Buscar

JohnBrokman EINSTEIN

Prévia do material em texto

Introdução 
 
EINSTEIN, GERTRUDE STEIN, 
WITTGENSTEIN E FRANKENSTEIN 
 
O homem cria instrumentos e depois molda-se 
à imagem deles. A realidade é fabricada pelo homem. 
O universo é uma invenção, uma metáfora. 
 
O coração é uma bomba é declaração que 
todos aceitamos como um truísmo. O cérebro é um 
computador é um enunciado que muitos agora 
começam a aceitar. Isaac Newton criou uma 
metodologia mecanicista e nós inventamos a nós 
mesmos em termos da linguagem mecanicista. A 
metodologia de Newton influenciou a perspectiva 
reducionista que levou a medicina a examinar 
corações, pulmões e fígados — em suma, a 
compreender o corpo humano principalmente em 
termos de suas partes constitutivas. Agora, em 
conseqüência da tecnologia de computadores, um 
médico retira uma amostra de sangue, analisa-a com o 
auxílio de computador e recebe um relatório cifrado 
com centenas de informações para diagnóstico. Em 
vez de máquinas, nós nos vemos como um processo de 
informação. A metáfora muda continuamente. 
 
Seja qual for a linguagem descritiva a que tenhamos chegado, o compreender a 
realidade torna-se a realidade. Não dizemos que o coração parece uma bomba. Ele é uma 
bomba. 
 
A idéia de que a realidade não e mais que a rede imaterial e transitória de nossa 
linguagem descritiva já foi formulada de vários modos por vários pensadores importantes. 
Um dos mais eminentes dentre eles foi o físico alemão Werner Heisenberg que, em seu ago-
ra famoso princípio da incerteza, demonstrou que a realidade em seu nível mais 
fundamental, ou subatômico, é mais "criada" do que "observada" pelos físicos. Da 
mesma forma, o lingüista Benjamin Lee Whorf assinalou que nenhum indivíduo pode fazer 
uma descrição absolutamente imparcial da realidade, colocando-se acima das restrições de 
sua linguagem. O poeta Wallace Stevens escreveu extensamente sobre o primado da teoria da 
descrição. A esse respeito, ele considerava o mundo como sendo, ao mesmo tempo, a ficção 
suprema e a única coisa sobre a qual valia a pena refletir. Ele escreveu que "a crença última é a 
crença numa ficção, que sabemos ser ficção, nada mais havendo. A extraordinária verdade e a de 
saber que ela é uma ficção e que nela cremos de bom grado".1 Baseando-me na obra de Stevens, 
Whorf e Heisenberg, bem como na de outros pensadores, escrevi uma trilogia no fim da 
década de 60 e início da de 70 - By the Late John Brockman, 37 e Afterwords - 
apresentando minha convicção de que o universo não é algo que descobrimos, mas sim algo 
que inventamos. 
 
Tendo concluído que quando apresentamos descrições do universo não estamos tanto 
explorando a realidade quanto criando-a, fiquei menos interessado em escrever acerca do 
significado do universo do que em descobrir os indivíduos responsáveis pelo atual estado do 
universo como invenção. Em 1973 participei de uma conferência, conhecida como Conferencia 
AUM, em Big Sur, na Califórnia. A finalidade da conferência era passar dez dias explorando a 
obra do matemático britânico G. Spencer Brown. Além de Brown, também participaram o 
filósofo Alan Watts, o antropólogo Gregory Bateson, o neurofisiologista Karl Pribram, o 
especialista em golfinhos John Lilly, o psicólogo Will Schutz, além de Stewart Brand, autor 
de Whole Earth Catalog, e o estudioso de cibernética e lógica de computação Heinz Von 
Foerster. 
 
Cada um dos participantes deveria proferir uma pequena palestra sobre seu trabalho. 
Isso me intimidou um pouco, pois eu não era cientista nem tinha reputação profissional 
apreciável. Só fui convidado depois que o físico Richard Feynman se recusou a participar. 
Decidi que a discrição era a melhor estratégia. Consegui evitar a tribuna por vários dias, mas 
depois, numa manhã bem cedo, quando bebia, ainda zonzo, a primeira xícara de café, minha 
vista do Pacífico de repente se eclipsou. Alan Watts e John Lilly, apropriadamente trajados 
com capas e capuzes inquisitoriais, assomaram à minha frente, ordenando-me que falasse 
naquela noite. 
 
Não tive escolha. Eu sabia que iria falar sobre a idéia geral do universo como invenção, 
como ficção última. Como referenda resolvi empregar um quadro conceitual que me foi 
sugerido, mais ou menos um ano antes, pelo artista conceitual James Lee Byars. No decorrer de 
diálogos muito freqüentes e intensos, Byars expôs sua idéia da importância dos "Steins", na 
base da consciência pós-moderna. Os "Steins", para ele, incluíam o físico Albert Einstein, a 
escritora Gertrude Stein e o filósofo Ludwig Wittgenstein. Eu achava que para confirmar o 
argumento do universo como invenção era necessário incluir também o trabalho do ciberneticista 
Norbert Wiener. Uma vez que a cibernética levou ao desenvolvimento da inteligência artificial, o 
dr. Frankenstein - certamente o inventor da primeira inteligência artificial - foi incluído para 
representar as idéias cibernéticas (de que valem as teorias sem o estilo?). Na palestra, cada Stein 
simbolizava o seguinte: 
 
Eistein representava a revolução ocorrida na física do século vinte e que culminou num 
universo em que a realidade é a teoria, onde espaço e tempo não existem salvo em relação ao 
observador, onde todas as representações da natureza são de ordem matemática, onde há um 
limite fundamental do conhecimento físico na forma do meio pelo qual o percebemos. A idéia 
da curvatura do espaço, um espaço que não pode ser experimentado diretamente por nossos 
sentidos, e talvez o exemplo mais óbvio em que o universo deixa de ser percebido e passa a ser 
mais claramente um ato mental. O universo não é. Ele apenas está. 
 
Gertrude Stein escreveu em The First Reader que Johnny media Jimmy e que Jimmy 
media Johnny até esses personagens perderem o sentido e restar apenas o ato de medir. Ela foi a 
primeira escritora a integrar em sua obra a idéia de um universo indeterminado e descontínuo. 
As palavras não representavam nem personagens nem ação: elas não constituíam "imitações 
fosse de sons, cores ou emoções". A linguagem era uma re-criação intelectual. Por meio de 
uma ênfase em recursos estilísticos como o da repetição, ela usava a linguagem para negar 
preocupações com o significado ou com a representação. Como ela mesma ressaltou: "queria 
escrever como se todo instante de escrita fosse completo em si mesmo, como se o fato de 
escrever algo fosse continuamente se tornando verdadeiro e completando-se a si mesmo, não 
como se estivesse conduzindo a alguma coisa". Uma rosa é uma rosa. E um universo é um 
universo. 
 
Ludwig Wittgenstein escreveu: "Uma representação nos aprisionava. E não podíamos 
escapar dela, pois estava em nossa linguagem, e a linguagem parecia repeti-la para nos 
inexoravelmente". O universo de Wittgenstein encontra-se nos limites da linguagem: "Os 
limites da minha linguagem são os limites do meu mundo". Num universo limitado pela 
linguagem, existe a tensão criada pelo fato segundo o qual "aquilo que se exprime na 
linguagem nos não podemos exprimir por meio da linguagem". Ao alcançar esse limite do 
significado, Wittgenstein observou que "sobre o que não se pode falar, deve-se calar". Ele 
acreditava numa entidade filosófica que "não era o ser humano, nem o corpo humano ou a 
alma humana, de que trata a psicologia, mas sim o sujeito metafísico, os confins do mundo - 
não parte dele". Na concepção filosófica de Wittgenstein, "o fato místico não está no modo 
como as coisas são no mundo, mas em que haja mundo". 
 
As teorias cibernéticas de Norbert Wiener ampliaram nossa compreensão dos sistemas 
auto-organizados, sejam eles máquinas, idéias, sistemas ecológicos ou relações humanas. O 
universo de Wiener interatua infinitamente consigo mesmo. Se a física newtoniana nos 
ensinava que o importante eram as partes, Wiener demonstrou a importância dos padrões que 
articulam as partes. Ele assentou as bases para o advento da revolução da inteligência artificial.Como resultado disso, estamos prestes a criar a primeira extensão de nós próprios, mais ou 
menos como o dr. Frankenstein, de Mary Shelley, constroe a sua. Num contexto mais amplo, 
as teorias científicas sempre foram uma espécie de monstros de Frankenstein, montados a 
partir de qualquer coisa que os cientistas possam estar pensando na ocasião. Os cientistas 
constroem teorias baseados em outras teorias, algumas delas erradas, e geralmente com 
conceitos tão abstratos que nem fazem idéia do que estão criando. Repito, o homem cria 
instrumentos e depois se molda à imagem dos instrumentos que criou. 
 
Após minha palestra, pedi a vários participantes que se dirigissem ao quadro-negro 
situado atrás da tribuna e escrevessem um resumo, numa só frase, de sua perspectiva da 
realidade. Enquanto cada um deles assim fazia, eu o seguia, com o apagador a poucos 
centímetros de sua mão, eliminando as palavras à medida que iam sendo escritas. 
 
Minha palestra e a demonstração de que "tudo começa e termina com palavras" 
tiveram uma conseqüência inesperada. Muitos dos presentes à conferência, apesar de serem 
escritores e pensadores, fascinantes, não tinham representação literária. Como eu vivia em 
Nova York e desenvolvera algum contacto e influência com editores nova-iorquinos, fui mais 
uma vez encurralado, agora por Lilly e Gregory Bateson, e literalmente "escalado" para me 
tornar agente literário deles. Dada minha convicção de que as palavras constituem a única 
realidade, a melhor coisa a fazer seria passar a vendê-las. Assim, como resultado de minha 
palestra em Big Sur naquela noite, não só me tornei inesperadamente agente literário como 
comecei a lançar as bases deste livro. 
 
Uma década depois, dirijo uma agenda literária especializada em representar 
pensadores sérios e em ajudá-los a traduzir suas idéias em livros. Entre nossos clientes ha 
dezenas de cientistas dos mais notáveis em todo o mundo. Algumas das pessoas de cujo 
trabalho trato aqui são minhas clientes. A maioria não é. 
 
Neste livro apresento um relato e uma avaliação do estado das hipóteses e avanços 
científicos mais recentes e importantes. A seleção é idiossincrática. Em vez de procurar ser 
exaustivo, selecionei os desenvolvimentos e as idéias que pessoalmente me interessam mais e 
que, a meu ver, mais se prestam a servir de objeto a imaginação humana. Também incluí uma 
seção de idéias altamente heterodoxas e não comprovadas cientificamente que, apesar de 
marginais, constituem interessantes heresias cientificas. 
 
Embora, no geral, minha tese seja a de que o universo é uma invenção e de que os 
cientistas estão criando, e não descobrindo, o mundo, deixei as teorias científicas aqui 
apresentadas se sustentarem a si mesmas. Apresentamo-las no contexto do que Wallace Stevens 
denominou "o delicado ambiente dos fatos". Como ele escreveu: "O final poema será o poema 
do fato na linguagem do fato. Mas será o poema do fato não realizado [not realized] antes".2
 
No mundo de hoje, os avanços científicos estão se processando a uma velocidade sem 
paralelo em nenhuma outra época da história. A própria natureza da mudança tem evoluído tão 
depressa que chega a ser uma característica do século vinte a incerteza com que todos vivemos. 
Esta é a razão por que acredito que as idéias e as informações incluídas neste livro são essenciais 
a quem esteja interessado em conhecer quem somos e para onde vamos. Se ainda subsiste 
alguma dúvida quanto a ser pura invenção nossa a atual compreensão do universo, tal dúvida 
e debelada pelo ritmo com que as metáforas da ciência continuam a mudar. Pois assim como os 
modelos newtonianos do corpo estão ficando obsoletos e os modelos cibernéticos, baseados 
em dados de computador, estão em ascensão, descobrir-se-á neste livro que o universo e todas 
as coisas que nele conhecemos estão se alterando e transformando radicalmente uma vez mais. 
Este livro trata da reinvenção do universo e, nas palavras de Rimbaud, ele "fixa vertigens". 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Parte 1 
O Universo Cosmológico 
 
Cada época inventou seu próprio universo. O astrônomo grego Eudoxo acreditava 
que o firmamento se compusesse de 27 esferas invisíveis, com a Terra ao centro. Copérnico 
destruiu as esferas e pôs a Terra na órbita do Sol. Newton definiu as leis que governam o 
movimento dos planetas pelo espaço, e com sua teoria da relatividade Eistein tornou a 
transformar o universo. Em vez de o espaço "não ser nada", um palco vazio em que a Terra 
se move livremente, Einstein revelou que o espaço é "alguma coisa", que é recurvo e 
também tem seu papel no drama da física. 
 
O próprio Einstein reconhecia que todas essas representações do universo são 
"fictícias", livres invenções da mente humana. Como ele mesmo disse: "O caráter fictício 
dos princípios é perfeitamente evidenciado pelo fato de ser possível apresentar duas bases 
essencialmente diferentes, cada uma das quais atingindo em suas conseqüências um alto 
grau de concordância com a experiência". Por exemplo, a concepção newtoniana de que os 
planetas se movem em torno do Sol em órbitas claramente elípticas é comprovada com 
precisão por meios experimentais, da mesma forma que o é a teoria da relatividade, apesar 
de ambas se basearem em compreensões geométricas do espaço completamente diferentes. 
 
Einstein acreditava que o fato de se poder adaptar a observação e a experiência uma 
variedade de diferentes representações do universo tem suas desvantagens, pois pode 
impedir que os que crêem nisso alcancem compreensões ulteriores e mais profundas. Aliás, 
ele achava ter sido o extraordinário sucesso das teorias de Newton o que impediu que os 
séculos XVIII e XIX descobrissem a teoria da relatividade. 
 
No entanto, Einstein também reconhecia que a ciência não poderia progredir sem a livre 
invenção. Como ele mesmo disse: "Nós agora sabemos que a ciência não pode se desenvolver só 
a partir do empirismo, que nas construções da ciência precisamos utilizar a invenção livre, que só 
a posteriori pode ser confrontada com a experiência quanto a sua utilidade. Esse fato pode ter 
escapado as gerações anteriores, para as quais a criação teórica parecia nascer indutivamente do 
empirismo sem a influência criativa de uma livre construção de conceitos".2 Por isso, 
Einstein concluiu que, quanto mais uma cultura reconhece que sua representação do universo é 
fruto da invenção, tanto mais avançada é sua ciência. 
 
Nesta seção, vamos explorar o estado atual do universo como invenção em sua escala 
cosmológica máxima. Como veremos, o processo de livre invenção em ciência tem rastreado a 
origem do universo até um grau inusitado. Propôs a existência de objetos interestelares e de 
fenômenos mais exóticos e estranhos do que quaisquer outros já imaginados, tendo examinado 
alguns dos problemas cosmológicos mais profundos de todos os tempos: Qual a idade do 
universo? Qual o seu tamanho? Ele teve começo e terá fim? 
 
Jonh Brochman 
Retirado do livro Einstain, Gertrude Stein, Wittgenstein e Frankenstein: Reinventando o 
Universo. 
	Parte 1 
	O Universo Cosmológico 
	Jonh Brochman

Continue navegando