1:.1l1:lU",.
• redução da primazia histórica
- Inchação - problema de Belém-Manaus
ambiental • rós das redes de
- rede nJ"aH.•.bana • sem circulaçãollnformação
3. Urbanização - . presença material da cidade: • retenção da expa.nsão sobre a
estrutll"a do favelas floresta
po\K>amento • sobrelXbanização • I.e. sem • mercado verde
base produtiva • Jocus de actrnuação interna,
- arco do desflorestamento e primeira vez na história recente
focos de calor - base de iniciativas polfticas e
da gestão ambiental
• diversificação da estrulLl'"asocial
• formação de novas sociedadeslocais. sub-regiões
4. Organização conflitos socioambientais • conscientizaçãolaprerdizado
Social Civil - conectividade + mobilidade + polilico
estrutlJ"a da urbanizaçâo • organização das demandas em
sociedade projetos allemativos com
alianças/parceiros externos
• despertar da regiâo/conquistas
da cidadania
• fonnação de lJll vetor
tecnoecológico
• demarcação de terras indígenas
5. Malha • multiplicação e consolidação de
Socioambiental- . conflitos de terra e de Unidades de Conservação (UCs)
estrutura de territorialidade • Projetos de Gestão Ambiental
apropriaçãl} do . conflitos ambientais hlegrada (PGAIs) nos estados;
território Projetos de Demorstração (PO/A)
- capacitação de quadros
Zoneamento Ecológico-
Econômico (ZEE)
6. ntegração- • Amazônia como una região do
estrutura do - conflitos/construções Brasil
imaginário social
'-
Quadro 1 - Mudanças estruturais na Amazônia
ambientais negativos. Conflitos de terra entre fazendeiros, posseiros, serin-
gueiros, índios, e desflorestamento desenfreado pela abertura de estradas,
exploração da madeira, expansão agropecuária e intensa mobilidade espa-
cial da população, impactos por todos devidamente conhecidos.
Que lições podem ser extraídas da política regional de ocupação do
território? O privilégio atribuído aos grandes grupos e a violência da implan-
tação acelerada da malha tecnopolítica, que tratou o espaço como isotrópico
e homogêneo, com profundo desrespeito pelas diferenças sociais e ecológi-
cas, teve efeitos extremamente perversos nas áreas onde foi implantada,
destmindo, inclusive, gêneros de vida e saberes locais historicamente
construidos. Essas são lições a aprender como não planejar uma região.
Tais constatações, contudo, não devem fazer tábula rasa das mudan-
ças eslrulurais que acompanharam esse conflituoso processo.
I\Judanças estruturais
Há que reconhecer as mudanças estruturais (Quadro I) porquc são
polencialidades com que a região pode contar para seu desenvolvimento
(Becker,2001a).
Mudança estrutural PrIncipais impactos Novas realidadesnegativos
• migração/mobilidade do • acréscimo e diversificação da
1. Conectividade _ trabalho popuação
estrulura de ~desnorestamento • casos de mobilidade
articulação do • desrespeito às diferenças ascerx:lenle
território sociais e ecolôgicas • acesso à informação.
alianças/parcerias
• urbanização
• urbanização e industrialização
de Manaus. Belém, São Luis,
Marabá
- grandes projetos - -ecoromia • segLn:fa no paíS/vaiar lotaI~. Industrialização- de erclave~ prodLÇào mineraleSlrutura da • Subsidio à grarde empresa • terceira no pa&' valor total daeconomia • desterritorialização e meio prodl.çãOde bef'5 de COnsLmO
ambiente afetado tTucurUl) dll<iveis
- transnacionalização da
Companhia Vale do Rio Doce
(CVRD)
3. Uma terceira mudança fundamental se deu na estrutura do povoamento.
A Amazônia passou a ser uma floresta urbanizada; entre 1970 e 1996 a taxa
de crescimento wbano na região foi a maior do país. Em 1996,61 % da popula-
ção regional vivia em núcleos wbanos; e em 2000, 69,07%. O processo de wba-
nização trouxe o problema da inchação das cidades, núcleos wbanos sem servi-
ços para atender a população que se amontoa nas periferias, e de uma rede
rurnl-urbana constituída de aglomerados'rurnis, verdadeiros favelõcs ern que a
população reside, mas é mobilizada para atender a diversas tarefas no campo e
na cidade. Apesar desses impactos negativos, a urbanização é um elemento
fundamental para o desenvolvimento, porque os núcleos wbanos são os nós das
redes de informação, são um mercado de trabalho altemativo para a população
- podendo significar uma retenção da expansão sobre a floresta - e um mercado
verde para produtos da floresta que não têm valor no mercado internacional.
Fato novo: pela primeira vez na história recente da região, o urbano passou a ser
um lugar de acumulação interna de capital justamente no momento em que há
escassez de dinheiro público, observando-se inclusive, por vezes, um investimen-
to em tomo dos núcleos urbanos. Uma outra mudança na estrutura do povoa-
mento importante foi a desconcentração da população, ou seja, as cidades com
menos de cem mil habitantes estão crescendo mais, relativamente às grandes
metrópoles. As grandes cidades também cresceram, mas menos do que as cida-
des de cinqilenta mil, e sobretudo as de até vinte mil habitantes, ligadas em parte
à formação dos municípios, reduzindo a primazia histórica de Manaus e Belém.
A urbanização se adensou mais justamente onde houve maior adensamento das
rodovias e do povoamento, gerando um macrozoneamento regional: concentra-
ção do povoamento, das estradas, das cidades e das atividades econômicas ao
longo das rodovias, sobretudo no grande arco que contorna a hiléia, separadas
por grandes extensões florestais com baixas densidades demográficas.
4. Talvez a mais importante mudança tenha sido a que ocorreu Illl
eslrulura da sociedade, constituída pela organização da sociedade civil e
as conquistas da cidadania. Ela é decorrência da ação conjugada dos vio-
lentos conniloS soci<lis c ~1I11hit'rHais. da conectividade, da mobilidade da
população - um processo Jllloroso de conscientização e de aprendizado
social e político - t: da urbaniZ<.hl:ào, que veicularam a informação c trouxe-
ram lima diversificação social com a atirmaçào de grupos sociais "tradicio-
nais" e a fomlaçào de dtft..'n:nlcS segmentos da configuração capitalista.
pequenos produtores. IlI,:lltll.'lln..; comerciantes que não existiam em expressão
"
8EITIIAK. 8[(m
na região até então. A mudança e a diversificação da estrutura social, a
conscientização e o aprendizado político permitiram à população organizar suas
demandas em projetos alternativos e reivindicar o seu direito à região de forma
muito mais organizada graças, inclusive, às parcerias e alianças que não pode-
riam ser feitas sem as redes de telecomunicações centradas nos núcleos urba-
nos. A urbanização favoreceu o despertar da região na sua organização social
e política. Hoje, o político está estimulando a urbanização.
5. Importante mudança foi a implantação da malha socioambiental, ou
seja, uma verdadeira mudança na estrutura da apropriação do territó-
rio. O processo de ocupação trouxe imensos conflitos de terra e de
territorialidade, como é o caso, por exemplo, das populações indígenas, e
dos seringueiros reivindicando o direito ao uso dos seus territórios. Mas
desses conflitos emergiu a organização da sociedade e tal pressão, somada
às do movimento ambientalista, está na base de novas formas de apropria-
ção do território por grupos indígenas, seringueiros, pequenos produtores e
pela multiplicação das unidades de conservação.
6. Enfim, a Amazônia passou a ter uma nova imagem como uma
efetiva região do país, integrando-se na estrutura do imaginário nacio-
tlal. E nesse processo de conflitos e mudanças, elaboraram-se geopolíticas
de diferetl.tes grupos sociais e, fato novo na região, resistências à sua
livre apropriação externa, tanto em nível da construção material quanto
da organização social, que influíram no seu contexto atual.
A transição para novo rumo
Dois processos opostos têm como marco o ano de 1985. Por um lado,
o esgotamento do nacional-desenvolvimentismo inaugurado na Era Vargas
com a intervenção do Estado na economia e no território, cujo último gran-
de projeto na Amazônia é o Calha Norte. Por outro lado, neste mesmo
ano. um novo processo tem início com a criação do Conselho Nacional dos
Seriogueiros, simbolizando movimento de resistência das populaçôes io-
cais - autóctones e migranlcs - à expropriação da tcrra. A crise do Estado
e à resistência social, somou-se a pressão ambicntalista intclllaciollai e
nacional para configurar a Amazônia como Lima fronteira socioambiental
entre 1985 e 1996, apoiada num novo vetor de desenvolvimento -
tecnoecológico -, vetor entendido como a força resultante da coalescenciade múltiplos projetos.
Os conflitos das décadas de 1970 e 1980 transfiguraram-se, organizando
suas demandas em diferentes projetos de desenvolvimento alternativos,
conservacionistas, elaborados a partir "de baixo". Para sua sobrevivência, graças
às redes transnacionais, contam com parceiros externos, tais como ONGs,
igrejas, partidos políticos, governos. Tratam-se de experimentos associados á
biossociodiversidade, novas territorialidades que resistem á expropriação. Cada
um desses experimentos se desenvolve em um dado ecossistema, Com popu-
lações de origem étnica elou geogràfica diferente, estrutura sociocconõmica c
política, técnicas e parccrias diversas (8ecker, 1997 e 200 la). Enfim, a estra-
tégia básica desses grupos é a utilização das redcs dc comunicação que lhes
permitem articular com atores em várias escalas geográficas.
Mas o vetor tecnoecológico e a fronteira socioambiental por ele gerada
não se resumem aos projetos coletivos e seus parceiros. Dele participam
outros atores comoo G7, o Banco Mlmdial e o governo brasileiro. Inicialmente,
através do Prol,>rama Piloto para Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras
(PP-G7), e a seguir com a criação do Ministério do Meio Ambiente, dos
Recursos Hídricos e da Amazõnia Legal e sua Secretaria de Coordenação
dos Assuntos da Amazõnia Legal, que vem implementando uma política regio-
nal voltada para um novo padrão de desenvolvimento sustentável.
Se a lição ensinada por esse vetor é sua positividade social e ambiental,
há, contudo, que registrar dois problemas que impedem a sua plena expan-
são: a di ficuldade de inserção nos mercados, em virtude de carências
gerenciais, de acessibilidade e competitividade, e a Sua característica pon-
tuai. que não aleança escala significativa de atuação em tão vasta região.
Tais problemas se acentuam a pm1ir de 1996, quando uma nova fase no
processo de ocupação regional se configura. Fase marcada pela retomada do
planejamento territorial pela União. JOl1alecendo o ,'etor tecnoindustriaI que
pcnn3nccera 3ITeíecido na fase anterior. Tal '"elorreúnc projetos de atores
interessados na mobilização de recursos natur~is c de negócios, como el11-
presários, bancos, segmentos de- gO\'emos estaduais, federJis c das Forças
Armadas, estas preocupadas com a soberania sobre ri região.
O lançamento do Programa Brasil em Açjo em 1996. com sua :\~end<l
de Eixos Nacionais de Intcgrnç:'io c DL's~ll\'ol,.ill1eJHo ampliado como A:.ança
Brasil, para o periodo 1999-2003, é Ul1ll1lareona trajetória regional. Ainda em
1996, na tentalj\'a de ampliar a escala de sua atuação. o \.ctm tccnoecoló"ico
propõe o Projeto dos Corredores Ecológicos ou de Conservação no âl11bit~do
- ~
B'illll K. BEl""
PP-G7, grandes extensões constituídas de um mosaico de unidades de con-
servação, terras indígenas, e reservas florestais privadas. Corredores de trans-
porte e corredores de conservação consolidam, em 1996, políticas públicas
paralelas e conflitantes, que expressam o novo significado adquirido pela
Amazônia no processo de globalização.
Novo geografia Amazônico
o esgotamento do nacional-desenvolvimentismo, as mudanças estm-
turais, o processo de globalização e o não menos importante processo de
organização da sociedade civil provocaram tão rápida e abrangente mu-
dança na Amazõnia e no país, que é mesmo difícil captar as marcas do
novo contexto e definir diretrizes de ação. Tem-se como hipótese que tais
dificuldades decorrem, em grande parte, da vigência de concepções que
não mais correspondem á realidade regional e que devem ser superadas,
para o que se apresentam algumas propostas de reflexão.
A nova geografia amazônica
A primeira proposta de reflexão refere-se ao fato de que as novas
tendências nacionais, regionais e globais acentuarnm a diversidade interna
da região configurando nova geografia amazônica que urge considerar para
as ações de politicas públicas (Becker, 1999).
Com efeito, a dinâmica regional na década de 1990 foi intensa e apresenta
inov;]ções, como se pode verificar no processo de povoamento e no uso d;]terra.
No que tange ao povoamento, ressaltam: a) a continuidade do proces-
so de urbanização de tal sorte que, em 2000, 69,07% da população da re-
gião Norte habitavam núcleos urbanos; b) a redução relativa da imigração
e intensificação das migrações intra.regionais, destacando-se três novos
corredores de ocupação: o que segue pela rodovia Cuiabá-Santarém. o que
Sé estende pela estrada 1'0110Velho-Manaus continuando pela estrada que
taz ligação dc-sta ci(bJe com a Venezuela, e o do baixo Amazonas par;] o
:\mapJ: c) ,'ale aínd:l rl'l::!istrar o processo de descentralização adminislra-
ti\.~lcom a lllultipli, ..::I)';jp de no\'os municípios.
O usn da tl'lT:I :,c l'aracleriza pclu munutcnç:io de p:}(.1rõcs tr;juiL'iolliJisc
a cllleri!ência til' n,)\"ns.Por um lado, persiste a reprodução do ciclo expansão
da PC~I~~lria(.'\pl\ Ir;h;tlt I LI:I Illadeira/destlorestumento, porém não mais de for-
Ill~lt:io C.'\ll'lbl'.a, (11Ih.:clllrando-se nas áreas já povoadas c em frentes de
expansão localizadas ao longo dos novos corredores de povoamento. Por
outro lado, duas grandes inovações se verificam na região. A primeira diz
respeito à introdução da agricultura capitalizada. Ressalta a agroindústria de
grãos, principalmente da soja. Se os cerrados do Mato Grosso respondiam
até agora pela presença desta agroindústria, há numa nítida tendência de ela
se expandir por outros estados. Mas a capitalização da agricultura não se
reduz à expansão da agroindústria de grãos. É digno de nota o que se verifica
em tomo de Marabá, com a melhoria da pecuária com métodos mais intensi-
,"os de criação. A segunda inovação se refere aos eco negócios. É bastante
generalizada hoje na região a convicção de que é necessário melhorar o nível
de vida das populações como condição para proteger O meio ambiente. Pe-
quenos produtores, seringueiros e Índios tentam, assim, crescentemente, ven-
der e certificar seus produtos. Entretanto, grandes investidores vislumbram a
possibilidade de auferir grandes lucros com atividades de valorização não
predatória do capital natural, tais como a madeira certificada obtida pelo manejo
norestal, modemas plantações de açaí, ecoturismo.
Agroindústria, pecuária melhorada e produtos certificados consti-
tuem, sem dúvida, um incremento de produtividade até então estranho à
região. A essa tendência acresce o movimento vinculado ao mercado de
créditos de carbono, pela conservação ou replantio de florestas, na ver-
dade. a mais rentável das novas oportunidades econômicas regionais, mas
que tem fortes implicações políticas, tendo em vista o controle do território.
Uma observação atenta desses processos sugere que a Amazônia
não é mais apenas a grande fronteira nacional de expansão econômi-
ca e demográfica que respondeu pela formação do chamado "arco do
fogo" ou "do desflorestamento". embora frentes de expansão localizadas
persistam, muitas delas são induzidas por dinãmicas internas à região.
Nesse sentido, deve-se chamar a atenção para o dinamismo econômico
que '"em ocorrendo no Sudeste e Sul do Pará, Tocantins, Mato Grosso e
Rondônia que, na prática, toma obsoletas duas imagens sobre a região. A pri-
meira imagem tlJl. respeito no "arco do logo ou do desflorestamento", desig-
naçào absurda pJra l'S'i3 :Íreadinâmica, onde se localiza o Estado do {\1ato
Grosso -UIll dos maiores produtores de soja no país e no mundo - e o Estado
do Pará - onde. além da mineração. vem se desenvolvendo uma pecuária
melhorada. J)~rll1iIJ\'~II11t.'ntenão se trata mais de uma fronteira, mas sim
de uma árt.'3d~ PO\'OJIllt.'1l10consolidado. A segunda imagem diz respeito
"
BEll1llK. BmEl
à própria "Amazônia Legal", construção geopolítica que hoje se deleta com a
dinâmica socioeconômica do cinturão dinâmico que nem ecologicamente, nem
economicamente, nem culturalmente participa da Amazônia. Embora haja
interessepolítico em manter a "Amazônia Legal", esta e sobretudo o "arco
do fogo" não são mais designações adequadas para a Amazônia, na medida
em não expressam a realidade regional e, conseqUentemente, prejudicam a
concepção e as práticas das políticas de desenvolvimento regional.
É possível, assim, identificar três macrorregiões na Amazônia, com
características e demandas diversificadas, tal como demonstra a figura nas
páginas seguintes.
Da política de ocupação à de consolidação do desenvolvimento
As politicas públicas paralelas e conflitantes destinadas à Amazônia
expressam, em grande parte, o desconhecimento da nova geografia ama-
zônica que exige uma nova politica regional.
A acentuação da diversidade interna na região não se restringe ao incre-
mento da produtividade em certas áreas e ao cinturão dinâmico. A tendência
dominante na região hoje é a de consolidação do povoamento e de desenvolvi-
mento. E os estados amazônicos perseguem estratégias diversas para consoli-
dar o povoamento e alcançar o desenvolvimento sustentáve!. Todos incluem o
ecoturism~ como uma atividade básica, mas outras estratégias variam conside-
ravelmente em função de seus contextos históricos. culturais e politicos, da sua
localização geográfica e dos níveis em que foram afetados pelo recente pro-
cesso de ocupaçâo. Os estados do Mato Grosso, Tocantins e parte dos estados
do Pará, Maranhão, Rondônia e Roraima têm um modelo de ocupação extcn-
sivo em área, baseado na agropecuária. Em contraste, o modelo de ocupação
do Estado do Amazonas é pontual, fundamentado na concentraçào industrial
na Zona Franca de Manaus e pretende mantê-lo, mediante investimentos em
alta tecnologia. Contudo, os estados do Acre e do Amapá apostam el11l11odelos
baseados na utilização conserv3cionista da floresta.
Nno se trata mais, port.lllto, de ocupar () território. Ele jú está ocupa-
do, e espera-se que as florestas existentes sl:jam mantidas com suas r~s.
pectivas populações. No no\'o contexto. a prioridade uas políticas pllblicas
para a região não dc\'e ser mais a ocupação do território. mas sim a política de
consolidação do povoamento \'isando ao desel1\'ol\'iml:nto. almejndo hoje por
todos os grupos sociais. Para muitos deles, um dcsen\'ol\'imento sllstelllún:1,
embora estc conccito seja apropriado sob formas muito di"ersa5.
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Na virada do milênio a demanda da região por desenvolvimento entra
em sinergia com as novas tendências nacionais e globais.
A política preservacionista então estabelecida em contraposição ao de-
senvolvimento a qualquer custo, concretamente, resultou em três novidades:
a) formação de grandes reservas de capital natural por meio da ampliação das
áreas protegidas (Unidades de Conservação e Terras Indígenas) que, com o
projeto Arpa (Áreas Protegidas da Amazônia) em curso, representarão 30%
do território amazônico; recortes territoriais excluidos do circuito produtivo, mas
também sib'J1ificando proteção da floresta e da terra, que são bens públicos e
trunfos do poder do Estado; b) a presença de um novo ator na região, a "coope-
ração internacional", envolvendo ajuda financeira e técnica com múltiplos atores
- organizaçôes não governamentais (ONGs), bancos, agências de desenvolvi-
mento, organizações religiosas - com forte poder de agenda e cooperação
assimétrica; c) atenção especial aos grupos sociais excluídos, por meio da im-
plantação de novos modelos de uso do território, como as Reservas Extrativistas
(Resex) e os projetos demonstrativos para produção agrossilvicultural.
Hoje, na virada do milênio, inicia-se o uso do capital natural reservado
na década de 1990,acentuando-se a vertente da acumulação em contraposição
à vertente ambienta lista. Observa-se um processo de mercantilização de
elementos da natureza transformados em mercadorias fictícias, pois não
foram produzidas para venda no mercado (Polanyi, 1980; Becker, 200 1)-
que geram mercados reais, cuja regulação está em curso nos grandes fóruns
globais. É o caso do mercado do ar, por meio do Protocolo de Quioto, o
mais avançado; da Convenção sobre Diversidade Biológica, que procura
superar os conflitos quanto à propriedade intclectual. c de múltiplas agências
que tentam com grande dificuldade regularo uso global da água, considera-
da o "ouro azul" do século XXI. Além disso, cresce o consumo de fármacos,
extratos, cosméticos e de alimentos protéicos que não de origem animal,
como já sinalizado pela soja.
Poços de carhono - conhecidos ou não -. localizados não npenas na
Ama/ônia. al~lIIhse cstabekccndo, inc!usin= mediante c:ol1lpra dI.' ~rca~
florestais '-, cl:rtilicac;ão da madeira com base em mallL'Jo llort:staI por
grandes L'l1lpn:sas. econegócios para toda a SOrlt: ti..: produtores são sina-
lizaçõt:s da no,,;) tendência, fortalecidas pelo falO de o Ban~o l\lulloial
negligenciar o Seu papel de gestor no PP~G7 e ,'olt:.1r à sua Cunç;10 de
banco, finanCiando projetos diretamente nos estndos. Simultaneamentl'.
BEI1IIAK. BEan
expandem-se os investimentos de empresas multinacionais no agronegócio,
a partir do Mato Grosso, sobretudo da soja.
Em nível nacional, é imperativa a urgência da retomada do crescimen-
to econômico, com imprescindível inclusão social e conservação do meio
ambiente. O necessário aumento da produção, da produtividade e da flui-
dez do território - com a intensificação de redes de circulação, comunica-
ção e de energia - conciliado com a geração de emprego e a conservação
ambiental não é de modo algum trivial.
A valorização da base de recursos naturais toma-se um elemento crucial
na retomada do crescimento, haja vista o papel crescente das exportações
de soja e de carne no balanço de pagamentos, sobretudo da soja: A escala
de expansão alcançada por essa lavoura forma hoje um imenso cinturão
ocupando os cerrados do Mato Grosso, da Bahia, do Maranhão e do Piauí,
ex tendendo-se a oriente pelo Tocantins e pelas áreas desmatadas do Pará,
e a ocidente por Rondônia e, em breve, pela Bolívia.
Nesse contexto, um confronto gigantesco se configura entre dois mO"-
dos de uso do território, baseados em formas de produção em dois tipos de
ecossistemas distini:os, um uso atual e um uso potencial futuro:
De um lado, o uso atual, em expansão no cerrado, comandado por
grandes c~nglomerados internacionais - como a Bunge, Cargill, ADM _
e nacionais, como o grupo Amaggi, do governador do Estado de Mato Grosso;
sua produção é baseada na pesquisa e no desenvolvimento e são dotados
de logística poderosa, gerando uma forma específica de ordenamento do
território. A demanda de tal modo de produzir é por expandir a produção e
a logística, visando reduzir os custos de transporte para exportação.
De outro lado, o uso do território que aponta para o futuro nos ecossistemas
amazônicos florestais que têm baixa densidade de população, à exceção de
enclaves empresariais (que estão deixando, aliás, de ser enclaves) e das cida-
des, são utilizados pela economia extrativista elou pequena produção agricola.
Sem conhecimento científico pleno de seu potencial e de tecnologias adequa-
das à SU3 uttlizaçào, os ecossistemas amazônicos. no entanfo, dcn=m ser "Islns
hoje na imensa escala da Amazônia sul-americana, ~ demandam um nl{)(!c:io de
uso capaz de gerar liqueza e emprego e/ou trabalho sem destruir a floresta. o
que só poderá s~rconseguido condicionado a oO"as tecnologias,
O cinturão soja/boi vem provocando um revigoramcnto da fromeira
móvel, que penetra na noresta amazônica em três frentes de expansão ~0111
forte desflorestamento a partir do Sudeste do Pará em direção à chamada
Terra do Meio, e do Norte do Mato Grosso em direção à rodovia Cuiabà-
Santarém e ao Sul do Estado do Amazonas, para o qual se dirige um fluxo
que parte de Rondônia. Nesse contexto, as áreas protegidas tomam-sevul-
neráveis e menos capazes de barrar a expansão da fronteira móvel.
A administração desse confronto é um grande desafio para o governo
federal, na medida em que ambos os usos, o atual e o futuro, são essenciais
à economia e it sociedade nacional e que o confronto é acompanhado por
conflitos de governabilidade que afetam a face interna da soberania sobre a
região. O que não se justifica é destruir o potencial de um futuro _ jà pre-
sente - da Amazônia, em nome do uso atual, que tem grandes espaços para
se expandir no cerrado e nas áreas desmatadas. Além disso, a história do
Brasil está repleta de experiências desastrosas baseadas em monoculturas
orientadas para a exportação e dependentes da oscilação dos mercados
externos.
Os processos em curso revelam dois importantes fatos: a) o esgota-
mento do ambientalismo preservacionista como modelo de desenvolvimento
regional; b) o desafio de conceber um novo padrão de uso do território capaz
de promover o crescimento econômico e a inclusão social com conservação
ambiental, em que ciência e tecnologia assumem papel central. O outro não é
o sentido das atuais politicas públicas.
Políticos públicas atuais
Para a maioria da nação, as políticas públicas, pouco nrticuladas. não
permitem configurar um projeto nacional e o papel da Amazônia nesse
projeto. Sob a complexidade do atual contexto, contudo, é possivel identifi-
car um projeto nacional baseado:
a) na inserção competitiva para assegurar um lugar no ccnnrio cconõ-
mico e político globa Iem que o ajuste das contJS públicas. entendido C0l110
condição necessária à Jtração de in\'estimentos, c: o elclllento centrJI. Pé.lra
tanto, o crescimento das exportaçües assume prioridade. N() plano t:.'\.tcrno.
o projeto ainda incorpora a integração continental. necessária para ala!'!!ar
o espaço econômico nacional e ganhar força política:
b) no plano doméstico, enfatiza-se a questiio social - gcraç~10 de ri-
queza, trabalho e renda - Com conservação ambiclllal e a rcgiollalilaç~lü
das políticas.
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I
\ B[mu, K.B"xu
o novo signlf1cado do patrimônio naturai amazônico
para o desenvolvimento regional
A Amazônia hoje é uma questão nacional. Seu imenso patrimônio na-
tural pouco e ínadequadamente utilizado é um desafio à ciência nacional e
mundial, e também um instrumento de pressão externa para adesão ao
"norte" e de negociação do Brasil contra essa pressão.
As politicas públicas destinadas à região a um só tempo expressam e con-
foon3111 o no\'o contexto. Visam, corretamente, compatibilizar o crescimento
econômico com a inserção social e a conservação ambiental; paratanto, contu.
do, necessitam administrar intensos conflitos que resultam na paralisação das
ações, gerando uma perversa defasagem de tempo em relação às ações da
sociedade, muito mais ràpídas, e um forte clima de desobediência cívil.
São vários os planos formulados para a Amazônia:
a) O Plana Plurianual (PPA) 2004.2007, só no final do mês de julho
de 2004 aprovado pelo Congresso, é o núcleo diretor dos demais planos e
políticas que a ele devem se ajustar em ãmbito nacional e regional. Embora
correto em sua proposição, contém contradições dificeis de solucionar, tais
como promover o crescimento econômico com emprego e renda, tendo
como bas~a dinamização do consumo de massa, ao mesmo tempo que
estabelece a necessidade de elevar os investimentos e a produtividade, e de
reduzir a vulncrabílidade externa, o que pressupõe menos emprego e ênfa-
se nas exportações. A ênfase recorrente na regionalização das politicas e
programas é um ponto positivo no PPA;
b) O Plallo Amazôllia SlIslellfá,'el (PAS) representa um grande avanço
na política para a Amazônia, estabelecendo as diretrizes gerais para a ação
regional. Concluído em outubro de 2003, encontra-se ainda na Casa Civil, aguar-
dando compatibilização com o PPA. Fundamenta-se no princípio da
trnns\'I?I"Salidadee significa a inserçãoda variúvelambientalnaspolíticas setoriais,
princípio expresso na c,iação de Gn,pos de Trabalho Intenninisteriais (GTls)
para ~I.h.<in púhlica 'mrcgi50. Visando compatibilizar crescimento econômico,
1:l,.'J~l-..~itl..•ill.'l~1l ~ cons(,[Yí.lçào ambiental, t~1l1como mcta uma Amazônia 1110-
llCrlll/alb l.' alnblentalmenle protegida, abandonandoa posturapreservacionista.
:\tlndadl.': cslabl.:kce a conexão da ciência e tecnologia com a base de recursos
na!crai ... para lima 1Hl\'í.l inserção nos mercados e geração de emprego e renda.
SJ.\ ,.'mcu os eixos do PAS: I) produção sustentável com tt:cnologiJ
11l1l\'adtlra l.' \.'ompetiti\'idadc; 2) inclusão social: 3) gestào ambiental e
AMI.z!Ii.lllSlBn\vll.
ordenamento do território; 4) infra-estrutura para o desenvolvimento; 5) novo
padrão de financiamento. Além disso, contêm uma estratégia espacial ba-
seada na regionalização interna da região.
O calcanhar-de-aquiles do PAS é a infra-estrutura para o desenvolvimen-
to, gerando intensos conflitos, debates e resistências entreos "desenvolvimentistas"
e os "ambientalistas", estes em parceria com os produtores familiares;
c) O Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento.
O objetivo geral deste plano é promover a redução das taxas de desmatamento
na Amazônia, por meio de um conjunto de ações integradas - de ordenamento
territorial e fundiário, monitoramento c controle, fomento a atividades produti-
vas sustentáveis e infra-estrutura com base em parcerias entre governo, socie-
dade civil e setor privado. A expectativa é reduzir os índices de desmatamento
e queimadas, de grilagem de terras públicas e de exploração madeireira ilegal,
e aumentar a adoção de práticas sustentáveis e a capacidade institucional na
implementação integrada de medidas de prevenção e na viabilização de ativi-
dades produtivas sustentáveis. Realizado igualmente por um Grupo de Traba-
lho Interministerial e ajustado ao PAS, o plano já iniciou seus trabalhos;
d) O Plano BR-163 Suslefllável está efetivamente em ação, embora a
duras penas. A pavimentação da BR-I 63 (rodovia Cuiabá-Santarém), aber-
ta na década de 1970, tomou-se o foco da guerra entre "desenvolvimentistas"
e "ambientalistas", e é emblemática no contexto atual da Amazônia. Em face
das pressões dos dois grupos, o governo federal decidiu criar um novo mode-
lo para a implantação de-cstradas na Amazônia, partindo do pressuposto de
que não é a estrada em si que necessariamente provoca desl1orestamcnto e
expropriação dos produtores familiares, mas sim o modo pelo qual a estrada
é planejada. Foram estabelecidas como medidas prévias a regularização
fundiária, prevista pelo Inera a ser concluída em um ano (o que é difkil).
ações emergenciais, consultas à sociedade c audiências públicas (já rt.'ali.-:a-
das), o Estado do Pará já realizou um ZEE para lodo o seu território, c a
Agência de Desenvolvimento da Âmazônia (ADA). ex-Sud~lIll. iniciou um
outro detalhado. para 200 km1 em t0l110 lb rodm'ia" Inici:ldo em agosto (200-1).
o plano teria sua primeira versão pronta no linal ún mesmo.
Enquanto isso, contudo, lima enomlt.' grilíJgcm de.:tcn-as públicas _
tcita, aliás, com uso de tecnologia de satéliles -, acompanhada de explora-
ção desordenada da madeira e de grande agressi\"idadc: dos fazendeiros,
JcrescerHa obst,ículos ao planejamento,
,
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BII1llA K. BEaII
c) A Política Nacional de Desenvolvimento Regional, ajustada ao
PAS, é outro elemento da ação pública a considerar, Entendendo que as
políticas para as regiões devem partir de uma visão nacional, essa política
se baseia na identificação de mesorregiões para as quais deve ser formula-
do um planejamento específico, no contexto dos princípios gerais. Tal ótica
é fundamental, sobretudo, para a Amazônia, onde condições históricas, geográ-
ficas, econômicas e culturais geram demandas e possibilidades de parcerias
diversas, c a possibilidade de reduzir a pulverização de recursos favorecen-
do a tão almejada presença do Estado.
Mudanças em nível global,nacional e regional em sintonia indicam
que a valorização do patrimônio natural amazônico é imperativo e urgente,
para atender às demandas sociais e à competitividade internacional.
Mas o desafio que se impõe não é trivial. Ele exige o uso do patrimônio
sob uma nova ótica que supere a falsa dicotomia entre desenvolvimento e
preservação ambiental. Para tanto, três estratégias parecem cruciais:
a) o fortalecimento institucional;
b) a estratégia espacial, por meio da regionalização, ajustando os prin-
cípios das políticas públicas às diferenciações internas, de modo a melhor
atendê-Ias c a não desperdiçar recursos, Outra questão associada à
regionalização é o reconhecimento de que a Amazônia hoje deve ser pen-
sada na escala da Amazônia sul-americana, tendo em vista a cooperação
em termos do uso dos recursos e da garantia de soberania;
c) o uso do conhecimento científico-tecnológico e a inovação como funda-
mento de um novo modo de uso do tenritório para impedir a destruição da
iloresla, atribuindo-lhe valor econômico para que possa competir com as
comf1lodities e a exploração madeireira convencional. A utilização econômica
da biodiversidade é a mais flagrante prioridade. Tendo em vista os imperativos
inadiá\'eis de inclusão social, c não apenas de competitividade global, a inovação
tecnológica não pode se ater a tecnologias de ponta, mas sim considerar dife-
rentes níveis tecnológicos, desde as mais sofisticadas às mais simples técnicas.
O Brasil já realizou importantes revoluções cientilico-lCcnológicas,
tais como a exploração do petróleo em águas profundas. a Embracr, a
transfomlação da cana-de-açúcar em combustível na i\lata :\tl5.ntica, a COf4
reção das condições ecológicas do cerrado, que permitiu a lavoura da
soja e outros grãos. Já é hora de realiz:lr outra para O~ CÚ)s";lstemas
nOl"estais amazônicos.
Integraçlio d. Amazônia sul-americana
A integração continental é parte do projeto nacional pelas razões aci-
ma assinaladas. No caso dos estados amazônicos pelo menos mais duas
ponderações devem ser acrescentadas:
a) Importância da escala do capital natural da Amazônia sul-americana
dos mais extensos do planeta, que constitui um trunfo para o desenvolvimen~
to se aproveitado adequadamente com tecnologias avançadas, e também
um fato: poderoso de barganha no cenário econômico e político. A exigên-
cia conjunta dos países amazônicos pela urgente regulação dos mercados
do ar, da vida e da água será certamente uma força que beneficiará a
todos eles; .
b) As dificuldades a que estão submetidos os paises sul-americanos
configurando um entorno de grande risco para o Brasil. Por um lado, registra-
se a c~nvulsãofinanceira e econômica da Argentina, abalando o Mercosul,
sugenndo que uma parceria amazônica poderia ser importante para reforçá-
lo. Por outro lado, assiste-se à crescente presença militar na América Cen-
tral e na fachada sul-americana do Pacifico. Após a Guerra Fria, verifica-se
a mtenção de transformar os Andes em mare nos/rum, utilizando a instabili-
da~epolitica dos países andinos e a Alca como contraponto estratégico. Essa
pohtlCa é patente na instalação de bases de operação avançada na Costa
RI."a, no Panamá, em Curaçau, no Equador, no Peru, na Bolívia e no Chile,
alem do Plano Colômbia, um verdadeiro "cordão sanitário" em nome de con-
tenção da crise colombiana.
A Amazônia brasileira constitui uma resistência à instalação de bases
e~trangelrasn~ terntório nacional e sul-americano. Nela, a incidência das pres-
soes da globahzação se faz pela cooperação internacional técnica, científica e
fi~anceJra, seja em projetos bilaterais, em grandes projetos com poderosos
~hados, ou em redes locais-globais de parcerias não devidamente conhecidas.
E c~rtoque tal cooperação assume por vezes autonomia excessiva, mas vale
regIstraro esforço ~o Ministério da Ciência e Tecnologia em assumir o Coman-
do nessa relação. E certo, também, que não há hoje condiçôes no mundo de
prescmdlr da cooperação int . I R I .. emaclOna, esu ta.aSSim,que a cooperação intcr-
naclOnalpodeserumimportant . . _ .. e mstnnnento na mtegraçao regIonal, estabelecidas
as negociações adequadas para eliminar uma cooperação assimétrica. É fácil
~ompreender que o TCA (Tratado de Cooperação Amazônica), em sua nova
\ ersão pode constItuir b tãn .. .. ,, su S ClaInstitucIOnala essa resistência e integração,
42
,
f,
1
.!
B"TlIAK.B,,,,,
Finalmente, uma proposta para reflexão: o que significa hoje integração
e como efetuá-la? Trata-se de uma reflexão de alerta, envolvendo múltiplas
questões, algumas das quais podem ser lembradas, tais como:
a) A passagem da cooperação para a integração envolve o reconheci-
mento e a compatibilização das diferenças, atribuindo especial importância
ao papel da negociação. Isso porque íntegração nlio significa homogeneidade
e perda de identidade, e sim ganhos em sinergia. Os oito Estados que par-
ticipam do TCA são muito desiguais em sua extensão geográfica, em seu
papel econômico e geopolítico e em sua presença nos organismos multilate-
rais. exigindo grande sensibilidade para lidar com essas diferenças;
b) No que tange à integração fisica, a proposta se fundamenta sobre-
tudo na infra-estrutura (URSA, 2002), entendida como capaz de, automati-
camente, gerar sinergia econômica e melhor qualidade de vida, O que é,
pelo menos, discutível.
Não se deve, c não se pode efetuar a integração segundo o modelo
ue ocupação amazônica dos anos 1970, baseado na extensão de rodovias,
indução da imigração e subsídios ao capital. Modelo que, em escalas va-
riadas, foi utilizado em todos os oito paises. Se o capital natural é básico
para a competividade regional, há que utilizá-lo de modo conservacionista.
E. sobretlido, não será possível promover a integração sem intemalizar
seu beneficios para as populações locais, sob o risco de afetar negativa-
mente a govemabilidade.
Ao que tudo indica, tecnologias avançadas terão um papel dominante
n3 integraç;io tisica dos oito países. envolvendo as redes de pesquisa; as
redes técnicas menos impactantes - de telecomunicações, de energia, de
circulação fluvinl com equipamento moderno, de circulação aérea -, o plane-
jamcnlo do liSO inlcbll"adoda água e dos eixos transfronteiriços; a biotecnologia,
p3ra aproveitamento imediato da biodiversidade.
QUJnto à IIlkrnalização do desenvolvimento em nível local, as lições
~lpfl:ndidas cnsinmn ser necessários; a definição de uma base econômica
I.'tlI11p('liti,'acm rebç:io ao narcotráfico. envolvendo a agregação de valor
,!tl:. rl.....:lIrsn~ 113turaislocais; a utiliznção dos equipamentos tenitoriais exis-
11..'1111.. •••• constituíuus pebs redes de circulação e comunicação que convergem
!1tI..; nllck'os urbanos; o f0l1alecimento das economias solidárias de fronteira,
\.'111que cidades gêmeas e fluxos transfronteiriços representam embriões de
IIl!l.'grJçoioa serem reforçados e convenientemente geridos.
43
Referências bibliográficas
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