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UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO PROCRASTINAÇÃO PARA O ESTUDO E AUTOEFICÁCIA ACADÉMICA EM ALUNOS DO 3º CICLO E ENSINO SECUNDÁRIO: RELAÇÃO COM O RENDIMENTO ESCOLAR E O NIVEL SOCIOECONÓMICO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO Anabela Silva Baptista Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro Orientadora: Professora Doutora Maria Cristina Quintas Antunes Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro Vila Real, 2013 UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO PROCRASTINAÇÃO PARA O ESTUDO E AUTOEFICÁCIA ACADÉMICA EM ALUNOS DO 3º CICLO E ENSINO SECUNDÁRIO: RELAÇÃO COM O RENDIMENTO ESCOLAR E O NIVEL SOCIOECONÓMICO. Dissertação de Mestrado em Psicologia da Educação Anabela Silva Baptista Orientadora: Professora Doutora Maria Cristina Quintas Antunes Composição do Júri: ____________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ Vila Real, 2013 Professor Doutor José Carlos Gomes da Costa Professora Doutora Susana Maria Gonçalves Coimbra Professora Doutora Maria Cristina Quintas Antunes ii Agradecimentos Em primeiro lugar, quero agradecer à minha orientadora, Professora Doutora Cristina Antunes, por todo o apoio prestado, pela disponibilidade, pela confiança e otimismo que sempre me concedeu durante todo este processo. Também quero agradecer à direção da escola, aos professores, alunos e especialmente à Dra. Amélia Moura pela forma como me receberam e pela colaboração prestada para desenvolver este projeto. À minha família, o meu sincero obrigado por acreditarem em mim e por saber que estão sempre ao meu lado e por todo o apoio, amor e carinho concebido. Às minhas colegas, Cristina, Camila, Diana, Tina e à Raquel que me acompanharam durante toda esta caminhada e que ajudaram nos momentos mais difíceis sempre com um sorriso, obrigada. Por último, mas não menos importante, quero agradecer ao José pelo incentivo e todo o apoio prestado, pela paciência e compreensão demonstradas, e acima de tudo pelo amor e carinho que me deram força para continuar esta etapa. E a todos os que de certa forma contribuíram com amizade e apoio, um muito obrigado! iii Resumo A procrastinação é um fenómeno complexo que abrange múltiplos fatores, nomeadamente fatores sociais, cognitivos e afetivos. São vários os estudos realizados nesta área, tendo demonstrado que este é um comportamento bastante frequente em diversos contextos, particularmente no contexto escolar podendo trazer consequências negativas para o rendimento escolar. A investigação procurado estudar a relação da procrastinação com outras variáveis, sendo a autoeficácia uma delas; no entanto os resultados dos estudos têm sido contraditórios. A primeira parte deste trabalho consiste na revisão de estudos empíricos enquadrados na problemática em questão. A segunda parte apresenta um estudo empírico com o objetivo de verificar a relação entre a procrastinação no estudo e a autoeficácia académica com o rendimento escolar e nível socioeconómico, assim como analisar do género, ano de escolaridade e habilitações dos pais nessas variáveis. O estudo foi realizado com 295 alunos a frequentar entre o 7º e o 12º anos de escolaridade, com idades compreendidas entre os 11 e os 19 anos. Os dados foram recolhidos através de um Questionário Sociodemográfico, da Escala de Autoeficácia Académica (EAEA) de Neves e Faria (2005) e do Questionário de Procrastinação no Estudo construída e validada por Rosário e Costa (2007). Os resultados demonstraram que os rapazes são em média mais procrastinadores do que as raparigas, sendo também as raparigas detentoras de maiores crenças de autoeficácia, particularmente na disciplina de português. Verificou-se uma relação significativa entre a procrastinação e o rendimento escolar. Também as habilitações dos pais estão significativamente relacionadas num sentido positivo com a procrastinação e a autoeficácia dos filhos. Das variáveis em estudo, a procrastinação no estudo para os testes é o melhor preditor para o rendimento escolar, operacionalizado pela nota no 3º período a matemática e a português. Palavras-chave: Procrastinação, autoeficácia, rendimento escolar, nível socioeconómico. iv Procrastination for the study and academic self-efficacy in students of the 3rd cycle and secondary education: Relationship with school performance and socioeconomic status Abstract Procrastination is a complex phenomenon involving multiple factors, including social, cognitive and affective ones. Several studies have been conducted in this area, having demonstrated that procrastination is quite common in many contexts, particularly in the school context, and may bring negative consequences for academic achievement. Research has pursued in the study of the relationship between procrastination and other variables, such as self-efficacy. Nevertheless empirical outcomes have been contradictory. The first part of this manuscript consists in the revision of the empirical studies concerning the problem under research. In the second part it is presented an empirical research with the aim of verifying the relation between procrastination and self-efficacy in academic context and their influence on school performance. It was also aimed to analyze gender and parental qualifications effects on these variables. The participants were 295 students attending 7th to 12th grades, aged between 11 and 19 years old. Data was collected through a Sociodemographic Questionnaire, the Academic Self-efficacy Scale (Neves & Faria, 2005) and the Procrastination in Study Questionnaire (Rosario & Costa, 2007). The results revealed that boys procrastinate more than girls, and girls hold higher self-efficacy beliefs, particularly in the subject of Portuguese Language. There was a significant negative relationship between procrastination and academic performance. The parental qualifications are significantly related in a positive direction with procrastination and self-efficacy of children. Procrastination was the best predictor of academic performance, obtained through Maths and Portuguese Language grades on final term. Keywords: Procrastination, self-efficacy, academic performance, parental qualifications. v Índice Geral Enquadramento teórico I ………….………………………………………………….…1 Introdução ………………………………………………………………..…….………2 1. Prevalência da procrastinação………………...……...……………………….……5 2. Conceptualização da procrastinação ………………………………………………6 2.1. Procrastinação crónica …………………………………………………………….10 2.2. Teorias explicativas da procrastinação ……………………………………………14 2.2.1. Teorias psicanalíticas e psicodinâmicas da procrastinação ……………………..14 2.2.2. Teoria dos traços da personalidade ……………………………………………...15 2.2.3. Teorias motivacionais …………………………………………………………...17 2.2.4. Teorias comportamentais da procrastinação …………………………………….17 2.2.5. Teorias cognitivo-comportamentais …………………………………………….19 2.3. Procrastinação em contexto escolar e académico …………….…………………...20 2.3.1. Procrastinação e motivação em contexto escolar e académico …………………24 2.4. Fatores psicossociais relacionados com a procrastinação ………………………...28 2.4.1. Género e procrastinação ………………………………………………………...28 2.4.2. Ansiedade e procrastinação ……………………………………………………..29 2.4.3. Autoestima e procrastinação …………………………………..………………..29 2.4.4. Família e procrastinação ……………………………………………………..…30 2.4.5. Tempo e procrastinação ………………………………………………………...31 2.4.6. Procura de ajuda e a procrastinação …………………………………………….31 2.4.7. Perfecionismo e procrastinação …………………………………………………31 2.4.8. Cultura e procrastinação ………………………………………………………...33 2.4.9. Valores de orientação e procrastinação …………………………………………35 3. Relação entre a perceção da autoeficácia e procrastinação e sucesso académico……………………………………………………………………………...38 4. Síntese …………………………………………………………………...……….…41 Parte II – Investigação de natureza empírica ……………………………...…………...43 1. Introdução ……………………………………………………………..…………….44 2. Método ………………………………………………………………………...…….50 2.1. Participantes …………..…………………………………………………………...50 2.2. Procedimentos …………………………………………………...…………...…...51 2.3. Instrumentos ………………...……………………………………………..……...52 vi 2.4. Apresentação dos resultados ………...………………………………………..…...56 3. Discussão dos resultados …………………………………………………...……….63 4. Conclusões …………………………………………………………………….…….69 Referências bibliográficas ……………………………………………………………..74 Anexos …………………………………………………………………………...….…86 1 Parte I Enquadramento teórico Anabela Silva Baptista Departamento de Educação e Psicologia Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro 2 Introdução A procrastinação tem vindo a ser estudada nas três últimas décadas por vários investigadores, visto ser um comportamento constantemente presente no quotidiano de várias pessoas e em diferentes contextos, interferindo de forma notória com a realização das tarefas, sendo a procrastinação mais elevada no contexto académico (Zarick & Stonebraker, 2009). A primeira análise histórica sobre a procrastinação foi descrita por Milgram (1992), que argumentou que as sociedades tecnicamente avançadas requerem numerosos compromissos e prazos, o que poderia estar na origem da procrastinação. Ferrari, Johnson, e McCown (1995), afirmam que a procrastinação tem existido ao longo da história, mas só começou a adquirir uma conotação negativa com o advento da revolução industrial. Antes disso, a procrastinação era vista de forma neutra e podia ser interpretada como um ato sensato de ação. Presume-se que pode haver alguma verdade na noção de que a procrastinação é uma doença moderna, uma vez que recentes pesquisas acerca da procrastinação indicam que esta pode estar em ascensão (Kachgal et al., 2001). Visto que a procrastinação poderá ser ao mesmo tempo um antecedente e uma consequência do desajustamento psicológico (Ferrari, Johnson & McCown, 1995) e comparativamente com outros construtos psicológicos, não deixa de ser surpreendente que a investigação tenha somente sido iniciada há cerca de vinte e cinco anos (Schouwenburg, 2004). Vários estudos têm demonstrado que a procrastinação (Chu & Choi, 2005; Ferrari, Parker, & Ware, 1992; Lay & Schouwenburg, 1993; Steel, 2007; van Eerde, 2003; Wolters, 2003;), as crenças de autoeficácia (Thakkar, 2009; Zimmerman, 2000) e a autoeficácia para a autorregulação da aprendizagem (Ferrari et al., 1992; Sirin, 2011; Tuckman, 1991; Wolters, 2003) são fatores importantes para compreender a construção das perceções dos sujeitos bem como, em contextos de aprendizagem, o seu nível de envolvimento na realização das tarefas académicas e consequentemente no seu rendimento escolar. No decorrer do tempo, vários investigadores têm centrado a sua atenção sobre este fenómeno, tendo sido realizadas inúmeras investigações no sentido de averiguar 3 quais as causas e que variáveis estão associadas a este comportamento. Vários estudos têm demonstrado a existência de uma ligação entre a procrastinação e a perceção que cada pessoa tem si e das suas competências para a realização das tarefas ou para enfrentar as dificuldades, embora ainda não esteja muito claro na literatura o modo como estes processos se relacionam (Costa, 2007; Klassen, Krawchuk, & Rajani, 2008; Steel, 2007; 2010; van Eerde, 2003; Wolters, 2003). Para além disso, alguns estudos apontam para a existência de uma ligação entre a procrastinação e a ansiedade, a depressão e a preocupação (Ferrari, Johnson, & McCown, 1995; Lay, 1994; Solomon & Rothblum, 1984; Rabin, Fogel, & Nutter-Upham, 2011; Steel, 2007; van Eerde, 2003). No entanto, outros, pelo contrário, parecem não encontrar uma relação significativa entre a procrastinação académica e a autoeficácia académica (Klassen, Krawchuk, & Rajani, 2008; Sirin, 2011). A literatura evidencia que ainda não existe uma relação clara entre o rendimento escolar e a procrastinação, encontrando-se assim estudos científicos que apresentam conclusões contraditórias (Klassen, Krawchuk, & Rajani, 2008; Lay, 1986; Scher & Osterman, 2002; Steel, 2007; Tuckman, 1998; van Eerde, 2003). Um conhecimento mais alargado acerca da relação entre estas variáveis é fundamental para melhor se compreender a procrastinação, de que forma surge e perceber como é que se mantém ao longo do tempo. Estes conhecimentos podem trazer muitos benefícios, sobretudo no contexto educativo, para a construção e aplicação de medidas eficazes de intervenção e prevenção deste problema. Como tal, com este trabalho pretende-se discutir algumas variáveis que podem estar relacionadas com os comportamentos de procrastinação em contexto escolar. Mais especificamente, este trabalho é realizado com base na revisão e análise de diversos estudos que explicam a relação entre a procrastinação e a autoeficácia académica em contexto escolar. É objetivo deste estudo analisar a procrastinação e a sua relação com a autoeficácia académica e com o rendimento escolar e ainda analisar a procrastinação em função das habilitações académicas dos pais e do rendimento escolar dos adolescentes que frequentam desde o 7º até ao 12º ano de escolaridade. Finalmente, pretende-se ainda verificar se a procrastinação e a autoeficácia concorrem como preditores do rendimento escolar. 4 A primeira parte deste trabalho funda-se na revisão dos estudos de natureza empírica dentro da problemática em estudo, enquadrando o problema de acordo com a literatura cientifica existente. Esta parte divide-se em vários pontos onde serão abordadas as várias conceções teóricas acerca da procrastinação, bem como a sua relação com determinadas variáveis. Por fim será realizada uma breve síntese sobre as principais conclusões dos trabalhos empíricos analisados e expostos. A revisão baseou- se numa pesquisa em revistas especializadas alocadas em bases de dados da ISI, pelo termo procrastinação seguindo como critério de pesquisa os últimos 20 anos das referidas publicações. Após esta pesquisa inicial, em que se pretendia encontrar os estudos mais relevantes dentro da problemática, procuraram-se ainda estudos nos repositórios universitários nacionais e em alguns motores de busca na língua portuguesa. Além disso, sempre que um artigo ou trabalho académico se justificava pela sua pertinência, ainda que com mais de 20 anos, foi incluído na análise bibliográfica, assim como obras de autores fundamentais no âmbito da problemática abordada. A segunda parte deste trabalho consiste na apresentação do estudo empírico desenvolvido com vista à prossecução dos objetivos delineados. Nesta parte será apresentada uma síntese teórica, bem como a metodologia utilizada, os resultados obtidos e a reflexão acerca destes, dentro de uma perspetiva que visa fazer a integração entre o conhecimento prévio e os resultados originais desta investigação. 5 1. Prevalência da procrastinação Toda a gente procrastina de tempos em tempos. No entanto, algumas pessoas tendem a procrastinar habitualmente, independentemente da situação, sendo chamados de procrastinadores, enquanto as pessoas que não têm este hábito, são designados de procrastinadores pontuais (Lay, 1986). Para uma grande parte das pessoas os comportamentos procrastinadores, com o tempo e com a frequência a que recorrem a este tipo de comportamento, tornam-se um estilo de vida. São vários os estudos realizados em diversos países que comprovam a existência de elevados níveis de procrastinação crónica nos mais variados contextos e tarefas. Num estudo realizado com adultos residentes nos EUA, Reino Unido e Austrália, Ferrari, O´Callaghan e Newbegin (2005) constataram que 11,5% dos participantes apresentaram níveis elevados de procrastinação por ativação e 9,9% procrastinação por evitamento. De acordo com Dewitte e Schouwenburg (2002) para cerca de 20% da população adulta não estudante, a procrastinação é geralmente vista como um grande problema, e para 40% dos casos, os comportamentos procrastinatórios foram causadores de perda financeira significativa. Embora o facto de a procrastinação ocorrer em todos os tipos de tarefas diárias e diferentes contextos (Alexander & Onwuegbuzie, 2007), é no contexto académico que este comportamento se manifesta em maiores percentagens, apesar de ser prejudicial para o progresso e sucesso académico dos alunos. Neste âmbito, já há bastante tempo, Solomon e Rothblum (1984) realizaram um estudo no qual os seus resultados permitiram verificar que uma percentagem elevada de estudantes universitários, com idades compreendidas entre os 18 e 21 anos, relataram possuir problemas de procrastinação em diversas tarefas académicas. Cerca de 46% dos participantes no estudo confessaram que tinham atos de procrastinação sempre ou quase sempre aquando da realização das monografias, 27,6% no estudo para os exames e 30,1% admitiam procrastinar na leitura dos trabalhos semanais. No que concerne à investigação em relação à prevalência da procrastinação, esta não tem sido tão profícua como a investigação sobre a relação entre a procrastinação e outros constructos psicológicos. Embora seja um fenómeno comum, com uma incidência estimada em estudantes universitários muito elevada, entre 80 a 95% (Steel, 6 2007) também pouco se sabe acerca do desenvolvimento da procrastinação na infância e adolescência (Klassen et al., 2009). 2. Conceptualização da Procrastinação A procrastinação é um fenómeno algo complexo que tem vindo nos últimos anos a despertar a atenção por parte da comunidade científica com a realização de vários estudos e a formulação de várias conceções e definições. “Porque procrastinamos?” Na perspetiva do modelo racional de escolhas, são os custos iniciais de uma tarefa que desencorajam os indivíduos a dar início à realização dessa mesma tarefa. Para tal, Steel (2007) afirma que os estudantes que tenham que dispor de grandes custos iniciais para dar início a um projeto escolar, podem adiar esta tarefa e em alternativa podem proceder à realização de outra. Ainda de acordo com Steel (2007), de um modo geral, os indivíduos estão menos predispostos a realizar tarefas das quais gostam menos, levando a um adiar dessas tarefas, procurando fazer qualquer outra coisa em vez de realizar a tarefa que realmente deviam. A incerteza também pode levar ao adiamento das tarefas. Aquando da necessidade de realização de uma determinada tarefa, o indivíduo pode manifestar grandes quantidades de incerteza quanto às suas capacidades para a sua realização e concretização, e certamente irá retardar ao máximo o iniciar dessa tarefa. Tal como referem Zarick e Stonebraker (2009), grandes quantidades de incerteza propiciam um aumento acentuado de procrastinação. Vários são os autores que investigaram a procrastinação e avançaram com várias definições, que a seguir são apresentadas. Definir a procrastinação pode ser problemático no sentido de que se trata de um processo intraindividual, algo que depende de normas internas de quando é tarde, quando começar, entre outros. As atividades em que os indivíduos tipicamente procrastinam variam amplamente, desde comprar presentes, preencher formulários ou telefonar aos amigos (van Eerde, 2000). Também pode ser definida em termos de um atraso comportamental em relação à realização de determinadas tarefas, passando pelo 7 adiamento da tarefa, pelo incumprimento do término da tarefa nos prazos estabelecidos e pelo adiar da tomada de decisão (Milgram & Naaman, 1996). A procrastinação é tipicamente definida como um atraso voluntário de uma intenção de ação de um indivíduo em relação a algumas tarefas apesar das possíveis consequências negativas e um potencial de resultados ainda pior (Ferrari et al., 1995; Milgram, 1991; Steel, 2007). De acordo com Solomon e Rothblum (1984) a procrastinação é a tendência para retardar deliberadamente o início ou conclusão das tarefas que são causadoras de desconforto. A maior parte da literatura existente sobre a procrastinação tem feito o contraste entre procrastinadores e não procrastinadores. A procrastinação tem sido considerada uma falha no comportamento que leva ao desperdício do tempo, mau desempenho e aumento do stresse (Chu & Choi, 2005). Alguns investigadores, como Ferrari (2001), têm muitas vezes retratado os procrastinadores como sendo indivíduos preguiçosos ou auto-complacentes que são incapazes de se autorregular. Em contraste, os indivíduos não procrastinadores têm sido associados a elevada eficiência, produtividade, e uma performance superior, e são muitas vezes descritos como indivíduos organizados e altamente motivados (Ellis & Knaus, 1977). Segundo Dewitte e Lens (2000), a procrastinação pode ser temporária ou permanente, podendo também ser definida como uma função ao nível comportamental, adiamento do que estava planeado fazer, ou ao nível cognitivo, no qual há um adiamento da tomada de uma decisão. Também na visão de Ferrari, Johnson e McCown (1995) a procrastinação é uma tendência comportamental, com consequências potencialmente negativas para a pessoa. O sintoma mais típico da procrastinação é o fraco desempenho, pois devido à tendência para começar tarde, os procrastinadores não possuem tempo suficiente para realizar a tarefa ao nível daquilo que as suas capacidades o permitiriam. Para van Eerde (2003) a procrastinação é o evitamento de um comportamento de uma intenção planeada, apesar de a expectativa ser pior quando há atraso. Porque o atraso é irracional, as pessoas acabam por voluntariamente escolher um percurso de ação que elas próprias sabem que não irá maximizar as suas capacidades físicas, 8 psicológicas e o seu bem-estar. Para o autor, a definição de procrastinação tem, decididamente, uma conotação negativa. A ansiedade da avaliação, dificuldade na tomada de decisão, falta de controlo, a falta de afirmação, o medo das consequências do sucesso, a perceção da aversão à tarefa e os padrões excessivamente perfecionistas sobre a competência podem ser algumas das possíveis razões apontadas para a procrastinação (Solomon & Rothblum, 1984). Partindo da possibilidade de que nem todos os comportamentos procrastinadores têm efeitos negativos, Chu e Choi (2005) identificaram dois tipos diferentes de procrastinadores: os procrastinadores passivos vs. os procrastinadores ativos. Os procrastinadores passivos são procrastinadores no sentido tradicional. Em termos cognitivos, os procrastinadores passivos não têm a intenção de procrastinar, mas muitas vezes acabam por adiar as tarefas por causa da sua incapacidade de tomar decisões rapidamente para, assim, agir sobre elas. Os procrastinadores ativos, em contrapartida, são capazes de agir sobre as suas decisões em tempo útil. No entanto, eles suspendem as suas ações de forma deliberada e focam a sua atenção em outras tarefas importantes que têm entre mãos. Portanto, os procrastinadores passivos diferem dos procrastinadores ativos em dimensões cognitivas, afetivas e comportamentais. Afetivamente, quando um prazo se aproxima, os procrastinadores passivos sentem pressão e tornam-se pessimistas acerca de si próprios, especialmente sobre as suas capacidades em alcançar resultados satisfatórios (Ferrari, Parker, & Ware, 1992). Os seus pensamentos de insegurança e de incapacidade aumentam a hipótese de fracasso e conduzem a sentimentos de culpa e depressão (Steel, Brothen, & Wambach, 2001). Os procrastinadores ativos, por outro lado, gostam de trabalhar sob pressão. Quando confrontados com tarefas de última hora, eles sentem-se motivados e desafiados, e este sentimento confere-lhes imunidade contra todo o tipo de sofrimento comum nos procrastinadores passivos. Diferentes vias cognitivas e respostas afetivas interagem para produzir diferentes padrões de comportamentos, ou seja, os procrastinadores ativos são persistentes e capazes de completar tarefas no último minuto. Por sua vez, os procrastinadores passivos são propensos a desistir e não terminar as tarefas. 9 Com base nas circunstâncias acima referidas, Chu e Choi (2005) sugerem que a procrastinação ativa é um fenómeno multifacetado que inclui componentes cognitivos (decisão de adiar), afetivos (preferência pela pressão do tempo) e comportamentais (conclusão de uma tarefa dentro do prazo) bem como os resultados físicos e satisfação com eles. Devido a estas diferenças fundamentais (cognitivas, afetivas e comportamentais), espera-se que os procrastinadores ativos e passivos tenham diferentes características psicológicas e alcancem resultados diferentes. Segundo os mesmos autores os procrastinadores ativos, ao invés dos procrastinadores passivos, devem ter uma melhor estrutura do tempo e também um melhor senso de propósito na sua utilização, porque eles são capazes de tomar decisões de forma deliberada em relação ao seu uso do tempo com base na urgência ou na prioridade. Neste sentido, os procrastinadores ativos são semelhantes aos não procrastinadores, em termos de envolvimento nos comportamentos de estruturação do tempo e no uso intencional deste, bem como na perceção de controlo do mesmo (Chu & Choi, 2005). Lay (1990) encontrou procrastinadores passivos a subestimar o tempo total que seria necessário para completar determinadas tarefas. Consequentemente, muitas vezes não conseguem finalizar as tarefas dentro do tempo previsto, fomentando a perceção de diminuição do controlo do tempo (Lay & Schouwenburg, 1993). Em contraste, os não procrastinadores que constantemente se envolvem no planeamento e na organização do seu tempo, tendem a ter perceções mais realistas do tempo e a perceber melhor o controlo que têm sobre ele. Enquanto os atrasos ocasionais são aceitáveis e podem até mesmo ser vantajosos em determinados momentos, o que distingue a procrastinação habitual ou problemática da mera decisão de realizar uma atividade em algum momento posterior, é o desconforto interno subjetivo inerente ao indivíduo que procrastina (Lay & Schouwenburg, 1993). Este desconforto pode traduzir-se em ansiedade, irritação, tristeza, desespero ou sentimento de culpa (Burka & Yuen, 1983; Rothblum, Solomon, & Murakami, 1986). Embora ambas as posições teóricas sobre a procrastinação atrás mencionadas, prática e académica, tenham conotações negativas associadas à procrastinação, os investigadores têm averiguado que a procrastinação pode induzir alguns benefícios a curto-prazo (Chu & Choi, 2005). 10 Neste sentido, Tice e Baumeister (1997) referiram que, em comparação com os não procrastinadores, os procrastinadores podem experimentar menos stresse e ter uma melhor saúde física quando os prazos estão muito longe. Assim, a procrastinação pode ser vista como um estratégia que os indivíduos utilizam para regular as suas emoções negativas, levando a que o indivíduo se sinta melhor, pelo menos temporariamente. Além disso, em princípio, se uma pessoa faz um trabalho muito em cima do prazo de entrega ou apenas ligeiramente em cima, isso pode não afetar necessariamente a qualidade do trabalho. Portanto, em termos práticos, a procrastinação não tem necessariamente um impacto negativo sobre a eficácia do desempenho na tarefa (Chu & Choi, 2005). Nesta linha de pensamento, também Knaus (2000) argumentou que nem todos os atrasos levam a resultados negativos. Por exemplo, os atrasos que resultam do tempo gasto a fazer o planeamento e da obtenção da informação necessária para iniciar uma tarefa, pode ser benéfico. Muitas pessoas afirmam que mesmo quando começam a trabalhar no último minuto, ainda podem terminar dentro do tempo estabelecido e tendem a trabalhar melhor e mais rápido ou gerar ideias mais criativas sobre a pressão do tempo. Esta linha de pensamento, sobre a procrastinação sugere que pode haver mais de um tipo de procrastinador e em alguns casos os comportamentos procrastinatórios podem levar a resultados positivos. 2.1. Procrastinação crónica A procrastinação crónica é considerada como sendo um traço de personalidade ligado a uma série de outras características, incluindo uma diminuição na autoeficácia, aumento da depressão e da ansiedade e uma baixa conscienciosidade (Haycock, McCarthy, & Skay, 1998; Schouwenburg & Lay, 1995; van Eerde, 2003; Wolters, 2003). Há também consequências externas à procrastinação académica crónica, tais como, comprometer o desempenho e o progresso, diminuição da aprendizagem, perda de oportunidades, aumento de riscos na saúde e alguma tensão nas relações (Beswick, Rothblum, & Mann, 1988; Rothblum, Solomon, & Murakami, 1986; Tice & Baumeister, 1997). 11 A procrastinação crónica parece ter vindo a aumentar na sua frequência e incidência, ou então as pessoas estão mais dispostas a admitir que procrastinam de forma crónica (Steel, 2007). De acordo com Steel (2007), em 1978, apenas 5% da população americana admitia procrastinar cronicamente enquanto atualmente esta percentagem situa-se entre os 15 a 20%. Cerca de metade dos estudantes universitários admitem procrastinar constantemente, o que é uma percentagem muito alta em termos históricos. As razões para este aumento da procrastinação na população americana podem ser atribuídas às tecnologias modernas podendo fazer com que as pessoas facilmente procrastinem. O computador tem atividades que acatam diversos setores da sociedade e distrações, como ir verificar os e-mails, conversar com os amigos na internet, pesquisar notícias, ouvir músicas, jogar jogos, navegar nas redes sociais, entre outras, que podem desnecessariamente atrasar uma tarefa que está em mãos. Grande parte das pessoas esperam para pagar as suas contas depois ou adiar o trabalho de que precisam fazer (Ferrari, Johnson, & McCown, 1995). Tais comportamentos podem parecer não ter nenhuma importância, mas a literatura sugere que os atrasos habituais frequentes nas ações e/ou nas decisões mais comuns podem ser desajustados. Uma larga percentagem de indivíduos nos EUA e noutros países são considerados procrastinadores crónicos, ou seja, são indivíduos que se envolvem em atrasos desnecessários de tarefas relevantes e oportunas através de situações ou ambientes (Ferrari, O’Callahan, & Newbegin, 2005). Os não procrastinadores, pelo contrário, são indivíduos que desempenham a maioria das tarefas em tempo útil (Ferrari, Barnes, & Steel, 2009). Recentemente, Ferrari e Díaz-Morales (2007) referiram que os procrastinadores crónicos ao contrário dos não procrastinadores, apresentavam um autoconceito focado na aparência, bem como estilos centrados na autoapresentação, que revelam uma pessoa que sabota as tarefas, mas que tenta justificar e desculpar a falha do seu desempenho. Pesquisas anteriores dos mesmos autores indicam que os procrastinadores eram muito preocupados com a sua imagem social e pública (Ferrari, 1991b; 2001), sugerindo que eles procuram essencialmente a aprovação social. Atualmente, duas formas válidas e confiáveis da procrastinação crónica foram identificadas nos adultos em ambos os sexos na população americana. Um tipo parece estar relacionado com a tendência de adiar as tarefas em busca de experiências 12 emocionais como uma forma de espantar o tédio, e o outro tipo com uma crença de que se trabalha melhor sobre pressão. Esta tendência comportamental foi avaliada por uma escala unidimensional de 20 itens criada por Lay (1986, cit por Ferrari, Barnes, & Steel, 2009), que identifica os atrasos como sendo motivados por uma necessidade de excitação/ativação. Estudos de validade concluíram que as pontuações nesta escala estavam relacionadas com variáveis externas aos indivíduos ou desculpas para os atrasos (Ferrari, 1993) e fraco desempenho, quando existem stressores ambientais que aumentam a excitação/ativação quando se aproxima o prazo de execução da tarefa (Ferrari, 2001). Outro tipo frequente de procrastinação crónica nos adultos dos EUA é reflexo de uma baixa autoestima e autoconfiança, de tal forma que a pessoa atrasa a realização das tarefas que pode ser reveladora de potenciais capacidades empobrecidas (Ferrari, Barnes, & Steel, 2009). Estudos de validade utilizando uma escala unidimensional de 15 itens que avalia a frequência da procrastinação, demonstraram que as pontuações mais elevadas na procrastinação numa variedade de tarefas estavam relacionadas com o desvio da divulgação de potenciais incapacidades percebidas e de incompetências (Ferrari, 1993) e com o evitar informação relevante acerca das suas próprias capacidades e competências (Ferrari, 1991b). A investigação científica suporta diferentes razões sobre os motivos pelos quais as pessoas procrastinam. Algumas pessoas evitam o início ou conclusão de uma tarefa, porque o resultado envolvido pode ameaçar a sua autoestima (procrastinação por evitamento) (Ferrari & Pychyl, 2012), ao passo que outros indivíduos podem adiar por adiar as decisões necessárias (procrastinação na decisão) (Effert & Ferrari, 1989). Ferrari (1992b) foi o primeiro a propor um modelo tripartido da procrastinação crónica, indicando que esta pode ser dividida em procrastinação por ativação (arousal procrastination), procrastinação por evitamento (avoidant procrastination) e procrastinação na tomada de decisão (decisional procrastionation). No entanto, Steel (2007; 2010) criticou o modelo proposto pelo Ferrari (1992b) com base em estudos meta-analíticos e de análises fatoriais, em que os resultados evidenciavam não haver suporte empírico para esse modelo. Steel (2007) considera que 13 a procrastinação é predominantemente um atraso irracional e assim deveria ser entendida e avaliada como unifatorial. A procrastinação crónica resulta frequentemente em pessoas que falham na forma de agir ou porque não conseguem tomar uma decisão, ou ainda porque esperam para agir até que seja tarde demais. Perder a oportunidade de decidir ou de agir como resultado de um ato de procrastinação, pode resultar em sentimentos de arrependimento (Ferrari, Barnes, & Steel, 2009). Os autores propõem assim que, quando um procrastinador crónico comparado com um não procrastinador, reflete sobre as ações passadas ou sobre as decisões falhadas que não conseguiu iniciar ou completar, em função dos resultados negativos, pode resultar um maior sentimento de arrependimento sobre o progresso. Por exemplo, os procrastinadores evitantes podem arrepender-se por não terem agido, o que resultou assim em resultados de sucesso ou de fracasso, enquanto os procrastinadores por ativação, sentem arrependimento porque perderam a oportunidade de uma experiência de emoção. Sugerem também que, o comportamento dilatório habitual pode trazer uma sensação de arrependimento em relação às oportunidades da vida perdidas ou não concluídas. O arrependimento é um sentimento negativo experimentado quando refletindo sobre decisões e ações, que se tivessem sido feitas de maneira diferente, o resultado teria sido muito melhor (Zeelenberg et al., 2002). Ferrari, Barnes, e Steel (2009) foram os primeiros a avaliar de forma sistemática os dois tipos de procrastinação crónica e os sentimentos de arrependimento, decidindo avaliar o arrependimento numa ampla variedades de situações, em vez de formularem hipóteses entre a relação do arrependimento e a procrastinação crónica. No entanto, era esperado que os procrastinadores crónicos reportassem mais sentimentos de arrependimento do que os não procrastinadores. Os resultados dos seus estudos revelam que os procrastinadores crónicos apresentam maiores níveis de sentimento de arrependimento numa variedade de situações (atividades educacionais e académicas, interações familiares, interações com os amigos e interações entre pais e filhos), quando comparados com os não procrastinadores. 14 2.2. Teorias explicativas da procrastinação A procrastinação é um conceito que a comunidade científica tem vindo nestes últimos anos a explorar de forma crescente em vários contexto as suas causas e consequências, daí que são muitos os modelos e teorias explicativas propostas para compreender o seu funcionamento. As principais teorias e as suas implicações serão a seguir apresentadas, partindo das mais antigas para as mais recentes. 2.2.1. Teorias psicanalíticas e psicodinâmicas da procrastinação A teoria psicanalítica foi das primeiras teorias a tentar explicar o comportamento e, como acontece em muitas outras áreas da psicologia, a procrastinação não foi exceção. Segundo Ferrari, Johnson e McCown (1995), a procrastinação foi explicada por Freud (1953) tendo como suporte as suas conceções do psiquismo humano. Segundo a corrente psicanalítica, o evitamento de determinadas tarefas é feito uma vez que estas podem ser encaradas como uma ameaça para o Ego. Portanto, a ansiedade funciona como um sinal de aviso para o Ego de que o material inconscientemente reprimido se pode tornar disruptivo, e este institui uma série de defesas evitando assim a conclusão de tarefas que o poderiam ameaçar. Assim, o evitamento é considerado uma defesa dinâmica do Ego. As teorias psicodinâmicas rejeitam as estruturas rígidas freudianas, apesar de adotarem aspetos dos modelos proposto por Freud, designadamente, a importância das experiências precoces no desenvolvimento da personalidade, e que por consequência mais tarde poder levar ao desencadear de comportamentos de procrastinação. Segundo Ferrari, Johnson e McCown (1995), alguns teóricos (por exemplo van der Kolk, 1987) enfatizam também o papel das emoções e os seus aspetos simbólicos relacionando-os com as experiências da infância, nomeadamente os traumas infantis. Estas conceções mantêm-se populares até ao presente apesar de haver algumas dificuldades na sua operacionalização, devido à falta de suporte empírico que permita avaliar a sua pertinência. 15 2.2.2. Teorias dos traços da personalidade Dado que a procrastinação reflete a personalidade, então a questão central é saber em que plano ela se enquadra, particularmente no modelo dos cinco fatores (Big Five), como modelo mais atual e mundialmente aceite sobre a organização e estrutura da personalidade. Conceptualmente, parece haver também uma considerável sobreposição com a dimensão conscienciosidade, no entanto, apesar de poder existir esta sobreposição, argumenta-se que o tipo/dimensão da conscienciosidade, no modelo Big Five, é um construto mais amplo (Steel, 2007). Das várias abordagens existentes sobre as teorias da personalidade, a que ganhou mais importância para a comunidade científica na área da procrastinação é a perspetiva dos traços, concretamente o modelo dos cinco fatores (Big Five) proposto por Costa e McCrae (1992). A teoria dos traços procura explicar a personalidade em função dos traços/fatores que são compreendidos como características constantes da personalidade, ou seja, são padrões habituais do comportamento, do pensamento e das emoções e que são diferentes entre os indivíduos. O modelo dos cinco fatores sustenta a estruturação da personalidade com base em cinco grandes dimensões ou fatores: neuroticismo, extroversão, amabilidade, abertura à experiência e conscienciosidade. São vários os autores que defendem a conceção da procrastinação como um traço da personalidade ou como uma predisposição comportamental para procrastinar (Ferrari, Johnson, & McCown, 1995; Schouwenburg & Lay, 1995), levando também a preocupações com o perfecionismo socialmente imposto (Sadler & Sacks, 1993) para uma impressão favorável perante os outros (Ferrari, 1991b) e também baixos níveis de autoconsciência (Schouwenburg & Lay, 1995). Assim, segunda esta perspetiva, a procrastinação é encarada como uma predisposição comportamental para o adiamento de tarefas, apresentando-se de forma estável através dos contextos e do tempo. São vários os estudos realizados para analisar a relação entre a procrastinação e as diferentes dimensões do modelo dos cinco fatores ou Big Five. Em termos de características de personalidade, a investigação tem consistentemente mostrado que a baixa conscienciosidade, em menor grau, e elevado neuroticismo estão relacionados com a procrastinação (Schouwenburg, & Lay, 1995; van Eerde, 2003). A conscienciosidade engloba características como a responsabilidade e honestidade ou, em 16 oposição, a negligência e a irresponsabilidade (Costa & McCrae, 1992). Para além da relação negativa entre a procrastinação e a conscienciosidade, o estudo de Schouwenburg e Lay (1995) demonstrou também a existência de uma associação com outra dimensão do modelo dos cinco fatores, nomeadamente, o neuroticismo. Esta dimensão avalia a adaptação vs. instabilidade emocional, ou seja, avalia em que medida os indivíduos são preocupados, nervosos, com sentimentos de incompetência, emocionalmente inseguros e com desejos e necessidades excessivas. Esta associação entre a procrastinação e o neuroticismo foi corroborada no estudo de Watson (2001) no qual participaram 349 estudantes universitários, onde foi possível verificar uma relação positiva entre a procrastinação e várias facetas do traço neuroticismo, especificamente, a ansiedade, depressão, a impulsividade, vulnerabilidade e a autoconsciência. Inicialmente colocou-se a questão empírica acerca da procrastinação poder ser considerada um traço. A investigação nesta área já é numerosa e consistente para sugerir qua a procrastinação tem uma estabilidade suficiente através do tempo e da situação. A literatura aponta também que parece haver um componente biológico ou genético para a procrastinação. Um estudo de Arvey et al., (2003) realizado neste sentido, com gémeos idênticos, revelou que a procrastinação está associada numa percentagem considerável (22%) com fatores genéticos. Outro estudo realizado por Elliot (2002) indicou que a procrastinação pode ser suficientemente estável para ser considerada como sendo um traço, eventualmente associado ao tipo de conscienciosidade. Steel (2007) também considera que a procrastinação pode ser um aspeto central da conscienciosidade, estando negativamente associada com a saúde e a felicidade. Além disso, as características individuais de impulsividade, de autoeficácia e a necessidade de realização, bem como as características de aversão à tarefa e o atraso foram ao mais fortemente associados com a procrastinação. A falta de energia é também uma das razões, apontadas pelo autor, que leva os estudantes a adiar o trabalho. No entanto, alguns autores colocam em questão as explicações da procrastinação com base nos traços da personalidade, embora achem que não devem ser postas de parte totalmente, mas em vez disso proceder à sua reformulação tendo em consideração as interações entre a personalidade e o ambiente, uma vez que o ambiente pode ser um meio inibitório ou potenciador da manifestação da personalidade (Moon & Illingworth, 2005). 17 2.2.3 Teorias motivacionais Tal como as outras teorias acima mencionadas, as teorias da motivação também se focaram na abordagem da procrastinação. A procrastinação enquanto questão da área motivacional não tem sido tão estudada, embora seja um fenómeno bastante divulgado e reconhecido (van Eerde, 2000). No que diz respeito aos construtos motivacionais, tem vindo a ser demonstrado que a procrastinação académica está associada com a falta de motivação autodeterminada, baixa incidência no estado de fluxo (Lee, 2005), baixa proficiência de orientação, baixa orientação para o desempenho, baixa persistência, falta de esforço próprio (Sadler & Buley, 1999) e baixo uso de estratégias de aprendizagem cognitivas e metacognitivas (Wolters, 2004). Ou seja, a procrastinação pode ser considerada como uma falha na autorregulação dos sujeitos (Dietz, Hofer, & Fries, 2007). Muitas teorias sobre a procrastinação no trabalho afirmam que a motivação aumenta a performance e reforça a satisfação, e que os indivíduos tentam ativamente alcançar resultados positivos. Raramente estas teorias se focam no porquê das pessoas não fazerem determinadas coisas ou como elas evitam os resultados. A procrastinação pode ser considerada como sendo uma ilustração de como as pessoas não estão motivadas para fazerem as coisas e como as pessoas por vezes evitam, em vez de se aproximarem, dos resultados. A impulsividade é a preferência pelos resultados a curto prazo em vez das recompensas futuras, mesmo que estas possam ser mais valiosas num sentido objetivo. Na procrastinação, a recompensa a longo prazo está associada à execução de uma ação pouco atraente, portanto, assim como acontece na impulsividade, o indivíduo escolhe uma atividade menos importante mas mais prazerosa a curto prazo (van Eerde, 2000). 2.2.4. Teorias comportamentais da procrastinação Foi através dos paradigmas comportamentais que surgiram as primeiras tentativas empíricas para compreender a procrastinação. No entanto esta corrente pouco fez em termos de investigação da procrastinação, embora os construtos 18 comportamentais possam ser bastantes úteis na sua explicação (Ferrari, Johnson & McCown, 1995). Segundo a teoria clássica da aprendizagem de Skinner (1975) tanto o castigo como as recompensas são incentivos ao comportamento. Como tal, a procrastinação deveria ocorrer com maior frequência nos estudantes que foram recompensados pelo seu comportamento, que optaram por atividades mais reforçadoras, em vez de estudar ou realizar trabalhos ou que não foram suficientemente punidos por procrastinarem. Se uma pessoa considerar que pode esperar ser punida pelo seu comportamento procrastinatório e tal não acontecer (van Eerde, 2000) ou que até esse comportamento procrastinatório é reforçado com bons resultados nos trabalhos ou exames, parece evidente que o sucesso obtido após estudar ou realizar uma tarefa no último momento reforça a crença de que a procrastinação é uma estratégia praticável, sugerindo a existência de uma ligação entre o comportamento e as suas consequências (Tuckman & Schouwenburg, 2004). A procrastinação envolve uma escolha voluntária de um comportamento ou tarefa sobre outras opções. Consequentemente, não se pode irracionalmente atrasar todas as tarefas, mas pode-se simplesmente favorecer algumas sobre outras. A menos que as pessoas procrastinem de forma aleatória, a natureza da própria tarefa pode ter algum efeito sobre as decisões (Steel, 2007). Neste sentido, há alguns anos atrás, Solomon e Rothblum (1984) apresentaram dados empíricos que comprovam esta teoria. Num dos seus estudos, os autores analisaram a procrastinação académica de estudantes universitários e a sua relação com as tarefas menos agradáveis. Verificaram que o fator “tarefa não agradável” foi responsável por 25 % da variância, que demonstrou que os estudantes tendem a adiar as tarefas que são por eles consideradas como menos agradáveis. Da mesma opinião, Milgram, Sroloff e Rosenbaum (1988) observaram empiricamente que as tarefas aborrecidas ou difíceis estariam sujeitas a ser adiadas com maior frequência. Não obstante, apesar de a teoria comportamentalista ostentar argumentos lógicos para explicar a procrastinação, aparentemente parece não ser capaz de explicar algumas diferenças individuais que surgem (Ferrari, Johnson, & McCown, 1995). 19 2.2.5. Teorias cognitivo-comportamentais As teorias cognitivo-comportamentais tentaram de certa forma colmatar as falhas das teorias comportamentais. Segundo Ferrari, Johnson e McCown (1995) a teoria cognitivo-comportamental que mais patenteou o estudo da procrastinação, foi a teoria racional-emotiva de Ellis e Knaus (1977). Esta teoria refere que as crenças emocionais disfuncionais ou irracionais são centrais nos problemas emocionais e comportamentais dos indivíduos. Os autores apontam também que as crenças podem ser divididas em dois tipos de categorias. A primeira representa a avaliação do valor próprio ou autoestima fundamentado em determinadas condições (e.g., tenho que ser bem sucedido/a para ter valor). A segunda categoria compreende a intolerância à frustração e é representadora da exigência da realidade de ser como gostaríamos que ela fosse (e.g., a vida deve ser livre de contrariedades). A intolerância à frustração é apontada por Ellis e Knaus (1977) como sendo uma das causas mais diretas da procrastinação. Embora, Harrington (2005) explique que as evidências empíricas acerca destas relações são pouco consistentes, ou seja, não existem medidas de crenças irracionais adequadas como a intolerância à frustração tem sido concetualizada como um construto unidimensional, o que não permite analisar vários aspetos do conceito. A procrastinação é, dentro desta perspetiva teórica, considerada como sendo um comportamento irracional de adiamento (Burka & Yuen, 1983; Ellis & Knaus, 1977, cit. por Steel, 2007). Ser irracional implica a escolha de um curso de ação, apesar de saber que esta escolha não vai maximizar os seus interesses, as suas preferências ou objetivos de natureza material (e.g., dinheiro) e psicológica (e.g., felicidade). A combinação destes elementos sugere que procrastinar é voluntariamente atrasar o curso de uma ação pretendida, apesar de a expetativa ser pior no atraso. A literatura também tem evidenciado que a procrastinação se relaciona com as tentativas para obter alívio imediato do efeito negativo que emerge do envolvimento em atividades distrativas (Tice, Bratslavsky, & Baumeister, 2001). Pelo contrário, outros estudos vêm contrariar esta relação mostrando que não existe qualquer relação entre o efeito negativo e a procrastinação (Pylchyl et al., 2000), ou se existe apenas pode ser verdade para um número reduzido de procrastinadores com medo do fracasso (Schouwenburg, 1992). 20 2.3. Procrastinação em contexto escolar e académico Hoje, a procrastinação é um fenómeno mais comum entre os estudantes do que nunca, visto que estes têm muita coisa para fazer com um tempo muito limitado. Segundo a literatura, existem várias razões para os comportamentos procrastinadores. Devido a estas razões, é muito frequente o indivíduo não entrar em ação até ao último minuto, podendo entrar em ação depois do prazo estabelecido ou por vezes o indivíduo não entra de todo na ação. Pesquisas sobre este assunto demonstram claramente que é difícil explicar o comportamento procrastinador apenas com uma única variável (Zarick & Stonebraker, 2009). A procrastinação académica tem sido definida como a tendência para adiar uma atividade importante em tempo oportuno no domínio académico (Ferrari, 2001). Os alunos, durante o seu dia-a-dia, não desempenham apenas um papel significativo, mas sim múltiplos papéis, tanto na sua vida pessoal como também na sua vida académica, dedicando assim o seu tempo às tarefas académicas, bem como às suas relações interpessoais. Esta difusão de papéis por vezes pode tornar-se incompatível e levar à criação de conflitos, que por sua vez pode levar a elevados níveis de procrastinação académica. Os alunos podem experienciar momentos de conflito quando perante uma situação em que têm de fazer uma escolha, por exemplo, estudar para um exame ou sair com os amigos para ir a uma festa. Quando estas situações acontecem, os indivíduos têm dificuldades em se manterem focados nos seus objetivos académicos (Senécal, Julien, & Guay, 2003). Segundo Steel (2007; 2010) a procrastinação académica pode ser entendida como um atraso voluntário da conclusão de uma tarefa académica dentro do prazo estipulado ou desejado, apesar de a expetativa do atraso ser algo desagradável. Também pode ser descrita, como o retardar do início de uma tarefa que eventualmente se pretende concluir, até que o indivíduo experimente desconforto emocional por não ter realizado a tarefa mais cedo (Lay & Schouwenburg, 1993). Já Chu e Choi (2005) explicaram a procrastinação como sendo um défice de autorregulação no desempenho individual. A procrastinação académica pode, portanto, ser entendida como um tipo de “anti motivação”, quando os indivíduos decidem não avançar no sentido de finalizar uma 21 tarefa académica escolhida (Tan et al., 2008). Este comportamento é comum entre adultos e estudantes do ensino superior e do ensino médio (Wolters, 2003). Também Ferrari (1998) e Lay (1986; 1995) descrevem a procrastinação académica como sendo uma tendência irracional de atraso no início ou na conclusão de uma tarefa académica. Os alunos podem ter a intenção de realizar uma atividade académica dentro do prazo estabelecido ou por eles desejado, mas falham em termos de motivação própria para o fazerem. A procrastinação para além de estar associada a níveis elevados de stresse e de ansiedade, leva também a um desempenho académico insatisfatório (Ferrari, O’Callaghan, & Newbegin, 2005). Uma grande percentagem de alunos sofre de procrastinação académica, tendo consequências negativas relacionadas com tal comportamento dilatório. Por exemplo, a procrastinação académica está relacionada com o baixo rendimento escolar (Beswick, Rothblum, & Mann, 1988; Tice, & Baumeister, 1997), depressão (Sadler, & Sacks, 1993), desânimo/ abatimento (Lay, 1995), falta de pontualidade, dificuldade em seguir instruções (Lay, 1986; Rothblum, Solomon, & Murakami, 1986; Solomon & Rothblum, 1984) e o aumento de problemas de saúde com a aproximação dos prazos para entrega dos trabalhos (Tice & Baumeister, 1997). A procrastinação académica pode também advir de certas características da personalidade dos indivíduos, tais como a existência de uma pré-disposição para procrastinar, preocupações com o perfecionismo socialmente imposto (Sadler & Sacks, 1993), para uma impressão favorável perante os outros (Ferrari, 1991b) e também por baixos níveis de autoconsciência (Schouwenburg & Lay, 1995). Este tipo de procrastinação é mais generalizada quando há prazos estabelecidos para a realização de trabalhos, no estudo para os exames e no complemento de tarefas semanais, este comportamento é prejudicial para o desempenho académico, refletindo- se nas baixas notas, mas também contribuindo para o aumento de riscos na saúde, nomeadamente, aumento da depressão e ansiedade. Existem muitos estudos, que chamam a atenção para as circunstâncias em que os alunos possam procrastinar. Por exemplo, quando questionados porque procrastinam, os estudantes universitários 22 apontam razões relacionadas com a aversão pela tarefa e o medo de fracassar na sua realização (Solomon & Rothblum, 1984). A falta de fiscalização e a dependência de iniciativa do aluno, muitas vezes leva à procrastinação excessiva e a um desempenho reduzido, particularmente entre os estudantes com tendência para procrastinar (Tuckman, 2005). O estudo de Sénecal, Koestner, e Vallerand (1995) realizado com 498 adolescentes estudantes, mostrou que a maneira como os estudantes regulam o seu comportamento no contexto académico estava significativamente relacionado com o envolvimento nos comportamentos de procrastinação. Os resultados deste estudo revelaram que os estudantes que referiam razões mais intrínsecas para estudar reportavam menores níveis de procrastinação do que os estudantes que apresentavam uma regulação mais extrínseca. Em conclusão, os autores apontam que os estudantes que apresentavam formas de regulação académica menos autónomas eram menos persistentes, mais inconsistentes entre as suas atitudes e comportamentos e apresentavam ainda mais emoções negativas. Owens e Newbegin (2000), descobriram que os adolescentes que procrastinavam em matemática ou inglês apontavam uma significativa baixa da autoestima, comparativamente com os adolescentes que não procrastinavam nestes domínios. Também, Milgram e Toubiana (1999) descortinaram que a ansiedade académica e a ansiedade da avaliação levavam a maiores níveis de procrastinação, e que os adolescentes atribuíam a procrastinação a uma lacuna na autorregulação dos comportamentos, como problemas na gestão do tempo. Um outro estudo, da autoria de Costa (2007) realizado em Portugal com uma amostra de alunos do 3º ciclo, evidenciou que a procrastinação no estudo e a autorregulação relacionavam-se de forma negativa. Um estudo que explorou a procrastinação entre os adolescentes encontrou que o adiar das tarefas eram associadas com a baixa autoestima, autorregulação e com a autoeficácia. Esta relação pode variar de acordo com as diferenças de género (Pychyl, Coplan & Reid, 2002). 23 Quando é feita uma análise através de estudos da relação entre as atividades de lazer dos adolescentes e o seu desenvolvimento académico e pessoal, é possível verificar a existência de efeitos positivos como consequência da estruturação das atividades. A literatura aponta para que a participação em atividades de lazer estruturadas está positivamente relacionada com uma variedade de índices de desenvolvimento da personalidade, bem como o rendimento académico na escola. Uma das causas para haver esta relação positiva, pode ser o facto de que uma rotina diária bem organizada proporciona menos possibilidades de existirem conflitos motivacionais, e portanto, maior capacidade para decidir quando os sujeitos se vêm confrontados com atividades de aprendizagem e atividades de lazer sedutoras (Dietz, Hofer, & Fries, 2007). A procrastinação pode ter consequências particularmente graves para os estudantes universitários, cujas rotinas são caraterizadas por prazos frequentes (Chu & Choi, 2005). Tice e Baumeister (1997) evidenciaram que os estudantes universitários que apresentam níveis elevados de procrastinação, não só recebem baixas notas, mas também manifestam níveis elevados de stresse e problemas de autoavaliação. Rabin, Fogel, e Nutter-Upham (2011), realizaram um estudo com estudantes universitários com duas hipóteses principais. A primeira hipótese era que o controlo inibitório/impulsividade, auto monitorização, capacidades de planeamento e de organização e a iniciação da tarefa, seriam variáveis preditoras da procrastinação académica. A segunda hipótese avaliava se as variáveis conscienciosidade, neuroticismo e os estados de humor também eram preditores da procrastinação académica. Os resultados obtidos corroboram em parte as hipóteses propostas pelos autores, uma vez que não encontraram relação significativa entre o neuroticismo e os estados de humor e a procrastinação. Um estudo de Solomon e Rothblum (1984) tinha como objetivo investigar a frequência da procrastinação nos estudantes universitários nas tarefas académicas e as razões para o comportamento procrastinador. Uma elevada percentagem de estudantes referiram ter problemas com a procrastinação em várias e especificas tarefas académicas. Os resultados obtidos neste estudo indicam que a procrastinação não é somente um défice nos hábitos de estudo ou na gestão do tempo, mas também envolve uma complexa interação de componentes comportamentais, cognitivos e afetivos. 24 São vários os contextos em que a procrastinação académica está presente, podendo também ser verificada no ensino à distância, pois a natureza deste tipo de ensino, exige aos alunos um maior nível de autorregulação, uma vez que o professor não está fisicamente presente. Aqueles que seguem por comportamentos de adiamento têm imensa dificuldade em focalizar a sua atenção na realização de tarefas, no tempo necessário para a sua execução e ainda dificuldades em avaliar a eficácia do seu estudo (DeWitte & Lens, 2000). Também neste tipo de ensino existem prazos definidos o que por sua vez leva a oportunidades para comportamentos procrastinatórios, pois a falta da presença física do professor/instrutor torna difícil o controlo comportamental (Tuckman, 2007). Embora as percentagens variem entre os vários estudos, em geral, a procrastinação académica parece ser altamente prevalente e amplamente debilitante (Rice, Neimeyer, & Taylor, 2011). Uma baixa assertividade (Rothblum Solomon, & Murakami, 1986; Steel, 2007), bem como as baixas notas e a média das notas da escola (Klassen et al., 2008; Tice & Baumeister, 1997), são problemas que estão associados aos comportamentos procrastinadores. 2.3.1. Procrastinação e motivação em contexto escolar e académico A motivação pode ser definida como o esforço e a persistência, e gestão de competências durante a execução de uma tarefa por parte de um indivíduo (Pintich & Schunk, 2002). A motivação é considerada a chave para a educação, ou seja, uma aprendizagem produtiva por parte do indivíduo está intimamente relacionada com o seu nível de motivação. Neste sentido, a literatura tem vindo a demonstrar que a motivação tem um impacto significativo sobre o desempenho académico (Vallerand et al., 1992; Wolters et al., 2005). Assim, um indivíduo que tem níveis elevados de motivação pode experimentar maior sucesso na realização de tarefas (e.g., preparação para os exames, fazer os trabalhos de casa) durante o seu percurso académico. Assim sendo, a motivação desempenha um papel importante na vida académica. Alguns autores (Klassen et al., 2007; Lee, 2005; Rakes & Dunn, 2010) têm vindo a evidenciar que existe uma relação inversa entre a motivação e a procrastinação. Isto é, quando os níveis de motivação diminuem, aumenta a tendência para procrastinar. 25 A procrastinação académica é considerada como um problema motivacional ao invés de falta de competência e de gestão do tempo ou preguiça. Segundo Tuckman (1998) é difícil motivar uma pessoa que exibe um comportamento procrastinatório. A literatura tem vindo também a debruçar-se sobre a relação existente entre os objetivos de realização e a procrastinação (Seo, 2008). Os objetivos de realização, dentro das teorias motivacionais, emergiram como uma abordagem proeminente para a compreensão de como as pessoas se comportam e respondem perante situações de realização no local de trabalho, nos campos desportivos ou na sala de aula (Van Yperen, 2006). Inicialmente, os objetivos de realização eram discutidos e analisados em termos de duas classes principais, objetivos para a mestria, em que o indivíduo compara o próprio desempenho atual com o desempenho anterior, e os objetivos para o desempenho, em que o indivíduo se preocupa sobretudo em comparar o próprio desempenho com o de outras pessoas (Ames, 1992). Recentemente, os objetivos de realização têm sido classificados como sendo compostos por combinações distintas das duas dimensões fundamentais atrás referidas: a definição (performance vs. mestria) e a valência (aproximação vs. evitamento) (Van Yperen, 2006). A literatura que aborda a relação entre a procrastinação e os objetivos de realização evidencia uma relação negativa entre a orientação de mestria e a procrastinação (Seo, 2009). Devido à classificação dos objetivos de realização, estudar a relação entre a procrastinação e o atingir de metas tornou-se um pouco complexo. Em estudos recentes, a procrastinação tem vindo a mostrar que se relaciona negativamente com os objetivos de mestria e positivamente com o evitamento (Howell & Watson, 2007; Wolters, 2003; Scher & Osterman, 2002). Wolters (2003) sugeriu que os objetivos para a mestria é o único preditor significativo de procrastinação entre a mestria, orientação para o desempenho, e orientação para o evitamento do trabalho. A orientação para o desempenho surgiu como positivamente correlacionada com a procrastinação (Howell & Watson, 2007; Scher & Osterman, 2002; Wolters, 2003). Os objetivos de desempenho para o evitamento de metas parecem também estar positivamente relacionados com a procrastinação (Howell 26 & Watson, 2007; Scher & Osterman, 2002), enquanto em outros estudos não foi encontrada nenhuma relação entre estas duas variáveis (Wolters, 2003). Umas das teorias motivacionais que mais tem recebido atenção no que concerne à procrastinação é a teoria da autodeterminação proposta por Ryan e Deci (2000). A princípio, esta teoria fazia a separação entre motivação extrínseca e motivação intrínseca. Motivação é uma força que leva a pessoa a empenhar-se numa atividade particular. A motivação extrínseca é aquela cuja satisfação está dependente de objetos externos. Já a motivação intrínseca está relacionada com as necessidades internas ao indivíduo, ou seja, a satisfação não depende de objetos externos, mas sim de reforços internos (e.g.; autorreforço) (Carita et al., 1998). Brownlow e Reasinger (2000) constatam que tanto a motivação intrínseca como a extrínseca foram negativamente relacionadas com a procrastinação académica. Conti (2000) sugeriu que, embora a motivação extrínseca fosse necessária para evitar o atraso da tarefa, os indivíduos motivados intrinsecamente dedicam mais tempo aos seus projetos do que os indivíduos motivados extrinsecamente. Com base nestes resultados, Chu e Choi (2005), apontam que os não procrastinadores são motivados pela motivação extrínseca e intrínseca porque os não procrastinadores tendem a não atrasar a execução de tarefas e talvez despendam mais tempo nela. Em contraste, devido ao adiamento frequente das tarefas e à sua não conclusão, os procrastinadores passivos parecem ter baixa motivação intrínseca e extrínseca. Os autores apontam também que os procrastinadores ativos devem apresentar níveis relativamente elevados de motivação extrínseca, mas níveis baixos de motivação intrínseca. Os procrastinadores ativos são capazes de concluir as tarefas no último minuto, mas não dedicar mais tempo do que o necessário para cada tarefa. A sua orientação para o trabalho e para a vida pode ser de conseguir o máximo possível no menor tempo possível, manifestando-se um valor que é mais estreitamente alinhado com a motivação extrínseca do que com a motivação intrínseca. Posteriormente, esta dicotomia motivação extrínseca e motivação intrínseca foi considerada pelos autores Ryan e Deci (2000) como sendo bastante redutora, e que através da teoria da autodeterminação a motivação poderia ser classificada de um modo mais integral, variando entre a forma mais autodeterminada para a menos autodeterminada, incluindo assim, a amotivação, a motivação extrínseca e a motivação 27 intrínseca. Através da investigação, pode-se verificar a existência de diferentes tipos de comportamentos motivados extrinsecamente, os quais diferem entre si no padrão em que caracterizam uma resposta autodeterminada ou uma resposta controlada. A teoria da autodeterminação aponta atualmente a existência de cinco tipos de autorregulação que são classificados numa forma contínua de autonomia: amotivação, regulação por introjeção, regulação externa, regulação por identificação e regulação intrínseca. Os comportamentos amotivados são representativos de menor autonomia pelo facto de não existir nenhum objetivo nem nenhuma expectativa de recompensa. A regulação por introjeção esta diz respeito aos comportamentos que foram internalizados, embora não totalmente aceites pelo indivíduo como tendo proveniência no self. Neste tipo de regulação, os constrangimentos externos podem levar a comportamentos que podem dar origem a sentimentos de culpa, típicos dos constrangimentos internos A regulação externa reporta-se aos comportamentos que são controlados pelos outros através de recompensas e dos constrangimentos impostos por eles. A regulação por identificação reflete a circunstância na qual o indivíduo realiza o comportamento pela razão de esse ser importante para si, mantendo o respeito pelos seus valores e objetivos. Finalmente, a regulação intrínseca diz respeito aos comportamentos que são praticados por divertimento, satisfação e prazer (Rayn & Deci, 2000; Sénecal, Koestner, & Vallerand, 1995). Não é de surpreender que a procrastinação esteja estreitamente relacionada com as variáveis da motivação, como a autoeficácia para a autorregulação da aprendizagem, por isso, alguns autores conceptualizaram a procrastinação como sendo uma falha de autorregulação (Chu & Choi, 2005; Steel, 2007). Os indivíduos que possuem autoeficácia para a autorregulação da sua aprendizagem, sabem como orientar os seus processos de aprendizagem, estabelecendo metas adequadas para si próprio, aplicam estratégias apropriadas para atingir os seus objetivos e conseguem uma autorregulação que impulsiona a motivação e a orientação para os seus esforços (Zimmerman et al., 1992). Além disso, de acordo com Zimmerman e Kitsantas (2005) os alunos com autorregulação elevada apresentam uma elevada perceção de autoeficácia, o que influencia a sua competência para os objetivos que eles traçaram para si próprios e o seu compromisso para cumprir esse desafio. Em contraste, os alunos que não possuem autorregulação, podem exibir baixos níveis de persistência na tarefa, de esforço e interesse, que se assemelham a características do comportamento procrastinador. 28 2.4. Fatores psicossociais relacionados com a procrastinação Devido aos aspetos negativos significativos da procrastinação, muitos investigadores têm-se dedicado ao estudo da procrastinação propondo diversas variáveis, cognitivas, emocionais e de personalidade como possíveis preditores (Rabin, Fogel, & Nutter-Upham, 2011). No que respeita ao funcionamento emocional, vários estudos têm encontrado que a ansiedade, a depressão, e a preocupação estão associados com a procrastinação (Ferrari, Johnson, & McCown, 1995; van Eerde, 2003), embora a evidência empírica sobre a relação entre humor e procrastinação não seja definitiva (Steel, 2007). 2.4.1. Género e procrastinação Também as diferenças de género na procrastinação têm sido observadas em pesquisas anteriores, com o género masculino apresentando níveis modestamente elevados de procrastinação em comparação com o género feminino, através de diversos estudos (Steel, 2007). Especula-se que as diferenças de género na procrastinação possam ser mais evidentes no início da adolescência, embora ainda seja uma questão que está a ser explorada empiricamente. As diferenças de género, no estudo de Steel (2007) podem ser explicadas pela forte associação entre a autorregulação e a procrastinação. A procrastinação está fortemente relacionada com os processos autorreguladores, e os adolescentes que estão confiantes de que são capazes de regular a sua aprendizagem, que apresentam uma sensação de controlo sobre o seu estudo, são menos propensos para procrastinar, facto este que se observa em diversos contextos culturais. As pesquisas levadas a cabo pelos autores evidenciam que a autoeficácia para a autorregulação está mais fortemente relacionada com a procrastinação do que a autoestima ou a ansiedade dos testes em diversos contextos culturais (Klassen, et al., 2009). Diversos estudos realizados em termos de avaliar as diferenças de género e a procrastinação académica indicam não haver diferenças significativas entre os sexos na incidência da procrastinação académica, ao contrário da crença popular (Ferrari, 1991; Haycock, McCarty, & Skay, 1998; Hess, Sherman, & Goodman, 2000; Johnson & 29 Bloom, 1995; Rothblum, et. al., 1986; Solomon & Rothblum, 1984; Watson, 2001). Em contraste, Steel (2007) através da sua meta-análise reporta que os homens procrastinam na vida quotidiana mais do que as mulheres. Estas inconsistências sugerem a necessidade de mais pesquisas. 2.4.2. Ansiedade e procrastinação Alguns pesquisadores que estudaram a ansiedade da avaliação/ansiedade para os testes, sugerem que os jovens que são altamente ansiosos não são persistentes perante as tarefas mais difíceis, evitando mesmo aquelas que são mais complexas, revelando características comportamentais similares às de procrastinação. Existe alguma evidência empírica que sugere que os estudantes que encararam uma tarefa como aversiva, que expressaram elevados níveis de ansiedade ou medo de falhar numa tarefa, demonstraram uma maior incidência de procrastinação (Lay, 1994; Solomon & Rothblum, 1984). 2.4.3. Autoestima e procrastinação São vários os autores que têm encontrado evidência empírica de ligações entre a procrastinação e a autoestima (Effert & Ferrari, 1989; Ferrari, 2000), uma vez que a forma como as pessoas percecionam o seu valor pessoal parece estar associado ao seu envolvimento ou evitamento das tarefas académicas. Vários estudos correlacionais têm evidenciado a existência de uma relação negativa entre a autoestima e a procrastinação (Ferran, 2004; Ferrari & Diaz-Morales, 2007; Solomon & Rothblum, 1984; Steel, 2007; van Eerde, 2003), o que revela que os estudantes com maiores níveis de procrastinação reportam menores níveis de autoestima. Para alguns autores a autoestima é visionada como um meio que pode dar origem a comportamentos procrastinatórios. Através de alguns estudos (Ferrari, 1991c; Ferrari & Tice, 2000) é possível verificar que os alunos com grandes níveis de procrastinação adiam as tarefas académicas, colocam de lado o estudo até poucas horas antes dos testes, e diminuem o seu esforço face às atividades escolares o que tem como resultado um baixo rendimento académico. Alguns dos estudantes adiam as tarefas como forma de proteger a sua autoestima, permitindo-lhes 30 assim, atribuir as causas dos seus insucessos a fatores externos, tais como o baixo esforço, a preguiça e a pressão do tempo em vez de admitirem a sua falta de competência. Por outro lado, alguns estudantes que possuem maiores níveis de procrastinação quando comparados como os que têm níveis mais baixos, têm a tendência para optarem por tarefas que consideram mais fáceis, uma vez que estes indivíduos têm uma perceção de si, de pouca competência para resolverem as tarefas que apresentam ser de maior dificuldade (Ferrari, 1991b; 1991c; 1994). 2.4.4. Família e procrastinação A literatura, no entanto, tem evidenciado a existência da relação entre o contexto familiar e a procrastinação, ou seja, práticas educativas parentais desadequadas podem originar comportamentos procrastinadores. Neste sentido, por exemplo, Scher e Ferrari (2000), demonstraram de forma indireta que algumas dinâmicas familiares, por exemplo, as perceções dos pais, desempenham um papel importante no comportamento procrastinatório dos filhos. Este estudo permitiu verificar a existência de uma correlação significativa entre a capacidade dos alunos se recordarem de tarefas escolares concluídas ou não concluídas com a importância percebida da tarefa para os progenitores. Um outro estudo efetuado por Rosário et al., (2009) com duas amostras independentes, uma com 580 e outra com 809 alunos, inseridos no sétimo e nono ano de escolaridade, teve como objetivo verificar a relação entre variáveis sociopessoais (escolaridade dos pais, nível escolar que frequentam, insucesso escolar e número de irmãos) com perfis de procrastinação académica. Em ambas as amostras os resultados foram semelhantes, mostrando que a procrastinação diminui quando a escolaridade dos pais aumenta, e aumenta com o número de irmãos e com o nível de escolaridade e está relacionada positivamente com o insucesso escolar. 31 2.4.5. Tempo e procrastinação A percepção do tempo é também considerada um fator de procrastinação. Ferrari, Mason e Hammer (2006) indicam que os procrastinadores tendem a não se concentrar em tarefas futuras, sugerindo que a procrastinação envolve alguma relação com a perceção do tempo. Segundo os autores, quanto mais longe uma tarefa se encontrar, menos provável será o procrastinador realizá-la. Frequentemente os procrastinadores não se concentram em tarefas futuras que requerem atenção, atrasando assim tarefas importantes e envolvendo-se em outras tarefas irrelevantes. De acordo com Schouwenburg e DeWitte (2002), os procrastinadores podem ter problemas no que respeita às consequências que as suas escolhas atuais apresentam para a viabilidade dos seus objetivos remotos. Isto é, eles podem subestimar a relevância dos esforços atuais para o seu sucesso final. 2.4.6. Procura de ajuda e procrastinação Outra variável que também pode estar relacionada com a procrastinação é a procura de ajuda. Procurar assistência e suporte dos professores e dos grupos de pares é
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