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Revista Biotecnologia ciência e desenvolvimento - N 35 - 2005

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Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 1
2 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança tem novo presidente
Transparência, isenção e participação pública são as prioridades do médico Walter Colli
Polêmicas à parte, o plantio de produtos transgênicos vem
crescendo significativamente no Brasil nos últimos anos.
Prova disso é que, de acordo com dados do ISAAA –
International Service for the Acquisition of Agri-Biotech
Application, o Brasil é hoje o terceiro maior usuário de la-
vouras GM, perdendo apenas para Estados Unidos e Argen-
tina. Além disso, foi o país que teve o maior aumento em
área plantada com lavouras transgênicas, 9,4 milhões de hec-
tares em 2005, ou seja, 4,4 milhões a mais do que os 5 mi-
lhões registrados em 2004.
Mas, mesmo com todo esse quadro de crescimento, os
problemas internos enfrentados pelos produtores e instituições que
pesquisam produtos transgênicos ainda são muitos. Por isso o médi-
co Walter Colli, que é o novo presidente da Comissão Técnica de
Biossegurança sabe que tem um grande desafio à sua frente. Com
ele, começa também uma nova era dessa Comissão, que havia sido
formalmente extinta no dia 24 de março de 2005.
Para encarar esse desafio da melhor maneira possível, Colli
conta com um quadro de 54 conselheiros de diferentes áreas que,
segundo ele, refletem a pluralidade do Brasil. Além disso, defende
que por ser uma instância técnica e apolítica, continuará pautando
suas ações e decisões pelos debates à exaustão de conteúdos absolu-
ta e eminentemente técnicos. “O que esperamos é que sempre pre-
valeça o argumento com fundamentos solidamente alicerçados na
literatura científica conhecida, bem como no que de mais moderno
as pesquisas científicas indicarem, nos termos dispostos na Lei de
Biossegurança e no Decreto que a regulamenta”, ressalta o novo
presidente.
Em entrevista à revista Biotecnologia, Ciência & Desen-
volvimento, no dia 08 de março, Colli falou sobre as suas priorida-
des à frente da Comissão, enfatizando que a transparência e a parti-
cipação pública serão as prioridades da sua nova gestão. Confiram:
Fernanda Diniz
Jornalista
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 3
BC&D - Assumir a presidência de
uma comissão como a CTNBio,
que trata de assuntos tão contro-
versos, como transgênicos e célu-
las-tronco é, sem dúvida, um de-
safio. Quais são as suas priorida-
des no comando da Comissão?
Colli - Ao Presidente da Comissão
cabe presidir as reuniões obedecen-
do estritamente os termos da Lei e
da legislação infra-legal. A CTNBio é
constituída de 27 membros titulares
e 27 membros suplentes. A legisla-
ção prevê trabalho para todos. Isso
quer dizer que, em tese, uma reu-
nião poderá contar com 54 membros.
Ao Presidente cabe moderar e agir
com isenção. Tendo em vista a qua-
lidade dos membros, a força do Pre-
sidente se resume apenas ao seu
voto.
BC&D - O senhor acha que a for-
mação multidisciplinar da Comis-
são está adequada ao cumprimen-
to de seus objetivos?
Colli - A sociedade brasileira é plu-
ral. A Lei procurou expressar essa
pluralidade, garantindo na composi-
ção da CTNBio a expressão das vari-
adas opiniões sobre assuntos tão di-
versos quanto polêmicos. A CTNBio,
no entanto, por ser uma comissão es-
tritamente técnica e apolítica, deverá
continuar pautando suas ações e de-
cisões pelos debates à exaustão de
conteúdos absoluta e eminentemen-
te técnicos. Espera-se que sempre
prevaleça o argumento com funda-
mentos solidamente alicerçados na
literatura científica conhecida, bem
como no que de mais moderno as
pesquisas científicas indicarem, nos
termos dispostos na Lei de Biosse-
gurança e no Decreto que a regula-
menta.
BC&D - Como funciona a CTNBio?
São realizadas reuniões mensais
para discussão dos assuntos em
pauta?
Colli – O art. 21 do decreto 5.591/05
define que a CTNBio reunir-se-á, em
caráter ordinário, uma vez por mês
e, extraordinariamente, a qualquer
momento, através de convocação de
seu Presidente ou por solicitação fun-
damentada e subscrita pela maioria
absoluta de seus membros. Desta
forma, a CTNBio tem um calendário
anual proposto pela Coordenação
Geral e aprovado pelo plenário.
Como são 54 conselheiros não é fá-
cil marcar reuniões de afogadilho, já
que os membros da CTNBio proce-
dem de todos os quadrantes do país.
BC&D - Desde que voltou a funci-
onar, quais foram as principais
decisões da CTNBio?
Colli – Houve, de fato, apenas uma
reunião. Essa reunião elegeu a lista
tríplice para o Ministro escolher o
Presidente e o Vice-Presidente e dis-
cutiu e votou o Regimento Interno
que foi aprovado pelo ministro Sér-
gio Rezende e publicado no DOU
no último dia 07/03/2006. Devo di-
zer que isso não é pouco, tendo em
vista visões diferentes sobre vários
assuntos. Foi um primeiro exercício
de busca de consenso. Quero dizer
ainda que a Lei exige publicação pré-
via de extratos de pleitos que devem
ficar 30 dias submetidos ao escrutí-
nio público, sem o que será ilegal
discutí-los. Na medida do possível, a
Secretaria os está preparando e eu
estou autorizando a sua publicação.
BC&D - Durante o tempo em que a
Comissão ficou sem funcionar,
muitos projetos de biotecnologia
ficaram parados. O senhor acha
que isso pode representar atraso
para o desenvolvimento da ciên-
cia no Brasil?
Colli – Todos os trabalhos de pes-
quisa – de Universidades, de Institu-
tos de Pesquisa, de laboratórios pri-
vados – que utilizem OGMs e seus
derivados necessitam de aprovação
da CTNBio. Como a antiga Comissão
foi formalmente extinta em 24 de mar-
ço de 2005, data de promulgação da
nova Lei e a CTNBio somente reto-
mou seus trabalhos agora, algum pre-
juízo deve ter havido, mas não é pos-
sível quantificá-lo.
BC&D - Sabemos pela mídia da
grande quantidade de produtos
transgênicos entrando ilegalmen-
te no país. Como a Comissão pre-
tende se posicionar diante desse
assunto?
Colli - Temos também acompanha-
do as notícias acerca desse assunto
pela imprensa. Todavia, não está sob
responsabilidade da CTNBio a tarefa
da fiscalização.
BC&D - O desenvolvimento de pro-
dutos transgênicos causou e cau-
sa polêmica junto à sociedade bra-
sileira. O senhor acha que essa si-
tuação melhorou? E como a Co-
missão pretende fazer em relação
à opinião pública, isto é, haverá
divulgação para a imprensa dos
produtos liberados?
Colli – A lei 11.105/05 e o decreto
5.591/05 que a regulamentou, intro-
duziram no marco legal da biossegu-
rança brasileira alguns mecanismos de
transparência e participação pública
no processo decisório da CTNBio,
principalmente no que se refere a
eventos GM destinados à comerciali-
zação. Um deles, por exemplo, é a
possibilidade de realização de audi-
ências públicas com o objetivo claro
de ouvir a população interessada so-
“A nova lei de
Biossegurança
resolveu um
problema que estava
levando incertezas às
comunidades
científica e
empresarial.”
4 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
bre eventuais liberações para o con-
sumo humano. Um outro mecanis-
mo de transparência introduzido pela
nova lei é a publicidade. Todos os
atos da CTNBio estão sendo divul-
gados não apenas no DOU mas tam-
bém em sua página eletrônica com
o seguinte endereço
www.ctnbio.gov.br . Lá, estão dispo-
níveis para consulta pública a pauta
das reuniões, os extratos prévios e
os extratos técnicos de parecer, as
atas, o calendário anual de reuniões
e, em breve, o trâmite de todos os
processos.
BC&D - Mesmo com toda a polê-
mica que cerca os produtos trans-
gênicos desde o começo, o Brasil
foi o país que teve o maior aumen-
to em área plantada com transgê-
nicos em 2005, de acordo com
dados do ISAAA. O senhor acha
possível hoje o desenvolvimento
agrícola no Brasil sem a biotecno-
logia?
Colli – À medidaque a Ciência pro-
gride os diversos setores da socieda-
de se apropriam das técnicas por ela
desenvolvidas. Nesse sentido, a bio-
tecnologia moderna faz uso das no-
vas técnicas da mesma forma que ou-
tras, agora consideradas clássicas, fo-
ram usadas no passado. Espera-se
que as novas tecnologias, em com-
plemento às já existentes na área
agrícola e em outras áreas, possam
ajudar os países a resolverem seus
problemas de abastecimento ou, pelo
menos, minimizá-los.
BC&D - O senhor acha que a Lei
de Biossegurança é um incentivo
para que o setor privado invista
mais em pesquisa agrícola no Bra-
sil?
Colli – A nova lei de Biossegurança
resolveu um problema que estava
levando incertezas às comunidades
científica e empresarial. Refiro-me ao
conflito de competências que existia
entre a lei de biossegurança e a lei
ambiental. O advento da lei 11.105/
05, bem como de seu decreto regu-
lamentador, trouxe segurança jurídi-
ca para esses setores. Portanto, o atual
marco legal da biossegurança brasi-
leira é um novo momento para o
Brasil.
BC&D - Mudando para a área de
saúde humana, o que o senhor,
como médico, pensa da polêmica
que envolve as células-tronco? Se
os embriões descartados em clíni-
cas de fertilização in vitro serão
irremediavelmente descartados,
não seria ao menos razoável que
ao invés disso fossem utilizados
para pesquisa? Qual a sua posição?
Colli – O assunto células tronco, em
que pese constar da Lei de Biosse-
gurança, não é de responsabilidade
da CTNBio. De acordo com o Art.
5º, §2º da Lei 11.105/05, bem como
o art. 63, §2º do decreto 5.591/05, as
instituições de pesquisa que realizem
pesquisa ou terapia com células tron-
co-embrionárias humanas deverão
submeter seus projetos à apreciação
e aprovação dos respectivos comitês
de ética em pesquisa, na forma da
resolução do Conselho Nacional de
Saúde. No entanto, não me furtan-
do à pergunta, lembro que a lei au-
toriza o uso de embriões após três
anos de congelamento com o con-
sentimento dos pais, além de embri-
ões inviáveis ou portadores de mu-
tações que levem a doenças genéti-
cas.
BC&D - Tem sido discutida, pela
mídia, a inconstitucionalidade da
Lei de Biossegurança. Se essa Lei
for realmente considerada incons-
titucional, isso não implicaria
mais atrasos para o desenvolvi-
mento da ciência e tecnologia no
Brasil?
Colli – O papel na CTNBio está de-
vidamente definido na lei 11.105/05
no seu decreto regulamentador bem
como no regimento interno. À justi-
ça caberá decidir esse entendimento
e o que por ela for deliberado será
acatado.
BC&D – A eterna indecisão do go-
verno brasileiro em relação ao de-
senvolvimento da biotecnologia,
que vai se manifestar novamente
na MOP3, não pode prejudicar o
país em relação ao contexto inter-
nacional?
Colli - A Convenção da Diversidade
Biológica (COP) ocorrerá nos próxi-
mos dias 13 a 17 em Curitiba e nos
dias 20 a 24, na mesma cidade, terá
lugar a Reunião das Partes sobre o
protocolo de Cartagena (MOP). O
Brasil ocupa posição muito especial,
pois é signatário do protocolo de Car-
tagena, é megabiodiverso e é gran-
de exportador de OGMs. As autori-
dades brasileiras, responsáveis pela
negociação dos termos do protoco-
lo, terão a sabedoria necessária para
optar pelos melhores interesses do
Brasil.
BC&D - Como o senhor vê a MOP3,
acha que pode contribuir para o
avanço da biotecnologia e da bi-
ossegurança no país?
Colli - Falando genericamente, o pro-
tocolo de Cartagena trata das medi-
das de biossegurança no uso de
OGMs. Assim, principalmente os pa-
íses que o assinaram estão preocu-
pados com esses assuntos. Todavia,
existem implicações de ordem comer-
cial que afetam diretamente os ter-
mos do protocolo. Como já disse,
estou certo que as autoridades brasi-
leiras terão a sensibilidade necessá-
ria para levar em conta todas essas
questões e, ao final, escolherem o
que for mais adequado aos interes-
ses do Brasil.
“Espera-se que
sempre prevaleça o
argumento com
fundamentos
solidamente
alicerçados na
literatura científica
conhecida.”
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 5
www.biotecnologia.com.br
um mundo de informações ao seu alcance
6 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
Colaboraram nesta edição:
BIOTECNOLOGIA
Ciência & Desenvolvimento
KL3 Publicações
Fundador
Henrique da Silva Castro
Direção Geral e Edição
Ana Lúcia de Almeida
Diretor de Arte
Henrique Castro Fº
Projeto Gráfico
Agência de Comunicação IRIS
E-mail
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Portal
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Departamento Comercial,
Redação e Edição:
SRTV - Sul Quadra 701
Ed. Palácio do Rádio II
Sala 215 CEP: 70340-902
Brasília DF
Os artigos assinados são de
inteira responsabilidade
de seus autores.
ISSN 1414-6347
Nota: Todas as edições da Revista Biotecnologia Ciência &
Desenvolvimento estão sendo indexadas para o AGRIS
(International Information System for the Agricultural Sciences
and Technology) da FAO e para a AGROBASE (Base de Da-
dos da Agricultura Brasileira).
Adriana Sartori de Almeida Santos
Alcides de Amorim Ramos
Alcides Lopes Leão
Ana Paula Rocha da Silva
Carla Maísa Camelini
Cesar Martins
Claudete Aparecida Mangolin
Daniela Bertolini Zanatta
Diouneia Lisiane Berlitz
Eliana Valéria Patussi
Elizabeth Juliana Ghiuro Valentini
Fabiana de Souza Gouveia
Fernanda Antunes Alves - Costa
Giuliano Dragone
Isaac Stringueta Machado
João Batista de Almeida e Silva
Joice Felipes
José Antonio Visintin
Jose Luis Vega-Pla
José Ribamar Felipe Marques
Juan Vicente Delgado Bermejo
Juliana Pereira Bravo
Lidia Mariana Fiuza
Marcella Pecora Milazzotto
Marcelo Farid Pereira
Marcelo Maraschin
Margarida de Mendonça
Maria Aparecida Fernandez
Maria de Fátima C. L. F. Távora
Maria de Fátima Pires da Silva Machado
Maria Iracilda da Cunha Sampaio
Maria Rosa Costa
Mayra Elena Ortiz d’Ávila Assumpção
Paulo Fernando Dias
Pedro Pablo Rodríguez Gallardo
Ricardo Rodrigues Ciferri
Sandra Aparecida de Oliveira-Collet
Sílvia Helena Zequim-Maia
Solange Inês Mussatto
Ubimara Pereira Rodrigues
Valério Américo Balani
Vânia G. M. Mattaraia
Virgínia Barreto Moreira
Walter Colli
Weber Beringui Feitosa
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 7
Conselho Científico
Dr. Aluízio Borém - Genética e Melhoramento Vegetal
Dr. Henrique da Silva Castro - Saúde;
Dr. Ivan Rud de Moraes - Saúde - Toxicologia;
Dr. João de Deus Medeiros - Embriologia Vegetal;
Dr. Maçao Tadano - Agricultura;
Dr. Naftale Katz - Saúde;
Dr. Pedro Jurberg - Ciências;
Dr. Sérgio Costa Oliveira - Imunologia e Vacinas;
Dr. Vasco Ariston de Carvalho Azevedo - Genética de Microorganismos;
Dr. William Gerson Matias - Toxicologia Ambiental.
Conselho Brasileiro de Fitossanidade - Cobrafi
Dr. Luís Carlos Bhering Nasser - Fitopatologia
Fundação Dalmo Catauli Giacometti
Dr. Eugen Silvano Gander - Engenharia Genética;
Dr. José Manuel Cabral de Sousa Dias - Controle Biológico;
Dra. Marisa de Goes - Recursos Genéticos
Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - IPEN
Dr. José Roberto Rogero
Sociedade Brasileira de Biotecnologia - SBBiotec
Dr. Luiz Antonio Barreto de Castro - EMBRAPA
Dr. Diógenes Santiago Santos - UFRGS
Dr. José Luiz Lima Filho - UFPE
Dra. Elba P. S. Bon - UFRJ
ENTREVISTENTREVISTENTREVISTENTREVISTENTREVISTAAAAA
WALTER COLLI Pág. 02
PESQUISAPESQUISAPESQUISAPESQUISAPESQUISA
TRANSFERÊNCIA GÊNICA MEDIADA POR ESPERMATOZÓIDES Pág. 08
ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO: CUIDADOS E DESCARTES Pág. 16
DNAr 5S Pág. 22
MUTAÇÕES E RECOMBINAÇÕES GENÉTICAS GERAM UVAS COLORIDAS Pág. 29
β-GLUCANAS DO COGUMELO Pág. 36
INOVAÇÕES NA PRODUÇÃO DE CERVEJAS Pág. 48
VARIABILIDADE GENÉTICA DE EQUINOS DA AMAZONIA BRASILEIRA Pág. 52
A UTILIZAÇÃO DA BIOTECNOLOGIA NA SERICICULTURA BRASILEIRA Pág. 56
CONCENTRAÇÕESDE BAP E TDZ NA PROPAGAÇÃO In Vitro de CURAUÁ Pág. 62
BACILLUS THURINGIENSIS e MELIA AZEDARACH Pág. 66
8 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
Pesquisa
TRANSFERÊNCIA GÊNICA MEDIADA
POR ESPERMATOZÓIDES
Ilustrações cedidas pelos autores
Espermatozóide Como Vetor de DNA Exógeno na Produção de Animais Transgênicos
Weber Beringui Feitosa
Médico Veterinário, Mestrando em Reprodução
Animal, FMVZ, USP
Marcella Pecora Milazzotto
Bióloga, Doutoranda em Biotecnologia, USP
José Antonio Visintin
Prof. Dr. do Departamento de Reprodução Animal,
FMVZ, USP
Mayra Elena Ortiz d'Ávila Assumpção
Prof. Dr. do Departamento de Reprodução Animal,
FMVZ, USP
INTRODUÇÃO
Animais geneticamente modifica-
dos são definidos como aqueles que
apresentam DNA de origem exógena,
introduzido por manipulação genéti-
ca (JACENKO, 1997). Apesar dos pri-
meiros experimentos terem sido con-
duzidos em ratos, durante os últimos
15 anos, os estudos realizados em
animais de laboratório têm sido ex-
trapolados para animais de interesse
zootécnico (PINKERT; MURRAY,
1999). Assim, a transferência gênica é
utilizada na produção de modelos
para estudos básicos ou aplicados, no
desenvolvimento de animais com alto
valor genético adicionado, na produ-
ção de animais para uso industrial ou
farmacêutico e na produção de órgãos
para xenotransplante.
Para a geração destes animais, são
utilizadas três metodologias principais:
injeção de DNA exógeno em pró-nu-
cleos de zigotos; produção de quime-
ras por modificação de célula-tronco
embrionária e, mais recentemente,
transferência nuclear. Para esta últi-
ma, células somáticas cultivadas in
vitro são modificadas geneticamente
e posteriormente fundidas com oóci-
tos receptores enucleados (McCREA-
TH et al., 2000). Estudos sobre a pro-
dução de animais transgênicos têm
sido desenvolvidos intensivamente e
com sucesso em camundongos e ra-
tos (CHARREAU et al., 1996). Entre-
tanto a adaptação e a utilização des-
tas técnicas em animais domésticos
continuam problemáticas (WALL et al.,
1997), apresentando baixa integração
do transgene (EYESTONE, 1994).
Para contornar estas dificuldades,
o uso de espermatozóides como ve-
tor de DNA na produção de animais
transgênicos tem sido empregado
como método alternativo. A primeira
evidência de que espermatozóides de
mamíferos são capazes de se ligarem
às moléculas de DNA exógeno ocor-
reu há 34 anos (BRACKETT et al.,
1971). Entretanto devido ao início das
pesquisas em biologia molecular e
fecundação in vitro, estes achados
foram esquecidos até o final da déca-
da de 80. Lavitrano et al. (1989) e Are-
zzo et al. (1989) mostraram que es-
permatozóides comportam-se como
vetores, transferindo DNA exógeno
para o interior de oócitos durante o
processo de fecundação e mais espe-
cificamente que células espermáticas
do epidídimo absorvem espontanea-
mente DNA plasmidial. Este achado
foi confirmado posteriormente por
vários grupos (ATKINSON et al. 1991;
CASTRO et al., 1991; HORAN et
al.,1991; GAGNÉ et al., 1991).
 A transferência gênica mediada
por espermatozóide (TGME) oferece
uma poderosa ferramenta para a trans-
genia animal e a biotecnologia nas
espécies em que a reprodução ocorre
por gametas, principalmente naque-
las em que as técnicas convencionais
apresentam baixa eficiência, como
suínos e bovinos. Esta revisão se pro-
põe a discorrer sobre a produção de
animais transgênicos utilizando o es-
permatozóide como vetor de DNA
exógeno, abordando aspectos como
a interação de DNA exógeno com as
células espermáticas e a sua internali-
zação no núcleo do espermatozóide.
INTERAÇÃO
A interação do DNA exógeno com
células espermáticas é um evento iô-
nico. Lavitrano et al. (1992), ao incu-
barem espermatozóides com molécu-
las de DNA entre 150bp e 7 kb, ob-
Pesquisa
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 9
servaram que moléculas maiores se
ligam mais eficientemente aos esper-
matozóides do que as moléculas me-
nores. Isto exclui a possibilidade da
internalização do DNA no esperma-
tozóide ser devido simplesmente à sua
permeabilidade através dos poros,
pois desta forma, moléculas peque-
nas seriam favorecidas em relação as
maiores. Tal fato sugere que a carga
das moléculas pode ter função impor-
tante na interação do DNA exógeno
com células espermáticas. De fato,
moléculas carregadas negativamente
parecem ser favorecidas molecular-
mente em suas interações específicas,
já que uma dada quantidade de carga
é necessária para completa ligação e
ou internalização.
Segundo Camaioni et al. (1992), o
DNA é mais comumente detectado no
segmento equatorial e na região pós-
acrossomal dos espermatozóides de
camundongos e uma minoria, na re-
gião apical do acrossoma, o mesmo
ocorrendo em espermatozóides de
bovinos, suínos e humanos. A locali-
zação específica da ligação do DNA
exógeno na região pós-acrossomal do
espermatozóide somado à relevância
da carga na interação entre o DNA
exógeno e o espermatozóide sugerem
a existência de um substrato, possi-
velmente uma proteína na cabeça dos
espermatozóides, no qual moléculas
negativamente carregadas podem se
ligar. Lavitrano et al. (1992) encontra-
ram proteínas de 30 a 35 kDa na ca-
beça dos espermatozóides.
 Resultados semelhantes foram
encontrados por Zani et al. (1995) que
ao pesquisarem o mecanismo envol-
vido na interação DNA-espermatozói-
de, identificaram três classes de pro-
teínas como potenciais substratos para
a interação do DNA exógeno com o
espermatozóide. A primeira classe é
uma proteína de baixo peso molecu-
lar, abaixo de 20 kDa que foi classifi-
cada como protamina. A segunda clas-
se é uma proteína de peso molecular
entre 30 e 35 kDa e a terceira classe,
de peso molecular em torno de 50
kDa. Estas proteínas estão presentes
na região da cabeça dos espermato-
zóides atuando como substrato para
a ligação do DNA exógeno, forman-
do um complexo estável (SPADAFO-
RA 1998). As proteínas de 30-35 kDa
representam o mais provável substra-
to fisiológico para a ligação do DNA,
visto que é o único grupo no qual a
mobilidade eletroforética é conserva-
da entre espécies de mamíferos tanto
quanto em peixes e equinodermes.
Além do mais, é a única classe de pro-
teínas acessíveis ao DNA exógeno em
células espermáticas intactas. As pro-
teínas de 30 a 35 kDa purificadas in-
teragem com o DNA exógeno geran-
do complexo proteína/DNA. Estes re-
sultados sugerem que a interação do
DNA exógeno com o espermatozói-
de é específica e mediada por fatores
protéicos em que o DNA exógeno se
liga para ser carreado para o núcleo.
Outra molécula que atua na liga-
ção do DNA exógeno com o esper-
matozóide é o complexo maior de his-
tocompatibilidade (MHC) de classe II.
Espermatozóides de camundongo
Figura 1: Representação esquemática dos mecanismos de transfecção de células espermáticas. a)
Incubação dos espermatozóides com o DNA exógeno. Após a lavagem do sêmen para a retirada
do plasma seminal contendo o fator de inibição IF-1, as moléculas de DNA exógeno se ligam a
proteínas ligadoras de DNA (PLDNA) presentes na membrana do espermatozóide, o que ativa a
internalização do DNA exógeno mediada por moléculas de CD4, representada pelo complexo
DNA/PLDNA/CD4. B) Na lipofecção, a carga positiva do lipossomo interage com a carga negativa
do DNA exógeno formando lipoplexos que sofrem endocitose sendo carreados para o núcleo. c)
Pulsos elétricos alternados na eletroporação, abrem poros na membrana plasmática do
espermatozóide facilitando a internalização do DNA exógeno.
10 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
knockout para MHC da classe II apre-
sentaram redução na ligação com o
DNA exógeno. Embora não tenha sido
encontrada molécula de MHC de clas-
se II em células espermáticas, sua ex-
pressão parece ser necessária duran-
te a espermatogênese para produzir
célulasespermáticas capazes de se li-
garem aos DNA exógeno (LAVITRA-
NO et al., 1997).
Por outro lado, existem também
moléculas que atuam como regulado-
res negativos no processo de intera-
ção do DNA exógeno com esperma-
tozóide. A alta permeabilidade de cé-
lulas espermáticas ao DNA exógeno
faz da fecundação um risco para a
identidade genética da prole. Entre-
tanto, isto é incomum na natureza. Em
contraste ao que acontece com célu-
las espermáticas do epidídimo, esper-
matozóides do ejaculado na presença
de plasma seminal são impermeáveis
ao DNA exógeno, sugerindo que o
plasma seminal possui fatores que
inibem a permeabilidade dos esper-
matozóides.
 A hipótese da existência de fato-
res de inibição no plasma seminal foi
confirmada por Lavitrano et al. (1992)
que, ao acrescentarem quantidades
crescentes de plasma seminal, obtive-
ram taxas decrescentes da ligação dos
espermatozóides com o DNA exóge-
no. O mesmo efeito do plasma semi-
nal foi observado por Camaioni et al.
(1992), que relataram aumento na
porcentagem de espermatozóides li-
gados ao DNA exógeno quando o
sêmen foi lavado antes da exposição
ao DNA. De fato, o plasma seminal
possui fator que antagoniza fortemen-
te a ligação do DNA exógeno, prote-
gendo os espermatozóides. Posterior-
mente, o fator inibitório de ligação do
DNA exógeno às células espermáti-
cas foi identificado e caracterizado
como uma glicoproteína, chamado de
Fator Inibitório 1 (IF-1). Este prova-
velmente se une às proteínas ligado-
ras de DNA exógeno dos espermato-
zóides, inibindo a interação DNA exó-
geno-espermatozóides (ZANI et al.
1995). Estas proteínas ligadoras de
DNA e o IF-1 aparentemente possu-
em alta afinidade, sendo que molécu-
las de IF-1 foram capazes de remover
DNA exógeno já associados às prote-
ínas ligadoras de DNA.
Carbalada e Esponda (2001) des-
creveram dois outros fatores que atu-
am como reguladores negativos na
interação do DNA exógeno com os
espermatozóides. O primeiro é o flui-
do da vesícula seminal, que possui
forte atividade de DNase dependente
de cálcio e magnésio. Este achado não
é surpresa, pois já foi descrita a pre-
sença de DNase no sêmen bovino
(TANIGAVA et al., 1975), estando tam-
bém presente no ejaculado de muitas
espécies mamíferas (MAMM; LU-
TWAK-MAMM, 1981). Provavelmente
a DNase é responsável pela maior ati-
vidade inibitória no plasma seminal.
Carbalada e Esponda (2001) observa-
ram forte correlação entre a atividade
de DNase e a habilidade desta ativi-
dade em inibir a interação DNA/es-
permatozóide. O segundo fator é o
fluido da próstata ventral que exibe
uma moderada atividade inibitória, o
qual possui proteínas ligadoras de
DNA que se ligam ao DNA exógeno.
Todas as proteínas são encontradas
em níveis muito baixo, especialmen-
te aquelas entre 50 e 80 kDa. A mais
abundante são as proteínas de 25kDa,
porém sua afinidade não é muito alta.
De qualquer modo, a contribuição
destas proteínas na inibição da inte-
ração do DNA com os espermatozói-
des são irrelevantes quando compa-
radas com a atividade da DNase (CAR-
BALADA; ESPONDA, 2001)
INTERNALIZAÇÃO
A proporção de DNA internaliza-
do no núcleo do espermatozóide ocor-
re em proporção constante como ob-
servado por microscopia eletrônica
(FRANCOLINI et al. 1993), em que 15
a 20% do DNA ligado ao espermato-
zóide foram eficientemente internali-
zados no núcleo dos espermatozói-
des e coberto pela cromatina. A inter-
nalização no núcleo também foi con-
firmada por microscopia confocal (BA-
CHILLER et al., 1991) e análise bio-
química (ATKINSON et al., 1991). La-
vitrano et al. (1997) relatam que o CD4
iniciam um importante papel na in-
ternalização do DNA. Camundongos
knockout para CD4 apresentaram efi-
ciência igual de ligação do DNA exó-
geno ao espermatozóide em compa-
ração aos camundongos normais, po-
rém foram incapazes de internalizá-
los no núcleo. O índice de internali-
zação constante somado com a loca-
lização específica da ligação do DNA
exógeno na região sub-acrossomal do
espermatozóide e o papel das molé-
culas de CD4 sugerem que a interna-
lização do DNA exógeno no núcleo
espermático provavelmente não é
conseqüência de um processo passi-
vo e incontrolado, mas provavelmen-
te mediado por mecanismos regula-
tórios.
Zoraqui e Spadafora (1997) obser-
varam que o DNA plasmidial interna-
lizado torna-se fortemente associado
com o núcleo, é extensivamente re-
organizado e sofre recombinação com
o DNA genômico do espermatozói-
de. Estes mesmos autores construíram
uma biblioteca genômica usando o
DNA extraído de espermatozóides
previamente incubados com o plas-
mídeo pSV
2
CAT, o que gerou o isola-
mento de diversos clones em que a
seqüência do plasmídeo foi recombi-
nada com o DNA cromossomal de
camundongo. Entre os clones, dois
foram selecionados aleatoriamente (7
e 8,5 kb) e seqüenciados. Em ambos,
a seqüência do DNA plasmidial foi
integrada na seqüência genômica de
células espermáticas de camundongo.
Os locais de integração foram identi-
ficados nos dois clones analisados,
sendo flanqueados por seqüências
idênticas, sugerindo que estes even-
tos não ocorrem aleatoriamente, mas
em locais preferenciais. Uma seqüên-
cia de topoisomerase II consenso foi
encontrada adjacente aos finais dos
locais de integração, sugerindo um
possível papel desta enzima no pro-
cesso de recombinação homóloga.
Pittogi et al. (2000) sugerem a hi-
pótese de que há integração de retro-
posons e moléculas de DNA exógeno
nas nucleohistonas no espaço da cro-
matina entre dois domínios de prota-
minas adjacentes. O nucleossoma da
cromatina espermática interage com
o esqueleto nuclear e é abastecido
com a maquinaria enzimática neces-
sária para suportar a integração do
DNA.
FATORES QUE AFETAM
A INTERAÇÃO
Não é apenas o DNA exógeno que
se liga à região pós acrossomal do
espermatozóide, mas também outras
macromoléculas carregadas negativa-
mente como a heparina, sulfato de
dextram e outras proteínas com pon-
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 11
to isoelétrico menor que 7 (LAVITRA-
NO et al., 1992). Em particular, a c-
phycocyanina, a albumina sérica bo-
vina e a b-lactoglobulina B, os quais
o ponto isoelétrico variam de 4,6 a
5,1, mostraram ligação preferencial na
parte posterior da cabeça, região cor-
respondente ao núcleo, em padrão
muito similar aos obtidos com molé-
culas de DNA. Esta ligação é reversí-
vel e moléculas de DNA ligadas ao
espermatozóide podem ser removidas
quando se aumenta excessivamente
a concentração destas moléculas.
A quantidade de DNA exógeno
incubado com as células espermáti-
cas também possui importante papel
na internalização. Plasmídeos extraí-
dos de células espermáticas após in-
cubação com baixas doses de DNA
permaneceram intactos. Entretanto o
DNA exógeno foi altamente degrada-
do quando células espermáticas fo-
ram incubadas com altas doses de
DNA exógeno. Estes resultados indi-
cam que o espermatozóide do epidí-
dimo reage contra a invasão do DNA
exógeno por meio de atividade de
nuclease, promovendo sua degrada-
ção. Quando é incubado com grande
quantidade de DNA exógeno, o es-
permatozóide sofre processo seme-
lhante a apoptose (ativada pela inter-
nalização do DNA), degradando o
DNA exógeno e o genômico (MAIO-
NE et al., 1997).
A endonuclease, por degradar o
DNA exógeno e o endógeno, exerce
papel negativo na interação do DNA
com as células espermáticas, razão
pela qual se dá atenção à temperatu-
ra de incubação dos espermatozóides
para não haver ativação desta enzima
por temperaturas altas. O cálcio tam-
bém possui efeito na interação. Na
capacitação espermática, evento de-
pendente de cálcio, ocorre grande
número de mudanças fisiológicas, tor-
nando o espermatozóide competente
para a fecundação e que deve ocor-
rer no seu ritmo normal. Entretanto a
remoção do plasma seminal (etapafundamental na interação do DNA
exógeno com o espermatozóide) ace-
lera a capacitação espermática, dimi-
nuindo a internalização do DNA exó-
geno no espermatozóide. Uma manei-
ra de inibir esta aceleração é a utiliza-
ção de meio de incubação sem cál-
cio, o que permite a capacitação es-
permática mais lenta na ausência do
PROTOCOLOS EMPREGADOS NA TRANSFERÊNCIA
GÊNICA MEDIADA POR ESPERMATOZÓIDE
INCUBAÇÃO
· Suspender os espermatozóides em meio de fecundação in vitro (sem
heparina) na concentração de 5x106/ml
· Incubar por 1 hora a 39°C e 5% de CO
2 
em ar com 500 ng/ml de DNA
· Inseminar os oócitos
ELETROPORAÇÃO
· Colocar o sêmen (5x106) com o DNA (500ng) na cubeta de eletroporação
· Incubar por 10 minutos
· Provocar o choque de 500V
· Incubar por 10 minutos
· Centrifugar em meio de Incubação (Meio 199 com hepes + BSA +
piruvato + antibiótico) por 5 minutos a 200g
· Centrifugar em meio de fecundação in vitro por 5 minutos a 200g
· Inseminar os oócitos
LIPOFECÇÃO
· Adicionar o DNA (500ng) em 4ml de solução para condensação do
DNA (disponível em vários kits comerciais de lipofecção)
· Incubar por 5 minutos a temperatura ambiente
· Adicionar 10ml de lipossomo
· Misturar vigorosamente por 10 minutos
· Incubar por 10 minutos a temperatura ambiente
· Acrescentar meio de fecundação até completar o volume de 270ml
· Adicionar 30ml de meio de incubação (Meio 199 com hepes + BSA +
piruvato + antibiótico) contendo 5x106 espermatozóides por ml
· Incubar por 2 horas em estufa
· Centrifugar em meio de incubação por 5 minutos a 200g
· Centrifugar em meio de fecundação in vitro por 5 minutos a 200g
· Inseminar os oócitos
plasma seminal (Lavitrano et al., 2003).
Outro fator é a variação individu-
al. Lavitrano et al. (2003) encontra-
ram diferenças que variaram de 9% a
67% nos índices de ligação de DNA
exógeno com espermatozóides suínos
em diferentes animais. Esta associa-
ção foi alterada quando diferentes
concentrações de DNA exógeno fo-
ram adicionadas. Entretanto, sob as
mesmas condições, a cinética de as-
sociação foi similar. Em todos os ca-
sos, a associação do DNA com o es-
permatozóide iniciou entre 15 e 30
minutos de incubação seguido de uma
fase platô aos 60 minutos. Estes re-
sultados mostraram que para cada
animal, a ligação do DNA exógeno
com o espermatozóide deve ser oti-
mizada. Para otimizar o protocolo de
geração de animais transgênicos, é
necessário estabelecer quando, por
quanto tempo e qual a quantidade de
DNA exógeno deve ser adicionada aos
espermatozóides, para que este seja
eficientemente ligado e internalizado
pela maioria das células espermáticas.
Isto sugere que os laboratórios que
trabalham com transferência gênica
mediada por espermatozóides devam
realizar vários testes de padronização
antes de iniciar os experimentos.
PRODUÇÃO DE
ESPERMATOZÓIDES
“TRANSGÊNICOS”
Para a internalização do DNA exó-
geno nas células espermáticas, as
metodologias mais utilizadas são a
incubação dos espermatozóides com
moléculas de DNA, a eletroporação e
a lipofecção (figura 1). Na incubação,
as moléculas de DNA exógeno se li-
gam nas proteínas ligadoras de DNA
presentes na membrana do esperma-
12 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
Tabela 1: Resumo dos resultados na literatura com a transferência
gênica mediada por espermatozóide
Espécie Metodologia Referência
Camundongo Incubação Lavitrano et al., 1989
Incubação Maione et al., 1998
Incubação Chang et al.,2002
Bovino Eletroporação Gagné et al., 1991
Incubação Schellander et al., 1995
Incubação Sperandio et al., 1996
Lipofecção Rotmann et al., 1996
Eletroporação Rieth et al., 2000
Suíno Incubação Sperandio et al., 1996
Incubação Habrova et al., 1996
Incubação Lavitrano et al., 2003
Coelho Incubação Brackett et al., 1971
Incubação Kuznetsov; kuznetsova, 1995
Lipofecção Rotman et al., 1996
Lipofecção Wang et al., 2003
Salmão Eletroporação Sin FYT et al., 2000
Eletroporação Symonds et al., 1994
Zebrafish Incubação Khoo et al., 1992
Eletroporação Patil; khoo. 1996
Carpa Incubação Zkong et al., 2002
Tilápia Eletroporação Mueller et al., 1992
Galinha Lipofecção Rotman et al., 1991
Incubação,
Eletroporação e
Lipofecção Nakanishi; Iritani, 1993
Lipofecção Yang et al., 2004
Ouriço do mar Incubação Arezzo 1989
Eletroporação Tsai et al., 1997
tozóide, formando o complexo pro-
teína/DNA, que se liga a molécula
CD4 ativando a internalização do DNA
exógeno. Na eletroporação, a corren-
te gerada por pulso elétrico alternado
é capaz de abrir temporariamente po-
ros na membrana celular, facilitando
a entrada do material genético nas
células. Na lipofecção, a carga positi-
va do lipídeo catiônico forma intera-
ção eletrostática com o fosfato do
DNA, formando o lipoplexo. A carga
positiva do lipoplexo forma interação
não específica com a carga negativa
da superfície celular, ocorrendo en-
docitóse, permitindo a internalização
do lipoplexo, que é direcionado para
próximo da região perinuclear onde
ocorre à dissociação, resultando na
separação do DNA, o qual entra no
núcleo provavelmente por transporte
nuclear dependente de energia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A literatura científica contém mais
de 70 relatos de sucesso sobre liga-
ção do DNA exógeno com células
espermáticas (exemplos na tabela 1).
Na maioria destes relatos a transferên-
cia e manutenção do transgene após
a fecundação são descritas, mostran-
do a subseqüente geração de animais
viáveis (F
0
) contendo o transgene. Em
alguns casos também é mostrada a
transmissão do transgene para a pro-
le (F
1
) ou adiante (SMITH; SPADAFO-
RA, 2005).
Entretanto a TGME ainda não está
bem estabelecida como forma confiá-
vel de manipulação genética. Um as-
pecto significante é que a integração
estável do transgene tem sido detec-
tada em níveis baixo nos protocolos
de TGME. A baixa freqüência de inte-
gração estável no genoma, a freqüên-
cia de modificação fenotípica e a trans-
genia total (incluindo características
transmitidas de forma epissomal) pode
variar de 0 a 100%. Maione et al.
(1998), em 75 experimentos, produ-
ziram 1755 fetos de camundongo dos
quais 130 eram transgênicos, repre-
sentando apenas 7% do total. A efici-
ência não foi homogênea entre os ex-
perimentos, onde os 130 camundon-
gos transgênicos foram originados de
13 dos 75 experimentos. Entre os 13
experimentos, a eficiência variou de
4 a 100%. Devido a grande variação
nos índices de integração do DNA
exógeno ao genoma hospedeiro, a
TGME não é considerada método bem
estabelecido de transgenia compara-
da a microinjeção pró-nuclear ou às
células tronco embrionárias (produ-
ção de quimeras). Além disso, uma
série de estudos mostrou, em espéci-
es diferentes, a ocorrência da seqüên-
cia de DNA exógeno em embriões na
fase pré-implantacional, seguido pelo
desaparecimento de qualquer sinal do
DNA exógeno na prole resultante,
sendo esta ocorrência atribuída à
transmissão epissomal do DNA exó-
geno.
Embora a TGME não seja uma téc-
nica bem estabelecida, ela oferece
vantagens quando utilizada em ani-
mais nos quais a microinjeção ou a
utilização de células tronco embrio-
nárias são menos eficiente. Este mé-
todo não necessita de equipamentos
caros nem habilidade na micromani-
pulação. Adicionalmente, a TGME
permite a produção de animais trans-
gênicos em massa, uma vez que gran-
de quantidade de zigotos pode ser
modificada coletivamente numa úni-
ca etapa. Esta técnica poderia ser exe-
cutada no campo, em programas de
inseminação artificial ou em labora-
tório utilizando a fecundação in vitro
ou injeção intracitoplasmática de es-
permatozóide. Podendo ser aplicado
em todas as espécies cuja reprodu-
ção é mediada por gametas.
A integração epissomal pode ser
atrativa para pesquisa futura em tera-
pia gênica. Segundo Smith; Spadafo-
ra (2005) a não integração do DNA
exógenoé na maior parte propagada
como estrutura extra-cromossomal
pelo desenvolvimento embrionário,
mantida nos tecidos de animais adul-
tos, sem interrupção da integridade do
genoma hospedeiro, sugerindo que a
terapia gênica, em particular em em-
briões e fetos, pode se tornar possibi-
lidade futura. O potencial uso da
TGME na terapia gênica embrionária
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 13
é teoricamente aceitável, consideran-
do que transgenes parecem persisti-
rem melhor no estádio inicial de de-
senvolvimento, possivelmente devido
ao seu estado epissomal. Entretanto,
a natureza especulativa desta possi-
bilidade deve ser reconhecida.
A interação do DNA exógeno com
células espermáticas também tem re-
velado funções inesperadas e ativida-
des metabólicas nestas células, que
são de outra maneira, convencional-
mente consideradas silenciosas. A in-
ternalização nuclear do DNA exóge-
no inicia a ativação metabólica de uma
variedade de enzimas endógenas, a
qual causa a reorganização das se-
qüências de DNA exógeno e catalisa
a sua recombinação com o DNA do
espermatozóide (MAGANO et al.,
1998).
Embora a TGME tenha alto índice
de integração epissomal, existem vá-
rios relatos na literatura de produção
de animais transgênicos utilizando esta
técnica com integração estável no
genoma hospedeiro (existem mais de
30 relatos de sucesso dos quais 25%
destes mencionam a transmissão do
transgêne para F
1
 ou adiante). Além
disso, esta técnica apresenta vantagens
como baixo custo, simplicidade, ca-
pacidade de produção de animais
transgênicos em alta escala, possibili-
dade de ser aplicada ao campo em
futuro próximo e perspectiva para uso
na terapia gênica. Isto faz com que
vários pesquisadores estudem a TGME
com finalidade de aumentar sua efici-
ência, tornado-a bem estabelecida e
confiável, apresentando alto índice de
integração estável.
CONCLUSÃO
Moléculas de DNA exógeno po-
dem se ligar e internalizar nos esper-
matozóides em processo que não
pode ser visto como evento aleatório,
mas sim como evento regulado por
mecanismos específicos. Entretanto,
pouco se sabe sobre os mecanismos
que regulam a internalização do DNA
exógeno nos espermatozóides, onde
ocorre integração epissomal ou genô-
mica, bem como o que realmente
acontece com o DNA exógeno depois
que ele entra no oócito. De qualquer
maneira, espermatozóides de diferen-
tes espécies têm sido usados como
vetores de DNA exógeno, produzin-
do animais geneticamente modifica-
dos. Futuras pesquisas sobre transfe-
rência gênica mediada por esperma-
tozóides incluem mecanismos que
regulam a interação do DNA exóge-
no no núcleo, a ação da atividade da
endonuclease espermática sobre o
DNA exógeno, a integração do DNA
exógeno no genoma quando, assim
como protocolos que aumentem a
eficiência da técnica.
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Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 15
www.biotecnologia.com.br
um mundo de informações ao seu alcance
16 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
Pesquisa
ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO:
CUIDADOS E DESCARTES
Fotografias cedidas pelos autores
Pesquisa
Um biotério brasileiro que produz animais de laboratório utilizados na fabricação de soros e vacinas.
Resumo
 Divisão Biotério Central
do Instituto Butantan
tem por finalidade a re-
alização da produção,
manutenção, descarte e
fornecimento de animais de labora-
tório, de diversas espécies como ca-
mundongos, ratos, coelhos, cobaias,
hamsters e meriones, para serem uti-
lizados na produção e controle de
qualidade de imunobiológicos e fár-
macos, desenvolvimento de pesqui-
sas e alimentação de outras espéci-
es animais tais como serpentes, ara-
nhas e sapos. A produção, manejo e
descarte dos animais são realizados
obedecendo rigorosamente as Nor-
mas de Boas Práticas de Produção
de Animais de Laboratórios e Bios-
segurança. Estas normas incluem
validação de barreiras sanitárias, es-
tabelecimento de fluxos, procedi-
mentos operativo padrão, certifica-
ção e validação de equipamentos e
processos. O objetivo deste trabalho
é divulgar a estratégia empregada
pelo Biotério Central do Instituto
Butantan, descrevendo os principais
aspectos utilizados na produção,
manutenção e descarte dos animais,
validação de barreiras, estabeleci-
mentos de fluxos, procedimentos
operativos padrão, protocolos e cer-
tificação, que estão intimamente li-
gados a biosseguridade dos animais
e dos técnicos.
Palavras chave
Animais de laboratório, Biossegu-
rança, Biotério, cGMP, Descarte.
Introdução
A experimentação animal data
dos antigos Gregos e Romanos, po-
rém foi durante os séculos dezoito e
dezenove que progrediu lentamen-
te de uma prática relativamente in-
comum, até alcançar um enfoque
científico. E lentamente também,
progrediam os primeiros movimen-
tos contra o uso dos animais. A par-
tir do século vinte intensificou-se o
debate em torno das questões sobre
a ética animal. Em meados do sécu-
lo dezoito, na Europa, uma elite so-
cial começou a questionar como os
animais eram tratados, especialmen-
te nos laboratórios de pesquisas.
Com o passar dos anos essas mes-
mas forças sociais estavam em tra-
balho também na América e a práti-
ca da pesquisa com animais e a opo-
sição a ela, começavam a crescer já
no final do século dezoito.
No cenário nacional, podemos
verificar que as instituições produ-
toras de imunobiológicos e fárma-
cos sofreram várias manifestações
éticas como as campanhas contra a
febre amarela e varíola que deram
origem à “revolta da vacina”. Em dez
de novembro de 1904, após a publi-
cação do decreto que tornava obri-
gatória a vacinação, focos de revol-
ta explodiram em toda a cidade (RJ),
Ana Paula Rocha da Silva
(rochap@butantan.gov.br)
Pesquisadora Cientifica da Divisão Biotério
Central do Instituto Butantan – Bióloga
Elizabeth Juliana Ghiuro Valentini
(ghiuro@butantan.gov.br)
Pesquisadora Cientifica da Divisão Biotério
Central do Instituto Butantan – Médica
veterinária.
Maria de Fátima C. L. F. Távora
(fatimatavora@butantan.gov.br)
Graduanda de Biologia
Ubimara Pereira Rodrigues
(uprodrigues@butantan.gov.br)
Pesquisadora Cientifica e Diretora Técnica da
Divisão Biotério Central do Instituto Butantan.
Virgínia Barreto Moreira
(vivimor@butantan.gov.br)
Biotecnóloga da Divisão Biotério Central –
Zootecnista
Vânia G. M. Mattaraia
(vmoura@butantan.gov.br)
Pesquisadora Cientifica e Diretora do Serviço de
Criação de Animais da Divisão Biotério Central
do Instituto Butantan – Zootecnista
Endereço: Instituto Butantan
Av. Vital Brasil, 1500 , Butantã – São Paulo SP
CEP: 05503-900
(11) 37267222 Ramais 2168 / 2169 / 2085
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 17
onde vinte e três revoltosos foram
mortose sessenta e sete feridos ten-
do sido presos aproximadamente mil
pessoas. Tudo porque o cientista
Oswaldo Cruz queria salvá-los, mes-
mo à força, da varíola (Chalhoub,
1996).
O quanto estes movimentos são
salutares? Não sabemos! Quando re-
trocedemos, verificamos que alguns
deles foram entraves para a saúde
pública e muitas vezes o que ocor-
reu foi o medo pelo desconhecido.
Por outro lado, é importante que a
sociedade exija e cobre dos gover-
nantes a criação de órgãos fiscaliza-
dores que possam garantir o bem
estar e a melhor sobrevivência do
planeta. Atualmente, é grande o nú-
mero de pessoas preocupadas com
a proteção dos animais e mais re-
centemente com o padrão genético
destes animais.
Desde 1995 podemos dizer que
o Brasil ingressou efetivamente na
era das pesquisas e no desenvolvi-
mento dos Organismos Genetica-
mente Modificados, conhecidos
como produtos transgênicos (Oda,
2001).
Uma questão basilar no novíssi-
mo campo de conhecimento é bios-
segurança. Podemos definir biosse-
gurança como sendo um conjunto
de ações voltadas para a prevenção,
minimização ou eliminação de ris-
cos inerentes a estas atividades e que
podem comprometer a saúde do ho-
mem, dos animais, do meio ambi-
ente ou a qualidade dos trabalhos
desenvolvidos (Cardoso, 2001).
As instituições produtoras de imu-
nobiológicos e fármacos necessitam
de grande quantidade de animais, li-
vres de patógenos específicos, para
serem utilizados no controle de
qualidade dos mesmos, pois o
produto final, por exigência da
farmacopéia e manual da WHO
deve ser testado in vivo. O Ins-
tituto Butantan, que mantém tra-
dição centenária no desenvol-
vimento de soros contra vene-
nos de animais peçonhentos e
a raiva, é também o maior pro-
dutor de vacinas da América La-
tina e principal parceiro do Mi-
nistério da Saúde nas campa-
nhas nacionais de vacina-
ção. “O Brasil é o único país
do mundo que oferece va-
cinas gratuitamente para cri-
anças, jovens e idosos”
(Raw, 2004).
Com o propósito de
atendermos estas necessida-
des, no ano de 1999 o Bio-
tério Central do Instituto Bu-
tantan sofreu uma grande
adequação física, com o in-
tuito de produzir animais li-
vres de patógenos específi-
cos. Para o estabelecimento
de um biotério protegido
com barreiras sanitárias res-
tritas, foi necessário o desen-
volvimento de um “Plano
Mestre de Validação”, cria-
do por um grupo multipro-
fissional, para atuar na cer-
tificação da eficiência máxi-
ma de cada
barreira.(Rodrigues et al,
2003). Foram introduzidos
os princípios de zoneamen-
to semelhantes aos utiliza-
dos na indústria farmacêutica com a
utilização de uma sistemática coeren-
te para evitar contaminações dano-
sas, que possam vir a ocorrer duran-
te o processo de produção, ou re-
duzi-las a níveis aceitáveis de acor-
do com as normas de Good Manu-
facturing Pratices (GMP), ou em por-
tuguês, Boas Práticas de Fabricação
(BPF). (Guias de Boas Praticas de Fa-
bricação,1995).
Este artigo tem como objetivo di-
vulgar a estratégia empregada pelo
Biotério Central do Instituto Butan-
tan, descrevendo os principais aspec-
tos utilizados na produção, manu-
tenção e descarte dos animais, vali-
dação de barreiras, estabelecimen-
tos de fluxos, procedimentos opera-
tivos padrão, protocolos e certifica-
ção, que estão intimamente ligados
a biosseguridade dos animais e dos
técnicos.
Materiais e Métodos
O Biotério Central do Instituto
Butantan é um biotério de produ-
ção, ou seja, em suas dependências
não alojamos animais infectados ou
que tenham passado por algum tipo
de manipulação experimental. Nele
estão alojadas as colônias de funda-
ção, as quais dependendo do padrão
genético da linhagem, têm um
manejo definido. Ainda temos
as colônias de expansão e de
multiplicação, para que pos-
samos atender a demanda e
preservar as linhagens. Produ-
zir animais dentro dos concei-
tos de BPF significa cumprir
com os conceitos da Garantia
da Qualidade. Boas Práticas de
Fabricação é a parte da Ga-
rantia da Qualidade que asse-
gura que os produtos são con-
sistentemente produzidos e
18 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
controlados, com padrões de
qualidade apropriados para o
uso pretendido e requerido pelo
registro. A aplicabilidade desses
conceitos para produção de
animais de laboratório é ainda
muito recente, havendo dificul-
dades para obtenção de litera-
tura de apoio. Portanto, descre-
vemos as principais práticas
(BPF) aplicadas no nosso bio-
tério:
Pessoal qualificado e devi-
damente treinado;
Nós, pesquisadores da Ciên-
cia de Animais de Laboratório,
temos como prioridade formar
pessoas para a área. Sendo as-
sim, realizamos anualmente cur-
sos de treinamento para técni-
cos de nível médio e superior,
para os funcionários do bioté-
rio do Instituto e de outras Ins-
tituições. Durante os meses de
setembro ou outubro realizamos
uma jornada interna, que consiste
em: um funcionário de cada área
apresenta para todos o seu trabalho
e as suas observações. Por muitas
vezes, após a avaliação do supervi-
sor, elas podem ser aceitas e passa-
rem a fazer parte dos Procedimen-
tos Operativos Padrão (POP). Todos
os funcionários são instruídos e in-
centivados a reportar aos seus su-
pervisores quaisquer condições re-
lativas ao ambiente, equipamento ou
pessoal que considerem prejudiciais
à qualidade e integridade do traba-
lho por ele desenvolvido. O ingres-
so de um novo funcionário depen-
de de um período de treinamento,
da realização dos exames admissio-
nais e dos exames específicos para
a área de atuação.
Espaço e instalações adequadas;
O biotério é um prédio indepen-
dente, isolado das demais áreas. Pos-
suí entrada e vestiários separados,
sistema de ventilação, exaustão, casa
de máquinas, caldeiras e gerador ex-
clusivo. Sua arquitetura é pa-
vilhonar, sendo que cada li-
nhagem é mantida em um pa-
vilhão e este totalmente in-
dependente dos demais. Fig.
01.
As áreas auxiliares como;
laboratório, vestiários de bar-
reira, administração, almoxa-
rifado, área de descanso e re-
feição são totalmente sepa-
radas.
O projeto arquitetônico
contemplou cada pavilhão
com estrutura física, equipa-
mentos e definição de fluxos
de forma a minimizar ou eli-
minar os riscos de contami-
nação através dos insumos e
pessoas enviados as áreas de
produção. Fig. 02. A defini-
ção do fluxo de materiais e
de pessoas evita a contami-
nação cruzada.
Os cantos sanitários não
permitem o acúmulo de sujeira e
facilitam a manutenção de forma
adequada nas áreas. Todos os
equipamentos são regularmente
validados, possuem suas especifi-
cações fixadas ao lado e os proce-
dimentos de uso e limpeza descri-
tos nos POPs e no Manual de Lim-
peza. Cada unidade de produção
dispõe de salas com classificação
10.000, destinadas à criação de ma-
trizes essas salas possuem sistema
de filtração de ar, com filtros HEPA
(Hight Efficiency Particulate Air).
A construção obedece aos princí-
pios de zoneamento, onde ocorre
um efeito em cascata, com o fluxo
de ar partindo da área de maior
pressão, para as áreas de menor
pressão. As zonas diferenciam-se
pela pressão e pureza do ar, po-
rém mantendo os demais parâme-
tros físicos, como: fluxo do ar não
turbulento e unidirecional, velo-
cidade, troca mínima horária, tem-
peratura e umidade relativa, níveis
de ruído e iluminação. Uma im-
portante característica do biotério
é o sistema de exaustão. Os ani-
mais são alojados em gaiolas, dis-
tribuídas em estantes metálicas
com seis prateleiras cada e a exaus-
tão é feita através de um sistema
de plenos, instalados nas paredes
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 19
das estantes, atrás das gaiolas. Isto
significa, que os odores fortes de
amônia produzidos pela urina e fe-
zes dos animais são exauridos dire-
tamente das gaiolas sem circular nasala. Fig. 03.
Manuais e Procedimentos Ope-
rativos Padrão
A documentação constitui parte
essencial do sistema de Garantia da
Qualidade e, deve estar relacionada
com todos os aspectos das BPF. Tem
como objetivo garantir as informa-
ções necessárias a rastreabilidade de
qualquer produto. Todos os docu-
mentos podem ser reunidos em uma
única pasta, ou permanecerem se-
parados, facilmente disponíveis,
constituindo o registro de todas as
informações da história do produto.
Todos os processos produtivos
dos animais estão descritos nos Ma-
nuais, de uma forma mais geral e
detalhadamente nos Pops. Os ma-
nuais, os procedimentos e toda do-
cumentação é descrita com a parti-
cipação do funcionário da área, de-
pois avaliada pelos supervisores e
finalmente aprovada pelo corpo téc-
nico do biotério. No Biotério temos
o Manual de Procedimentos, que tra-
ta do manejo com os animais. No
Manual de Biossegurança estão re-
latados todos os possíveis riscos e
as exigências para os procedimen-
tos dentro e fora das áreas de cria-
ção. O Manual de Limpeza trata do
procedimento de limpeza de cada
área, desde a forma de ser limpa até
os produtos de limpeza e as suas di-
luições (Fig.4). O Manual de Biosse-
gurança deve ser lido por todos os
funcionários que assinam um termo,
de ciência e de acordo, com o cum-
primento das normas nele estabele-
cidas. Um outro complemento do
Manual de Biossegurança é a docu-
mentação de recebimento e de ins-
truções de uso dos equipamentos de
proteção individual (EPIs). Os Pops
descrevem, passo a passo, cada ope-
ração do processo de produção, seja
ele manejo, esterilização, procedi-
mento de fluxo de pessoas e insu-
mos.
A elaboração da documentação
deve obedecer determinadas exigên-
cias, que dependem do tipo de do-
cumento, ou seja, se é um Pop, um
protocolo (prot.), uma requisição de
análise (RqA), etc. Porém existem
normas comuns a todos, tais como:
Os documentos devem ser redigidos,
revistos e distribuídos somente as
pessoas designadas. Os originais de-
vem ser aprovados, assinados e da-
tados pelo responsável técnico. Ne-
nhum documento deve ser modifi-
cado sem autorização prévia. O con-
teúdo dos documentos não pode ser
ambíguo, o título e o seu objetivo
devem ser apresentados de forma
clara, precisa e correta. Além disso,
devem ser dispostos de forma or-
denada e serem de fácil verificação.
Os documentos devem ser regular-
mente revistos e atualizados. As al-
terações efetuadas em qualquer do-
cumento deve ser assinada e data-
das, a alteração deve possibilitar a
leitura da informação original.
Armazenamento e transporte
adequados;
Os animais são mantidos em co-
lônias fechadas, com sistemas de
acasalamento adequado ao padrão
genético de cada linhagem. Ficam
em acasalamentos monogâmicos
nas colônias de fundação, poligâ-
micos nas colônias de multiplica-
ção e separados por sexo nas salas
de estoque, onde aguardam atingir
o peso ou a idade solicitada pelos
usuários. Um procedimento peculi-
ar do nosso biotério é a manuten-
ção de uma amostra de todos os
desmames realizados. Essa amostra
é mantida no biotério até atingir a
idade adulta, com a finalidade de
possibilitar o rastreamento dos lo-
tes dos animais fornecidos aos usu-
ários.
O transporte dos animais é rea-
lizado de terça a quinta-feira, sem-
pre na parte da manhã. Em condu-
ção do biotério um técnico acom-
panha a entrega dos animais aos
diversos Laboratórios. A entrega é
registrada no “protocolo de entre-
ga”, onde consta, quantidade, sexo,
idade ou peso, dia e hora de forne-
cimento. Esse protocolo é assinado
pelo requisitante e arquivado em
nossa documentação.
Descarte
O procedimento de descarte dos
animais do biotério obedece nor-
mas rígidas, descritas tanto no ma-
nual de procedimentos, quanto no
manual de biossegurança. Os ani-
mais saem das áreas de produção
pela trampa de expurgo de cada
área. O funcionário recebe os ani-
mais, os conduz à câmara de euta-
20 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
násia e esta é efetuada de acordo
com o procedimento descrito no
Manual de Procedimentos. Nos no-
vos conceitos de ética, as espécies
convencionais com peso abaixo de
1Kg, podem ser eutanasiadas em
câmeras de CO
2, 
Figs 05 e 06. Ani-
mais de peso superior são aneste-
siados antes de colocados na câ-
mera de CO
2.
O procedimento de eutanásia é
resultante de vários treinamentos
com a finalidade de preparar o téc-
nico a identificar a cessação dos si-
nais vitais nos animais. É realizado
um revezamento entre os técnicos,
com o objetivo de que estes não
fiquem insensíveis ao procedimen-
to. Após a eutanásia, os animais são
acondicionados em sacos plásticos
identificados com símbolo de risco
biológico e levados ao freezer (-
20ºC) onde permanecem até a co-
leta do lixo. A coleta é feita pela
prefeitura (Coleta de Resíduos In-
fectantes), em carros especiais e le-
vada ao incinerador público, Figs.
07, 08, 09, 10 e 11.
Resultados
A adequação física do biotério
foi realizada em 1999 e nestes qua-
tro anos percebemos que a adoção
destes cuidados tem permitido a
aplicação do principio dos 3Rs. E
apesar da produção cientifica e da
produção de produtos ter aumen-
tado ano a ano houve uma dimi-
nuição no número de animais for-
necidos, isto se deve a obtenção
de um animal com padrão sanitá-
rio definido.
Conclusão
Com a implantação das normas
de biossegurança e de cGMP em
todos os procedimentos de rotina,
fomos classificados “em conformi-
dade” pelos Órgãos de Vigilância
(Auditoria/Inspeção) e nenhuma
adequação ou mudança nos foi so-
licitada na parte física e de docu-
mentação. Sempre que fomos sub-
metidos aos órgãos de vigilância
sanitária, como ANVISA e WHO,
conseguimos a aprovação dos pro-
cedimentos e a certificação dos
produtos. Além do que, até o mo-
mento conseguimos manter o pa-
drão sanitário e genético exigido
pelos laboratórios de pesquisa e
produção e no mesmo período não
registramos nenhum tipo de aci-
dente de trabalho.
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22 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35
DNAr 5S
Pesquisa
Um novo marcador molecular para análise genética de tilápias
Fernanda Antunes Alves - Costa
Mestre em Genética, Doutorando do
Programa de Pós-Graduação em
Ciências Biológicas (Genética) do
Instituto de Biociências de Botucatu,
UNESP-Universidade Estadual Paulista,
Telefone/Fax: (14) 3811 6264,
fa_alves2003@yahoo.com.br
Cesar Martins
Doutor em Genética e Evolução,
Professor Assistente do Departamento
de Morfologia do Instituto de
Biociências de Botucatu, UNESP-
Universidade Estadual Paulista,
Telefone/Fax: (14) 3811 6264,
cmartins@ibb.unesp.br
Resumo
s recentes avanços da ge-
nética têm permitido um
salto tecnológico na aqüi-
cultura mundial, especial-
mente, pela utilização dos estudos
de DNA para determinação de vari-
abilidade genética dentro e entre li-
nhagens de peixes, para identifica-
ção de parentais e para formulação
de mapas genéticos úteis na identi-
ficação de genes ou seqüências de
DNA, ligadas a características de va-
lor econômico. Estes tipos de análi-
ses podem ser aplicados ao melho-
ramento dos estoques e linhagens,
levando a incrementos significativos
na produção. Embora diversas regi-
ões do genoma vem sendo explora-
das como marcas nas análises gené-
ticas, a identificação de novos mar-
cadores ainda se faz necessária. Des-
sa forma, foram objetivos deste es-
tudo analisar a potencialidade da
aplicação das seqüências de DNA ri-
bossomal 5S como marcadores para
estudos genéticos nos peixes, utili-
zando como modelo espécies de ti-
lápias de ampla utilização no setor
produtivo.
Introdução
As tilápias representam os primei-
ros peixes utilizados para criação em
cativeiro no mundo – ilustrações de
tumbas do Egito sugerem que a tilá-
pia vem sendo criada há mais de três
mil anos (Popma e Masser, 1999).
As tilápias pertencem à família Cich-
lidae que ocorrem, predominante-
mente, nos lagos africanos. Os ciclí-
deos africanos têm representado um
excelente modelo de estudos, pois
além de apresentarem uma história
evolutiva bastante peculiar, que le-
vou ao surgimento de uma grande
diversidade de formas e comporta-
mentos, muitas espécies (como as
tilápias, por exemplo) apresentam
enorme importância na aqüicultura
mundial, especialmente em regiões
onde há uma carência crônica de
proteína animal (Kocher, 2004).
Algumas características das tilá-
pias fazem delas extremamente fa-
voráveis para a aqüicultura: alimen-
tam-se de uma ampla variedade de
organismos e aceitam, muito bem,
qualquer tipo de alimento; são rela-
tivamente robustas e resistentes a
doenças; possuem tolerância a bai-
xos níveis de oxigênio e baixas tem-
peraturas e possuem rápido cresci-
mento, tornando-se sexualmente
maturas e comercializáveis aos 4-8
meses (Boscolo et al., 2001). Ao lado
de sua importância econômica, as
tilápias representam também, um
excelente animal de laboratório. Uma
das características mais intrigantes
deste grupo é sua agressividade,
apresentando um comportamento
territorialista, o que permite amplos
estudos na área de etologia (Kocher,
2004). Algumas espécies de tilápia
protegem a prole na cavidade bu-
cal, podendo reproduzir-se em con-
dições de cativeiro durante todo o
ano, desde que a temperatura da
água não fique abaixo de 22oC. Além
disso, seus ovos podem ser facilmen-
te incubados de maneira artificial
(Zimmermann, 1999).
Embora cerca de 70 espécies de
ciclídeos recebam a denominação de
“tilápia”, somente Oreochromis ni-
loticus, Oreochromis mossambicus,
Oreochromis aureus, Tilapia ren-
dalli e seus híbridos têm grande
importância na aqüicultura mundial
Fotografias e ilustrações cedidas pelos autores
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 35 23
(Stickney, 1997). Atualmente, as ti-
lápias representam o segundo gru-
po de peixes mais amplamente pro-
duzido no mundo (o primeiro é re-
presentado por espécies de carpas).
A tilápia do Nilo, Oreochromis
niloticus (Figura 1) é uma es-
pécie nativa do Norte da Áfri-
ca, que foi introduzida em vá-
rios outros continentes, espe-
cialmente na América, onde
sua produção anual excede
1.000.000 toneladas. Neste ce-
nário, o Brasil tem contribuído
com uma ínfima parcela de
0.2% em relação à produção
mundial e de 5% em relação à
produção americana, equiva-
lendo a um total de, aproxima-
damente, 50 mil toneladas/ano
(Kubtiza, 2003).
A partir de uma única in-
trodução de tilápia do Nilo no nor-
deste brasileiro, na década de 70,
diversas linhagens foram desenvol-
vidas e sua criação disseminada en-
tre os estados brasileiros (Lovshin,
2000). Embora a produção de tilápi-
as fosse inicialmente vista com bas-
tante desconfiança pelos aqüiculto-
res, aos poucos este peixe foi con-
quistando seu espaço, provando ser
de grande potencial para criação e
comercialização. Nas décadas seguin-
tes, a produção se fixou, cresceu e
novas linhagens foram trazidas para
o território nacional, entre elas a Tai-
landesa ou Chitralada, em 1996 (Zim-
mermann, 1999) e, mais recentemen-
te, a Genomar Supreme, em 2002
(Zimmermann, 2003), que promete
ganhos significativos na produção
quando comparada com as demais
linhagens. Atualmente, os tilapicul-
tores nacionais têm almejado a con-
quista do mercado externo e, ainda,
têm se preocupado com a busca da
competição igualitária com outros
países produtores de tradição no
mercado. Desse modo, há grande ex-
pectativa e incentivo ao desenvolvi-
mento de novos métodos que indu-
zam ao aumento da produtividade e
à diminuição dos custos de produ-
ção.
A chegada da tecnologia tailan-
desa de reprodução em tanques-rede
e incubação artificial de ovos e em-
briões têm aumentado não apenas a
produtividade, mas também, a pos-
sibilidade de controle sobre o pro-
cesso de reversão sexual, aumentan-
do a eficiência do processo de ale-
vinagem, tanto no sentido da sobre-
vivência quanto na proporção de
machos revertidos (Zimmermann,
1999). No entanto, em muitas tilapi-
culturas do país, as práticas em aqüi-
cultura têm inadvertidamente dimi-
nuído a variabilidade genética pre-
sente nos estoques de produção,
pela seleção e acasalamento de in-
divíduos aparentados ou pelo uso
de um pequeno número de indiví-
duos como reprodutores, aumentan-
do grandemente a probabilidade de
endocruzamentos. Dessa for-
ma, um manejo adequado as-
sistido por análises genéticas
podem contribuir grandemen-
te para o progresso da aqüi-
cultura no Brasil.
Estudos genéticos
em tilápias
As linhagens domesticadas
da tilápia do Nilo utilizadas em
todo o mundo sofrem de um
empobrecimento genético,
oriundo de práticas sucessivas
de endocruzamentos; e as li-
nhagens de melhor performan-
ce são aquelas isoladas mais recen-
temente da natureza. Da mesma for-
ma, durante os anos consecutivos às
primeiras introduções de tilápia do
Nilo no Brasil, foram desenvolvidas
novas linhagens provenientes de cru-
zamentos híbridos entre as linhagens
importadas e, também, entre a tilá-
pia do Nilo e outras espécies de tilá-
pia. Como resultado, o produtor en-
frenta um grave problema relacio-
nado à incerteza quanto à origem
dos animais que vêm sendo utiliza-
dos para produção e ao empobreci-
mento genético que gera indivíduos
com performance reduzida no cres-
cimento e pouca resistência a doen-
ças, afetando grandemente a produ-
ção. Além disso, a questão da ma-
nutenção da variabilidade genética
dos estoques, que está diretamente
associada à produtividade, muitas ve-
zes, não recebe a valorização que
merece. Uma outra dificuldade en-
frentada pelos produtores relaciona-
se à identificação eficiente de espé-
cies, subespécies e linhagens de ti-
lápias, e ao estabelecimento de pa-
rentesco genético entre os estoques.
Para isso, os estudos voltados à
caracterização genética dos estoques

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