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6.DERIVA GENÉTICA

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4.4.2. DERIVA GENÉTICA
A deriva genética ocorre devido ao efeito do tamanho reduzido da população. Como conseqüência, pode ocorrer alteração nas freqüências alélicas das populações. Contudo, de modo não previsível, daí o termo deriva genética. Pode-se incrementar o alelo que proporciona maior adaptação, inclusive levar a sua fixação, como também, reduz a freqüência do alelo favorável, contribuindo para menor adaptação. Além disto, também em populações pequenas, ocorre endogamia, cruzamento entre indivíduos aparentados. A endogamia pode ter algumas conseqüências com redução da média populacional e liberação da carga genética.
Há várias causas que podem reduzir o tamanho das populações na natureza, entre eles: recursos essenciais à sobrevivência das espécies são limitados. Os indivíduos têm pequena capacidade de dispersão entre ambientes apropriados para a sua sobrevivência; ocorre normalmente em animais a demarcação de territórios entre indivíduos; as populações podem ficar isoladas como em uma ilha ou lago; podem ocorrer catástrofes ambientais tais como: terremoto, inverno ou seca muito rigorosa e inundações. Nesse último caso pode ocorrer o fenômeno denominado de afunilamento genético (bottle neck), ou seja, a população é grande e bem adaptada em um ambiente e sofre uma redução drástica no seu tamanho, como conseqüência poucos indivíduos sobrevivem. Posteriormente, quando as condições melhoram há expansão da população. As conseqüências desse afunilamento são imprevisíveis.
Será comentado a seguir os efeitos da amostragem nas propriedades genéticas de uma população. Será visto que a teoria do efeito da amostragem é bem conhecida, porém a importância da oscilação genética para a evolução não é clara. 
4.4.2.1. Efeito da deriva genética nas propriedades genéticas das populações 
	Foi comentado várias vezes, anteriormente, que em uma população grande, cruzando-se ao acaso, na ausência de seleção, mutação e migração, as propriedades genéticas permaneciam inalteradas nessa população em equilíbrio. O efeito dos processos sistemáticos da seleção, mutação e migração na condição de equilíbrio já foi comentado. Resta discutir é a questão do tamanho da população. No conceito é mencionado que a população deve ser grande, ou seja, sempre problemas de amostragem. O que ocorre quando a amostra é pequena, deficiente, é o enfoque deste tópico.
	Em princípio deve ser comentado que o efeito da amostragem deficiente é imprevisível, por isso, a denominação de deriva genética ou oscilação genética. É, portanto um processo dispersivo nas propriedades genéticas de uma população. Ele apresenta quatro conseqüências, ou seja:
a) Oscilação das freqüências alélicas
	As freqüências alélicas mudam erraticamente de geração a geração sem tendência a voltar ao seu valor original.
b) Diferenciação entre subpopulações
	A deriva genética ocorrendo independentemente em diferentes subpopulações leva à diferenciação genética entre as mesmas. Os habitantes de uma grande área raramente constituem uma única população porque os acasalamentos são mais freqüentes entre os indivíduos de uma mesma região. Assim, populações naturais são mais ou menos subdivididas em grupos locais ou subpopulações, e estas irão diferir em freqüências alélicas se o número de indivíduos no grupo for pequeno. Populações domesticadas ou de laboratório, do mesmo modo, freqüentemente são subdivididas em raças, rebanhos ou variedades e nelas também as diferenciações genéticas são muito marcantes.
c) Uniformidade dentro das subpopulações – fixação dos alelos
	A variação genética dentro de cada subpopulação reduz progressivamente e os indivíduos se tornam genotipicamente mais semelhantes.
d) Aumento da homozigose
	A freqüência dos homozigotos aumenta à custa da freqüência dos heterozigotos. Como os alelos recessivos, em geral, tendem a ser deletérios, há uma perda de fertilidade e viabilidade que quase sempre estão associados com a endogamia.
	Para entender a deriva genética de uma forma mais simples, imagine uma população ideal ou população base, infinitamente grande, conforme a Figura 18. Esta população é subdividida em um grande número de subpopulações ou linhas, constituídas de N indivíduos cada. Esta subdivisão pode ocorrer devido a causas geográficas ou ecológicas em populações naturais ou por condições controladas em populações domesticadas ou de laboratório. Todas as linhas juntas constituem a população como um todo e cada linha é uma população pequena, na qual a deriva genética pode ocorrer. O que ocorre aos alelos de um loco em várias linhas, ocorre igualmente em vários locos numa mesma linha, admitindo que todos têm a mesma freqüência inicial. Para facilitar o entendimento desse processo considere, inicialmente, as seguintes condições que simplificam o modelo:
i) Os acasalamentos estão restritos aos membros de uma mesma linha, isto é, não há migração, entre as subpopulações.
ii) Não ocorre sobreposição de gerações, como é o caso de plantas anuais.
iii) O número (N) de indivíduos que se acasalam é o mesmo em todas as linhas e gerações.
iv) Os acasalamentos são inteiramente ao acaso, incluindo autofecundação em quantidade aleatória.
v) Não há seleção em nenhuma linha ou geração.
vi) A mutação é desconsiderada
Gametas 2N 
2N
 
2N
 
2N
 
2N
População Base (N = 
)
Gametas 2N 
2N
 
2N
 
2N
 
2N
Indivíduos
N 
N
 
N
 
N
 
N
Gametas 2N 
2N
 
2N
 
2N
 
2N
Indivíduos
N 
N
 
N
 
N
 
N
 0
Gametas
2N 
2N
 
2N
 
2N
 
2N
Gametas
2N 
2N
 
2N
 
2N
 
2N
Gametas
2N 
2N
 
2N
 
2N
 
2N
 
1
Indivíduos
 
N 
N
 
N
 
N
 
N
 
2
Indivíduos
 
N 
N
 
N
 
N
 
N
Geração
	
	
Figura 18. Representação da subdivisão de uma população infinitamente grande - população base - em diversas subpopulações ou linhas.
O que ocorre em termos das propriedades genéticas pode ser estimado a partir da expressão da variância das freqüências alélicas () que é obtido por uma espécie diplóide; considerando o gene B, com os alelos B e b tem-se:
.
.
ou
 
	Por exemplo, se a população inicial tem 5000 indivíduos e p = q = 0,5, o desvio nas frequências alélicas será , ou seja, se for considerado um grande número de amostras de tamanho 5000 em 68% delas a frequência alélica irá flutuar de q = 0,5 0,005, ou seja, entre 0,495 e 0,505. Isto é, ocorre o que denominamos de fixação dos alelos. Acaba com a variabilidade da população que passa a possuir apenas genótipos homozigotos, BB quando q = 0 e bb para q =1,0. Se continuar com está amostra pequena, após algum tempo todas as subpopulações poderão fixar seus alelos. De um modo imprevisível, para maior adaptação BB ou ao contrário menor adaptação bb.
	Pelo último comentário fica claro que as subpopulações não irão fixar o mesmo alelo. Inlusive, porque a freqüência alélica média das subpopulações é igual à freqüência alélica da população original. Para exemplificar, vamos considerar 64 subpopulações de tamanho dois obtidas de uma população original obtidas do cruzamento de indivíduos (Bb x Bb), ou seja, novamente p = q = 0,5. Os descendentes na primeira geração serão BB Bb e bb na freqüência 1:2:1. Na próxima geração serão considerados novamente dois indivíduos para o acasalamento. As possibilidades serão então :
	Acasalamento
	Probabilidade
	Frequência dos alelos
	
	
	B
	b
	BB x BB
	
	1
	0
	2BB x Bb
	
2
	
	
	2BB x bb
	
2
	
	
	Bb x Bb
	
 . = 
	
 
	
	2Bb x bb
	
2 ( . ) = 
	
	
	bb x bb. = 
	0
	1
	
	Média
	
	
	Assim, para as 64 subpopulações ou oito subpopulações irão se fixar, quatro com genótipo BB e quatro com genótipo	bb. A frequência alélica média como já comentado será a mesma da população original. Verifica-se que em 56 subpopulações (64-8) ainda não ocorreu a fixação. Porém, na próxima geração, considerando novamente amostra de tamanho 2, mais fixação deverá ocorrer. Na realidade, nesta terceira geração 18,75 das amostras- subpopulações – já estarão fixadas, Ou seja, das 64 amostras, 12 não terão mais variabilidade. O processo se repetindo ao final todas as subpopulações estarão fixadas. Quando isto ocorrer 32 das amostras serão BB e 32 bb.
	Quando N é grande, a fixação ocorre lentamente. Mas mesmo para populações grandes, em longo prazo, certa proporção de fixação pode ocorrer. Wright citado por Strickberger (1976) mostra o que ocorre com populações de diferentes tamanhos (Figura 19). Veja que para populações de tamanho superiores a 10.000 a 100.000 é que, no tempo avaliado, a fixação não ocorreu.
	
	Figura 19: Fixação de alelos considerando populações com diferentes tamanhos. Veja que, com uma população de 1.000 ou 15.000 a fixação ocorre, já com 10.000 e 100.000 ela não ocorreu durante o tempo em que foi avaliada. Fonte: Strickberger, 1976.
	O número de pais é um aspecto importante para se atingir a fixação. Contudo, deve-se fazer distinção entre o N no sentido ecológico, isto é, o número de indivíduos contados, por exemplo, em uma dada região, o número genético (Ne), os que realmente participam do processo reprodutivo, nem sempre eles são iguais. O Ne é conhecido como tamanho efetivo. Se, por exemplo, em uma população de 10.000 indivíduos, há 300 pares de cruzamentos que contribuem igualmente para a descendência na próxima geração, o tamanho efetivo é de apenas 600. A proporção sexuada envolvida também afeta. Por exemplo, se cinco fêmeas forem cruzadas com 500 machos o Ne será superior a cinco mais inferior a 500. Wright mostra que nesta situação Ne é obtida pela expressão: Ne = (4NfNm)/(Nf + Nm), em que Nf número de fêmeas genitoras e Nm número de machos genitores. No exemplo Ne = (4 . 5 . 500)/5 + 500) = 19.8. O tamanho efetivo é difícil de medir na prática e existe um grande número de outras situações em que ele pode variar.
	É preciso salientar também que ao longo das gerações de amostragem, as freqüências alélicas das subpopulações oscilam muito. 
	O aumento da diferenciação entre as linhas é equivalente ao aumento da variância das freqüências alélicas entre estas linhas. A variância das freqüências alélicas entre as linhas, em qualquer geração t é:
	Veja o exemplo apresentado na figura 20. Assim, três dos aspectos do processo dispersivo já podem ser visualizados: a oscilação das freqüências alélicas, diferenciação em subpopulações e a fixação dos alelos.
	1,0
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,9
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,8
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,7
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,6
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
Gerações0,5
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,4
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,3
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,2
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,1
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	0,0
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	1
	2
	3
	4
	5
	6
	7
	8
	9
	10
	11
	12
	13
	14
Figura 20. Freqüências alélicas ao longo de 14 gerações para quatro populações de tamanho 20.
	
4.4.2.2. Deriva genética sob o ponto de vista da endogamia
	A endogamia corre quando há acasalamento entre indivíduos aparentados. A endogamia varia de acordo com o grau de parentesco entre os indivíduos envolvidos no acasalamento. Ela é máxima quando ocorre autofecundação. É também expressiva no acasalamento entre irmãos completos, tios, sobrinhos, etc. 
	Para exemplificar, vamos considerar o que ocorre quando há autofecundação de todos os indivíduos da população. Esse exemplo é restrito às populações de plantas e somente sob a interferência do homem. Posteriormente vamos comentar o seu efeito em populações naturais. 
	Seja uma população de plantas em equilíbrio e que . Nessa condição ao as freqüências dos genótipos serão: 
; 
; 
. 
Se ela for autofecundada, a freqüência genotípica passa a ser:
;
;
. 
Veja que a freqüência alélica não foi alterada, pois:
Porém, a frequência genotípica foi modificada. Há incremento na freqüência dos genótipos homozigóticos e redução dos heterozigóticos. Se nós imaginarmos que o alelo A2 for prejudicial, deletério, a endogamia aumenta a frequência dos indivíduos A2A2, expressando maior carga genética e facilitando a seleção. Vejamos agora o que ocorre com a média da população. Sejam os genótipos mostrados a seguir com os respectivos valores genotípicos:
	Endogamia
	Sem autofecundação
	Com autofecundação
	Genótipos
	HW
	Valor genotípico
	p = q = ½
	A1A1
	p2
	100
	
	
	A1A2
	2pq
	80
	
	
	A2A2
	q2
	20
	
	
	MÉDIA
	
	
	70
	65
	A endogamia, em ocorrendo dominância, como ocorre no exemplo, diminui a média da população, e aumenta a freqüência de homozigotos, como já salientado.
	Em populações naturais, mesmo nos vegetais, não ocorre autofecundação em 100% dos indivíduos. Além do mais, a autofecundação não é a única forma de ocorrer endogamia. Há várias alternativas de acasalamento entre indivíduos aparentados. O que queremos mostrar em populações naturais, é que a endogamia é função do tamanho da população. Quanto menor a população, maior a chance de ocorrer acasalamento entre indivíduos aparentados.
	No momento, é preciso definir dois índices importantíssimos no estudo das populações naturais. O primeiro é o Índice Panmítico (P) que expressa a freqüência de heterozigotos nessa população, relativa à freqüência esperada na população em equilíbrio de Hardy-Weinberg. Se a população é grande e os acasalamentos ocorrem todos ao acaso, como já mencionado, as freqüências genotípicas não se alteram. Nessa condição, P assume valor 1,0. Porém ,quando há acasalamento entre indivíduos aparentados P assume valores inferiores a 1,0, chegando a zero quando só ocorrem homozigotos. Desse modo, o P é obtido pela expressão:
	P =
	Freqüência de Heterozigotos na geração t
	=
	2pq(1-F)
	=
	1-F
	
	Freqüência de heterozigotos na população em equilíbrio
	
	2pq
	
	
	Em que o F é o coeficiente de endogamia.
	Esse é outro índice muito importante. Ele mede o grau de relacionamento entre os indivíduos da população. É fácil ver que em uma população de indivíduos bissexuados todos eles têm dois pais, quatro avós, oito bisavós, etc. Ou seja, 2t ancestrais, considerando t gerações passadas. Depreende-se que, quanto menor o tamanho da população, maior a probabilidade de que dois indivíduos, tomados ao acaso na população, sejam aparentados. 
	Conforme Falconer & MacKay (1996) ressaltam, a conseqüência principal resultante do fato de dois indivíduos terem um ancestral comum é que eles podem, os dois, carregarem cópias dos alelos de um determinado gene, presente no ancestral, e se eles se acasalam podem transmitir essas cópias às suas progênies. Assim, indivíduos endogâmicos podem possuir dois alelos, em um determinado loco, idênticos por descendência. É preciso, então, separar os indivíduos que são homozigotos em estado, e aqueles que são homozigotos com alelos idênticos por ascendência.
	O coeficiente de endogamia (F) mede a probabilidade de dois alelos em qualquer loco, serem idênticos por ascendência. É importante o grau de parentesco entre os pais desse indivíduo. Esse coeficiente é sempre tomado em referência a uma população em um passado não muito remoto. Essa população de referência é considerada a população com endogamia zero (F = 0).
	Para exemplificar será considerada uma população de referência ideal constituída de N indivíduos produzindoigual quantidade de gametas e cruzando ao acaso. Falconer e MacKay (1996) para exemplificar, consideraram N indivíduos de um organismo marinho hermafrodita , diplóide, que expele ovos e esperma no mar em igual quantidade, e portanto os acasalamentos serão ao acaso. Na população de referência, todos os alelos em um dado loco são considerados não idênticos. Considerando apenas um loco, existem 2N tipos diferentes de gametas na mesma freqüência. A pergunta é: Qual é a probabilidade de dois gametas, tomados ao acaso, carregar alelos idênticos?
	No exemplo, qualquer gameta tem a probabilidade de da união com outro do mesmo tipo. Então, é a probabilidade de os gametas possuírem alelos idênticos por descendência.
	Outro modo de visualizar esse fenômeno. Seja um loco A em um indivíduo diplóide. Então, nós teremos, para dois indivíduos, os seguintes genótipos:
A i A j
A k Al
	Em que o índice indica apenas que o indivíduo inicial não é aparentado, isto é, não possui alelos idênticos por descendência, pois os índices são diferentes. 
	Qual seria a probabilidade dos descendentes terem nos genótipos alelos idênticos por descendência, por exemplo, A i A i ? A freqüência do alelo A i é, e a probabilidade de de unir dois alelos A i é. Pode ser também A j A j = , A k A k = e Al Al = . Ou seja, a probabilidade total de ter alelos idênticos é de P(A i A i) + P(A j A j) + P(A k A k) + P(Al Al). Então, P = = = . Esse é o coeficiente de endogamia (F) de uma população de tamanho 2. Ou seja, o mesmo valor que seria obtido com a expressão anterior:
F = = = .
	Se for incluído mais um indivíduo não aparentado Am An, a probabilidade passa a ser:
	A i A i
	
 = 
	
 = 
	A j A j
	
 = 
	
 = 
	A k A k
	
 = 
	
 = 
	Al Al
	
 = 
	
 = 
	Am Am
	
 = 
	
 = 
	An An
	
 = 
	
 = 
	A probabilidade de se ter alelos idênticos é, portanto, . Usando a expressão anterior, F = , onde N = 3, F = .
	Esse é o coeficiente de endogamia da geração 1. Na geração 2 já existem dois modos pelos quais os homozigotos idênticos podem aparecer: um devido à união de alelos idênticos já acumulados na geração anterior, e o outro devido às novas uniões que são possíveis nessa geração. Essa nova probabilidade é também , pela mesma razão. Lembrando que nessa nova geração apenas dos zigotos têm alelos que não são idênticos por descendência. Assim, o coeficiente de endogamia da geração 2 passa a ser:
. Para uma geração t qualquer, tem-se: 
	Desse modo, a expressão do coeficiente de endogamia tem duas partes. A primeira, atribuível à nova endogamia, e uma outra função da endogamia pré-existente. Veja, então, 	que o coeficiente de endogamia é função do tamanho (N) da população. Se N é grande, o coeficiente de endogamia é pequeno, e a recíproca também é verdadeira. É por isso que o tamanho da amostra da população afeta a sua endogamia.
	Se uma população for mantida com amostras pequenas por algumas gerações a sua endogamia será acentuada. Se houver um aumento expressivo no tamanho da amostra a endogamia pré-existente persiste.
	Pode-se estimar o incremento na endogamia de uma geração para outra (F), isto é:
	F = 
	Então, Ft = F + (1 - F)Ft-1. Reescrevendo de outro modo,
	F = 	
	Essa equação estima o coeficiente de endogamia em uma geração, tomada em relação à distância que falta para alcançar a endogamia completa.
	Podemos agora expressar a variância nas freqüências alélicas em função do coeficiente de endogamia. A variância das alterações nas freqüências alélicas em uma geração 2q é obtida por:
	2q = 
	A variância nas freqüências alélicas entre linhas (sub-populações) na geração t (2q) é obtida por:
	2q = 
	A média do genótipo A2A2 média de todas as sub-populações, por exemplo, é fornecida por:
	
	Como 2p = 2q pode-se escrever:
	Genótipos
	Freqüência na população
	A1A1
	
	A1A2
	
	A2A2
	
	A principal conseqüência fenotípica da endogamia é a redução da média populacional que é denominada de depressão por endogamia. Suponha, por exemplo, que indivíduos A1A1 e A1A2 produzam 4 descendentes e que o genótipo A2A2 produza apenas 1 descendente. Assumindo freqüências alélicas de p = q = ½ e coeficiente de endogamia F = 0,75 tem-se:
	Genótipos
	Nº de
descendentes
	População panmítica
(F = 0)
	População endogâmica
(F = 0,75)
	A1A1
	4
	p2 = 0,25
	p2 + pqF = 0,4375
	A1A2
	4
	2pq = 0,50
	2pq - 2pqF = 0,1250
	A2A2
	1
	q2 = 0,25
	q2 + pqF = 0,4375
	
Média ()
	
	3,25
	2,6875
	A endogamia foi responsável pelo aumento das freqüências genotípicas dos homozigotos e na redução dos heterozigotos. Observa-se, ainda, que o número médio de descendentes foi reduzido na população endogâmica. Este fenômeno é bastante comum em muitas espécies e freqüentemente resulta em efeitos deletérios, como aumento na taxa de mortalidade, mal formações, perda de vigor, redução na fertilidade, tamanho dos indivíduos, etc.
4.4.2.3. Exemplos de deriva genética
	Formação de subpopulações: Os exemplos mais ilustrativos de como tamanhos finitos de populações afetam a distribuição das freqüências alélicas foi apresentado por Buri, 1956. O trabalho foi conduzido com Drosophila melanogaster. Simulou 107 subpopulações, cada uma contendo 16 indivíduos heterozigóticos para o gene que afeta a cor dos olhos. Alelo bw75 olhos avermelhados e bw olhos marrons. Portanto, p = q = 0,5 na população original. Em cada uma das sub-amostras por geração 8 machos e 8 fêmeas eram aleatoriamente tomadas para formar a próxima geração. Os histogramas na figura 21 ilustram a distribuição das freqüências alélicas ao longo das gerações. A desuniforme distribuição inicial se torna mais achatada e adquire a forma de U à medida que as subpopulações vão sendo fixadas para os alelos bw75 ou bw. O empilhamento ocorre porque uma vez que o alelo é fixado ou perdido, não há mais possibilidade dele reverter a qualquer outra freqüência. Na geração 18, cerca de 50% das subpopulações foram fixadas para um alelo ou outro e, as populações não fixadas apresentaram freqüências alélicas semelhantes.
Número de populações
Figura 21. Deriva genética em 107 populações de Drosophila melanogaster. Cada uma das populações inicial consistia de 16 indivíduos heterozigotos bw75/bw (N = 16; bw75 olhos avermelhados e bw olhos marrons). Em cada uma das progênies em cada geração, 8 machos e 8 fêmeas eram tomadas aleatoriamente para formar a próxima geração. Com o passar do tempo, números crescentes de populações se tornaram fixadas para um ou outro alelo. (Buri, 1956)
Efeito do fundador e afunilamento genético
As populações podem ser formadas por pequeno grupo de indivíduos, isto é, comum em algumas situações. Nesse caso, ocorre o que se denomina de efeito do fundador. Mayer (2006) definiu efeito do fundador como sendo “O estabelecimento de uma nova população a partir de uma amostra de poucos indivíduos fundadores (no extremo caso apenas uma fêmea) a qual carrega apenas uma pequena fração da variação genética total da população original.” Há vários exemplos conhecidos. Estima-se, por exemplo, que a população humana da Europa tenha se originado de poucos indivíduos, provavelmente apenas 2 fêmeas e 4 machos. 
Um exemplo interessante é o relacionado a uma ilha na costa brasileira – Tristão da Cunha. Em um censo realizado em 1961 foram encontrados 267 indivíduos na ilha. Um pesquisador estudou a genealogia e mostrou que essa população derivou de número muito pequeno de ancestrais. Os fundadores foram um casal que chegaram à ilha em 1816. Esse casal contribuiu com mais de 25% dos alelos da população em 1885. Posteriormente, mais três genitores foram introduzidos na ilha. Foi possível mostrar em 1961 que 45% dos alelos presentes na população humana da ilha era devido a apenas 5 genitores. Durante esses anos ocorreram flutuações no tamanho populacional. A redução é como se os alelos tivessem que passar pelo gargalo de uma garrafa, redução drástica.E, posteriormente, a população retorna à condição normal. A chance que a nova população acabe com toda a variabilidade – fixação dos alelos é fornecida pela probabilidade de ocorrer homozigotos na população, ou seja, (p2)N + (q2)N. É fácil visualizar que a probabilidade de eventos fundadores produzir só homozigotos é muito pequena. Ridley (2006) mostra que mesmo com um tamanho tão pequeno como N = 10, a chance de só ocorrer homozigoto é muito pequena, especialmente se p =q. O mesmo autor comenta como foi formada parte da população da África do Sul, “Africânder”. Ao que tudo indica, eles descendem de imigrantes que chegaram em um navio de carga, em 1652. Atualmente, a população tem 2,5 milhões de indivíduos e mais de 1 milhão possui nome dos 20 colonizadores iniciais. Esse fato tem permitido acompanhar alguns alelos na população. Um dos imigrantes que chegou no navio em 1652, tinha doença de Hungtington. A maioria dos indivíduos da população atual, que possui essa anomalia, pode ser rastreada até o imigrante com a anomalia. Vários outros exemplos são conhecidos.
Extinção das espécies 
A expressão populações ameaçadas de extinção constantemente utilizada pela mídia e alguns biólogos refere-se a casos em que ocorrem redução drástica no tamanho da população, em muitos casos por ação do homem, devido à caça, avanço da área agrícola, crescimento das cidades entre outros. A tabela 16 apresenta a relação de algumas espécies submetidas ao afunilamento genético. 
A extinção é o destino mais provável de uma população reduzida a tamanhos críticos. Contudo, é exagero dizer que isto é inevitável. Algumas linhagens altamente endogâmicas mostraram-se presistentes durante várias gerações.
Uma população pequena e isolada pode se tornar especificamente adaptada a um habitat característico e manter-se com sucesso neste habitat por longo período, e até mesmo se expandir. Problemas surgem se este habitat passa por alterações significativas.
Tabela 16. Populações de diversas espécies submetidas ao afunilamento genético.
	Espécie
	Tamanho Populacional 
	
	Nº de fundadores
	Ovelha dos montanhas (Cwis canadensïs)
	8/1947; 90/1954
	Morcego (L.asïorhïnus-latifrons)
	20-30/1981; 70/1994
	Koalas (Phascolarctos cinereus)
	18/1924;2-3/1880
	Raposa vermelha (Vulpes vulpes)
	5/1870
	Lobos (Canis fupus)
	3/1984
	Urso marrom (Ursus erectus)
	40/1932; 700/1995
	Pardais (Passer montanus)
	20/1870
Outros exemplos: elefantes marinhos (20 ind), gansos americanos (Trus amerïcana- 20 ind.), condor da Califórnia (14 ind.).
4.4.3 MECANISMOS DE ISOLAMENTO REPRODUTIVO
O que são espécies? Por que elas existem? Como se mantêm isoladas? Esses são alguns questionamentos que os biólogos constantemente formulam. O conceito de espécie pode ter significado diferente em diferentes áreas da biologia. Alguns taxonomistas adotam o conceito tipológico, por meio de caracteres fenéticos ou morfológicos. Segundo Ridley (2004), caracteres fenéticos são aqueles que podem ser observados ou medidos no organismo incluindo caracteres microscópicos e fisiológicos. Os morfológicos são caracteres de forma observados no organismo como um todo ou em parte. Assim, por exemplo, o comportamento de um animal e sua fisiologia fazem parte de caracteres fenéticos, mas não morfológicos. Contudo, na prática eles se misturam. As expressões fenética e fenotípica também são freqüentemente utilizadas como sinônimos. Os taxonomistas observam um dado caracter comparando a expressão fenotípica de outra espécie para definir se é uma nova espécie ou apenas indivíduos diferentes da mesma. O problema é que há muita variação na expressão fenotípica dos diferentes caracteres que dificultam a classificação em muitas situações. 
Os evolucionistas por seu turno têm o conceito de espécie fundamentado na capacidade dos indivíduos da mesma espécie trocarem alelos entre si, ou seja, espécie é um grupo de indivíduos que possuem a capacidade de trocar alelos livremente entre si, porém não com indivíduos de outra espécie. Os indivíduos de uma espécie participam de um pool gênico comum. A espécie é uma unidade de evolução. Esse é conhecido como conceito biológico de espécie. Em vários casos, a classificação dos tipologistas e dos evolucionistas coincide, porém há situações que isto não ocorre, o que gera confusão. No gênero Eucaliptus, por exemplo, os taxonomistas colocam como espécie distinta Eucaliptus grandis e Eucaliptus urophyla fundamentado em diferenças morfológicas. Na natureza, contudo, indivíduos dessas duas espécies cruzam produzindo descendentes férteis e viáveis, para os evolucionistas elas constituem uma espécie única.
Há também o conceito ecológico de espécie. Esse conceito é discutido por Ridley (2004) e não será comentado aqui. Apenas será mencionado que por esse conceito, a espécie é um grupo de indivíduos adaptados a um determinado nicho no ambiente. 
O conceito a ser adotado nessa disciplina, evidentemente é o conceito biológico. Nesse contexto é necessário comentar que há ainda alguns conceitos importantes relacionados à espécie. Por exemplo, especiação alopátrica, que ocorre quando as populações são geograficamente isoladas; especiação simpátrica, tipo de especiação em que uma espécie origina duas espécies dentro de uma mesma região geográfica; espécies crípticas ou irmãs, populações morfologicamente similares ou idênticas que são isoladas reprodutivamente.
O segundo questionamento é; por que as espécies existem? A resposta nem sempre é consensual. Mayr (2005) assim se expressou a esse respeito: “A espécie é com efeito, um desafio fascinante. Apesar da maturidade do darwinismo, ainda estamos longe de alcançar unanimidade sobre a origem de novas espécies, sobre seu significado biológico e sobre a delimitação dos táxons de espécie”. Fica fácil, contudo imaginar que se todos os seres vivos tivessem condições de partilharem de um mesmo conjunto gênico, não existiriam espécies definidas. Certamente, o número de indivíduos com menor adaptação a cada geração de acasalamento seria enorme. E o preço a ser pago também imenso. 
O terceiro questionamento: Como as espécies se mantêm isoladas? É mais fácil de ser respondida. Constitui o foco desse tópico da teoria sintética da evolução, ou seja, as espécies se mantêm isoladas por meio de mecanismos de isolamento reprodutivo. São barreiras que impossibilitam a troca de alelos entre indivíduos de espécie diferentes. Um desses mecanismos é o isolamento geográfico, que origina as espécies alopátricas. Esse mecanismo, embora possa funcionar por algum tempo, dificilmente promove o isolamento para sempre. Além do mais, há enorme número de espécies simpátricas, isto é, que vivem em uma mesma região. Nesse caso, não existe isolamento geográfico. Como então que estas espécies mantêm-se isoladas? Isto ocorre por meio dos mecanismos de isolamento reprodutivo, ou seja, todos os mecanismos que impedem ou dificultam o acasalamento entre indivíduos de espécies diferentes.
A classificação desses mecanismos é apresentada na tabela 17. Veja que eles podem ser pré-zigóticos, agem impedindo o contato entre indivíduos de espécies diferentes ou restringem a união dos gametas, se porventura a fertilização ocorrer. Já os pós-zigóticos atuam no embrião e/ou indivíduos híbrido impedindo o seu desenvolvimento ou reduzindo ou impedindo a fertilidade do híbrido obtido. 
Há vários mecanismos pré e pós-zigóticos. Alguns exemplos serão apresentados nessa nota de aula, outros podem ser encontrados em Stebbins 1970; Dobzansky 1970; Ridley 2004.
Tabela 17. Mecanismos de isolamento reprodutivo. Fonte: Sttebins (1970).
	A.
	Mecanismos Pré-zigóticos: Impedem a fecundação e a formação do zigoto.
	
	1. Habitat: As populações vivem na mesma região mas ocupam habitats diferentes.
	
	2. Sazonal ou temporal: As populações existem na mesma região, mas apresentam maturidade sexual em épocas diferentes.
	
	3. Etológica (sòmente em animais): As populações são isoladas por comportamentos diferentes e incompatíveisantes do acasalamento.
	
	4. Mecânico: A fecundação cruzada é impedida ou atenuada por diferenças estruturais dos orgãos reprodutores (genitais nos animais, flôres nas plantas).
	
	5. Gamético: Os gametas de espécies diferentes não se fundem.
	B.
	Mecanismos Pós-zigóticos: A fecundação ocorre e zigotos híbridos são formados, mas êstes são inviáveis, ou dão origem a híbridos fracos ou estéreis.
	
	1. Inviabilidade ou fraqueza do híbrido.
	
	2. Esterilidade estrutural do híbrido: Os híbridos são estéreis porque as gônadas se desenvolvem anormalmente, ou a meiose se degenera antes de se completar.
	
	3. Esterilidade segregacional do híbrido: Os híbridos são estéreis devido à segregação anormal, para os gametas, de cromossomos inteiros, segmentos de cromossomos ou combinações de genes.
	
	4. Deterioração de F2: Os híbridos F1 são normais, vigorosos e férteis, porém a geração F2, contém muitos indivíduos fracos ou estéreis.
4.4.3.1 MECANISMOS PRÉ-ZIGÓTICOS
ISOLAMENTO DE HABITAT
No caso das plantas, as populações exploram numa mesma região habitats diferentes. Dobzhansky (1970) e Stebbins (1970) citam exemplo de uma árvore de clima temperado, o carvalho. No E.U.A o carvalho escarlate (Quercus coccínea) e o carvalho negro (Quercus velutina) são duas espécies simpátricas no leste do país e se distinguem facilmente. O carvalho escarlate habita brejos ou áreas mal drenadas com solos ácidos. Já o carvalho negro é encontrado em solos mais secos, bem drenados, terras altas. Em alguns casos, em regiões de transição podem ser encontrados alguns híbridos entre eles.
É mencionado também as espécies de moscas no Japão. As espécies realizam enxameamentos diários durante os quais ocorrem as cópulas; entretanto cada espécie tem o seu local de enxameamento em um tipo diferente de habitat.
ISOLAMENTO TEMPORAL
A troca de alelos é impedida entre espécies que se reproduzem em épocas diferentes. Em Dendrobium ocorre um exemplo marcante. As flores abrem ao amanhecer e murcham ao entardecer. O florescimento é produzido por um estímulo meteorológico, como uma tempestade súbita. As espécies se mantêm isoladas porque uma delas floresce oito dias após a ocorrência do estímulo, a outra com nove e uma terceira com 10 a 11 dias após a ocorrência do estímulo. No Brasil ocorrem exemplos interessantes de isolamento temporal em espécie de orquídeas. A espécie Cattleya labiata e C. chocoensis podem ocorrer numa mesma árvore, mas mantêm-se isoladas porque a primeira floresce nos meses de janeiro a fevereiro, enquanto a C. chocoensis floresce de maio a junho.
Outro belo exemplo ocorre nas cigarras (Magicicada). O período larval dura vários anos. E a eclosão dos adultos ocorre aos milhares em uma determinada época do ano. No Brasil, normalmente nos meses de setembro /outubro. Elas se mantêm isoladas porque o tempo de permanência no solo é variável. Existem espécies em que o tempo de desenvolvimento é de 13 anos e em outras é de 17. Fica fácil ver que dificilmente elas terão chance de eclodirem juntas. Segundo Dobzhansky (1970) elas vêm sendo estudadas há mais de três séculos e essa periodicidade tem sido mantida. Há espécies, contudo, que eclodem ao mesmo período. Estima-se 13 com ciclos de 17 anos e 5 com 13 anos. Quando há coincidência no ciclo atuam outros mecanismos de isolamento, tais como o habitat e também etológico, diferenças no canto como será comentado posteriormente. Com relação a esse comportamento Dobzhansky (1970) faz o seguinte comentário: “A abundância espetacular das espécies de Magicicada nos anos de emergência em massa indica que esses insetos são muito bem sucedidos”. Por que têm então um tempo de desenvolvimento tão longo (gêneros próximos se desenvolvem muito mais depressa) e para que aparecem uma vez cada 17 ou 13 anos em uma determinada localidade? Autores sugerem que esse comportamento possa ser uma adaptação singular para escapar a parasitas e predadores. Não se conhece nenhum parasita com ciclo de vida dessa extensão e os predadores (principalmente aves) ficam rapidamente saciados por uma ou duas semanas nos anos de emergência em massa. O número relativamente pequeno de animais desgarrados, isto é, cigarras que emergem um ano após a emergência em massa, é rapidamente destruído pelos predadores. Isto explica por que as três espécies simpátricas sempre emergem juntas; seria seletivamente desvantajoso sair do ritmo. Menos fácil é entender a origem da progênie de cada espécie emergindo em anos diferentes e a existência de ciclos de 17 e de 13 anos.
ISOLAMENTO ETOLÓGICO
Etologia é o estudo do comportamento animal. Essa é uma das áreas mais interessantes da biologia, sobretudo no que é relacionado à reprodução. Há uma infinidade de exemplos descritos na literatura. Nas aves, por exemplo, a visão e o canto são os principais fatores da atração sexual. A plumagem, os adornos e exibições no corte desempenham papel fundamental no reconhecimento do sexo oposto, porém da mesma espécie.
Um exemplo marcante é apresentado por Dobzhansky (1970) relacionado às aves do gênero Ptilorhynchidae. Nesse gênero já foram descritas 19 espécies que vivem na Austrália e Nova Guiné. O comportamento no momento da corte é extraordinário. Os machos constroem "caramanchões", cada espécie a seu modo, que decoram em vários estilos. Para a decoração dos caramanchões algumas espécies usam flores e frutos de cores vivas ou constroem avenidas de acesso com ossos alvejados, pedras, peças de metal que podem encontrar ou campos de musgo. Uma espécie chega a ponto de pintar seu caramanchão com a polpa de frutos, usa para isto, como pincel um chumaço de capim seco ou uma cortiça esponjosa. As fêmeas são seduzidas para entrar no caramanchão, onde ocorre a cópula. Entretanto, os ninhos são construídos em outros lugares, sem nenhuma decoração especial.
Em sapos e rãs os estímulos auditivos desempenham um papel importante na reunião de fêmeas e machos da mesma espécie nos seus locais de reprodução. Durante a estação de reprodução os chamados dos machos atraem as fêmeas e também estimulam outros machos a se aproximarem e começarem a chamar, de modo que se forma um "coro" de indivíduos coespecíficos. A resposta ao chamado é própria para cada espécie. O papel de estímulos auditivos no isolamento reprodutivo das espécies vem sendo estudado A Tabela 18 fornece exemplos das características dos chamados (sons) de onze espécies de rãs hilas que ocorrem na Flórida. São mostradas a freqüência dominante (em ciclos por segundo) e a duração média (em segundos), tal como foram reveladas por meio de espectrogramas de som. Observe que não há duas espécies com o mesmo padrão de sons emitidos. Na realidade as diferenças são bem mais numerosas - por exemplo, a taxa de repetição para as espécies que produzem trinados varia de 9,7 notas por segundo em Hyla phaeocrypta a 50,0 em H. ocularis.
Tabela 18. Valores médios para a freqüência dominante e duração dos sons de chamamento de onze espécies de rãs hilas. Fonte: Dobzansky, (1970).
	Espécie
	Freqüência dominante,
ciclos por segundo
	Duração, segundos
	Trinado
	Hyla gratiosa
	435
	0,16
	-
	H. crucifer
	2 467
	0,14
	-
	Pseudacris ornata
	2562
	0,06
	-
	Hyla cinerea
	3 407
	0,18
	-
	H. squirella
	3 457
	0,24
	-
	Acris grillus
	3 914
	0,04
	-
	Hyla versicolor
	2 444
	0,84
	+
	Pseudacris nigrita
	3 325
	0,39
	+
	Hyla phaeocrypta
	4 500
	1,99
	+
	H. femoralis
	4 800
	2,35
	+
	H. ocularis
	7 125
	0,16
	+
Merece destaque também os ferormônios que são substâncias químicas que servem como sinais que determinam reações de comportamento em indivíduos da mesma espécie. Eles são importantes no reconhecimento das espécies e, portanto, no isolamento etológico. A maior parte dos estudos relevantes são com insetos e mamíferos, mas os ferormônios sexuais são bem disseminados no reino animal. A natureza química de alguns ferormônios está se tornando conhecida.Em geral são pequenas moléculas, com peso molecular entre 80 e 300. 
Há um caso interessante também em alguns peixes da África. Ocorre isolamento etológico por meio da cor dos peixes, No lago Vitória são encontradas duas espécies Pundamilia nyererei e P. pundamilia. São espécies relacionadas que diferem na cor P. Nyererei é azul e P. Pundamilia é vermelha. Foi realizado um trabalho em laboratório para estudar a preferência sexual (Seehausen & Van Aphen 1998). Eles testaram o comportamento das fêmeas das duas espécies com luz normal. A preferência das fêmeas foi para o macho da mesma espécie. Repetiram o experimento com luz monocromática, não permitindo distinção na cor das duas espécies. Nessa situação não houve diferença na preferência das fêmeas para os machos. Esse experimento mostra que o isolamento pré-zigótico é determinado pela cor dos machos das duas espécies de peixe. Inclusive, tem sido constatado que a poluição no lago vitória tem contribuído para o aparecimento de peixes híbridos, pois as fêmeas não conseguem distinguir as cores dos macho. Quando as fêmeas são fertilizadas artificialmente no laboratório produzem descendentes férteis e viáveis com ambos os machos, indicando que os mecanismos pós-zigóticos não funcionam nesse caso. 
ISOLAMENTO MECÂNICO: 
Esse isolamento ocorre devido a diferenças estruturais nos órgãos reprodutivos. Há vários exemplos. Na falsa erva-de-rato (Asclepias spp) plantas tóxicas que ocorrem em pastagens, as flores de espécies distintas têm a estrutura floral tão diferente que mesmo com visitas sucessivas de insetos polinizadores, não há ocorrência de híbridos interespecíficos.
Em muitas espécies da família das Escrofulariáceas (Penstemon) ocorrem plantas com flores azuis ou avermelhadas, mas o tamanho e a forma das flôres diferem muito de uma espécie para outra. Algumas são adaptadas à polinização por abelhas grandes, tais como as xilacopíneas, outras, por mamangavas, outras ainda, por abelhas pequenas, solitárias, ou por vespas. Algumas espécies, além disso, possuem flores de coloração vermelha viva e forma tubular que se adapta aos bicos dos beija-flores, seus principais polinizadores (Figura 22).
As espécies de bocas-de-leão (Antirrhinum), muitas das quais são encontradas em estado silvestre na Espanha, são todas polinizadas por abelhas altamente desenvolvidas, com instintos especializados, um dos quais é o da constância de flor. As abelhas de uma determinada colméia visitam flores de uma única espécie. Experiências em um jardim plantado contendo duas espécies de boca-de-leão mostraram que uma determinada abelha raramente voará da flor de uma espécie para a de outra, embora abelhas diferentes da mesma colméia visitem ambas as espécies. É importante enfatizar que são produzidas poucas sementes híbridas na natureza, embora tais híbridos possam ser facilmente obtidos por polinização artificial.
Fig. 22. Quatro espécies do gênero Pentstemon encontradas na Califórnia e seus polinizadores. Evidências baseadas na distribuição indicam que as duas espécies mais antigas são os tipos extremos: o Pentstemon das montanhas (
P. grinnellü
) (A) e o 
Pentstemon escarlate
 (
P. centranthifolius
) (B). Os outros tiois tipos são derivados da hibridação entre êsses dois, seguida de isolamento e estabilização de populações intermediárias, através da ação seletiva de polinizadores específicos. Fonte: Sttenbins (1970)
Em animais a estrutura complexa da genitália, especialmente em insetos, é utilizada pelos taxonomistas para a classificação das espécies muito próximas. Em alguns casos ocorre o que é denominado de “chave-fechadura”, isto é, as genitálias dos machos e das fêmea se ajustam perfeitamente. Mesmo pequenas diferenças na estrutura tornam a fertilização de espécies diferentes quase impossível. Dohbzansky (1970) comenta que a genitália de cada espécie é uma fechadura que só pode ser aberta por uma única chave.
ISOLAMENTO GAMÉTICO
Quando óvulos de duas espécies de ouriço-do-mar Strongy locentrotus purpuratus e S. Franciscanus são expostos a mistura de esperma das duas espécies, a fertilização de esperma da mesma espécie é muito mais frequente. O mesmo fato é observado para espécies de peixes em que a fertilização é externa. Outros exemplos são conhecidos em Drosophila em que foi realizada a inseminação artificial utilizando espermatozóides de diferentes espécies. A eficiência é muito maior quando o espermatozóide (semen) é da mesma espécie do óvulo.
Um belo exemplo de incompatibilidade gamética ocorre em espécies do gênero (Tribolium), barata da farinha. Em duas espécies T. Castaneum, T. Fremani, não há mecanismos de isolamento antes da fertilização, isto é, os machos das duas espécies copulam indisdintamente com as fêmeas. Em experimento realizado por Wade et al (1993) com fêmeas de T. Freemani, foram avaliados três tratamentos: (i, a fêmea foi submetida sucessivamente a dois machos de T. Fremani ii) com dois machos de T. Castaneum; ou i) com um macho de cada uma das espécies. Constatou-se que as fêmeas produziram a mesma quantidade nos três casos e os ovos eclodiram (contudo, estéreis). Isto mostra que o espermatozóide de T. Castaneum consegue fertilizar os óvulos de T. Freemani. Entretanto, quando as fêmeas de T. Freemani foram colocadas com os machos de ambas as espécies, condição iii, menos de 3% dos descendentes foram híbridos, ou seja mais de 97% dos óvulos foram fertilizados por espermatozóides de T. Freemani. Há competição entre os espermas das espécies diferentes e o da mesma espécie vence a competição. A fisiologia dos órgãos reprodutivos da fêmea é que realiza a seleção dos espermatozóides .
Em plantas ocorrem inúmeros exemplos. No gênero Nicotiana, o pólen de uma espécie aborta no estigma da flor de outra espécie bem relacionado. Nesse caso, inclusive foi constatado que a reação de compatibilidade não tem controle genético monogênico.
4.4.3.2 MECANISMOS PÓS-ZIGÓTICOS 
	A fecundação ocorre e os zigotos híbridos são formados, mas estes são inviáveis ou produzem híbridos fracos ou estéreis. Há alguns tipos: 
INVIABILIDADE OU DEBILIDADE DO HÍBRIDO.
	O estudo mais detalhado sobre esse mecanismo de isolamento foi feito a partir da inseminação artificial de rãs de uma espécie com esperma de outra, na tentativa de se obterem híbridos interespecíficos. A hibridação de Rana pipiens x Rana sylvatica produziu embriões que se desenvolveram apenas até o estágio de gástrula, mostrando portanto ser inviável a formação do híbrido. Um exemplo em planta foi observado em linho, onde as sementes híbridas, provavelmente do cruzamento de Linum perenne ( ) x L. austriacum (), não germinaram porque o embrião não conseguiu romper o invólucro da semente nas condições naturais.
	Esse tipo de incompatibilidade ocorre também em muitas outras espécies vegetais. Contudo, a incompatibilidade pode em alguns casos ser superada por meio de processo artificial via cultura de embrião. Esse processo tem sido utilizado em muitos casos, especialmente nas cucurbitáceas e em Phaseolus.
ESTERILIDADE DO HÍBRIDO 
	Os híbridos são estéreis porque os órgãos reprodutivos não se desenvolvem completamente ou o processo meiótico é anormal. Na pecuária, em várias ocasiões já foi experimentada a obtenção de certos híbridos interespecíficos visando a associar em um mesmo animal características desejáveis que estão separadas em indivíduos de espécies diferentes. Um dos exemplos é o cruzamento de bovinos com búfalos, visando a incorporar nos bovinos maior rusticidade. Nos casos em que os descendentes foram obtidos, esses eram estéreis, principalmente devido ao desenvolvimento incompleto dos testículos dos machos.
	A esterilidade pode ocorrer também devido à falta de homologia entre os genomas das espécies. O exemplo mais marcante que se tem é o cruzamento de jumento (Equus asinus) com a égua (Equus caballus). Neste caso o híbrido obtido, burro ou mula, é muito vigoroso, apesar de estéril. Há contudo relatos, especialmente no caso demulas, em que estas foram férteis.
Nas plantas, as segregações cromossômicas anormais são também causas freqüentes da esterilidade dos híbridos interespecíficos. No entanto, as plantas suportam a poliploidia porque a esterilidade pode quase sempre ser suplantada por meio da duplicação do número de comossomas. Vários exemplos obtidos desse modo são encontrados na natureza, de alopoliplóides férteis. Algumas espécies alopoliplóides, e que hoje assumem grande importância econômica após terem duplicado seus comossomas, são o trigo comum (Triticum durum x Aegilops squarrosa), triticale (Triticum aestivum x Secale cereale) e nabo (Brassica oleracea x Brassica campestris), entre outras.

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