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FICHA DE LEITURA HALL, Peter; SOSKICE, David. Varieties of capitalism: the institutional foundations of comparative advantage. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 1-68 Prof. Hugo Pena Identificação de categorias-chave: variedades de capitalismo, instituições, firma, interações estratégicas, economias liberais de mercado, economias coordenadas de mercado, complementaridade institucional, vantagens comparativas institucionais. O texto de Hall & Soskice está voltado à compreensão de diferenças nas instituições políticas e econômicas de países com economias capitalistas desenvolvidas. O modelo proposto toma a instituição da firma como central à análise, sem negligenciar outras instituições, tais como sindicatos, associações de negócios, indivíduos etc. (p. 6) A opção pela ênfase na firma não significa, tampouco, a desimportância das estruturas estatais: “many of the most important institutional structures – notably systems of labor market regulation, of education and training, and of corporate governance – depend on the presence of regulatory regimes that are the preserve of the nation-state.” (p. 4) O ponto é o de que todos estes são atores relevantes, mas as firmas são atores cruciais no delineamento das variedades de capitalismo. A questão principal para compreender este ponto é saber como o comportamento das firmas é afetado pelas instituições da política econômica. Três abordagens propõem elementos para uma resposta. A primeira delas enxerga as instituições como agentes socializantes, que incutem normas e atitudes aos que operam em seu âmbito. Uma segunda abordagem sugere que os efeitos de uma instituição fluem do poder que ela confere a certos atores por meio de sanções formais garantidas hierarquicamente, ou por recursos que a instituição disponibiliza. Por fim, um terceiro modo de ver enfatiza as instituições como matrizes de sanções e incentivos. Para além destas contribuiões, Hall & Soskice propõem que as instituições condicionam as interações estratégicas dos agentes econômicos: “the most important institutions distinguishing one political economy from another will be those conditioning such interaction, and it is these that we seek to capture in these analysis.” (p. 5). Ou seja, diferenças institucionais geram padrões de comportamento estratégico diferenciados nas firmas. A concepção que os autores têm a respeito da firma é relacional. Há cinco esferas em que as firmas precisam desenvolver relações para resolver problemas de coordenação inerentes a suas atividades (p. 6-7): (i) a esfera das relações industriais (sobretudo discutindo condições de trabalho e remuneração); (ii) a esfera do treinamento vocacional e da educação (que envolve qualificação laboral); (iii) a esfera da governança corporativa (conectando a firma ao mundo financeiro); (iv) a esfera das relações entre firmas (envolvendo fornecedores e clientes) e (v) a esfera dos empregados. (p. 7) Qual é a importância deste rol de feixes de relações? A importância está em que estes são os eixos em que as instituições afetam as interações estratégicas das firmas. Dois grandes tipos ideais são caracterizados como ferramentas de análise destas relações. De um lado, as liberal market econonomies (LMEs). De outro, as coordinated market economies (CMEs). (p. 8) “In liberal market economies, firms coordinate their activities primarily via hierarchies and competitive market arrangements.” (p 8) Em essência, o mecanismo de preços (idealizado no modelo de equilíbrio geral) é a ferramenta que coordena espontanea e automaticamente os interesses distintos na economia. Confia-se na lei da oferta e da demanda, em resumo. Em contraste, “[i]n coordinated market economies, firms depend more heavily on non-market relationships to coordinate their endeavors with other actors” (p. 8). O equilíbrio, aqui, não é determinado automaticamente pelo mecanismo de preços, por oferta e demanda, mas por interações estratégicas entre as firmas e outros atores. (p. 8) Isto é feito por meio de instituições que reduzem a incerteza enfrentada pelos atores, quer pela troca de informações, quer pelo monitoramento dos comportamentos, ou ainda pela sanção a comportamentos que desviem de atitudes cooperativas. (p. 10) Em síntese, o foco das CMEs está na composição por deliberação, por discussão coletiva, e não pelo mecanismo de preços. (p. 11) O Reino Unido é um caso típico de LME, ao passo que a Alemanha, de CME. Em consequência, as firmas destes dois países respondem muito diversamente a problemas semelhantes, como no caso de um choque que aumente o preço dos produtos exportados. “British firms tend to pass the price increase along to customers in order to maintain their profitability, while German firms maintain their prices and accept lower returns in order to preserve market share.” (p. 16) Hall & Soskice atribuem estes diferentes comportamentos (note-se: face a um mesmo problema) às diferentes estruturas institucionais. No Reino Unido, por um lado, a estrutura do sistema financeiro vincula o acesso ao capital à lucratividade da firma, por outro, há grande liberdade na regulamentação laboral para permitir dispensas de mão-de-obra. Isso incentiva a manutenção da lucratividade mesmo que empregos sejam perdidos. Já na Alemanha, o acesso a capital não está tão vinculado à lucratividade, e as estratégias de empregabilidade de longo prazo tornam as demissões onerosas, de modo que as firmas preferem abrir mão de lucratividade para manter empregos. (p. 16) Os incentivos são diferentes nas duas estruturas institucionais, apesar de ambas economias serem caracterizadas como capitalistas. A partir de contrastes como este (entre Reino Unido e Alemanha) emerge a ideia de complementaridade institucional. Como o exemplo sugere, há vinculações entre o mercado de trabalho e o mercado de capitais: “long-term employment is more feasible where the financial system provides capital on terms that are not sensitive to current profitability.” (p. 18) Os países se agrupam em clusters ao longo do par ‘proteção laboral’ x ‘capitalização via mercado de ações’ (numa relação inversa). As LMEs tendem a favorecer a a capitalização via mercado de ações, e a ter baixa proteção laboral, ao passo que as CMEs optam pelo contrário. (Este ponto, aliás, permite levantar o questionamento, no âmbito do Direito, sobre quais instituições da política econômica favorecem a fruição de direitos previstos, e quais se contrapõem à sua efetividade.) Hall & Soskice trazem dados de desempenho macroeconomico comparado de LMEs e CMEs. Observa-se nestes dados que o crescimento de PIB é semelhante nas duas (com variações em períodos distintos), mas que as CMEs conseguem maior distribuição de renda e menores níveis de desemprego. (p. 20) Para além destas constatações gerais, as diferenças de desenho institucional implicam outras formas de comportamentos diferenciados das firmas segundo a variedade de capitalismo assumida. Hall & Soskice antecipam que o modelo de economias coordenadas é mais propício a realização de investimentos, pelas firmas, em ativos específicos, com baixa liquidez. Em contraste, nas LMEs há preferência por switchable assets, que possam ser liquidados tão logo a “maré” do mercado se altere (p. 17) Interessante contribuição do modelo proposto pelos autores, ao enfatizar tantas diferenças, está na ideia de vantagens comparativas institucionais. “The basic idea is that the institutional structure of a particular political economy provides firms with advantages for engaging in specific types of activities there.” (p. 37) Ou seja: o desenhoinstitucional afeta a eficiência da produção de bens e serviços, podendo ser mais propício a uns do que a outros (p. 38) A ênfase dos autores, a este respeito, está no potencial para inovação: ao passo que ambientes institucionais como as LMEs favorecem a inovação radical (que envolvem destruição criativa), como nos setores de biotecnologia, semicondutores, telecomunicações etc.; as CMEs favorecem inovações incrementais, mais comuns em bens de capital e bens de consumo duráveis. (p. 39-40) “Firms in coordinated market economies [...] are well placed to secure high levels of quality control, by virtue of their close relationships with workers and suppliers”, ao passo que “liberal market economies can cut costs by releasing workers, given fluid labor markets and high levels of managerial prerogative, may provide them with advantages in products for which demand is highly price-sensitive.” (p. 44) Como decorrência destas características distintas, os autores sugerem que os incentivos desenhados precisam ser compatíveis com os ambientes institucionais. A mensagem, aqui, parece aproximar-se da linha de Evans e Ha-Joon Chang. O mecanismo de mercado pode possibilitar interações bem sucedidas em alguns setores e contextos, mas não em outros, nos quais só a coordenação entre os atores funcionará. Com isso, Hall & Soskice erguem ainda uma crítica às tentativas de homogeneização dos ambientes regulatórios nacionais (como no caso europeu), não porque ameacem tradições nacionais (embora também), mas porque comprometem vantagens comparativas institucionais (p. 54), capazes de traduzir-se em vantagens competitivas para as firmas de países distintos. (p. 56) "Because of comparative institutional advantage, nations often prosper, not by becoming more similar, but by building on their institutional differences." (p. 60)
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