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Disciplina: Sociologia Durkheim: Suicídio e Religião Professor: Marcelo Ottoni Durante Universidade Federal de Viçosa Bibliografia: • ARON, Raymond. As Etapas do Pensamento Sociológico, São Paulo: Martins Fontes, 2008 – Segunda Parte - Durkheim 02/12 Curso Sociologia Durkheim: Suicídio Problema da Relação entre Indivíduos e o Grupo na Sociedade Moderna • Durkheim considera positivo a diferenciação dos indivíduos e das profissões, a regressão da autoridade da tradição, o domínio crescente da razão e a evolução da parte que foi deixada à iniciativa pessoal. Contudo, observa que o homem não se sente mais feliz nas sociedades modernas e registra o aumento de suicídios como expressão dos traços patológicos da organização atual da vida coletiva. • As sociedades tradicionais atribuem a cada indivíduo um lugar fixado pelo nascimento ou por imperativos coletivos. Nessas sociedades, seria anormal o individuo reivindicar uma situação adaptada a seus gostos ou méritos. Nas sociedades modernas, marcadas pelo individualismo, cada um quer aquilo a que julga ter direito e o princípio individualista de justiça se torna o princípio coletivo da ordem social. • O problema central de toda e qualquer sociedade é a relação entre os indivíduos e o grupo.Nas sociedades modernas, este relacionamento é transformado pelo fato de que os homens se tornaram por demais conscientes de si mesmo para aceitar cegamente quaisquer imperativos sociais. Tal individualismo, em si mesmo desejável, comporta perigos, pois o indivíduo pode exigir da coletividade mais do que esta pode lhe dar. É preciso uma disciplina que só a sociedade pode impor. Se os valores comuns se debilitarem, a sociedade fica ameaçada de desintegrar. 03/12 Curso Sociologia Durkheim: Suicídio e Religião Durkheim: Equívocos nas Explicações Existentes do Suicídio • O foco do estudo de Durkheim é a relação entre a fenômeno individual (suicídio) e o fenômeno coletivo (taxa de suicídio). • Durkheim desconsidera a associação entre a incidência de suicídio e estados psicopatológicos e disposições hereditárias. Afasta também, nas suas análises preliminares, a interpretação do suicídio como fenômeno de imitação (Gabriel Tarde), pois sob este rótulo 3 fenômenos distintos são confundidos: 1. Fusão das consciências: Sentimentos comuns (atos, crenças e as paixões) afetam um grande número de pessoas e pertencem a cada um por que pertencem a todos. O suporte do suicídio é a coletividade e não um ou mais indivíduos. 2. Adaptação do individuo à coletividade: Cada um se sujeita as regras coletivas e imperativos sociais mais ou menos difusos e o indivíduo prefere não se singularizar, agindo da forma como se comportam os outros. 3. Imitação: O ato tem origem no ato semelhante ao realizado anteriormente por outrem, sem que entre a representação e a execução se intercale qualquer operação intelectual sobre as características intrínsecas do ato reproduzido. (tosse ou o bocejo) Neste caso, seria possível seguir o contágio do suicídio num mapa, a partir de um centro onde a taxa seria mais elevada. A distribuição dessas taxas é irregular e incompatível com a idéia da imitação. 04/12 Curso Sociologia Durkheim: Suicídio Tipos de Suicídio Definidos por Durkheim Egoísta: Homens e mulheres se suicidam mais quando pensam essencialmente em si mesmos, quando não estão integrados em um grupo social e os desejos que os animam não podem ser reduzidos a uma medida compatível com o destino humano pela autoridade do grupo. Só atingem um certo equilíbrio graças a uma força exterior de ordem moral (religião, família, etc) que lhes ensina a moderação e os ajuda a encontrar a paz. Altruísta: Não se trata de excesso de individualismo, mas sim pelo desaparecimento do indivíduo no grupo. O indivíduo se mata devido a imperativos sociais, sem pensar sequer fazer valer seu direito à vida. Se manifesta pela energia e paixão. Um sinal moderno de suicídio altruísta é o aumento da freqüência de suicídios no exército. Anômico: Revelado pela correlação estatística que identifica um aumento dos suicídios nos períodos de crise econômica e de grande prosperidade. Este suicídio atinge os indivíduos devido às condições de vida nas sociedades modernas, em que a existência social não é regulamentada pelos costumes. Os indivíduos estão em competição permanente uns com os outros; esperam muito da vida e se sentem sempre acuados pelo sofrimento resultante da desproporção entre suas aspirações e satisfações. O suicídio anômico se manifestará pela irritação associada às numerosas situações de decepção oferecidas pela vida moderna. 05/12 Curso Sociologia Durkheim: Suicídio Fenômenos Sociais são a Base dos Fenômenos Individuais • As sociedades são de natureza diferente dos indivíduos, pois os fenômenos sociais, cujo suporte é a coletividade e não a soma dos indivíduos, comandam os fenômenos individuais. • Um exemplo de fenômeno social são as correntes suicidógenas que levam os indivíduos a se matarem, embora cada um deles pense que está obedecendo apenas a si mesmo. As correntes suicidógenas, que atravessam a sociedade, não atingem qualquer indivíduo. Quem se suicida estava predisposto ao suicídio pela sua constituição psicológica, por fraqueza nervosa ou distúrbios mentais. • As sociedades modernas apresentam certos sintomas patológicos, principalmente a insuficiente integração do individuo na coletividade. O suicídio anomico é o que mais interessa a Durkheim, pois ocorre em todos os casos em que se produz um exagero da atividade e uma ampliação das trocas e das rivalidades. Estes fenômenos são inseparáveis das sociedades em que vivemos, mas a partir de um certo limiar tornam-se patológicos. • Da mesma forma, em todas as sociedades um certo numero de crimes são cometidos. Esta regularidade retira o caráter patológico do crime. O crime constitui um fenômeno socialmente normal, o que não significa que os criminosos não sejam anormais e nem que o crime não mereça ser condenado ou punido. 06/12 Curso Sociologia Durkheim: Suicídio Esforço de Reintegração dos Indivíduos na Sociedade • Os indivíduos precisam consentir em limitar seus desejos, obedecendo às regras sociais que determinam seus objetivos e os meios que têm o direito de empregar. • Problemas na promoção da reintegração no âmbito da: – Família: A taxa de suicídio anômico não aumenta menos entre os casados do que entre os solteiros, ou seja, a família não oferece proteção contra a corrente suicidógena, e as funções da família estão em declínio na sociedade moderna. – Estado ou grupo político: Estas instâncias da vida coletiva estão muito afastadas do indivíduo e são excessivamente abstratas e autoritárias para proporcionar o contexto necessário à integração. – Religião: Nas sociedades modernas, as religiões tem cada vez mais um caráter abstrato e intelectual. Incitam os indivíduos a transcender suas paixões e a viver de acordo com a lei espiritual, mas não conseguem precisar as obrigações ou as regras às quais os homens devem submeter-se na vida profana. • No mundo moderno, o único grupo social que favorece a integração dos indivíduos na coletividade é a profissão ou a corporação. As corporações são as organizações profissionais que, reunindo empregadores e empregados, estariam em condições para constituir escolas de disciplina. Além disto, responderiam ao caráter da sociedade moderna, onde predominam as atividades econômicas. 07/12 Curso Sociologia Durkheim: Suicídio Ciência da Religião • As ciências detêm hoje, nas nossas sociedades individualistas e racionalistas, a autoridade intelectual e moral suprema. • Estas sociedades necessitam de crenças e regras comuns, que não podem mais ser proporcionadas pelas religiões tradicionais, uma vez que elas não respondem àsexigências do espírito científico. • A ciência da religião revela a possibilidade de reconstituir as crenças necessárias ao consenso por que nos mostra que a nossa sociedade ainda é capaz de fabricar deuses, uma vez que todos os deuses do passado constituíram a transfiguração da própria sociedade. • O objetivo de Durkheim é elaborar uma teoria com base na análise das instituições religiosas mais simples e primitivas, pressupondo que é possível apreender a essência de um fenômeno social observando suas formas mais elementares. • Se a religião é uma criação coletiva, seria contrário à teoria um sociólogo criar sozinho uma religião. Descobrindo a verdade profunda de todas as religiões, a ciência não recria uma religião, mas dá confiança na capacidade que têm as sociedades de produzir em cada época os deuses de que necessitam. 08/12 Curso Sociologia Durkheim: Formas Elementares da Vida Religiosa Definição de Religião • Durkheim desqualifica as antigas interpretações sobre religião: – Animismo: A crença religiosa num espírito que é a transfiguração das experiências que os homens têm em termos de corpo e alma. – Naturismo: Os homens adorariam as forças naturais transfiguradas. – Se a religião consistisse em amar espíritos irreais ou forças naturais, ela corresponderia a uma alucinação coletiva. Nem as forças naturais e nem os espíritos ou almas são sagrados por si mesmos. • Segundo Durkheim, a categoria do religioso é constituída pela distinção bipartida do mundo entre o profano e o sagrado. O sagrado tem sua força derivada da coletividade, que é superior a todos os indivíduos. A religião pressupõe a noção do sagrado, em seguida, a organização das crenças relativas ao sagrado e, por fim, os ritos ou práticas derivados das crenças. • O racionalismo científico salva a religião ao demonstrar que os homens nunca adoraram senão sua própria sociedade, pois só a sociedade é uma realidade sagrada por si mesma. • A noção de igreja é acrescentada ao conceito de sagrado para diferenciar a religião da magia, pois implica necessariamente na existência de um consenso entre os fiéis, reunidos em uma igreja. 09/12 Curso Sociologia Durkheim: Formas Elementares da Vida Religiosa Importância da Cerimônia e dos Ritos para a Criação do Divino • A sociedade favorece o surgimento de crenças quando os indivíduos estão em comunhão uns com os outros e, na efervescência da festa, adquirem a capacidade de criar o divino. A cerimônia, atividade coletiva que aproxima os indivíduos em função de práticas e comportamentos semelhantes, arrasta os indivíduos para fora de si mesmos, faz com que participem da força do grupo e dá-lhes o sentimento de algo que não tem medida comum com a vida cotidiana. • A sociedade desperta em nós o sentimento do divino, um preceito que se impõe e é superior aos indivíduos, provocando o respeito, o devotamento e a adoração. O objeto do culto é uma força anônima, difusa e próxima dos indivíduos. • As sociedades são levadas a criar deuses ou religiões quando entram num estado de exaltação que resulta da intensificação da vida coletiva. Isto ocorre, nas sociedades modernas, por ocasião das crises políticas e sociais. 10/12 Curso Sociologia Durkheim: Formas Elementares da Vida Religiosa Religião como Origem Primitiva da Ciência • A religião não é apenas o núcleo primitivo do qual saíram as regras morais e regras religiosas, mas também é a origem primitiva do pensamento científico. Esta teoria sociológica do conhecimento possui três proposições: 1. As formas primitivas de classificação estão ligadas às imagens religiosas do universo, retiradas das representações que as sociedades fazem de si mesmas e da dualidade do mundo profano e sagrado. 2. A idéia de causalidade só pode provir da sociedade, pois é a sociedade que dá aos homens a concepção de que existe uma força superior à dos indivíduos. 3. A teoria sociológica do conhecimento fornece o meio para superar a oposição entre o empirismo (conceitos resultam da experiência sensível) e o apriorismo (conceitos resultam do espírito humano). O empirismo é falso por não explicar como os conceitos saem dos dados sensíveis e o apriorismo é falso por não explicar nada, colocando no espírito humano aquilo que é preciso explicar. • Assim como no contexto das religiões, os conceitos científicos se impõem aos indivíduos porque são representações coletivas, exprimindo a maneira pela qual as sociedades representam as coisas. Desta forma, verificamos que a eficácia da demonstração científica depende da sociedade ter uma fé na ciência. 11/12 Curso Sociologia Durkheim: Formas Elementares da Vida Religiosa Limites da Análise de Durkheim sobre a Religião • Para Durkheim, a sociedade é ao mesmo tempo real e criadora do ideal. Uma vez que a sociedade não é só real, os indivíduos passam a adorar uma realidade transcendente. Nesta hipótese, a religião é uma alucinação, exatamente do mesmo grau que a representação naturista ou animista. Assim, saímos do totemismo para ingressar numa espécie de religião da humanidade, no sentido de Comte. Nesta hipótese, não é a sociedade que explica a noção do sagrado; é a noção de sagrado, dada ao espírito humano, que transfigura a sociedade como pode transfigurar qualquer outra realidade. • Durkheim afirma que a sociedade cria a religião quando está em efervescência. Uma vez que o que existem são sociedades, se o culto se dirige a sociedades, a essência da religião consistira em inspirar aos homens uma vinculação a grupos parciais, consagrando a ligação de cada um deles com a coletividade e sua hostilidade em relação aos outros. 12/12 Curso Sociologia Durkheim: Formas Elementares da Vida Religiosa
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