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Direito e Filosofia na Idade Moderna

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ANOTAÇÕES DE FILOSOFIA GERAL E JURÍDICA
PROFESSOR CARLOS HENRIQUE PEREIRA DE MEDEIROS
Tópico IV – OS ELEMENTOS DA FILOSOFIA RENASCENTISTA NA FILOSOFIA MODERNA E ILUMINISTA
Tema 01: Direito e filosofia na Idade Moderna
1. Questões introdutórias: movimentos de transição
a) A reforma protestante
O final da Idade Média é marcado pelo questionamento das posições filosóficas estabelecidas por Agostinho e, sobretudo, por Tomás. Dentre outros fatores que marcam este questionamento, a reforma protestante ganha fundamental destaque. A fundamentação filosófica de Tomás é colocada em xeque pelo protestantismo.
É que o protestantismo emergente mostra-se mais radical nas noções de verdade pela fé, de salvação pela graça e de povo eleito por Deus. Por isso, busca em Agostinho a fundamentação para sua teoria. Em contraposição, o catolicismo reafirma sua base nas interpretações de São Tomás de Aquino. A Igreja Católica, embora reconhecesse Agostinho como filósofo maior durante 800 anos, declara válidas as noções tomistas, seja teológica seja filosoficamente.
Lutero e Calvino filiam-se radicalmente às noções agostinianas, contrapondo-as ao tomismo moderado dos papas católicos. Noções de fé e de graça passam a ser o eixo para tal oposição. Para os protestantes, a Igreja Católica estava perdida por sua complacência com os atos dos homens poderosos e com a corrupção do clero. 
Por isso mesmo, Martinho Lutero, um monge de formação agostiniana, declara que pela fé, e não pelos atos, o homem se justifica. Com Lutero, a possibilidade de salvação humana por meio dos atos humanos mesmo está fora de questão. Paulo e Agostinho ressurgem, contudo, com nova fundamentação. Já que a carta aos romanos de Paulo permite um questionamento sobre o governo dos homens: respeita-se, segundo Lutero, a autoridade não porque é boa, mas porque deriva da vontade divina. E se deve respeitar o direito porque é legitimado por Deus.
João Calvino, homem de formação jurídica sólida e de pensamento filosófico estruturado, firma desde a proeminência da graça a noção máxima de predestinação. Agora, não os atos que justificam o justo, mas o desdobramento do plano estabelecido por Deus para cada homem, já que somente na graça divina é que se pode dar a salvação. Agostinho, por isso, é chamado para firmar a noção de direito constituído pela vontade divina.
Rejeitar o mundo em favor de uma graça divinamente estabelecida, a graça de Deus, mostra-se o caminho. Mas a graça deve ser encontrada neste mundo mesmo, e não fora dele. Abandonar o mundo estando nele deve ser, portanto, buscar a graça divina. E; e abandonar o mundo significa abandonar as práticas mundanas para voltar-se ao Sagrado: mais que atos justos, a salvação está orientada pela fé; não são os atos justos na Terra que salvam, mas os atos orientados pela justiça divina. Eis, pois, a raiz da noção protestante de justiça.
Com a reforma, pobreza e riqueza na Terra afastam-se do debate político, pois se relacionam com a vontade divina: se existem, é a vontade de Deus. Já do ponto de vista teológico, riqueza pode significar sinal da graça de Deus; a prosperidade mostra-se sinal da eleição divina: quanto mais prospera o homem, tanto mais sinal possui de que é um eleito de Deus.
Como os governos e suas leis derivam da vontade divina, não se questionam as coisas do Estado. O mundo reformado, então, deve submeter-se ao poder terreno e sua lei positiva, porque a vida interior voltada a Deus independe dos resultados de leis corrompidas ou injustas. A reforma, portanto, proporciona um distanciamento dos homens em relação as coisas do Estado, o que gera conseqüência.
b) A contra-reforma católica
Mas a Igreja Católica não permanece inerte à reforma protestante. Com efeito, institui uma contra-reforma, que se desdobra em termos institucionais, políticos e intelectuais. O tomismo marca no catolicismo a caracterização das noções de fé e de salvação. A conseqüência jurídica da contra-reforma se mostra quando se apreende o movimento como uma construção jurídica que segue na direção de um direito natural independente da graça e da fé.
A contra-reforma é marcada por dois fatos históricos: a fundação da Companhia de Jesus (1534-1540) e o Concílio de Trento (1545-1563). Com o Concílio estabelece-se o ressurgimento de Tomás, no entanto, de modo diverso do estabelecido pela escolástica. A contra-reforma chega a ser, por isso mesmo, nomeada segunda escolástica.
Juristas como Francisco Suarez, Francisco de Vitória e Bartolomé de Las Casas trabalham na elaboração do pensamento jurídico da contra-reforma. De certo modo, para a contra-reforma, mesmo os homens que não conheciam a palavra divina teriam direitos naturais. Mas não um direito natural no sentido que o conhecemos, e sim no sentido de um direito de povos que participam de alguma maneira da natureza. A contra-reforma, ao contrário da reforma, consagra então um direito aos povos em geral; um direito das gentes que independe da nacionalidade e da formação teológica.
c) O Renascimento
Mas não somente a reforma e a contra-reforma caracterizam a passagem do medievo para a modernidade. O movimento renascentista também se mostra fundamental. Caracteriza-se, do ponto de vista intelectual, pelo ressurgimento da antiguidade clássica e helênica, em especial o pensamento de Platão, Aristóteles, os platonismos, o epicurismo, o estoicismo, o ceticismo, etc. 
O renascimento é também chamado de humanismo, por direcionar os problemas filosóficos não para as questões de Deus, mas para o homem. Representa certo rompimento com as tradições que determinam que o governo dos homens deve decorrer da vontade divina. Com o humanismo, toda e qualquer noção de poder deve ser derivada do homem e não de Deus: do homem, por seu engenho, astúcia e capacidade. 
Entre os renascentistas humanistas destacam-se Dante Alighieri, Petrarca, Boccacio. Caracteriza-se como um vigoroso movimento que alcança domínio nas idéias políticas, filosóficas e jurídicas, aqui se destacando pensadores como Maquiavel, Bodin e Grócio. 
Se no medievo Deus estava no centro da organização de todas as coisas, inclusive do Estado e suas leis, no renascimento o centro gravitacional mostra-se bem distinto: a razão humana permite que o Estado e seu Direito sejam engendrados. O Direito Natural deve agora, portanto, basear-se não na vontade divina, mas no homem e em sua vontade.
2. Pensamento filosófico e jurídico moderno
A) Maquiavel
Niccolò Machiavelli (1469-1527) foi secretário da República de Florença e representa um expoente do pensamento moderno nascente. Em sua obra O Príncipe desdobra uma noção em que o homem do pensamento deve voltar-se para a realidade. Para ele, a ação do homem deve estar voltada para o momento histórico real de sua pátria. 
Em sua Florença, a unidade política precisava ser restaurada, já que os governos não se sustentavam e, em efeito, causavam problemas efetivos para a ordem política e econômica. Sua doutrina exposta no Príncipe volta-se, por isso, para a manutenção do governo político. Unidade e universalidade do Direito, neste contexto, são elementos observados por Maquiavel. 
Maquiavel afasta a arte de administrar da moralidade. Por isso, em sua obra já não há espaço para uma noção de Direito Natural. A noção de justo em Maquiavel, em efeito, não pode se apresentar em um cunho estritamente ético, mas deve ser algo da ordem da política, já que o justo, para ele, deve residir na manutenção e na unidade do governo. 
A doutrina de Maquiavel caracteriza-se pelo estabelecimento de noções efetivas para o exercício do poder na sua forma-Estado e nas relações entre os Estados. Analisa Maquiavel, portanto, o mundo político tal qual dado em sua realidade, e não desde as perspectivas de especulações. Neste contexto, então, o direito aparece na forma de lei e se manifesta nas relações efetivas. 
A obra de Maquiavel encontra um problema político efetivo: a vida política de Florença. Daí suas análises afastadas de especulações. A Maquiavel, por isso, é dado o título decientista político, e não de filósofo político, já que analisa a realidade política de seu tempo ao invés de especular sobre a política. 
O direito em Maquiavel deve residir, portanto, no campo da atuação humana. Como afasta toda tua teoria das noções da Igreja, Maquiavel será considerado um “maldito” e toda sua obra será renegada, considerada negativamente. Daí a derivação do termo “maquiavélico” como algo relacionado ao mal, ao ruim, ao perverso. 
Em sua obra Discurso sobre a primeira década de Tito Lívio, Maquiavel empreende uma espécie de retomada das experiências políticas e jurídicas de Roma. Com isso, resgata, de certo modo, uma tradição que coloca a filosofia no centro de discussão da política. Pode-se, então, afirmar que a Razão retoma seu lugar de destaque na obra de Maquiavel.
Para Maquiavel, duas forças que se opõem ao longo a história: uma que quer dominar e outra que não quer ser dominada. Os dominadores não sufocam definitivamente os vencidos, mas os subjugam e mantém a dominação. 
O que marca a história, portanto, é um confronto de grupos que se enfrentam pela assunção do domínio: ordem e desordem se revezam. A um tempo de ordem sucede um tempo de desordem, e uma nova ordem sucede uma nova desordem, e assim sucessivamente. O problema político, então, está em encontrar mecanismos que imponham estabilidade nas relações, que sustentem uma determinada correlação de forças. A Estabilidade deve ser o ponto de Maquiavel. A necessidade determina que sejam encontrados mecanismos para manter a ordem por mais tempo que a desordem.
Se a Itália da época de Maquiavel, dividida, corrompida, vivia sujeita tanto às invasões externas quanto às revoltas internas, faz-se necessário o aparecimento de um homem virtuoso capaz de fundar e governar o Estado: mostra-se necessário um Príncipe.
Para se opor à crença da predestinação dos governantes, que dominava o cenário político há tempos, Maquiavel chama a alegoria de Virtù e Fortuna. Para ele, a política é uma prática dos homens livres e uma atividade terrena; e esta prática exige Virtù, o domínio sobre a Fortuna.
Fortuna, no mito antigo, possui os bens que os homens desejam: a honra, a riqueza, a glória, o poder. O homem que seduz a deusa, uma mulher, dela recebe os presentes desejados. Mas para seduzi-la é necessário Virtù (virilidade) de inquestionável coragem. Logo, o homem de mais virtù deve, portanto, governar os outros homens: este será o príncipe.
Como o poder se expressa em termos de força, o seu domínio deve ser virtuoso. O príncipe deve, então, exercer a força de modo virtuoso. E se a Política possui uma ética e uma lógica diferente da moralidade, o Príncipe deve ser aquele que exerce o poder de forma virtuosa não por buscar o bem, mas por mirar, em última instância, a estabilidade de seu governo.
A idéia de virtude cristã mostra-se contrária à virtude política de Maquiavel. O florentino possibilita que a política seja feita e pensada não nos termos da moralidade piedosa do cristianismo, mas em termos de necessidades práticas e efetivas da ação política. Daí, inclusive, mais um fator para que a Igreja o demonize e o aloque no rol dos autores malditos. 
Seja como for, o pensamento político moderno crítico se permite desmistificado pela atitude de Maquiavel. Com ele, possibilidades são abertas ao questionamento do poder tal qual apresentado pelos filósofos da Igreja. Mais do que isso, com Maquiavel, torna-se possível laicizar as coisas do Estado. Depois dele, temas como soberania, fundamentação do Estado não em uma vontade divina, mas na vontade dos indivíduos, são abordados o se tornam possíveis. Há, pois, uma guinada no pensamento filosófico.

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