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1 INTRODUÇÃO Os objetivos principais deste capítulo são: Apresentar diferentes significados da palavra administração. Esclarecer o papel e a importância da administração para todos os tipos de organizações sociais. Esclarecer as diferenças entre a teoria e a prática da administração. Sintetizar os principais eventos e idéias da história da administração. A palavra administração é usada tão freqüentemente no dia-a-dia que parece não haver dúvidas com relação a seu significado. O mesmo acontece com palavras como administrador, gerente, eficiência e eficácia, que têm papel importante dentro do campo da administração, e muitas outras. 1 ADMINISTRAÇÃO: CONCEITO E IMPORTÂNCIA Para entender o que significa a administração, é preciso ir além da interpretação da palavra. É preciso também compreender o papel que a administração desempenha para as organizações e para a sociedade. 1.1 DEFINIÇÃO DO CONCEITO Objetivos, decisões e recursos são as palavras-chaves na definição do conceito de administração. Administração é o processo de tomar e colocar em prática decisões sobre objetivos e utilização de recursos (Figura 1.1). Para esclarecer e ampliar a definição: 2 1.1.1 PROCESSO Figura 1.1 Administração como processo de tomar deci- sões sobre obje- tivos e recursos*. A administração é processo ou atividade dinâmica, que consiste em tomar deci- sões sobre objetivos e recursos. O processo de administrar (ou processo administrati- vo) é inerente a qualquer situação em que haja pessoas utilizando recursos para atin- gir algum tipo de objetivo. A finalidade última do processo de administrar é garantir a realização de objetivos por meio da aplicação de recursos. Para melhor aproveitar o estudo da administração, você precisa pensar em situações práticas em que haja pes- soas utilizando recursos para produzir bens e serviços. Pense em organizações próxi- mas, como padarias, supermercados, a prefeitura de sua cidade, e outras, com as quais você tem contato direto. Pense também em organizações distantes, mas que têm influência sobre sua vida: a rede de televisão a cujos programas você assiste, as em- presas que fabricam os produtos que você usa (como roupas e automóveis) e as com- panhias fornecedoras de serviços, como telefone, água e esgoto, e energia elétrica. Pense na organização em que você trabalha. Pense em si próprio e em sua família como administradores de recursos e tomadores de decisões. Todas essas organizações representam o cenário da ação administrativa. De fato, a principal razão para o estudo da administração é a existência de organizações. Nos capítulos à frente, este tema será retomado. 1.1.2 DECISÕES Tomar decisões significa fazer escolhas. O processo administrativo abrange qua- tro tipos principais de decisões, também chamadas processos ou funções. A Figura 1.2 resume os quatro processos e descreve as decisões de cada um. 3 Figura 1.2 Principais deci- sões do processo administrativo. 1.1.3 RECURSOS Os recursos que as organizações utilizam classificam-se em seis tipos principais: instalações, espaço, tempo, dinheiro, informações e pessoas. As organizações são sis- temas de recursos empregados na realização de objetivos, como mostra a Figura 1.3. Figura 1.3 A organização como sistema de recursos que realiza diversos tipos de objeti- vos. 4 1.1.4 OBJETIVOS Os objetivos são os resultados esperados, ou fins que as organizações ou sistemas procuram atingir, por meio do emprego dos recursos. Os objetivos organizam-se em uma cadeia de meios e fins. Produtos e serviços são objetivos imediatos, que possibilitam a realização de outros objetivos, como o atendimento dos interesses dos acionistas, a satisfação dos clientes e a contribuição para a comunidade. Um sistema ou organização que consegue realizar seus objetivos é eficaz. Entre duas organizações, ou entre dois momentos da mesma organização, é mais eficiente aquela que realiza o mesmo objetivo com menor quantidade de recursos. Eficácia é a capacidade de realizar objetivos. Eficiência é a capacidade de utilizar produtivamente os recursos. 1.1.5 PESSOAS As pessoas estão no centro do processo administrativo. Elas tomam decisões, compartilham o processo decisório com outras pessoas ou são afetadas pelas decisões que outras tomam. Como indivíduos ou membros de organizações, as pessoas são os principais agentes do processo administrativo. 1.1.6 ADMINISTRADORES Os administradores, ou gerentes, são as pessoas que tomam decisões de administração. Podem ser indivíduos (como um presidente de empresa) ou grupos (como a assembléia de acionistas que nomeia esse mesmo presidente). Todas as pessoas que administram sistemas de recursos e objetivos são administradores (ou gerentes). Você é administrador de seus objetivos pessoais, de seu próprio tempo e de outros recursos pessoais. Algumas pessoas administram o trabalho de outras pessoas, porque ocupam posições de chefia. IMPORTÂNCIA SOCIAL DA ADMINISTRAÇÃO A administração é o processo que procura assegurar a eficácia e eficiência das organizações. A administração, como assinalou Fayol, é importante em qualquer escala de utilização de recursos para realizar objetivos - individual, familiar, grupai, organizacional ou social. A Figura 1.4 ilustra essas definições, bem como a relação entre o aumento da quantidade de recursos e a complexidade do processo administrativo. 5 Figura 1.4 A complexidade do processo ad- ministrativo au- menta deforma diretamente pro- porcional ao vo- lume e interde- pendência de re- cursos. Embora o processo administrativo seja importante em qualquer contexto de utilização de recursos, a razão principal para estudá-lo é seu impacto sobre o desempenho das organizações. As organizações assumiram importância sem precedentes na sociedade e na vida das pessoas. Há poucos aspectos da vida contemporânea que não sejam influenciados por alguma espécie de organização. A sociedade moderna é uma sociedade organizacional, em contraste com as sociedades comunitárias do passado, como indica a Figura 1.5. O principal motivo para a existência das organizações é o fato de que certos objetivos só podem ser alcançados por meio da ação coordenada de grupos de pessoas.1 Na socieda- de organizacional, muitos produtos e serviços essenciais para a simples sobrevivência somente se tornam disponíveis quando há organizações empenhadas em realizá-los. A qualidade de vida depende delas em grande parte: serviços de saúde, fornecimento de energia, segurança pública, controle de poluição - tudo depende de^alguma empresa ou organização pública. 1 GIBSON, James L., IVANCEVICH, John M., DONNELLY JR., James H. Organizations. Dallas : Business Publications, 1976. p. 4-5. 6 Figura 1.5 Você está cerca- do, Caraíba... de todos os tipos de organizações. 1.3 IMPACTO DA QUALIDADE DA ADMINISTRAÇÃO Devido a sua importância para a realização de objetivos sociais, as organizações afetam a qualidade de vida tanto positiva quanto negativamente. É dramático o im- pacto do mau funcionamento de uma organização, especialmente de grande porte, sobre a sociedade. Pense nos seguintes casos: • Numa cidade inundada pelas chuvas, e lembre-se da Prefeitura. No baixo nível do ensino, na necessidade de pagar planos de saúde ou pensão, ou nas filas nos hospitais públicos, e lembre-se de que o governo não trabalha como deveria. • Tomara que você não tenha vivido os 21 anos de ditadura, época em que os militares, que vivem falando em disciplina e hierarquia, destituíram um Pre- sidente da República legitimamente eleitoe depois resolveram transformar o Brasil num imenso quartel. Invasões de escolas e sindicatos, censura de todos os tipos de pensamento discordante, proibição de funcionamento de centros acadêmicos, prisões arbitrárias, justiça de exceção, entre outras coisas, algu- mas bem piores. Era perigoso ser estudante ou professor naquele tempo. Muitos problemas que você enfrenta têm sua origem na inexistência ou ineficiên- cia de algum tipo de organização. Organizações bem administradas são importantes por causa do impacto sobre a qualidade de vida da sociedade. Administradores com- petentes, portanto, são recursos sociais importantes.2 A predominância das organiza- 2 Op. cit. 7 ções e sua importância para a sociedade moderna, bem como a necessidade de admi- nistradores competentes, justificam e fundamentam o desenvolvimento e o estudo da Teoria Geral da Administração. 2 TEORIA ADMINISTRATIVA Essencialmente, uma teoria é uma representação abstrata do que se percebe como realidade. A teoria é um conjunto de afirmações ou regras feitas para enquadrar alguma parte do mundo real.3 Segundo F. von Hayek, sem teoria, os fatos são silenciosos. A Teoria Geral da Administração é o corpo de conhecimentos a respeito das orga- nizações e do processo de administrá-las. É formada por princípios, proposições e técnicas em permanente elaboração. Não há na teoria da administração fórmulas ou receitas definitivas, como acontece com outras disciplinas. Teoria, em administração, significa um conjunto de conhecimentos organizados, produzidos pela experiência prática das organizações. As teorias da administração compreendem dois tipos principais de conhecimentos (ou teorias): descritivos e prescritivos, resumidos na Figura 1.6. Figura 1.6 Dois tipos de co- nhecimentos a respeito da ad- ministração das organizações. 2.1 CONHECIMENTOS DESCRITIVOS Conhecimentos de natureza descritiva são os que se propõem explicar um evento ou fenômeno da realidade. As teorias descritivas da administração compreendem ex- 3 ZIMBARDO, Philip, EBBESEN, Ebbe B. Influencing attitudes and changing behavior. Reading : Addison- Wesley, 1970. p. 64. plicações ou interpretações das organizações e do processo administrativo. Seu objetivo é entender e explicar as organizações e os administradores. Em toda descrição encontra-se a interpretação do autor. Diferentes autores, pro- curando entender o mesmo evento ou processo, interpretam-no de maneiras diversas ou chegam a conclusões divergentes. Muitos dos conhecimentos descritivos, por isso, 8 são proposiçõ es, ou explicaçõ es- tentativas, que os autores apresenta m para leitores e estudantes tirarem suas próprias conclusões. Como os autores divergem na interpreta- rão da realidade, surgem as teorias alternativas e, com elas, a polêmica e as críticas. Há, por exemplo, diversas teorias sobre motivação, liderança, inteligência, personali- dade e estratégia. A polêmica é benéfica porque estimula a dúvida e a curiosidade, motivando a procura de novas explicações. Um dos melhores exemplos de teoria polêmica é a própria definição da adminis- tração como processo de tomar decisões de planejamento, organização, direção e con- trole. Há autores que, divergindo dessa interpretação, propuseram-se a oferecer expli- cações alternativas. A busca por essas explicações alternativas foi extremamente posi- tiva, por revelar aspectos da administração que teriam sido ignorados sem a polêmica. 2.2 CONHECIMENTOS PRESCRITIVOS Há teorias que propõem recomendações, soluções para problemas ou decisões que devem ser tomadas em certas situações: são as teorias prescritivas, que compreen- dem duas grandes categorias: doutrinas (princípios ou preceitos) e técnicas. 2.2.1 DOUTRINAS As doutrinas ou princípios (ou, ainda, preceitos) recomendam como agir e con- têm valores implícitos ou explícitos. Os valores definem o que é importante e em que a atenção deve estar concentrada. A doutrina procura orientar os julgamentos e deci- sões dos administradores a respeito dos inúmeros aspectos de seu trabalho.4 Por exem- plo: o movimento da administração científica tinha uma doutrina ou princípio da eficiência dos recursos. O movimento da qualidade tem uma doutrina ou princípio da satisfação do cliente. A escola do pensamento estratégico tem uma doutrina de eficá- cia da organização. 2.2.2 TÉCNICAS As técnicas são soluções para problemas específicos. Por exemplo: o problema de estudar a eficiência de um processo pode ser resolvido com as técnicas do estudo de tempos e movimentos. As técnicas, em geral, agregam-se em métodos. Ao estudar e praticar administração, é de extrema importância distinguir as téc- nicas dos princípios. Os princípios, que são mais importantes, têm utilidade genérica. 4 Doutrinas são também chamadas filosofias de administração. 9 Eles explicam por que e como as técnicas, em geral transitórias, devem ser aplicadas. Essa distinção é uma das idéias mais importantes de Frederick Taylor, o criador da administração científica. 3 FORMAÇÃO DO CONHECIMENTO ADMINISTRATIVO Os conhecimentos administrativos são produzidos pela observação da experiên- cia prática das organizações e de seus administradores. Há duas fontes principais desses conhecimentos: a própria experiência prática e os métodos científicos. O co- nhecimento sempre volta para o mundo que o produziu, num processo de constante elaboração, como procura mostrar a Figura 1.7. Figura 1.7 Processo defor- mação e disse- minação das teo- rias da adminis- tração. 10 EXPERIÊNCIA PRÁTICA Desde que existem as organizações, os administradores vêm criando um acervo de conhecimentos que aumentam e se refinam, de geração a geração. O administrador atual dispõe de considerável acervo teórico, que faz parte da cultura coletiva e é pro- duto da transmissão de conhecimentos empíricos desde que as primeiras organizações humanas foram criadas. Esse acervo de conhecimentos práticos resulta também de um processo de seleção natural. Os princípios e as técnicas que se revelam mais úteis são preferidos àqueles cuja aplicação produz resultados duvidosos. A experiência prática continua sendo importante fonte de conhecimentos sobre como administrar. Muitas contribuições teóricas continuam a ser feitas por praticantes da administração, que refletem e registram sua própria experiência. E o caso de Henri Fayol, Chester Barnard, Akio Morita, Lee Iacocca, Taiichi Ohno, Ricardo Semler, Andrew Grove e outros executivos que escreveram suas memórias administrativas. Também pertencem a essas contribuições as biografias de líderes de todos os tipos de organiza- ções. MÉTODOS CIENTÍFICOS V O segundo vetor do moderno conhecimento administrativo é a aplicação da ciên- cia à observação das organizações e dos administradores. A produção de conhecimen- tos administrativos por meio da aplicação de métodos científicos (processos sistemáti- cos de aquisição e tratamento de informações) é semelhante a outras formas de pes- quisa, que se dedicam ao estudo de outros fenômenos, como a observação do universo ou da vida no mar. A metodologia é essencialmente a mesma. O que muda é apenas o objeto de estudo. Há cinco métodos mais comuns usados na pesquisa de administra- ção, que serão descritos a seguir: experimento, levantamento simples, levantamento correlacionai, método do caso e incidente crítico. 3.2.1 EXPERIMENTO O experimento é o método científico por excelência, e consiste, em linhas gerais, em medir as conseqüências de uma alteração produzida em uma situação. Por exem- plo: . - O que acontecerá com a produtividade se for aplicado o método X de traba- lho? Para obter respostasa essa pergunta, é preciso: • Medir a produtividade atual de um grupo de pessoas, chamado grupo experi- mental. • Introduzir o método X. • Medir novamente a produtividade. 11 Para saber se qualquer alteração observada na produtividade é conseqüência do novo método de trabalho, os pesquisadores usam um grupo de controle, que é subme- tido à medição de produtividade, mas não à alteração dos métodos de trabalho. Se ocorrer modificação na produtividade dos dois grupos, não se pode atribuí-la à altera- ção dos métodos, mas a algum outro fator que é preciso identificar. O experimento mais famoso da história da administração é o de Hawthorne, que você irá estudar no Capítulo 6. Nesse experimento, os pesquisadores tentaram descobrir se alterações na iluminação produziriam alterações no desempenho humano. O esquema geral de um experimento encontra-se na Figura 1.8. Figura 1.8 Desenho de um experimento. 3.2.2 LEVANTAMENTO SIMPLES O levantamento simples é feito usando-se questionários, entrevistas, observação direta e outras técnicas semelhantes de obtenção de informações. Seu objetivo é sim- plesmente identificar as características de algum fenômeno administrativo, entender algo que esteja ocorrendo num grupo de organizações, ou analisar a freqüência com que determinada técnica ou princípio está disseminada. O levantamento simples estu- da um aspecto singular, chamado variável de observação. O levantamento simples é feito apoiado em uma pergunta básica, também cha- mada pergunta-chave ou questão de pesquisa. Por exemplo: Quais as estruturas organizacionais mais freqüentes em empresas de enge- nharia? Quais são as atribuições mais comuns dos gerentes de recursos humanos? Com que freqüência os grupos autogeridos são empregados pelas empresas de um ramo de negócios? Quais os critérios utilizados pelas empresas para promover a participação nos lucros e resultados? 12 3.2.3 LEVANTAMENTO CORRELACIONAI, Os levantamentos correlacionais procuram identificar relações de causa e efeito entre determinados processos ou variáveis. Por exemplo: entre a produtividade da equipe de trabalho e o estilo de chefia de seu gerente; entre a satisfação dos emprega- dos e os métodos de trabalho que a organização utiliza. O levantamento correlacionai procura identificar o efeito ou impacto de um tipo de variáveis (variáveis independen- tes ou causas) sobre outro tipo de variáveis (variáveis dependentes ou efeitos). A finalidade é verificar se há alguma relação do tipo "se x, então y" (Figura 1.9). ' Os mesmos princípios do levantamento simples aplicam-se aqui. A diferença fun- damental está no fato de que o levantamento correlacionai usa pelo menos duas clas- ses de variáveis (ou questões) que são contrastadas entre si. A pergunta básica do levantamento correlacionai, como nos exemplos a seguir, deixa evidente a tentativa de associação entre duas questões: • De que modo o estilo de liderança do chefe (efeito) é influenciado por seu treinamento (causa)? • Quando o chefe aceita sugestões (causa), qual o efeito sobre a satisfação expe- rimentada por seus funcionários (efeito)? Um exemplo da informação obtida por essa segunda pergunta básica (após sua transformação em questões de um formulário) está na Figura 1.10. Figura 1.9 Exemplo de es- tudo de correla- ção. 13 Figura 1.10 Informações produzidas por um estudo cor- relacionai. 3.2.4 MÉTODO DO CASO O ponto central do método é o relato ou narrativa de uma situação real. A situação deve conter informações que permitam ao leitor ou aluno desenvolver habilidades de análise ou resolução de problemas, a serem aplicadas em situações semelhantes. Um caso tem três objetivos específicos principais: I - Apresentar uma situação em que uma decisão já foi tomada e deve ser analisada pelos estudantes. O estudante deve colocar-se na posição de analista crítico, para julgar o acerto da decisão e, eventualmente, propor alternativas. II Apresentar uma situação em que há um problema, exigindo decisão ou solução. O estudante deve colocar-se na posição de tomador de decisões, que procura resolver o problema. III - Apresentar uma situação em que não há problema, apenas uma descrição de fatos que podem, eventualmente, evoluir e apresentar ameaças ou oportunidades. O estudante deve colocar-se na posição de especialista em planejamento, que faz projeções para estudar o futuro. Certos casos podem ter mais de um objetivo e diferentes situações dentro de uma mesma narrativa, com objetivos distintos. 14 3.2.5 INCIDENTE CRÍTICO A técnica do incidente crítico é uma variante do método do caso. Um incidente é uma situação muito rápida, um instantâneo que exemplifica muitas situações seme- lhantes, e que se usa para deduzir princípios gerais. O incidente crítico pode referir-se a um fato ou evento, ou a uma pessoa, cuja conduta é objeto de estudo. A técnica do incidente crítico foi desenvolvida durante a Segunda Guerra Mundial, com a finalida-' de de ajudar a selecionar pessoas com as capacidades necessárias para trabalhar como pilotos e artilheiros de aviões. Posteriormente, a técnica do incidente crítico foi esten- dida à seleção e ao treinamento de pessoas em todos os tipos de profissões. 4 OBJETIVOS E CAMPO DE APLICAÇÃO A Teoria Geral da Administração abrange os conhecimentos descritivos ou prescritivos que se relacionam com as organizações, os administradores e o processo administrativo. Seu objetivo final é a preparação de administradores para todos os tipos de organizações. Derivados desse objetivo final, os grandes objetivos específicos da Teoria Geral da Administração são os seguintes: a. Entender e explicar as organizações. b. Entender e explicar o papel da administração e dos administradores nas or ganizações. c. Identificar e propor diretrizes e técnicas para administrar as organizações. A Teoria Geral da Administração abrange grande variedade de assuntos específi- cos. Esses assuntos específicos correspondem a teorias específicas ou campos do co- nhecimento com vida própria (por exemplo, teoria das organizações, teoria da deci- são, liderança, papel gerencial, administração estratégica, estrutura organizacional), de tal maneira que a teoria geral da administração é um sistema que abrange diversas teorias distintas e interdependentes. Os conhecimentos que compõem a Teoria Geral da Administração agrupam-se em três categorias principais: enfoques, modelos e escolas (Figura 1.11). As fronteiras entre essas três categorias não são rígidas, de forma que há muita sobreposição entre elas. 15 Figura 1.11 Três maneiras de estudar administração. 4.1 ENFOQUE Enfoque é um aspecto particular das organizações ou do processo administrati- vo, que é selecionado para estudo e produção de conhecimentos. Alguns autores pre- ferem usar a palavra abordagem para a mesma idéia. Enfoque também é palavra que indica preferência por aquele aspecto ou, ainda, uma perspectiva ou maneira particular de observar e analisar as organizações, os administradores e o processo adminis- trativo. Por exemplo: • O enfoque sistêmico interpreta as organizações como conjuntos complexos de partes interdependentes. • O enfoque humanístico, social ou comportamental interpreta as organiza- ções predominantemente como sistemas sociais, feitos de pessoas e senti- mentos. 4.2 ESCOLA Escola é uma linha de pensamento ou conjunto de autores que usaram o mesmo enfoque, escolheram o mesmo aspecto específico para analisar, ou adotaram o mesmo raciocínio. Escola é palavra que também pode indicar autores com diversos enfoques, que nunca se encontraramou viveram em épocas e locais diferentes, mas que compar- tilham um interesse ou ponto de vista, ou que é possível associar em função de algum critério. Dependendo da perspectiva, enfoque é o mesmo que escola. Por exemplo: A escola das relações humanas congrega autores e adeptos do enfoque humanístico. O movimento da administração científica pode ser associado a uma escola, a 16 escola da eficiên cia e da racionalização do trabalho. O enfoque da qualidade focaliza a satisfação do cliente, enquanto a escola da qualidade compreende todos os autores associados a esse enfoque. 4.3 MODELO Modelo é um conceito com dois significados: modelo de gestão e modelo de organização. 4.3.1 MODELO DE GESTÃO (OU DE ADMINISTRAÇÃO) É um conjunto de doutrinas e técnicas do processo administrativo. Muitas vezes, o modelo está associado a uma base cultural. Embora não sejam sinônimos, método e modelo são palavras usadas de modo intercambiável. Estilo é palavra que tem o mes- mo sentido. Por exemplo: • O modelo japonês de administração tem ingredientes culturais nacionais e, ao mesmo tempo, forte influência da escola da administração científica. • O modelo (ou estilo) democrático de liderança está associado simultanea- mente à satisfação e produtividade do grupo. 4.3.2 MODELO DE ORGANIZAÇÃO Modelo de organização é um conjunto de características que definem organiza- ções e a forma como são administradas. O modelo de organização é o produto da utilização de determinadas doutrinas e técnicas. Por exemplo: • O modelo burocrático (ou mecanicista) de organização enfatiza a regula- mentação e a padronização de procedimentos. • As empresas que adotam o modelo japonês de administração procuram al- cançar o modelo da organização enxuta. 5 PRINCIPAIS ENFOQUES Os principais enfoques, escolas e modelos de administração, e os respectivos aspec- tos enfatizados, que este livro examina, estão resumidos na Figura 1.12. Serão anali- sados sucintamente a seguir, com a indicação dos capítulos em que são estudados. 17 Figura 1.12 Principais enfoques da administração. I - Escola clássica da administração Compreende as contribuições de Frederick Taylor (Capítulo 3), Henri Fayol (Ca- pítulo 4) e Max Weber (Capítulo 5). II - Enfoque técnico Corresponde à visão mecanicista das organizações. Além dos integrantes da es- cola clássica, Henry Ford (Capítulo 3) e os fundadores da escola da qualidade (Capítu- lo 6) adotaram uma perspectiva essencialmente técnica. Uma parte importante do modelo japonês (Capítulo 7) baseia-se nesses antecedentes. III- Enfoque comportamental Compreende todos os autores que adotam uma perspectiva orientada para o en- tendimento das pessoas e o manejo dos fatores humanos. Toda a segunda parte do livro, compreendendo os Capítulos de 8 a 11, é dedicada a esse assunto. IV- Enfoque sistêmico O enfoque sistêmico corresponde ao pensamento orientado para a visão de con- junto (Capítulo 12). Neste livro, a administração estratégica (Capítulo 13) e o estudo da ética (Capítulo 14) são considerados dentro desse enfoque. 18 Além desses enfoques principais, o livro inclui dois temas sob a classificação de novos paradigmas: administração participativa (Capítulo 15) e tendências (Capítulo 16). 6 QUAL IDÉIA É MELHOR? Qual é o melhor modelo, enfoque ou escola? Escola da eficiência, modelo japo- nês, enfoque humanístico, estilo participativo - qual é melhor? Algumas teorias procuram oferecer soluções universais para todos os problemas ou situações. Segundo Peter Drucker, era essa a proposta dos primeiros autores da administração e dos primeiros grandes empresários da moderna era industrial, pessoas como Henry Ford, Henri Fayol, Frederick Taylor e Werner von Siemens. Eles definiram técnicas e estruturas que deveriam funcionar em todos os casos.5 Outras teorias oferecem aos administradores a possibilidade de escolher entre modelos de gestão ou estilos, cada um apropriado para uma situação. À medida que a administração amadurece, a pesquisa mostra, repetidamente, que muitas idéias são úteis em determinadas situações, mas não em outras. Algumas teorias servem para determinados gerentes, mas não para outros. Isso fez surgir uma escola de pensamento chamada teoria da situação ou teoria situacional {contingency theory).0 A teoria situacional estabelece que não há maneira de administrar que seja melhor que outra. A solução "melhor" depende do ambiente da organização, de sua tecnologia e de vários outros fatores. Em resumo, • depende da situação. Assim, a teoria da situação procura auxiliar os administradores a decidir qual é a melhor maneira de enfrentar cada situação. Há diversas teorias situacionais na administração. Em outras partes deste livro, serão feitas referências a teorias situacionais específicas, como a teoria da .liderança situacional e o enfoque situacional na escolha da estrutura de organização. 7 ADMINISTRAÇÃO NO PRESENTE No limiar do século XXI, a administração e as organizações estão em uma conjun- tura muito diferente daquela de 100 anos atrás. As principais diferenças entre as duas situações são analisadas a seguir. 5 DRUCKER, Peter. Managemenfs new paradigms. Forbes Global Business & Finance, p. 52-63, 5 Oct. 1998. 6 MASSIE, Joseph L., DOUGLAS, John. Managing: a contemporary introduction. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1992. p. 39-40. Contingency theory, teoria situacional, teoria circunstancial, ou, ainda, teoria contingencial. 19 7.1 ECONOMIA GLOBALIZADA E COMPETITIVIDADE No início do século XX, a palavra-chave era eficiência. No final do século XX, a palavra-chave é competitividade. A eficiência continua sendo uma preocupação domi- nante, como no tempo de Taylor e Ford, mas por razões diferentes. Ainda é preciso fazer mais, com menos recursos. No entanto, o problema das empresas, naquela épo- ca, era atender a um mercado crescente, ávido por produtos como automóveis, telefo- nes e eletricidade, dos quais havia poucos fornecedores. Na passagem para o século XXI, há muitos fornecedores atuando numa economia globalizada. A expansão das empresas multinacionais, a facilidade de transportes e a eliminação de restrições alfandegárias (eliminação de reservas de mercado e da proi- bição de importar certos produtos) e tributárias (diminuição de impostos sobre produ- tos importados) criaram um mercado mundial. Pode-se comprar e vender praticamente qualquer coisa em praticamente qualquer lugar do mundo. Um dos ingredientes da globalização é a formação de blocos econômicos, como Mercado Comum Europeu, Associação Norte-Americana de Livre Comércio (Nafta), Mercosul, Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean). Há organismos inter- nacionais que zelam pela saúde da economia globalizada. Um desses organismos é a Organização Mifndial do Comércio. Outros organismos, como Fundo Monetário Inter- nacional e Banco Mundial, são agentes estimuladores de políticas de abertura dos mercados e outras, como a privatização e a redução do déficit público. Essas políticas forçam os governos a preocupar-se com a eficiência da mesma forma que as empresas privadas. Deu-se a esse conjunto de políticas a designação de Consenso de Washington. Agora, as empresas devem ser capazes de concorrer com outras empresas, de outros países, em seus mercados locais e nos mercados para os quais exportam. De- vem ser competitivas, mais do que apenas eficientes. A eficiência tornou-se um dos ingredientes da competitividade. 7.2 INTERDEPENDÊNCIA Ao mesmo tempo em que incentivou a competitividade entre empresas, a econo- mia globalizada também tornou os países interdependentes, devido ao livre trânsito de capitais. Problemas econômicos de um país com economia frágil deixaram de ser localizados,para provocar um efeito sistêmico que afeta inúmeros outros. Os mesmos organismos internacionais de socorro financeiro passaram a ser criticados por sua incapacidade de resolver esse problema. Na passagem para o século XX, havia quem sugerisse a criação de mecanismos de coordenação internacional para supervisionar o mercado de capitais e administrar a interdependência.7 A sociedade global, por causa da interdependência dos países, criou necessidades sem precedentes de administração internacional. 7 Entrevista de George Soros à Newsweek, fev./1999, p. 13. 20 TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO A tecnologia da informação está presente em todos os processos administrativos e produtivos. Movimentar contas no banco, fazer o planejamento das compras de uma unidade industrial ou controlar a fabricação de peças são tarefas que não precisam mais da intervenção humana direta. A tecnologia da informação facilita a tomada de , decisão e o desempenho de todas as tarefas de comunicação. Os exércitos de contado- res, auxiliares de escritório e operários do passado foram substituídos por computado- res. Algumas funções de controle que os gerentes precisavam realizar pessoalmente também foram absorvidas pelos computadores. Muitas das atividades gerenciais foram alteradas pela tecnologia da informação. DIMINUIÇÃO DE TAMANHO Tecnologia da informação e programas de eficiência tornaram desnecessários muitos tipos de mão-de-obra e alteraram muitas profissões e ramos de negócios. As grandes organizações deixaram de ser grandes empregadoras de mão-de-obra, tanto de trabalhadores especializados quanto de gerentes. Até a década de 80, os livros de administração mostravam organogramas gigantescos, das grandes corporações ame- ricanas, empresas como Boeing, General Motors ou IBM. Esses organogramas, cheios de chefes, diretores, gerentes e seus assessores, eram exibidos como modelos de efici- ência e poder. Tamanho grande era sinônimo de controle, segurança e desempenho. Essas empresas continuam vivas e saudáveis, em muitos casos, mas seus organogramas são completamente diferentes. A partir daquela década, as grandes organizações inicia- ram projetos de downsizing (diminuição do número de níveis hierárquicos). Uma das conseqüências da diminuição de tamanho é a importância crescente dos métodos da administração participativa, porque é preciso que os funcionários operacionais aprendam a ser seus próprios gerentes. VALORIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO EMPREENDEDORA Outra conseqüência da diminuição do tamanho das organizações é o aumento do desemprego (que tem também outras causas). Essa tendência tem forte impacto sobre as expectativas da sociedade, uma vez que o sistema de ensino, especialmente o ensi- no superior, está fortemente orientado para a formação de pessoas para trabalharem nas organizações. A perda das perspectivas de emprego duradouro e de carreira nas grandes organizações, por outro lado, estimulou muitas pessoas a procurar ser seus próprios patrões. Com isso, a administração empreendedora (complementando a tra- dicional administração formadora de empregados) tornou-se uma tendência social importante. 21 DEFESA DO CONSUMIDOR E ÊNFASE NO CLIENTE No início do século XX, o administrador não precisava preocupar-se tanto com o cliente, como seu colega de 100 anos depois. O consumerismo surgiu, nos anos 60, da necessidade de evitar os riscos para a vida, causados por produtos (especialmente o automóvel). Rapidamente, transformou-se em conduta de defesa contra fornecedores de produtos e serviços defeituosos. Essa conduta é amparada pela legislação que há em muitos países para proteger o consumidor, como o Código de Defesa do Consumidor que há no Brasil. Ao contrário do que ocorria no passado, um dos principais condicionantes das decisões a respeito de novos produtos, e de sua propaganda, é essa legislação, que obriga as empresas a pensar primeiro nas conseqüências para o cliente. Outro fator que orienta a atenção das empresas para seus consumidores, enquanto no passado elas podiam preocupar-se mais com produção ou participação no mercado, é a disseminação das doutrinas da qualidade total e satisfação do cliente, que se tornaram palavras obrigatórias no dicionário do administrador do presente. ECOLOGIA E QUALIDADE DE VIDA Na época de Taylor e Ford, os administradores não precisavam preocupar- se com a poluição provocada por suas fábricas nem com o nível de emissão de gases dos veículos que fabricavam. A medida que os problemas provocados pelos danos ao meio ambiente tornaram-se mais graves, afetando a saúde e o bem-estar das pessoas, a sociedade reagiu. Uma conseqüência importante, que marcou os anos 60 do século XX, foi a legislação que limita a liberdade de decisão e ação das empresas. Inúmeras decisões, como localização de empresas, construção, projetos e embalagem de produtos, o administrador moderno deve tomar levando em conta essa legislação. Outras questões que no passado seriam irrelevantes, muitas delas ligadas à administração de recursos humanos, assumiram dimensão considerável para o empregador do presente. Saúde e educação do empregado e de sua família, benefícios, participação nos resultados da empresa, stress do executivo, entre outros, são assuntos que fazem parte da agenda do administrador moderno. Por causa desses e de outros problemas, como o crescimento das cidades, estrangulamento da circulação no trânsito, desemprego e violência, a sociedade humana passa a ter preocupações cuja solução reside nas decisões de natureza administrativa. A administração, por isso, torna-se disciplina social cada vez mais importante.
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