Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
6 CORRENTE ELÉTRICA E RESISTÊNCIA Nos capítulos anteriores estudamos as propriedades de cargas em repouso, assunto da eletrostática. A partir deste capítulo iniciaremos o estudo das correntes elétricas, ou seja, das cargas em movimento. 6.1 CORRENTE ELÉTRICA Quando ligamos uma bateria às duas extremidades de um condutor, uma diferença de potencial V é criada e, se o comprimento do fio for ℓ, então um campo elétrico de módulo E = V/ℓ será criado dentro do condutor. Este campo elétrico ~E atuará sobre os elétrons, imprimindo-lhes um movimento resultante no sentido oposto a ~E. Se uma carga líquida dq passa através de qualquer super- fície num intervalo de tempo dt, dizemos que foi estabelecida uma corrente elétrica, cuja intensidade é definida por I = dq dt . Para uma corrente em um fio, dq é a carga que passa através de uma seção transversal em um tempo dt. A unidade SI de corrente é o ampère (A), definido como 1 ampère = 1 coulomb/segundo A I + + + + + Figura 6.1 – Cargas em movimento através de uma área A. A taxa com a qual a carga flui através da área é definida como a corrente I. A direção da corrente é a direção do movimento das cargas positivas. ©Serway–Jewett 3ed. Note que é necessário que exista o escoamento de uma carga resultante dq para que se estabeleça uma corrente. Além disso, a carga resultante que atravessa uma dada superfície pode ser positiva ou negativa. Por razões his- tóricas, convencionou-se dizer que a corrente possui a mesma direção do fluxo das cargas positivas, como mostra a Figura 6.1. Nos condutores elétricos, como cobre ou alumínio, a corrente é devida ao movimento de elétrons com carga negativa. Portanto, a corrente num condutor possui direção oposta ao movimento dos elétrons. No entanto, se estamos considerando um feixe de prótons carregados positivamente num acelerador, a corrente possui a mesma direção do movimento dos prótons. Portanto, é a carga líquida em movimento que define o sentido da corrente elétrica. Por exemplo, a Figura 6.2 mostra quatro seções I!0II I Figura 6.2 – Cargas movem-se através de quatro regiões: (a) A carga líquida é positiva, portanto a corrente I tem o mesmo sentido das cargas positivas; (b) A carga líquida é positiva e o sentido da corrente é o mesmo do movimento das cargas; (c) A carga líquida é nula, portanto não há corrente fluindo na região; (d) A carga total é negativa e a corrente possui sentido oposto ao do movimento das cargas. ©Serway–Jewett 3ed. de área pelas quais fluem diferentes quantidades de cargas positivas e negativas, o que resulta em diferentes intensidades e sentidos para a corrente elétrica em relação ao movimento das cargas. 6.2 RESISTÊNCIA Vimos no Capítulo 3 que o campo elétrico no interior de um condutor é zero. Entretanto, isto é válido apenas se o condutor estiver em equilíbrio eletrostático. Nesta seção vamos descrever o que acontece quando cargas num condutor não estão em equilíbrio, ou seja, quando há um campo elétrico no interior do condutor. Considere um condutor com uma seção transversal de área A transportando uma corrente I. A densidade de corrente J no condutor é definida como a corrente por unidade de área: J ≡ I A , onde J possui unidades de A/m2. Esta expressão é válida apenas se a densidade de corrente é uniforme e somente se a superfície da seção de área A é perpendicular à direção da corrente. De uma forma geral, a densidade de corrente é uma quantidade vetorial e está relacionada com a corrente I pela expressão I = ˆ ~J · d ~A, onde d ~A é um elemento de superfície e a integral é calculada sobre toda a superfície em questão. O campo elétrico exerce uma força ~F = q~E sobre os por- tadores de carga (elétrons) em um condutor, mas esta força não produz uma aceleração resultante porque os elétrons colidem continuamente com os átomos ou íons que fazem parte do condutor. O efeito das diversas colisões resulta numa pequena velocidade média adquirida pelos elétrons, chamada velocidade de deriva ou arrasto, ~ud. Como os elétrons possuem carga negativa, o sentido da velocidade de Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 28 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 6: Corrente elétrica e resistência vd E – Figura 6.3 – Representação gráfica do movimento dos elétrons em um condutor. Mudanças na direção dos movimentos são o resultado de colisões entre elétrons e átomos no condutor. Note que o movimento líquido do elétron é oposto à direção do campo elétrico. ©Serway–Jewett 3ed. deriva é oposto ao do campo elétrico (Figura 6.3). O número de elétrons livres ou de condução em um comprimento ℓ de um fio condutor é nAℓ, onde n é o número de elétrons por unidade de volume e Aℓ é o volume do comprimento ℓ do fio. A carga que atravessa o fio num intervalo de tempo ∆t = ℓ/vd é ∆q = (nAℓ)e. Logo, a corrente I é dada por: I = ∆q ∆t = nAℓe ℓ/vd = nAevd. Como J = I/A, temos que vd = I nAe = J ne . Ou, em termos vetoriais, temos que: ~J = −ne~ud onde o sinal negativo indica que para os elétrons ~J e ~ud possuem sentidos opostos. A densidade de corrente ~J e um campo elétrico ~E são estabelecidos em um condutor qualquer que seja a diferença de potencial mantida ao longo do condutor. Em alguns materiais, a densidade de corrente é proporcional ao campo elétrico: ~J = σ~E, onde a constante de proporcionalidade σ é chamada de condutividade do condutor. Esta relação é conhecida como a lei de Ohm, que pode ser escrita como: para diversos materiais (incluindo a maioria dos metais), a razão entre a densidade de corrente e o campo elétrico é uma constante σ que é independente do campo elétrico que produz a corrente. Materiais que obedecem a lei de Ohm são chamados ôhmi- cos. Consideremos agora um fio condutor de seção de área A e comprimento ℓ, como mostrado na Figura 6.4. Uma diferença de potencial V é mantida através do fio, criando um campo elétrico e uma corrente ao longo do fio. Supondo que o campo seja uniforme, a diferença de potencial está � Vb Va IA E Figura 6.4 – Uma diferença de potencial V = Vb − Va é aplicada a um condutor cilíndrico de comprimento ℓ e área da seção reta A, originando uma corrente I. ©Halliday 8ed. relacionada com o campo pela expressão V = Eℓ. Portanto, podemos expressar a magnitude da densidade de corrente no fio como J = σE = σ V ℓ . Como J = I/A, podemos escreve a diferença de potencial como V = ℓ σ J = ( ℓ σA ) I = RI. A quantidade R = ℓ/σA é chamada de resistência do condutor. Assim, podemos definir a resistência como a razão entre a diferença de potencial ao longo do condutor e a corrente no condutor: R = V I . Esta equação será muito empregada na análise de circuitos elétricos. A resistência possui unidades SI de volts por ampère, que recebe a denominação de ohm (Ω): 1Ω ≡ 1V 1A . Esta expressão mostra que se uma diferença de potencial de 1 V ao longo de um condutor causa uma corrente de 1 A, a resistência do condutor é de 1 Ω. Um condutor cuja função num circuito é fornecer uma resistência específica é chamado de resistor e é representado num diagrama de circuito com o símbolo . Para uma dada diferença de potencial, quanto maior for a resistência ao fluxo de carga, menor será a corrente. Em termos da resistência, podemos escrever a lei de Ohm como: um condutor obedece à lei de Ohm quando sua re- sistência é independente do valor e da polaridade da diferença de potencial aplicada. O inverso da condutividade é a resistividade ρ: ρ = 1 σ , onde ρ possui unidades de ohm·metro (Ω · m). Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina29 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 6: Corrente elétrica e resistência Como R = ℓ/σA, podemos expressar a resistência de um bloco uniforme de material com comprimento ℓ como R = ρ ℓ A . Note que esta relação só é válida para condutores homogê- neos e isotrópicos de seção reta uniforme e sujeitos a um campo elétrico também uniforme. 6.2.1 Variação da resistividade com a temperatura A resistividade de um material depende da temperatura. A resistência dos metais geralmente aumenta com a tem- peratura. Isto não é surpresa, já que para temperaturas mais altas os átomos movem-se mais rapidamente e estão organizados de forma menos ordenada, afetando de forma mais significativa o fluxo de elétrons. Se a variação de tem- peratura não é tão grande, a resistividade dos metais aumenta aproximadamente de forma linear com a temperatura, de acordo com a relação: ρ = ρ0[1 + α(T − T0)], onde ρ0 é a resistividade numa dada temperatura de refe- rência T0 (como 0°C ou 20°C), ρ é a resistividade a uma temperatura T e α é chamado de coeficiente de temperatura da resistividade. 6.2.2 Semicondutores Semicondutores são substâncias cuja resistividade elé- trica, ao contrário do que ocorre com os condutores normais, diminui com a temperatura. Assim, são condutores nas temperaturas usuais e isolantes nas baixas temperaturas. Exemplos de elementos químicos com propriedades de semicondutores são o germânio e o silício. Além destes elementos, também são semicondutores uma grande quanti- dade de substâncias entre as quais se destacam os compostos binários constituídos por átomos de grupos diferentes da tabela periódica como, por exemplo, GaAs, AlSb e InSb. 6.3 POTÊNCIA EM CIRCUITOS ELÉTRICOS Se uma bateria é usada para estabelecer uma corrente elétrica em um condutor, há uma contínua transformação da energia química na bateria para a energia cinética dos elétrons, isto é, para a energia interna do condutor, o que resulta em um aumento da temperatura do condutor. Vamos determinar uma expressão que permite calcular a taxa pela qual a energia é transferida ao condutor. Em primeiro lugar, vamos considerar um circuito simples como o mostrado na Figura 6.5 onde a energia está sendo transferida diretamente para um resistor. Como os fios que conectam a bateria e o resistor também possuem uma resistência, parte da energia é transferida para os fios e parte para o resistor. Por simplicidade, vamos considerar que a resistência dos fios é desprezível, portanto toda a energia fornecida ao circuito é b a c d R I ∆V + – Figura 6.5 – Um circuito simples consistindo de um resistor de resistência R e uma bateria possuindo uma diferença de potencial V entre seus terminais. Cargas positivas movem-se no sentido horário. ©Serway–Jewett 3ed. transferida para o resistor. Uma quantidade de carga positiva q move-se ao longo de todo o circuito criando uma corrente I. Entre os pontos a e b, a carga move-se através da bateria e a energia potencial elétrica do sistema aumenta por uma quantidade U = qV enquanto a energia potencial química na bateria diminui pela mesma quantidade. Quando a carga move-se de c até d através do resistor, o sistema perde energia potencial elétrica durante as colisões dos elétrons com os átomos no resistor. Neste processo, a energia é transformada em energia interna correspondendo a um aumento do movimento vibracional dos átomos no resistor. Nos segmentos bc e da não ocorre nada, já que desprezamos a resistência do fio condutor. Portanto, quando a carga retorna ao ponto a, parte da energia foi transferida para o resistor na forma de energia interna. O resistor está normalmente em contato com o ar, logo, como sua temperatura aumenta, a energia interna é transferida para o ar na forma de calor. Além disso, o resistor também emite radiação térmica, uma outra forma de transferência de energia. Após um certo intervalo de tempo, o resistor atinge uma temperatura constante e a energia fornecida pela bateria é balanceada pela energia liberada pelo resistor na forma de calor ou radiação. A taxa pela qual o sistema perde energia potencial elé- trica à medida que a carga q atravessa o resistor é então dU dt = d dt (qV) = dq dt V = IV, onde I é a corrente no circuito. O sistema ganha esta energia potencial quando a carga passa através da bateria, ao custo da diminuição da energia química da bateria. Portanto, a potência P = dU/dt que dá a taxa de perda de energia potencial é P = IV. Como para um resistor V = IR, podemos expressar a potência transferida para o resistor como: P = I2R = V2 R . Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 30 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 6: Corrente elétrica e resistência Se a corrente I é expressa em ampères, V em volts e R em ohms, a unidade SI de potência é o volt·ampère ou watt: 1 volt · ampère = 1 joule coulomb · coulomb segundo = 1watt O processo pelo qual a potência é perdida como energia interna em um condutor de resistência R é frequentemente chamado aquecimento Joule ou efeito Joule. Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 31 7 CIRCUITOS DE CORRENTE CONTÍNUA Neste capítulo vamos tratar da física de circuitos elétricos que contêm resistores, fontes e capacitores. Vamos limitar a discussão a circuitos nos quais as cargas se movem sempre no mesmo sentido, conhecidos como circuitos de corrente contínua ou circuitos DC (do inglês Direct Current). 7.1 FONTES DE FEM Para fazer passar cargas elétricas por um resistor pre- cisamos estabelecer uma diferença de potencial entre as extremidades do dispositivo. O dispositivo que mantém a voltagem constante em um circuito é chamado de fonte de fem, ou simplesmente fonte. Originalmente, o termo fem era uma abreviação de força eletromotriz, que era usada para designar a diferença de potencial produzida por uma fonte de tensão, embora na verdade não se trate de uma força. As fontes de fem (símbolo E ) são todos os dispositi- vos (por exemplo, baterias e geradores) que aumentam a energia potencial de um circuito mantendo uma diferença de potencial entre pontos no circuito enquanto cargas o atravessam. Pode-se pensar em uma fonte de fem como sendo uma “bomba de carga” que faz com que os elétrons se desloquem em uma direção oposta ao campo elétrico dentro da fonte. A diferença de potencial máxima entre os terminais de uma fonte, quando nenhuma corrente é fornecida para um circuito, é chamada de fem da fonte. A fem E de uma fonte descreve o trabalho realizado por unidade de carga, ou E = dW dq . A unidade de fem é o joule/coulomb que, como já vimos, é o volt (V). Uma fonte real, como uma bateria, tem sempre alguma resistência interna r para o fluxo de cargas. Consequente- mente, quando ligamos uma bateria a um circuito gerando uma corrente elétrica ao longo dele, a diferença de potencial entre os terminais da bateria será uma quantidade diferente da sua fem. Por exemplo, considerando o circuito mostrado na Figura 7.1, vamos determinar a diferença de potencial entre os pontos a e b, V = Vb − Va. Quando passamos pela fonte entre o terminal negativo e o positivo, o potencial aumenta por uma quantidade E . Quando passamos através da resistência r, o potencial diminui por uma quantidade Ir, onde I é a corrente no circuito. Assim, a voltagem da bateria é (7.1) V = E − Ir. Para uma bateria ideal, r = 0 e portanto V = E. Se nenhuma corrente flui na bateria, V = E. Portanto, a diferença de potencial entre os terminais de uma bateria depende da corrente na bateria e de sua resistência interna. ε a d R I b r – + c (a) I Figura 7.1 – Um circuitocontendo uma fonte de fem com resis- tência interna r e um resistor com resistência R. ©Serway–Jewett 3ed. Considere novamente o circuito da Figura 7.1. A dife- rença de potencial entre os pontos c e d, que atravessa o resistor é V = IR. Como a diferença de potencial fornecida pela bateria deve ser igual à diferença de potencial ao longo do resistor, podemos reescrever a Eq. 7.1 como (7.2) E − Ir = IR⇒ E = IR + ir. Isolando a corrente obtemos I = E R + r . Esta equação mostra que num circuito simples a corrente elétrica depende da resistência externa R e da resistência interna r da bateria. Se R é muito maior que r, como é o caso de muitos circuitos reais, podemos desprezar r e a corrente será dada por: I = E R , que é a corrente máxima de um circuito operando a uma dada fem E e com uma resistência R. Se multiplicamos a Eq. 7.2 pela corrente I, obtemos IE = I2R + I2r. Esta equação indica que a potência total fornecida pela bate- ria IE é transferida para a resistência externa na quantidade I2R e para a resistência interna na quantidade I2r. 7.2 RESISTORES EM SÉRIE E EM PARALELO 7.2.1 Resistores em série A Figura 7.2 mostra dois resistores R1 e R2 formando uma combinação em série. As correntes que atravessam ambos os resistores são iguais já que a quantidade de carga que passa através de R1 também deve passar através de R2 no mesmo intervalo de tempo. Portanto, a diferença de potencial aplicada em uma combinação em série de resistores será Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 32 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 7: Circuitos de corrente contínua dividida entre os resistores, ou seja V = IR1 + IR2 = I(R1 + R2) = IReq, onde Req é a resistência equivalente do circuito dada por: Req = R1 + R2 + ... + RN . Esta relação indica que a resistência equivalente de uma combinação em série de resistores é a soma numérica das resistências individuais e é sempre maior que qualquer resis- tência individual. Figura 7.2 – Combinação de resistores em série. ©Tipler–Mosca 5ed. 7.2.2 Resistores em paralelo Agora considere a combinação de resistores mostrada na Figura 7.3, que representa resistores em paralelo. Quando a corrente atinge o ponto a, chamado de nó, ela se divide em duas partes I1 e I2. Um nó de um circuito é portanto caracterizado como qualquer ponto de um circuito no qual a corrente se divide. Esta divisão implica que menos corrente passará por cada resistor individual do que a corrente total fornecida pela bateria. Como a carga elétrica (ou a corrente) no circuito é conservada, a corrente I que entra no ponto a deve ser igual às correntes que o deixam, isto é I = I1 + I2, onde I1 é a corrente em R1 e I2 é a corrente em R2. A diferença de potencial entre os resistores é a mesma, logo I = I1 + I2 = V R1 + V R2 = V ( 1 R1 + 1 R2 ) = V Req , onde novamente Req é uma resistência equivalente para um circuito com resistências em paralelo, dada por 1 Req = 1 R1 + 1 R2 + ... + 1 RN . Para dois resistores, temos: Req = R1R2 R1 + R2 . Estas expressões mostram que o inverso da resistência equi- valente de dois ou mais resistores conectados em paralelo é igual à soma dos inversos das resistências individuais. Figura 7.3 – Combinação de resistores em paralelo. ©Tipler– Mosca 5ed. 7.3 REGRAS DE KIRCHHOFF Conforme vimos anteriormente, circuitos simples podem ser analisados usando a expressão V = IR e regras para combinações de resistores em série e em paralelo. Porém, em muitos casos não é possível reduzir um circuito a uma forma simples. Para analisar circuitos mais complexos, como o da Figura 7.6, utilizamos dois princípios chamados regras de Kirchhoff: 1. Regra dos nós (conservação de cargas) Em um nó, a soma das correntes elétricas que entram é igual à soma das correntes que saem, ou seja, um nó não acumula carga. Por exemplo, para o nó mostrado na Figura 7.4, a relação entre as correntes será I1 = I2 + I3. Esta regra está relacionada ao princípio da conservação de cargas aplicado a circuitos elétricos. ∑ Ientra = ∑ Isai. (a) I1 I2 I3 Figura 7.4 – Regra dos nós de Kirchhoff. ©Serway–Jewett 3ed. 2. Regra das malhas (conservação de energia) A soma algébrica das diferenças de potencial encontradas em todos os pontos ao longo de um percurso completo do circuito deve ser igual a zero. Esta regra está associada ao princípio da conservação da energia em circuitos. ∑ ao longo do circuito V = 0 Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 33 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 7: Circuitos de corrente contínua Quando aplicamos a segunda regra de Kirchhoff na prática, consideramos as seguintes convenções de sinal: (a) I a b∆V = –IR (b) I a b∆V = +IR (c) ε a b ∆V = +ε – + (d) a b ∆V = –ε –+ ε ε ε Figura 7.5 – Regras para determinação das diferenças de potencial através de um resistor e uma bateria. Cada elemento é atravessado da esquerda para direita. ©Serway–Jewett 3ed. • Se atravessamos um resistor na direção da corrente, a diferença de potencial será −IR (Figura 7.5a). • Se atravessamos um resistor na direção oposta da cor- rente, a diferença de potencial será +IR (Figura 7.5b). • Se a fonte de fem (assumindo que possui resistência in- terna desprezível) é atravessada na direção da fem (de − para +), a diferença de potencial será +E (Figura 7.5c). • Se a fonte de fem (assumindo que possui resistência interna desprezível) é atravessada na direção oposta da fem (de + para −), a diferença de potencial será −E (Figura 7.5d). 7.3.1 Exemplo de aplicação das regras de Kirchhoff Dado o circuito mostrado na Figura 7.6, desejamos obter os valores das correntes I1, I2 e I3. Solução Em primeiro lugar, não podemos simplificar o circuito usando as regras para resistores em série ou paralelo. Deve- mos utilizar, então, as regras de Kirchhoff. Vamos definir de forma arbitrária as direções das correntes tal como mostrado na Figura 7.6. Aplicando a lei dos nós para o ponto c, obtemos I1 + I2 = I3. Temos uma equação com três variáveis desconhecidas. Logo, para encontrar os valores das correntes precisamos de pelo menos mais duas equações que envolvam essas três variáveis. Podemos dividir o circuito em três malhas, ou caminhos: abcda, be f cb e ae f da. Portanto, necessitamos 14.0 V e b 4.0 Ω – + 10.0 V 6.0 Ω –+ f I2 c I3 I1 2.0 Ω da (Example 28.9) A circuit containing Figura 7.6 – Um circuito de malhas múltiplas. ©Serway–Jewett 3ed. determinar as equações para duas malhas para encontrar as correntes. Aplicando a regra das malhas para os caminhos abcda e be f cb e atravessando o circuito no sentido horário, obtemos as seguintes expressões: abcda : 10,0 V − (6,0 Ω)I1 − (2,0 Ω)I3 = 0 be f cb : −(4,0 Ω)I2 − 14,0 V + (6,0 Ω)I1 − 10,0 V = 0 Portanto, temos três equações para determinar três variáveis. Substituindo I3 = I1 + I2 na equação para abcda, temos: 10,0 V − (6,0 Ω)I1 − (2,0 Ω)(I1 + I2) = 0 10,0 V = (8,0 Ω)I1 + (2,0 Ω)I2 = 0 Dividindo cada termo da expressão para be f cb por 2 temos: −12,0 V = −(3,0 Ω)I1 + (2,0 Ω)I2 Substituindo esta equação na anterior, eliminamos I2 e obte- mos 22,0 V = (11,0 Ω)I1 I1 = 2,0 A E determinamos I2 fazendo (2,0 Ω)I2 = (3,0 Ω)I1 − 12,0 V (2,0 Ω)I2 = (3,0 Ω)(2,0 A) − 12,0 V = −6,0V I2 = −3,0 A Finalmente, I3 = I1 + I2 I3 = −1,0 A Para finalizar o problema, notamos que as correntes I2 e I3 são ambas negativas, indicando que as correntes possuem sentido oposto do que escolhemos inicialmente. Prof. Abílio Mateus Jr.Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 34 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 7: Circuitos de corrente contínua 7.4 CIRCUITOS RC Até agora analisamos circuitos de corrente contínua nos quais a corrente é constante. Se incluirmos capacitores nestes circuitos, a corrente terá sempre a mesma direção mas pode variar com o tempo. Um circuito contendo uma combinação em série de um resistor e um capacitor é chamado circuito RC. Um exemplo deste tipo de circuito é mostrado na Figura 7.7. 7.4.1 Carregando o capacitor Considere o circuito da Figura 7.7 com o capacitor em (a) inicialmente descarregado. Não há corrente no circuito já que a chave S mantém o circuito aberto. Se a chave for fechada em t = 0, a carga começará a fluir estabelecendo uma corrente elétrica ao longo do circuito, o que ocasionará o carregamento do capacitor. À medida que as placas do capacitor vão sendo carregadas, a diferença de potencial no capacitor aumenta. O valor máximo da carga nas placas depende da voltagem da bateria. Quando a carga máxima é atingida, a corrente no circuito é zero pois a diferença de potencial no capacitor iguala-se à voltagem fornecida pela bateria. Para analisar este circuito quantitativamente, vamos apli- car a lei das malhas de Kirchhoff após a chave ser fechada. Seguindo o circuito da Figura 7.7b no sentido horário, temos (7.3) E − q C − IR = 0, onde q/C é a diferença de potencial no capacitor e IR é a di- ferença de potencial no resistor, onde usamos as convenções de sinal mostradas na Figura 7.5. Para o capacitor, note que estamos atravessando-o na direção da placa positiva para a negativa; isto representa uma diminuição do potencial. As- sim, usamos o sinal negativo para esta diferença de potencial. Note que q e I são valores instantâneos que dependem do tempo à medida que o capacitor vai sendo carregado. Podemos utilizar a Eq. 7.3 para encontrar a corrente inicial no circuito e a carga máxima no capacitor. No instante em que a chave é fechada (t = 0), a carga no capacitor é zero, logo a corrente inicial I0 no circuito é máxima e igual a I0 = E R (corrente em t = 0). Quando o capacitor está carregado com seu valor máximo de carga Q, não há mais fluxo de carga, a corrente no circuito é zero e a diferença de potencial na bateria foi transferida completamente para o capacitor. Substituindo I = 0 na Eq. 7.3 obtemos a carga máxima do capacitor Q = CE carga máxima. Para determinar as expressões analíticas da dependência temporal da carga e da corrente, devemos resolver a Eq. 7.3. A corrente deve ter o mesmo valor em todos os pontos do circuito-série. Assim, a corrente que atravessa a resistência R ε S R C ε R S I q– + q t < 0 t > 0 Figura 7.7 – Um circuito contendo uma fonte, um resistor e um capacitor. Quando a chave do circuito é ligada, o capacitor começa a ser carregado. ©Serway–Jewett 3ed. deve ser a mesma entre as placas do capacitor. Esta corrente é igual a taxa pela qual a carga nas placas do capacitor varia. Logo, substituímos I = dq/dt na Eq. 7.3, rearranjando os termos, temos: dq dt = E R − q RC . Para encontrar o valor de q, resolvemos esta equação dife- rencial simples. Primeiro, combinamos os termos do lado direito: dq dt = CE RC − q RC = − q −CE RC . Agora, multiplicando por dt e dividindo por q−CE, obtemos dq q −CE = − 1 RC dt. Integrando esta expressão, usando o fato que q = 0 em t = 0, obtemos ˆ q 0 dq q −CE = − 1 RC ˆ t 0 dt ln ( q −CE −CE ) = − t RC . E resolvendo o logaritmo, podemos escrever esta expressão como (7.4) q(t) = CE ( 1 − e−t/RC ) = Q ( 1 − e−t/RC ) , onde Q = CE é a carga máxima no capacitor. Podemos determinar uma expressão para a corrente dife- renciando a Eq. 7.4 em relação ao tempo. Usando I = dq/dt, encontramos (7.5) I(t) = E R e−t/RC . A quantidade RC, que aparecem nos expoentes na Eq. 7.4 e Eq. 7.5, é chamada de constante de tempo τ do circuito: τ = RC. Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 35 Notas de aula – FSC 5133: Física Teórica B Capítulo 7: Circuitos de corrente contínua S RC –Q +Q R S I –q +q C t < 0 t > 0 Figura 7.8 – Um circuito simples contendo um resistor e um capacitor. ©Serway–Jewett 3ed. 7.4.2 Descarregando o capacitor Agora considere o circuito mostrado na Figura 7.8, que consiste de um capacitor carregado com uma carga inicial Q, um resistor e uma chave. Quando a chave está aberta (Figura 7.8a), uma diferença de potencial Q/C existe entre as placas do capacitor e é zero no resistor pois I = 0. Se a chave é fechada em t = 0, o capacitor inicia o processo de descarga através do resistor. Num instante t durante a descarga, a corrente no circuito é I e a carga no capacitor é q (Figura 7.8b). Note que o circuito da Figura 7.8 é o mesmo da Figura 7.7 se removermos a bateria. Assim, eliminando a fem E da Eq. 7.3, obtemos − q C − IR = 0. Substituindo I = dq/dt nesta expressão, fica −R dq dt = q C dq q = − 1 RC dt. Integrando esta expressão, usando o fato que q = Q em t = 0, temos ˆ q Q dq q = − 1 RC ˆ t 0 dt ln ( q Q ) = − t RC q(t) = Qe−t/RC . Diferenciando esta expressão em relação ao tempo nos dá a corrente instantânea em função do tempo: I(t) = dq dt = d dt ( Qe−t/RC ) = − Q RC e−t/RC , onde Q/RC = I0 é a corrente inicial. O sinal negativo indica que à medida que o capacitor descarrega, a direção da corrente é oposta à direção quando o capacitor estava sendo carregado. Notamos que tanto a carga no capacitor como a corrente no circuito decaem exponencialmente a uma taxa caracterizada pela constante de tempo τ. Prof. Abílio Mateus Jr. Departamento de Física (CFM) http://abiliomateus.net/ensino Universidade Federal de Santa Catarina 36
Compartilhar