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INT. AO DIREITO 9ª AULA

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AULA 9
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
Direito Positivo e direito natural.	
1.1 Conceito de direito positivo
Gusmão define conceitualmente o direito positivo como o “sistema de normas vigentes, obrigatórias, aplicáveis coercitivamente por órgãos institucionalizados, tendo a forma de lei, de costume ou de tratado”.[2: GUSMÃO, op. cit. p. 54]
Com fincas neste conceito é fácil concluir que o direito positivo é formado por regras impostas ao convívio social pelo poder público organizado (lei), pela sociedade (costume) ou pela convenção internacional (tratado, convenção). Em outras palavras é o “direito vigente, histórico, efetivamente observado, passível de ser imposto coercitivamente, encontrado em leis, códigos, tratados internacionais, costumes, resoluções, regulamentos, decretos, decisões dos tribunais, etc.” O direito positivo também é o que já vigorou no passado e não só o que está em vigor, p. ex. direito romano, Lei das XII tábuas, etc. [3: PINHO, Ruy Rebello; NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Instituições de Direito Público e Privado. 22 ed. São Paulo: Atlas,2000, p. 33.][4: GUSMÃO, op. cit. p. 54.][5: GUSMÃO, op. cit. p. 53.]
O direito positivo, por outro lado, dá certeza ao direito. É aquele direito que ninguém contesta e cuja existência não é, ou se presume não ser, desconhecido de ninguém.
1.2 Características do direito positivo
O direito positivo, seja ele promulgado (legislação) ou declarado (precedente judicial) tem dimensão temporal, isto é, vigência a partir de um determinado momento histórico. Outra característica é a dimensão territorial ou espacial, pois tem eficácia em determinado território onde impera a autoridade que o promulgou ou reconheceu (em algumas situações o direito positivo também tem eficácia extraterritorial). O direito positivo também tem a característica da formalidade pelo fato de ser instituído através de fontes formais (lei, costume, tratado, precedente judicial, etc.). Caracteriza-se, ainda, pelo autocontrole de sua própria criação, modificação e revogação. Finalmente, há de se dizer que o direito positivo se caracteriza também por uma hierarquização de normas. Temos no topo da hierarquia a Constituição, as leis federais, Constituições dos Estados, leis estaduais, leis municipais. As leis superiores são mais gerais, mais ricas em conteúdo e em menor número.[6: GUSMÃO, op. cit. p. 54.]
Acima de todas as normas de direito positivo temos os princípios gerais de direito a quem, cabe o papel de definir rumos no direito positivo. E, como princípio norteador, acima do direito estatal, temos a DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM, estabelecida pela ONU e depois ratificada por todos os países membros.[7: Idem, Ibidem.]
1.3 Conceito de direito natural
O direito natural pode ser conceituado como o direito que sempre existiu a partir do momento em que ser humano surgiu no planeta. O direito natural é aquele direito que ”deve existir independentemente de qualquer regra imposta aos indivíduos pelo constrangimento social organizado”, em outras palavras, o direito natural não depende de lei alguma, ele é espontâneo, razão pela qual é autônomo. O direito positivo, ao contrário, é aquele direito que decorre de um ato de vontade (legislador), sendo por isso heterônomo por ser imposto pelo Estado através de lei, costume ou convenção internacional. O direito natural seria imutável e necessário.[8: GUSMÃO, op. cit. p. 54.]
1.4 Fontes do direito natural
A primeira fonte é a própria natureza que ensina a todos o justo e o necessário. No entender dos jusnaturalistas o direito natural decorre da própria natureza e, principalmente, da natureza do ser humano. Por exemplo, a obrigação da mãe cuidar dos filhos menores ou a tendência dos seres humanos se unirem para se protegerem mutuamente. Assim, os jusnaturalistas, no sentido estrito, atribuem à natureza uma particular força normativa. Para eles natural não é só aquilo que existe, mas também tudo aquilo que deve guiar o nosso comportamento e, por isso, merece ser respeitado por todos.[9: DIMOULIS, Dimitri, op. cit. p. 90.]
Outra fonte do direito natural é a vontade divina. Esta fonte é conhecida como jusnaturalismo teológico. Para este corrente o Ser supremo que criou e ordenou o Universo também cria as regras de comportamento a serem seguidas pelo ser humano. Por ex. na cultura cristã as regras mais conhecidas do direito natural são os Dez Mandamentos. Logo, não matar e não roubar é direito natural porque Deus assim o ordenou.[10: Idem, ibidem]
A terceira fonte do direito natural é criação da Idade Moderna e é chamada de jusracionalismo. Para esta corrente doutrinária os mandamentos do direito natural são provenientes da razão humana, pois é inerente a todo o ser humano pensar e atuar de modo racional. Ora, se o homem é um ser racional pode perfeitamente satisfazer as suas necessidades básicas e se desenvolver para entender o sentido do mundo e seus próprios direitos e deveres. Em outras palavras: “a capacidade de pensar racionalmente é a razão humana. Assim sendo, os homens podem descobrir o que é certo e errado e devem fazer o certo para possibilitar o convívio social civilizado e pacífico...”[11: DIMOULIS, Dimitri, op. cit. p. 91.]
Uma quarta fonte do direito natural seria o denominado jusnaturalismo social . Esta corrente doutrinária de certa forma esvazia o direito natural de seus conteúdos de direito imutável e necessário. De fato, limita-se esta corrente a fazer referências abstratas sobre o “justo” e a necessidade de realizá-lo.
1.5 Relações entre o direito natural e o direito positivo 
Os partidários do direito natural adotam uma visão dualista do direito. Ao lado do direito natural existe o direito positivo, sendo que este direito é criado pela vontade política de um povo ou de seus chefes.
Na maioria das vezes, direito natural e direito positivo estão em lados opostos, isto é, quem cria o direito positivo sempre acrescenta ou retira algo do direito natural, pois os fundamentos dos dois direitos não são exatamente os mesmos. Tal constatação, todavia, não apaga certas épocas em que caminharam juntos, com ocorreu na Revolução Francesa, por exemplo, quando o direito natural inspirou os revolucionários a elaborarem a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” onde esse direito era expressamente mencionado, por ex. nos artigos II e IV.
Essas diferenças entre os dois direitos quando são pequenas não geram problemas, por ex. se determinado prazo de prescrição de um determinado direito é de 4 anos ou de 5 anos, não gera problemas na relação entre direito positivo e natural, pois ambos de complementam. O problema surge quando o direito positivo pretende derrogar normas de direito natural, por ex. proibindo a defesa do acusado.
Quando isso ocorre os jusnaturalistas entendem que o direito que prevalece é o natural, pois só a lei justa deve ser considerada lei. Nesse ponto de vista os jusnaturalistas não adotam apenas uma visão dualista do direito, mas também hierarquizada.
Essa hierarquia aparece com clareza na tragédia “Antígona” que Sófocles apresentou ao público, em Atenas no ano de 441 AC. Nessa peça de teatro Antígona, a figura central da targédia, face à proibição de enterrar o irmão, imposta pelo rei de Tebas, Creonte, preferiu enterrá-lo, seguindo a lei divina, mesmo sabendo que isso acarretaria a sua sentença de morte. Disse ela “não me parece que tuas determinações tivessem força para aos mortais impor até a obrigação de transgredir divinas normas, não escritas, inevitáveis; não é de hoje nem de ontem, é desde os tempos mais remotos que elas vigem.”[12: DEMOULIS, Dimitri, op. cit. p. 92.]
Nesta frase de Antígona encontramos todos os elementos do jusnaturalismo: o dualismo entre o direito positivo e o direito natural; a imutabilidade e necessidade do direito natural desde os tempos mais remotos; e a absoluta prevalência dos seus mandamentos em relação a qualquer norma proveniente do Poder Político.[13: Idem, ibidem]
Essa visão do direito natural é sustentávelnos nossos dias? Certamente não. Realmente, já no século XIX, em decorrência da grande velocidade das mudanças sociais, os juristas deixaram de lado esse ideal de direito imutável e necessário, muito embora ainda adotassem a ideia de que o direito natural poderia fornecer princípios de justiça que deveriam guiar o legislador, era o chamado “jusnaturalismo disfarçado.”[14: DEMOULIS, Dimitri, op. cit. p. 93.]
A verdade é que na modernidade com o surgimento do positivismo e a sua prevalência nas ciências sociais o direito natural passou a estar em posição oposta ao direito positivo. O que restou aos naturalistas foi dizer que o direito natural é a “medida e linha diretriz do direito positivo”. Atualmente encontram-se muito poucos professores de direito natural nas faculdades de direito e as posições de direito natural que aparecem estão ligadas a pontos de vista teológicos, principalmente ligados à Igreja Católica na tradição de Tomás de Aquino.
A verdade é que o direito natural teve grande importância para a Civilização Ocidental. De fato, o direito natural segundo alguns doutrinadores pertence à Moral e sobre esse ponto de vista sempre foi o “ideal jurídico da nossa Civilização”. É do direito natural, por isso, que se destacam dois direitos naturais fundamentais que GUSMÃO entende estarem acima de qualquer legislação são eles: o direito à vida e o direito à liberdade.[15: GUSMÃO, op. cit. p. 55.]
No século XX Gustav Radbruck, jurista alemão, criou uma modalidade de direito natural denominada fórmula de Radbruck que constituiria uma versão fraca do jusnaturalismo. Esta versão de direito natural surgiu em decorrência das atrocidades cometidas pelo regime nazista, contra os judeus e contra outras minorias, sob o manto do direito positivo que assim deixou de atender às exigências da justiça. Por isso, Radbruck estabeleceu a sua doutrina no sentido de que o direito positivo deveria se submeter aos princípios da justiça. Essa visão foi aceita pelos moralistas modernos que admitem a superioridade do “direito justo”, não por reconhecerem a existência de um direito natural, mas porque desejam corrigir o direito estatal com base em imperativos morais.[16: DIMOULIS, Dimitri, op. cit. p. 94.]
2. Críticas ao direito natural.
O direito natural é um direito vago. É verdade que o direito natural estabelece o respeito à liberdade e à vida de todos, que os contratos devem ser cumpridos, que não se devem tratar os iguais de forma desigual, que todos devem ter direito a ampla defesa, mas essas prescrições não resolvem conflitos sociais, pois não fixam os direitos e deveres de cada um e nem fixam sanção para o descumprimento.
É um direito prenhe de subjetivismo. De fato, foram dadas as mais variadas opiniões sobre a origem do direito natural. Lado outro, esse direito permitiu a escravidão, os sanguinários príncipes da Idade Média que se diziam representantes de Deus, a denominação dos colonizadores sobre os colonizados, a submissão da mulher, etc.
É um direito conservador. De fato é um direito caracterizado pela estabilidade, negando o poder transformador dos cidadãos reunidos em sociedade. Não é um direito democrático, mas autoritário a serviço dos poderosos que defendem os seus interesses como consagrados pelo tempo e pela suposta “natureza humana”.[17: Idem, ibidem]
É um direito irrelevante. Este direito só terá importância se for respaldado pelo Poder Político vigente. Isso ocorre se o legislador incorporar ao direito positivo normas que correspondam ao direito natural. Se isso ocorrer essas normas passam a valer porque são vontade do legislador e não porque são justas ou “naturais”.

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