Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DOCÊNCIA EM SAÚDE GENÉTICA E EVOLUÇÃO 1 Copyright © Portal Educação 2013 – Portal Educação Todos os direitos reservados R: Sete de setembro, 1686 – Centro – CEP: 79002-130 Telematrículas e Teleatendimento: 0800 707 4520 Internacional: +55 (67) 3303-4520 atendimento@portaleducacao.com.br – Campo Grande-MS Endereço Internet: http://www.portaleducacao.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - Brasil Triagem Organização LTDA ME Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167 Portal Educação P842g Genética e evolução / Portal Educação. - Campo Grande: Portal Educação, 2013. 164p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-8241-526-9 1. Genética – Evolução. 2. Leis Mendel. 3. Genealogia. I. Portal Educação. II. Título. CDD 576 2 SUMÁRIO 1 LEIS DE MENDEL...................................................................................................................... 5 1.1 Informação genética ................................................................................................................. 5 1.2 Termos da genética .................................................................................................................. 7 2 1ª LEI DE MENDEL ................................................................................................................... 14 2.1 Genes letais ............................................................................................................................. 20 2.2 Herança sem dominância ....................................................................................................... 22 2.3 Genealogia ............................................................................................................................... 23 2.4 Gêmeos .................................................................................................................................... 25 2.4.1 Métodos dos Gêmeos ............................................................................................................. 29 3 2ª LEI DE MENDEL ................................................................................................................... 30 3.1 Linkage ..................................................................................................................................... 31 3.1.1 Mapas genéticos ....................................................................................................................... 33 3.2 Interação gênica ...................................................................................................................... 34 3.2.1 Epistasia .................................................................................................................................... 37 3.2.2 Herança quantitativa .................................................................................................................. 39 4 ALELOS MÚLTIPLOS E BIOTECNOLOGIA ............................................................................ 41 4.1 Sangue ...................................................................................................................................... 41 4.1.1 Sistema ABO e grupos sanguíneos .......................................................................................... 43 4.1.2 Transfusão sanguínea .............................................................................................................. 49 4.1.3 Auto-hemoterapia ...................................................................................................................... 52 4.1.4 Sistema MN .............................................................................................................................. 55 5 FATOR Rh ................................................................................................................................ 57 5.1 Transfusão do fator Rh ........................................................................................................... 60 3 5.1.2 Eritroblastose fetal ..................................................................................................................... 61 5.1.3 Consanguinidade ....................................................................................................................... 63 6 CROMOSSOMOS AUTOSSOMOS X CROMOSSOMOS SEXUAIS ........................................ 66 7 HERANÇA LIGADA AO SEXO ................................................................................................. 69 8 BIOTECNOLOGIA ................................................................................................................... 70 9 CLONAGEM ............................................................................................................................. 79 10 TRANSGÊNICOS ..................................................................................................................... 87 11 DOENÇAS GENÉTICAS ........................................................................................................... 91 11.1 Anomalias genéticas ............................................................................................................... 92 11.1.1 Fenilcetonúria ........................................................................................................................... 92 11.1.2 Albinismo .................................................................................................................................... 4 11.1.3 Fibrose cística ........................................................................................................................... 97 11.1.4 Distrofia Muscular ..................................................................................................................... 100 11.1.5 Hemofilia ................................................................................................................................... 101 11.1.6 Daltonismo ................................................................................................................................ 104 11.1.7 Anemia falciforme ..................................................................................................................... 106 12 ANOMALIAS CROMOSSÔMICAS .......................................................................................... 116 12.1 Síndrome de Down ................................................................................................................. 119 12.2 Síndrome de Klinefelter ......................................................................................................... 123 12.3 Síndrome de Turner ................................................................................................................ 125 12.4 Síndrome de Patau ................................................................................................................. 128 12.5 Síndrome de Edwards ............................................................................................................ 130 13 EVOLUÇÃO ............................................................................................................................. 132 13.1 A origem da espécie humana ............................................................................................... 132 13.2 Linha evolutiva dos primatas ................................................................................................ 134 13.2.1Os primatas atuais .................................................................................................................... 137 4 13.2.2 Evolução das mãos, visão, cérebro e postura .......................................................................... 139 13.2.3 Hominídeos .............................................................................................................................. 143 13.3 Teorias da evolução: Lamarck e Darwin ............................................................................. 146 13.3.1 Lamarck ................................................................................................................................... 146 13.3.2 Darwin ..................................................................................................................................... 148 13.3.3 Neodarwinismo ........................................................................................................................ 154 13.4 Fixismo .................................................................................................................................... 155 13.5 Especiação .............................................................................................................................. 156 13.6 Irradiação adaptativa .............................................................................................................. 157 13.7 Princípio de Hardy-Weinberg ................................................................................................ 159 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 162 5 1 LEIS DE MENDEL Gregor Mendel nasceu na Áustria em 1822 e viveu até 1884. Aos 21 anos de idade entrou para um convento da Ordem de Santo Agostinho, e posteriormente foi enviado para Viena a fim de estudar história natural. Desenvolveu trabalhos geniais e tornou-se um dos maiores cientistas da humanidade (Figura 1). Mendel desenvolveu estudos sobre hibridização, entre 1856 e 1863, usando como objeto de estudo ervilhas da espécie Pisum sativum. O critério de escolha foi encontrar plantas de caracteres distintos que ao cruzarem entre si pudessem gerar híbridos igualmente férteis e capazes de reproduzirem. Figura 1. Foto do geneticista Gregor Mendel considerado um dos maiores cientistas da humanidade, devido sua contribuição de trabalhos desenvolvidos com ervilhas sobre herança genética. 1.1 Informação genética A Genética é o ramo da biologia que estuda as leis da transmissão dos caracteres hereditários nos indivíduos, e as propriedades das partículas que asseguram essa transmissão. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_de_Santo_Agostinho 6 Com os estudos de Mendel a genética tomou um grande impulso, assim Mendel é considerado um dos pais da Genética moderna. Todas as informações genéticas de um indivíduo estão em seus genes e são hereditárias, ou seja, transmitidas dos pais para seus descendentes (filhos), sendo que um gene sempre será transmitido pelo pai e o outro pela mãe. As informações genéticas são únicas, ou seja, não existem duas pessoas que apresentem informações idênticas, com exceção dos gêmeos idênticos (univitelinos) que são considerados clones. Mendel afirmou que os genes não se misturam, e sim permanecem lado a lado após a fecundação, independente de se manifestarem ou não. Esses genes se separam para formar os gametas, indo um gene para cada gameta. Após a fecundação, os gametas se unem e o par de genes é novamente reconstituído (Figura 2). Y X XY Figura 2. Ilustração dos gametas, masculino (Y) e feminino (X) separados, e a união dos gametas após a fecundação formando um embrião, reconstituindo o par de cromossomos XY. 7 1.2 Termos da genética A genética apresenta vários termos próprios, sendo necessário o conhecimento desses termos para um melhor entendimento deste curso. A seguir, serão citados e explicados os termos mais usuais. Cromossomo: O cromossomo constitui-se de uma longa sequência de DNA condensado, associado a proteínas; e contém vários genes. O genoma humano é constituído de 23 pares ou 46 cromossomos. Cromossomos homólogos: São cromossomos advindos dos parentais, ou seja, do pai e da mãe. Cromossomos autossomos: As células humanas contêm 46 cromossomos. Vinte e dois pares (22) pares ou quarenta e quatro (44) desses cromossomos são autossomos, já que são herdados dos dois genitores e contém essencialmente os mesmos genes. Cromossomos sexuais: Os outros dois cromossomos (44 + 2 = 46), ditos sexuais, são o cromossomo X e o cromossomo Y. Todo indivíduo possui dois cromossomos sexuais que são responsáveis pela determinação do sexo. Assim, um indivíduo com cromossomos sexuais XX será mulher e o indivíduo com cromossomos sexuais XY será homem. Genoma: 8 O genoma é o conjunto dos cromossomos de um organismo, sendo seu tamanho variável de espécie para espécie. Gene: O gene é um pedaço da molécula de DNA que contém toda informação genética de um indivíduo, ou seja, toda a informação necessária para produção de uma proteína. Genes letais: Genes letais são àqueles que causam a morte pré ou pós-natal, ou que produzem uma deformidade significante. Alelo: O alelo é cada uma das formas alternativas do mesmo gene, ocupando determinado locus num cromossomo. Como exemplo, é possível citar o gene que determina a cor da flor em várias espécies de plantas. Um único gene controla a cor das pétalas, podendo haver diferentes versões desse mesmo gene, sendo que essas diferentes versões resultam em diferentes cores. Ou seja, o gene que determina a cor das pétalas, pode ter um alelo que determina a cor vermelha e outro alelo que determina a cor branca. Fonte: http:// www.virtual.epm.br http://pt.wikipedia.org/wiki/Flor http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%A9tala 9 Locus: Locus é a posição de um gene ou de um marcador genético em um cromossomo. Fonte: www.virtual.epm.br Genótipo: Genótipo é a constituição gênica dos indivíduos, ou seja, o conjunto dos genes de um indivíduo. Fenótipo: Fenótipo é cada variedade do caráter que pode aparecer no indivíduo, isto é, são as características observáveis visualmente no indivíduo. O fenótipo é o resultado da interação do genótipo com o Meio Ambiente. É possível citar como exemplo características como peso e estatura, que são determinados pelos genes, porém o fenótipo irá depender de fatores externos como a nutrição. Gametas: Gametas são células sexuais dos seres vivos, que se fundem na fecundação formando o ovo ou zigoto, que irá se dividir e formar o embrião. Os gametas serão oriundos dos parentais (pai e mãe). 10 Homozigoto: Homozigoto é o mesmo que puro, considera-se um indivíduo homozigoto para um caráter aquele que apresenta dois genes iguais para a característica, ou seja, uma dose dupla de um mesmo alelo (alelos idênticos presentes em um mesmo locus gênico). A homozigose pode ser dominante (1) quando os genes em dose dupla forem dominantes, e pode ser recessiva (2) quando os genes em dose dupla forem recessivos. (1) (2) Fonte: www.virtual.epm.br Heterozigoto: Heterozigoto é o indivíduo que possui dois alelos diferentes para certo caráter (característica). 11 Fonte: www.virtual.epm.br Dominância: A dominância é expressa em dose simples. Assim, consideramos um gene dominante quando havendo apenas um,(dose simples) se torna capaz de determinar o fenótipo. Ou seja, se consideramos o gene B responsável pela determinação da altura, sempre que ele aparecer, em dose simples (Bb) ou dose dupla (BB), ele irá caracterizar indivíduos altos, portanto, o B é um gene dominante. A ausência desse gene também mostra a ausência da característica, assim, quando o gene dominante não ocorrer à característica não se manifestará. Portanto, os indivíduos serão de pequena estatura (bb) - gene recessivo. Recessividade: A recessividade é expressa sempre em dose dupla. Assim, consideramos um gene recessivo aquele que só expressa um fenótipo quando está em dose dupla, ou seja, repetido (bb). Quando esse gene recessivo está junto com um gene dominante (heterozigose) o mesmo não é expresso, comportando-se como inativo. Híbrido: Híbrido é o produto do cruzamento de dois ou mais genitores distintos geneticamente. 12 Cruzamento: O cruzamento ocorre quando se cruza os genótipos de dois indivíduos (genitores) gerando um terceiro genótipo, o do descendente ou prole (chamado de F1). Cruzamento-teste: Cruzamento entre um genótipo desconhecido e um genótipo recessivo. Consanguinidade: Consanguinidade é o grau de parentesco entre indivíduos de ascendência comum. À medida que expressa o quanto um determinado indivíduo é consanguíneo chama-se grau de consanguinidade. O coeficiente de consanguinidade será maior se houver mais de um ancestral comum na genealogia de um indivíduo. Genealogia: A genealogia é uma ciência que estuda a evolução, história e disseminação das famílias. Ou seja, faz a correlação do parentesco das pessoas. Também é conhecida como a ciência da história da família, pois busca desvendar a origem das pessoas e famílias e suas relações interfamiliares. Haploide: Haploide é uma célula que contém metade do número de cromossomos característicos da espécie. São produzidas a partir da meiose, e tem por finalidade a produção de gametas. A célula haploide é representada por: (n). Diploide: Diploide é uma célula que contém a informação em duplicado, ou seja, para cada característica existem pelo menos dois genes, estando cada um deles localizado num http://pt.wikipedia.org/wiki/Meiose http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A9lula 13 cromossomo homólogo. A célula diploide é representada por: (2n), sendo que (n) é o número de cromossomos. Hereditariedade: Hereditariedade é a transmissão das características genéticas paternas (considera-se o genitor) à prole por meio de genes específicos. A hereditariedade segue as leis mendelianas de transmissão, em homenagem ao seu descobridor, Gregor Mendel. Clones: Clones são indivíduos geneticamente idênticos. Assim, os gêmeos univitelinos são considerados exemplos de clones naturais. http://pt.wikipedia.org/wiki/Cromossomo 14 2 1ª LEI DE MENDEL Mendel obteve sucesso em suas pesquisas sobre a herança genética e sua transmissão, pois considerou uma característica de cada vez, ao contrário de outros cientistas que consideravam todas as características do indivíduo ao mesmo tempo, sem sucesso. O sucesso de Mendel também se deu pelos métodos por ele utilizados como a escolha do material, escolha de características contrastantes e análise estatística dos resultados. Mendel trabalhou com ervilhas, plantas que se reproduzem rapidamente, propiciando a análise de várias gerações num tempo relativamente curto. Mendel tinha controle, experimentos, e certeza de quem eram os parentais (pais) nos cruzamentos realizados, característica essa importante para que suas teorias fossem confiáveis. A flor da ervilha possui suas partes reprodutoras (feminina/gineceu e masculina/androceu) no interior das pétalas fechadas e se reproduz por autopolinização e, portanto, autofecundação. A autopolinização é a transferência dos grãos de pólen da antera de uma flor para o estigma da mesma flor. Dessa forma, Mendel obtinha linhagens puras, isto é, características invariáveis de uma geração para a outra. Mendel realizava a polinização cruzada (transferência dos grãos de pólen da antera de uma flor para o estigma de outra flor da mesma espécie) entre as flores de ervilha. Para cruzar duas plantas, por exemplo, ele retirava os estames de uma delas antes que atingisse a maturidade para evitar a autofecundação. Então, salpicava naquela flor o pólen da outra planta (Figura 2). Assim, Mendel também controlava os descendentes das plantas cruzadas 15 Figura 2. Ilustração da polinização cruzada entre ervilhas realizada por Mendel. No passo 1, os estames da primeira flor (púrpura) são retirados, a seguir (passo 2) o pólen da flor branca é transferido para ao carpelo da flor púrpura. No passo 3, ocorre a maturidade do carpelo polinizado e da vagem. No passo 4, as vagens são plantadas, e por fim (passo 5) obtêm-se apenas flores púrpuras. Fonte: http://www.scb.org.br Para obtenção de sucesso nas suas pesquisas com ervilhas, Mendel escolheu características contrastantes. Essas características não podiam ter caracteres intermediários, ao contrário, deveriam ser características determináveis (do tipo sim ou não). Como exemplo, podemos citar as cores das ervilhas que podiam ser verdes ou amarelas, não havendo cores intermediárias como verde-amareladas ou amarelo-esverdeadas. Outra característica é a forma das sementes, que podiam ser lisas ou rugosas, não havendo um meio-termo. A altura também foi uma característica considerada, já que as plantas eram altas ou baixas, e nunca de estatura média (Figura 3). A análise estatística foi baseada não apenas em resultados qualitativos, mas também em resultados quantitativos. Mendel contava os descendentes obtidos e determinava a proporção em que as características apareciam. A determinação dessas proporções permitiu a criação de um modelo teórico para explicar melhor os resultados obtidos. 16 Figura 3. Ilustração das sete características estudadas por Mendel. As características são forma da semente (lisa ou rugosa), cor da semente (amarela ou verde), forma da vagem (lisa ou ondulada), cor da vagem (verde ou amarela), cor da flor (púrpura ou branca), posição da flor (ao longo dos ramos ou terminal) e altura do pé de ervilha (alta ou baixa). Fonte: www.carampangue.cl/genetica.htm http://www.carampangue.cl/Biocarampangue/Plan-segundo-genetica.htm 17 No início de seus experimentos, Mendel utilizava plantas puras, isto é, aquelas que só haviam se reproduzido por autofecundação, de maneira que durante várias gerações só geraram uma característica contrastante. Por exemplo, plantas puras de sementes amarelas são descendentes de plantas de sementes amarelas que autofecundaram durante várias gerações, gerando apenas plantas com sementes amarelas, e nunca com sementes verdes. O mesmo se aplica para outras características contrastantes como sementes verdes, lisas ou rugosas. Um dos experimentos foi realizado por meio do cruzamento de plantas puras de sementes amarelas (VV) com plantas puras de sementes verdes (vv). Os pais são chamados de geração parental ou P. Os filhos são chamados de primeira geração ou F1. E os ‘netos’ são chamados de segunda geração ou F2. Na primeira geração (F1) foram obtidas apenas plantas de sementes amarelas. Na segunda geração de filhos (F2) foram obtidas plantas de sementes amarelas e de sementes verdes (Figura 4). Figura 4. Ilustração do modelo teórico que explica os resultados obtidos por Mendel. Proporção: 3:1 (três plantas com sementes amarelas e uma planta com semente verde). Com esse experimento, Mendel constatou que o não aparecimento da cor verde nos primeiros descendentes (F1) tornava essa característica recessiva, enquanto a cor amarela era dominante. Comoa cor verde foi manifestada entre as sementes na segunda geração (F2), 18 conclui-se que essa característica sempre existiu, inclusive na geração F1, porém por ser recessiva não foi manifestada. Quando o gene é recessivo ele só será manifestado quando acompanhado pelo mesmo gene recessivo. Assim, a cor verde (v) da semente só irá se manifestar quando aparecer em duplicidade (vv). Quando o alelo (v) aparecer acompanhado de outro alelo como o que determina a cor amarela (V), a semente será amarela. O caráter dominante se manifesta em dose simples. Dessa maneira, os genótipos (Vv) e (VV) geram sementes amarelas. A partir desse experimento, Mendel chegou à conclusão que uma determinada característica é expressa por dois fatores, sendo que cada um desses é recebido por cada um de seus progenitores (pai e mãe). Essa conclusão define a herança genética. Em todos os cruzamentos entre caracteres recessivos e dominantes homozigotos realizados por Mendel, o caráter recessivo desapareceu na primeira geração, reaparecendo na segunda geração. Na segunda geração sempre se obteve plantas com características dominantes e recessivas na proporção de 3:1. Sendo, três genótipos dominantes para um genótipo recessivo. Dessa forma, as proporções obtidas na prática experimental dos cruzamentos confirmaram a validade do modelo teórico de Mendel. A primeira lei de Mendel ou lei da segregação dos fatores ou ainda, lei fundamental da genética define-se por: “Cada caráter é condicionado por dois fatores. Eles se separam na formação dos gametas, indo apenas um fator para cada gameta”. Na formação de um gameta onde o mesmo carrega apenas um alelo de cada gene, considera-se puro com relação a cada fator. A fecundação permite a união dos alelos e a manifestação do fator relacionado aos genes. Quando um indivíduo possui um par de alelos idênticos é chamado homozigoto (puro) e se apresenta diferentes alelos é heterozigoto (híbrido). Ao cruzar ervilhas puras que apresentavam sementes amarelas com ervilhas puras que apresentavam sementes verdes, Mendel obteve na 1ª geração sementes totalmente amarelas. Cruzando as sementes da 1ª geração entre si, ou seja, realizando uma autofecundação, obteve uma 2ª geração composta por 75% das sementes amarelas e 25% das sementes verdes (Figura 5). 19 Figura 5. Ilustração do cruzamento que representa a Lei da segregação. Cruzamento entre sementes puras amarelas e sementes puras verdes (parentais). Na 1ª geração as sementes foram cruzadas entre si, ou seja, realizando uma autofecundação, e como resultado obteve-se uma 2ª geração composta por 75% das sementes amarelas e 25% das sementes verdes. Interpretando os resultados, é possível afirmar que cada caráter é determinado por um par de fatores ou unidades hereditárias designadas genes; os dois genes que determinam um caráter segregam-se (separam-se) na formação de dois gametas: Lei da segregação. Por fim, os dois genes que controlam um caráter são designados alelos. A figura abaixo representa novamente a interpretação dada por Mendel, de cruzamentos realizados entre linhagens puras, ou seja, linhagens que apresentavam ervilhas apenas com sementes amarelas ou apenas com sementes verdes. Na primeira geração (F1), as plantas descendentes dos cruzamentos apresentavam a cor de apenas um dos progenitores, sendo a cor amarela denominada dominante e a cor verde denominada recessiva. Quando as plantas F1 foram cruzadas entre si, a característica recessiva reaparecia, em 1/4 dos descendentes, ou seja, na proporção de 3:1 (três sementes amarelas para uma semente verde). Esse fenômeno repetiu-se para mais seis outras características analisadas por Mendel. 20 As características fenotípicas dos seres humanos seguem os princípios da primeira Lei de Mendel. Características como cor dos olhos, tipo de cabelo (liso ou crespo), lobo da orelha (colado ou solto), grupos sanguíneos e outras, são transmitidas por um par de genes, transmitidos sempre pelos pais. Algumas doenças hereditárias como albinismo e polidactilia (dedos a mais) também são regidas pela Lei da segregação de fatores. 2.1 Genes letais Os genes letais foram identificados, em 1905, pelo geneticista francês Lucien Cuénot quando em um experimento observou que a herança relacionada à cor do pelo nos camundongos não obedecia às proporções mendelianas. Ao cruzar camundongos amarelos os descendentes nasciam com pelagem amarela e castanha (aguti). Por esse motivo, considerou o gene para cor amarela (K) dominante e o gene para cor castanha (k) recessivo, já que pais com pelagem amarela tinham filhos com pelagem castanha. Para que essa explanação se justificasse os camundongos amarelos foram considerados heterozigotos, pois sempre geravam filhos amarelos e filhos castanhos na proporção 2:1, 21 entretanto a proporção esperada, segunda a lei mendeliana, era de 3:1. Assim, é possível dizer que os camundongos com dois genes dominantes (KK) não sobreviviam. Essa hipótese foi confirmada pela presença de ¼ dos embriões mortos no útero dessas fêmeas heterozigotas (Figura 6). Quando o gene K surge em dose simples (Kk) condiciona a cor amarela da pelagem dos camundongos, mas quando aparece em dose dupla (KK) leva à morte dos animais, considerando-os como genes letais. Para cada cruzamento só irá existir uma combinação letal. (Kk) (Kk) X (Kk) (Kk) (kk) (KK) Figura 6. Ilustração do experimento com camundongos realizado pelo geneticista francês Cuénot que permitiu a identificação de genes letais. Proporção = 2:1 22 2.2 Herança sem dominância A ausência de dominância é outro fator que contraria a lei mendeliana. Essa ausência de dominância é representada por características em que os dois alelos não apresentam relação de dominância ou recessividade, manifestando, portanto ambos os alelos. Os genes são chamados de codominantes. A flor da espécie Mirabilis sp conhecida como flor maravilha se encaixa no mecanismo de herança sem dominância. Ao cruzar flores de cor branca com flores de cor vermelha, a F1 gerada é de apenas flores cor-de-rosa. Porém, quando se cruza plantas de F1 entre elas (autopolinização) a F2 gerada é de flores brancas (BB), rosas (VB) e vermelhas (VV), na proporção de 1:2:1 (uma flor branca, duas flores rosas e uma flor vermelha). Nesse caso, as flores com genes dominantes determinam cores diferentes para as flores. Segundo a primeira lei de Mendel o gene dominante em dose simples determina a mesma característica de quando aparece em dose dupla. Portanto, a ausência de dominância de alguns genes contraria essa lei. A herança sem dominância está ilustrada no esquema abaixo: P Vermelha (VV) Branca (BB) F1 23 Rosa (VB) F2 Vermelha (VV) Rosa (VB) Rosa (VB) Branca (BB) 2.3 Genealogia Genealogia ou heredograma é a representação gráfica da transmissão de determinada característica dentro de uma família, considerando o grau de parentesco. As convenções utilizadas nos heredogramas são: 24 Fonte: Genética Humana (Otto, P.G 1997) As cores podem representar alguma característica ou anomalia, como no caso a seguir: Aa aa I II Aa Aa aa aa 25 Esse heredograma mostra o cruzamento entre um indivíduo do sexo masculino heterozigoto de olhos castanhos e um indivíduo do sexo feminino homozigoto de olhos azuis. A cor azul dos olhosrepresenta uma característica recessiva. A F1 gerou dois filhos com olhos castanhos (Aa) e dois filhos com olhos azuis, na proporção de 2:2, ou 1:1. A tabela abaixo mostra como é realizado o cruzamento entre os alelos dos parentais. Em que os descendentes devem sempre receber um alelo do pai e um alelo da mãe. A a A AA Aa a Aa aa 2.4 Gêmeos Gêmeos são irmãos que nascem na mesma gestação. Os gêmeos podem ser univitelinos (idênticos) ou bivitelinos (fraternos). Os gêmeos univitelinos ou monozigóticos são formados a partir de um único óvulo. Nessa gestação apenas um óvulo é produzido e fecundado. Ao se dividir esse óvulo forma dois embriões que quase sempre são formados na mesma placenta, mas não dividem o saco amniótico (Figura 7). Os gêmeos univitelinos são muito semelhantes, são sempre do mesmo sexo e apresentam o mesmo tipo sanguíneo. Por isso, também são conhecidos como gêmeos idênticos. Gêmeos idênticos são considerados clones naturais por apresentarem a mesma carga genética. 26 Figura 7. Ilustração da fecundação e desenvolvimento embrionário de gêmeos univitelinos. Fonte: http://www.anossaescola.com Os gêmeos bivitelinos ou dizigóticos são formados a partir de dois óvulos. Nessa gestação são produzidos dois óvulos e os dois são fecundados, formando dois embriões que quase sempre são formados em placentas diferentes e não dividem o saco amniótico (Figura 8). Os gêmeos bivitelinos podem ou não ser do mesmo sexo, geralmente não se assemelham entre si, e podem ou não ter o mesmo tipo sanguíneo. Por isso, também são conhecidos como gêmeos fraternos. Gêmeos fraternos podem ter pais diferentes, isso pode ocorrer se a mãe ovular mais de uma vez ao mesmo tempo (gerar mais de um óvulo ao mesmo tempo) e ter relação sexual com dois homens diferentes num curto período de tempo. 27 Figura 8. Ilustração da fecundação e desenvolvimento embrionário de gêmeos bivitelinos. Fonte: www.marcobueno.net Existe ainda, os gêmeos siameses ou xifópagos. Esses gêmeos são monozigóticos, mas por um erro durante a divisão celular que resulta em uma divisão incompleta, esses gêmeos são ligados por alguma parte do corpo (Figura 9 e 10). Gêmeos siameses desenvolvem-se na mesma placenta e com o mesmo saco amniótico. Alguns casos de gêmeos siameses permitem a cirurgia de separação, tudo depende de qual parte do corpo os gêmeos estão unidos e se compartilham o mesmo órgão. No caso de gêmeos que compartilham órgãos é muito complicado que a cirurgia seja realizada, condenando os irmãos a viverem grudados a vida inteira ou corre- se o risco de que apenas um sobreviva após a cirurgia. 28 Figura 9. Gêmeos siameses unidos pelo abdômen. Fonte: http://www.cema.org.br Figura 10. Radiografia de gêmeos siameses. Fonte: http://www.cema.org.br 29 2.5 Métodos dos Gêmeos Uma das melhores maneiras de avaliar o quanto uma característica tem de hereditária e o quanto de ambiental é estudá-la em gêmeos monozigóticos, dizigóticos e em situações de adoção. Nos monozigóticos, o material genético é igual, e o ambiente é o mesmo. Nos dizigóticos, a constituição genética é diferente, e o ambiente é o mesmo. Nos estudos de adoção, os pares, monozigóticos ou dizigóticos, são separados (ou não) e, em geral, passam a ter ambientes familiares diferentes. Em mais de 30 estudos, envolvendo mais de 10.000 pares de gêmeos, para habilidades cognitivas (QI), observou-se que os gêmeos idênticos têm uma correlação de 0,85, e os fraternos, de 0,60. Algumas habilidades cognitivas específicas, tais como verbal e espacial, têm uma influência genética tão alta quanto o QI, mas outras, como a memória, têm menos. As estimativas de herdabilidade da personalidade variam de 20 a 50%. Neurose e extroversão tinham 50% de herdabilidade. A semelhança, embora útil, não é o melhor critério para determinar a zigosidade dos gêmeos. Ao nascimento, dos diferentes tipos de anexos embrionários que podemos encontrar, o único que permite assegurar que o par seja monozigótico é quando só existe um córion. O modo mais seguro de determinação da zigosidade é o da verificação dos grupos sanguíneos e a prova de histocompatibilidade. Esta prova se baseia no fato de os monozigóticos aceitarem transplante de um para o outro, enquanto os membros de um par dizigótico em geral rejeitam o tecido transplantado. Fenocópias ocorrem quando fatores ambientais produzem fenótipos muitos semelhantes. Podemos citar como exemplo o lábio leporino. O lábio leporino é uma má formação do lábio superior de causa genética. Porém, constatou-se que a droga talidomida ministrada a gestantes para combater naúseas, no passado, também podia provocar fendas no lábio superior. 30 3 2ª LEI DE MENDEL Depois de seus experimentos com ervilhas considerando um caráter fenotípico por vez, Mendel passou a realizar experimentos considerando dois caracteres ao mesmo tempo, num só cruzamento. Um dos experimentos mais conhecidos foi o cruzamento de ervilhas considerando a forma e cor ao mesmo tempo. Assim, Mendel cruzou ervilhas amarelas e lisas puras (para as duas características) com ervilhas verdes e rugosas puras (para as duas características): O cruzamento gerou uma F1 de 100% de ervilhas amarelas lisas. Cruzando a F1 entre si (autofecundação), obteve-se uma F2 com quatro fenótipos distintos. Os fenótipos, amarela lisa e verde rugosa são os mesmo dos parentais, contudo os fenótipos, amarela rugosa e verde lisa são novos. Mendel conclui que havia independência na transmissão dos caracteres, ou seja, os caracteres da cor e da forma da ervilha não estão ligados. 31 A segunda lei de Mendel ou lei da segregação independente ou ainda, lei da herança independente define-se por: Os genes para dois ou mais caracteres são transmitidos aos gametas de modo totalmente independente, um em relação ao outro, formando tantas combinações gaméticas quantas possíveis, com igual probabilidade. A segunda lei de Mendel envolve dois, três ou mais caracteres, denominando-se diibridismo, triibridismo e poliibridismo. Considerando a lei da segregação independente o genótipo AaBb irá gerar quatro gametas diferentes, sendo eles: AB, Ab, aB e ab. B AB B aB A a b Ab b ab Ao cruzarmos, entre si, o genótipo AaBb obteremos: AB Ab aB ab AB AABB AABb AaBB AaBb Ab AABb AAbb AaBb Aabb aB AaBB AaBb aaBB aaBb ab AaBb Aabb aaBb aabb Cada gameta formado deverá ter obrigatoriamente um gene do primeiro genótipo e um gene do segundo genótipo, em todas as combinações possíveis. 3.1 Linkage 32 Linkage ocorre quando dois ou mais genes estão localizados no mesmo cromossomo (“ligados”). Esses genes não sofrem segregação independente permanecendo juntos durante a formação dos gametas. Quando num par de cromossomos homólogos cada um dos cromossomos apresentarem um gene dominante e um gene recessivo, denomina-se trans, e quando no par, um cromossomo apresentar apenas genes dominantes e o outro apenas genes recessivos denomina-se cis. alelos trans alelos cis Linkage pode ocorrer quando determinados genes estão tão próximos em um mesmo cromossomo que a separação deles pelo processo de crossing-over não se dá, ou se dá de forma muito excepcional. O crossing-over ou permutação, contrário ao linkage, ocorre durante a meiose quando os cromossomos formam pares e trocam (permutam) segmentos entre as duas cromátides homólogas, em qualquer ponto do cromossomo. A frequência de permuta entre dois genes é aporcentagem de gametas recombinantes e varia de 0% a 50%, sendo igual à metade da porcentagem de células em que ocorre a permuta. Nem todas as células meióticas apresentam 33 permuta para dois genes considerados. A frequência de permutação é determinada por meio dos resultados obtidos no cruzamento teste. 3.1.1 Mapas genéticos Os mapas genéticos servem para determinar a posição e a distância relativa dos genes no cromossomo, partindo-se de dois princípios básicos: - Os genes se dispõem linearmente ao longo dos cromossomos; - A permutação ocorre em qualquer ponto do cromossomo e, portanto, quanto maior a distância entre dois genes, maior será a probabilidade de ocorrer permuta entre eles. Por outro lado, entre genes próximos diminui a probabilidade de permuta. Na ligação gênica, o que determina a frequência dos gametas, e consequentemente a frequência dos descendentes, é a frequência do crossing-over. Tal frequência depende da distância entre os tais genes ligados, de modo que quanto maior a distância maior a frequência de gametas recombinantes, ou seja, com combinações resultantes de crossing-over. Assim, se um gene é distante do outro por 18 u.m. (unidades morgan), a taxa de crossing-over será de 18%. Consideremos três genes (A, B e C) que se encontram em linkage (mesmo cromossomo). A porcentagem de gametas com recombinantes (crossing) entre (A) e (B) é de 18%; entre (B) e (C) é de 24%; e entre (A) e (C) é de 42%. Essas informações são necessárias para determinar a disposição dos três genes no cromossomo. A taxa de crossing-over é proporcional à distância entre os genes, logo 1% de gametas recombinantes (crossing) representa uma unidade de distância, ou um morganídeo no mapa genético, em homenagem a Morgan responsável por tais conceitos. Com as informações do exemplo citado acima é possível construir um mapa genético, indicando a posição e distância dos genes. Segue abaixo o mapa: 34 A B C ______________________________________ 18% 24% 42% Os locus (A) e (C) são os mais distantes, já que 42% dos gametas são recombinantes. Os locus (A) e (B) são os mais próximos, já que existem 18% de gametas com recombinação entre os mesmos. 3.2 Interação gênica A interação gênica ocorre quando dois ou mais pares de genes, com distribuição independente, determinam conjuntamente um único caráter. Esses pares de genes interagem entre si. É possível explicar a interação gênica por meio de um exemplo clássico na genética: a forma da crista nas galinhas. Existem quatro tipos distintos de cristas na galinha; a crista simples, a crista rosa, a crista ervilha e a crista noz (Figura). Cada forma distinta de crista é condicionada pela interação de dois pares de genes, resultando nos seguintes genótipos: Crista simples: eerr Crista rosa: eeR_ (eeRr/eeRR) Crista ervilha: E_rr (EErr/Eerr) Crista noz: E_R_ (EeRr/EERR) 35 No caso dos genótipos acima apresentados, note que nas cristas em forma de ervilha, noz e rosa os genes vêm acompanhados de um traço. Esse traço significa um gene desconhecido. Portanto, tomando como exemplo a crista rosa, é possível afirmar que essa crista irá se manifestar toda vez que aparecerem, ao mesmo tempo, os genes (e) em dose dupla e o (R) em dose simples, ou seja, os genótipos eeRr e eeRR manifestam a forma da crista rosa. Da mesma maneira, a crista em forma de ervilha irá se manifestar sempre que aparecerem, ao mesmo tempo, os genes (E) em dose simples e o (r) em dose dupla. A crista em forma de noz surgirá com os genes (E) e (R) em dose, simples e juntos. Já a crista simples sempre será determinada pela dose dupla dos genes (e) e (r), manifestando sempre com o mesmo genótipo: eerr. Figura. Ilustração dos quatros fenótipos distintos da crista de galinhas, sendo as cristas rosa, ervilha, simples e noz. Fonte: http://www.cynara.com.br Portanto, ao cruzar galinhas de crista ervilha, puras, com galinhas de crista simples obtêm-se uma F1 com 100% de seus descendentes de crista ervilha. Cruzando as galinhas de 36 F1 entre si, obtêm-se uma F2 com galinhas de crista ervilha e de crista simples, na proporção de 3:1. Segue a representação abaixo: P Crista ervilha x Crista simples (EErr) (eerr) F1 Crista ervilha x Crista ervilha (Eerr) (Eerr) F2 Crista ervilha Crista ervilha Crista ervilha Crista simples (EErr) (Eerr) (Eerr) (eerr) Proporção: 3:1 (três galinhas de crista ervilha e uma galinha de crista simples) Quando galinhas de crista em forma de ervilha são cruzadas com galinhas com crista rosa obtêm-se uma F1 com 100% de seus descendentes de crista em forma de noz. Ao cruzar as galinhas de F1 entre si, obtêm-se uma F2 com galinhas de crista noz, crista ervilha, crista rosa e crista simples, na proporção de 9:3:3:1. P Crista ervilha x Crista rosa (EErr) (eeRR) F1 Crista noz x Crista noz (EeRr) (EeRr) 37 F2 Crista noz Crista ervilha Crista rosa Crista simples (E_R_) (E_rr) (eeR_) (eerr) Proporção: 9:3:3:1 (nove galinhas de crista noz, três galinhas de crista ervilha, três galinhas de crista rosa e uma galinha de crista simples). Como são possíveis galinhas de crista ervilha cruzar com galinhas de crista rosa e gerarem descendentes de crista noz? E ainda, como são possíveis esses descendentes de crista noz cruzar entre si e gerarem quatro fenótipos distintos? Isso acontece porque a forma da crista é definida por dois pares de genes, (E) e (e) no caso da crista ervilha e (R) e (r) no caso da crista rosa. Esses pares de genes possuem segregação independente, porém não se manifestam de forma independente. 3.2.1 Epistasia A epistasia é uma modalidade da interação gênica na qual, genes de um locus inibem a manifestação de genes de outro locus. O efeito epistático manifesta-se entre genes não alelos. Genes epistáticos são os que impedem a atuação de outros, e hipostáticos são os genes inibidos. Portanto consideraremos dois pares de genes: 38 A a B b O gene (A) é dominante sobre o alelo recessivo (a), assim como o gene (B) é dominante sobre o alelo recessivo (b). Porém, o gene (A) não é dominante sobre o par Bb, pois são genes diferentes em locus diferentes. Nesse caso, o gene (A) é epistático sobre o par Bb, já que inibe seu efeito. E os genes (B) e (b) são hipostáticos, pois são inibidos pelo gene (A). A epistasia pode ser dominante ou recessiva. Será dominante quando uma característica determinada por um par de genes depende, em parte, da ação de outro par de genes. Galinhas da raça Leghorn apresentam plumagem colorida condicionada pelo gene dominante (C), assim galinhas coloridas terão os genótipos: CC ou Cc. O gene recessivo (c) condiciona plumagem branca, assim galinhas brancas terão o genótipo cc. E o gene (I) é epistático em relação a (C), inibindo a manifestação de cor. Seu alelo recessivo (i) permite que a cor se manifeste. Assim, sempre que os genótipos forem CCii ou Ccii as galinhas terão plumagem colorida, e quando osgenótipos forem CCII, CcII, CcIi, ccII, ccIi e ccii as galinhas terão plumagem branca. A epistasia recessiva ocorre quando o alelo recessivo em homozigose funciona como epistático de um gene em outro locus. É possível exemplificar por meio da cor da pelagem de certos ratos. A cor da pelagem depende dos dois pares de genes: Aa e Cc. Sendo que, (A) determina a pelagem amarela, (C) determina a pelagem preta, (a) não produz pigmento, e (c) em homozigose condiciona a ausência total de pigmento, ou seja, o albinismo. Sempre que o gene (a) aparecer à coloração dos pelos será determinada pelo gene dominante (A ou C). Quando os genes A e C aparecem juntos a coloração produzida é pardo-acinzentada. E quando o gene (c) 39 surge em homozigose junto ao gene (A) os ratos serão albinos, já que o par cc é epistático sobre o locus (A). 3.2.2 Herança quantitativa A herança quantitativa ou herança poligênica também é uma modalidade da interação gênica, na qual se avalia variações de caracteres, ao contrário dos caracteres que apresentam “fenótipo sim ou não”, como no caso do daltonismo, em que o indivíduo é daltônico ou apresenta visão normal. Caracteres com variações apresentam gradação contínua do fenótipo entre os extremos. Como por exemplo, o tom de pele. Não existe apenas pele branca ou escura. Existem peles alvas, brancas, morenas, amarelas, pardas, mulatas, negras. Assim, a herança quantitativa irá estudar todos esses fenótipos intermediários entre os extremos. Essas variações contínuas ocorrem de maneira suave, como no caso da estatura. Existem indivíduos com altura de 1,50m, 1,51m, 1,52m, 1,53m, e assim por diante. A herança quantitativa não apresenta dominância. Um gene não apresenta dominância sobre o outro. Nessa herança, considera-se o número de genes aditivos. Voltando ao exemplo da tonalidade de pele, consideram-se os genes (A) e (B) como genes que acrescentam melanina ao fenótipo básico, já os genes (a) e (b) não acrescentam melanina. Os genes (A) e (B) são chamados de genes acrescentadores ou aditivos. Portanto, a tonalidade da pele será determinada pela quantidade de genes aditivos no fenótipo. No caso da pele negra os dois genes aditivos são encontrados (AABB), na pele mulata escura são encontrados três genes aditivos (AaBB; AABb), na pele mulata média dois genes aditivos (aaBB; AaBb ; AAbb), na pele mulata clara apenas um gene(aaBb ; Aabb) e na branca, nenhum gene aditivo é encontrado (aabb). Esse exemplo foi dado de maneira simplificada, apenas para facilitar o entendimento, já que existe uma variação muito maior na tonalidade da pele e, portanto, mais genes aditivos. Veja a representação no quadro abaixo: 40 Número de genes aditivos Genótipos Fenótipos 0 aabb Pele branca 1 aaBb ; Aabb Pele mulata clara 2 aaBB; AaBb ; AAbb Pele mulata média 3 AaBB ; AABb Pele mulata escura 4 AABB Pele negra Logo, a herança quantitativa é determinada por dois ou mais pares de genes que apresentam seus efeitos somados, em relação a um mesmo caráter, de maneira a ocasionar a manifestação de um fenótipo em diferentes intensidades. Na herança quantitativa o número de fenótipos é determinado por: Número de genes +1 Diante disso, se considerarmos os fenótipos da cor da pele do exemplo citado acima, quatro genes são atuantes. Assim, quatro genes +1 = 5 fenótipos. Os cinco fenótipos são representados por peles branca, mulata clara, mulata média, mulata escura e negra. Outro exemplo é o da flor maravilha que apresenta como genes atuantes o (V) e o (B), mas apresenta três fenótipos, já que dois genes +1 = 3 fenótipos. Sendo assim, os três fenótipos das cores das flores são cor-de-rosa, vermelha e branca. 41 4 ALELOS MÚLTIPLOS E BIOTECNOLOGIA 4.1 Sangue O sangue é um tecido conjuntivo produzido na medula óssea dos ossos chatos, vértebras, quadril, crânio, costelas e osso esterno que circula pelo sistema vascular sanguíneo e serve para manutenção da vida do organismo (Figura 1). Um indivíduo adulto apresenta em média cinco litros de sangue circulante no seu corpo, variando de acordo com o peso. Figura 1. Produção do tecido sanguíneo na medula óssea. A ilustração mostra que as células-tronco pluripotentes da medula óssea formam todos os componentes celulares do sangue, como eritrócitos, plaquetas e células de defesa. Fonte: http://www.afh.bio.br O sangue apresenta vários constituintes como o plasma constituído por água, sais e vitaminas que constituem cerca de 55% do volume sanguíneo; e dos elementos figurados do http://www.afh.bio.br/ 42 sangue que são as hemácias, leucócitos e plaquetas, constituindo os 45% restantes do volume do sangue (Figura 2). Figura 2. Elementos figurados do sangue: plaquetas, glóbulos vermelhos e glóbulos brancos. Fonte: http://www.aula2005.com O plasma é um líquido de cor amarelo claro, constituído de 90% de água, 1% de substâncias inorgânicas (como potássio, sódio, ferro e cálcio), 7% de proteínas plasmáticas (albumina, imunoglobulinas e fibrinogênio), e cerca de 1% de substâncias orgânicas não proteicas. Proteínas, açúcares, gorduras e sais minerais encontram-se dissolvidos na água. O plasma é responsável pela circulação de elementos nutritivos necessários à vida celular. As plaquetas são fragmentos celulares de vida curta responsáveis pelo processo de coagulação. Os leucócitos ou células de defesa são chamados de glóbulos brancos, possuem funções relacionadas à defesa do organismo contra “corpos estranhos”. 43 As hemácias são chamadas de glóbulos vermelhos ou eritrócitos e apresentam vida média de 120 dias. Sua função é transportar o oxigênio dos pulmões para todo o organismo. 4.1.1 Sistema ABO e grupos sanguíneos Os grupos sanguíneos são constituídos por antígenos que são a expressão de genes herdados da geração anterior. Quando um indivíduo apresenta determinado antígeno significa que ele herdou o gene de um ou de ambos os pais, e que este gene poderá ser transmitido para a próxima geração. Os grupos sanguíneos são herdados independentemente entre si. O sistema ABO, foi descoberto por Karl Landsteiner, em 1900, e baseia-se no estudo das diferenças sorológicas individuais, ou seja, na definição do tipo sanguíneo de cada indivíduo. Landsteiner demonstrou que ao colocar em contato hemácias de certos indivíduos com o soro sanguíneo de outros, em alguns casos havia aglutinação das hemácias formando grumos visíveis a olho nu. A aglutinação é decorrente da reação entre antígenos e anticorpos. Antígenos são “corpos estranhos“ que penetram num determinado organismo. A defesa desse organismo aos corpos estranhos ocorre por meio dos anticorpos, que funcionam como defesa do organismo, a fim de neutralizar os antígenos. Quando um anticorpo reage ao antígeno provoca aglutinação (um grumo). A incompatibilidade sanguínea entre alguns indivíduos observada por intermédio da aglutinação por Landsteiner, explicou porque alguns doentes apresentam choques após transfusão de sangue. No soro (plasma) existem anticorpos naturais (aglutininas) e antígenos (aglutinogênios) determinados geneticamente. Os anticorpos dos grupos sanguíneos já estão presentes no soro independentemente da presença de algum antígeno, sendo chamados de aglutininas. Os antígenos do grupo sanguíneo, por sua vez, chamados de aglutinogênios, são polissacarídeos (polímeros de açúcar) presentes na superfície dos glóbulos vermelhos. São formados por dois diferentes polissacarídeos o A e o B. Ambos são produzidos a partir de uma 44 substância precursora, modificada por um produto enzimático de cada alelo dos genes chamados IA ou IB. Já o grupo sanguíneo AB possui um gene A e um gene B, tendo sido um herdado da mãe e o outro do pai. Seu genótipo é AB (IAIB) não possuindo anticorpos ou aglutininascorrespondentes. No grupo O, o gene O é herdado tanto da mãe quanto do pai. O genótipo desse grupo é OO (ii). O sistema ABO é constituído de três genes (A, B e O) e três alelos (IA, IB e i), podendo qualquer um dos três ocupar o loco ABO em cada elemento do par de cromossomos responsáveis por este sistema. Os genes não codificam diretamente seus antígenos específicos, mas às enzimas com função de transportar açúcares específicos, para uma substância precursora, produzindo os antígenos ABO. Indivíduos do grupo sanguíneo A apresentam na membrana plasmática da hemácia o aglutinogênio a que têm a função de antígeno quando introduzida em indivíduos de grupos sanguíneos diferentes. No soro desses indivíduos ocorrem aglutininas anti-b, ou seja, anticorpos que reajam contra o tipo sanguíneo B. Assim, indivíduos do grupo sanguíneo B apresentam na membrana plasmática da hemácia o aglutinogênio b e a aglutinina anti-a no soro. Indivíduos do grupo sanguíneo AB possuem os antígenos a e b na membrana plasmática da hemácia e ausência das aglutininas anti-a e anti-b, portanto não possuem anticorpos correspondentes. Indivíduos do grupo sanguíneo O não possuem os antígenos a e b na membrana plasmática da hemácia, mas apresentam as aglutininas anti-a e anti-b. Os tipos sanguíneos O e AB só apresentam um possível genótipo, sendo eles respectivamente: (ii) e (IAIB). Já os tipos sanguíneos A e B apresentam, cada um, dois possíveis genótipos. Quando o indivíduo herda de seus pais um gene O e um gene A, apenas o gene A se manifesta produzindo antígeno a e aglutinina anti-b. O genótipo desse indivíduo é AO (IAi). Um indivíduo do tipo sanguíneo A também pode apresentar o genótipo AA (IAIA), decorrente da herança do gene A de cada um dos pais. Nesse caso, também haverá produção do antígeno a e aglutinina anti-b. O indivíduo com sangue do tipo B pode apresentar dois genótipos, BO (IBi) e BB (IBIB). Nos dois casos haverá produção do antígeno b e aglutinina anti-a. A diferença dos dois tipos sanguíneos está nos genes herdados pelos pais. Assim, quando o indivíduo herdar de seus pais um gene O e um gene B, apenas o gene B se manifestará, determinado o genótipo BO (IBi). E quando o indivíduo herdar de seus pais o mesmo gene B seu genótipo será BB (IBIB). 45 A tabela abaixo relaciona cada tipo sanguíneo com seu genótipo, antígeno e aglutinina correspondente: FENÓTIPO GENÓTIPO ANTÍGENO AGLUTININA A AO (IAi) A anti-B AA (IAIA) A anti-B O OO (ii) nenhum anti-a e anti-b B BO (IBi) B anti-a BB (IBIB) B anti-a AB AB (IAIB) AB nenhuma Em testes laboratoriais os indivíduos AO e AA; BO e BB não são diferenciados. Considera-se tipo sanguíneo A para os indivíduos AO e AA, e tipo sanguíneo B para indivíduos BO e BB. Os testes para determinar os grupos sanguíneos envolvem dois soros, o anti-a e o anti-b, e uma pequena amostra (duas gotas) de sangue do indivíduo. A amostra sanguínea é colocada numa lâmina, de tal modo que as duas gotas estejam separadas na lâmina (Figura 3). Então, são pingados os soros anti-a e anti-b, cada um numa gota de sangue. A ocorrência de aglutinação nas gotas de sangue indica a presença de antígeno e determina o tipo sanguíneo. 46 Gotas de sangue Figura 3. Esquema da técnica da determinação dos grupos sanguíneos. Lâmina com duas gotas de sangue de um único indivíduo. Existem quatro possibilidades de reação entre as amostras sanguíneas e os soros anti-a e anti-b. Essas reações estão ilustradas abaixo: 1) Soro anti-a Soro anti-b Tipo sanguíneo B. Na primeira lâmina as hemácias não reagiram com o soro anti-a e aglutinaram em presença do soro anti-b. Por isso, o sangue é considerado do tipo B. 47 2 ) Soro anti-a Soro anti-b Tipo sanguíneo A. Na segunda lâmina as hemácias aglutinaram em presença do soro anti-a e não reagiram com o soro anti-b. Por isso, o sangue é considerado do tipo A. 3) Soro anti-a Soro anti-b Tipo sanguíneo O. 48 Na terceira lâmina as hemácias não reagiram nem com o soro anti-a, nem com o soro anti-b, significando que não apresentam nenhum dos dois antígenos em suas membranas. Por isso, o sangue é considerado do tipo O. 4) Soro anti-a Soro anti-b Tipo sanguíneo AB. Na quarta lâmina as hemácias aglutinaram em presença dos dois soros, anti-a e anti- b. Isto significa que possuem polissacarídeos A e B em suas membranas. Por isso, o sangue é considerado do tipo AB. Os grupos sanguíneos são determinados por alelos múltiplos, logo os genótipos possíveis são mais numerosos. Em caracteres condicionados por alelos múltiplos os indivíduos têm dois genes localizados num par de cromossomos homólogos, porém há mais de duas qualidades de alelos. 49 Os quatro tipos de sangue apresentam distribuição variada dentro da população. A frequência dos tipos sanguíneos A, B, AB e O entre os brasileiros está representada no quadro abaixo: Tipo Sanguíneo Frequência O 45% da população A 40% da população B 10% da população AB 5% da população O quadro mostra que o tipo sanguíneo mais frequente entre a população brasileira é o tipo O, e o menos frequente é o tipo AB. 4.1.2 Transfusão sanguínea A transfusão de sangue é uma prática médica na qual um indivíduo recebe sangue de um outro indivíduo (Figura 4). A transfusão sanguínea é usada frequentemente em pessoas que sofreram intervenções cirúrgicas, traumatismos, hemorragias, e em geral, em pessoas que tenham sofrido grande perda de sangue. 50 (a) (b) Figura 4. Ilustração de um homem doando sangue (a) e a foto de um doador (b).Fontes:http://www.bauru.unesp.br e http://www.tiosam.com Na transfusão de sangue leva-se em conta o efeito das hemácias do doador sobre o plasma do receptor. Indivíduos do grupo O são considerados doadores universais, pois não apresentam aglutinogênios a e b nas hemácias, dessa maneira indivíduos do grupo A, B e AB não irão sofrer reação de aglutinação ao receberem sangue do grupo O. No entanto, esse grupo apresenta as aglutininas anti-a e anti-b, e por isso só podem receber sangue de indivíduos do mesmo grupo. Logo, o grupo O pode doar sangue para todos os outros grupos (A, B e AB), mas só pode receber do seu próprio grupo (O). Indivíduos do grupo AB são considerados receptores universais, pois não apresentam as aglutininas anti-a e anti-b no plasma, dessa maneira esses indivíduos não irão sofrer reação de aglutinação ao receberem sangue dos outros grupos (A, B e O). Entretanto, esse grupo apresenta os dois aglutinogênios a e b nas hemácias, impedindo o grupo de doar para outros grupos. O grupo AB pode receber de todos os grupos, mas só pode doar para o próprio grupo. 51 Tanto o grupo A quanto o B podem receber sangue do grupo O e de seu próprio grupo; e podem doar sangue para o grupo AB e para seu próprio grupo. Assim sendo, indivíduos do tipo sanguíneo A podem doar para indivíduos do tipo AB e A, e recebem de indivíduos dos tipos O e A. Indivíduos do tipo sanguíneo B podem doar para indivíduos do tipo AB e B, e recebem de indivíduos dos tipos O e B. O diagrama abaixo mostra as possibilidades de transfusão para doadores e receptores. Durante muito tempo as pessoas tinham receio de doar sangue e de aceitar a transfusão, por medo de perderem seu sangue e de contraírem alguma doença infectocontagiosa. A quantidade de sangue doada é de 450 mL, e um indivíduo adulto apresenta cerca de 5 litros de sangue circulantes no seuorganismo. Além disso, o sangue é um tecido vivo que constantemente é reposto. Quem doa sangue não diminui sua capacidade sanguínea e nem fragiliza seu corpo. Ao doar sangue é necessário fazer uma série de testes que indentificam doenças contagiosas, prevenindo o receptor da transfusão. Embora a ciência já tenha desenvolvido alguns protótipos de sangue artificial, a fase de teste para esses produtos ainda não acabou. Por esse motivo a doação sanguínea é muito 52 importante e essencial para salvar vidas daqueles que por algum motivo necessitam da transfusão de sangue. Os 450 mL de cada doação podem salvar até quatro vidas. Para doar sangue o doador precisa ter entre 18 e 65 anos, mais de 50 Kg, não estar em jejum, ter dormido bem antes da doação e estar em boas condições de saúde. Homens podem doar no máximo quatro vezes ao ano, com intervalos mínimos de 60 dias. Mulheres podem doar no máximo três vezes ao ano, com intervalos mínimos de 90 dias. No caso de doadores com idade de 60 a 65 anos a frequência de doação cai para duas vezes ao ano com intervalos mínimos de seis meses. Pessoas com gripe ou febre; grávidas ou amamentando; que tenham ingerido bebida alcoólica no dia da doação; que tenham feito tatuagem ou piercing nos últimos 12 meses e que tenham feito endoscopia nos últimos 12 meses, não podem doar sangue dentro dessas condições. São realizados testes gratuitos para habilitar os doadores. Logo, indivíduos que apresentem tais doenças não podem NUNCA doar sangue. Os testes são de: - Chagas; - HIV; - Hepatites B e C; - Sífilis; - HTLV I /II. O sangue doado passa por um processo chamado fracionamento, no qual é sempre separado em vários componentes e cada paciente receberá aquela parte que seu organismo necessita. 4.1.3 Auto-hemoterapia 53 A auto-hemoterapia é uma técnica simples, baseia-se na retirada de sangue venoso do paciente e, logo imediatamente este sangue é aplicado na região intramuscular convencional (músculo do braço ou das nádegas). Os defensores da auto-hemoterapia alegam que a técnica estimula o sistema imunológico do organismo por considerar o sangue reinjetado como um “corpo estranho”. A técnica foi descoberta empiricamente em 1912 por um médico da universidade de Paris. Em 1940 o Dr. Jesse Teixeira, um grande cirurgião de tórax, brasileiro, descobriu o mecanismo de ação da auto-hemoterapia, comprovando assim cientificamente seu uso para tratar inúmeras doenças. Seu trabalho foi publicado e premiado, em 1940, na Revista Brasil– Cirúrgico do Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (vol. II, março de 1940, número 3, páginas 213 – 230). O trabalho desenvolvido pelo médico baseou-se na formação de uma bolha na coxa de pacientes, a partir da aplicação de uma substância irritante. Após o procedimento o médico fez a contagem dos macrófagos antes da auto-hemoterapia, na qual a cifra foi de 5%. Após a auto-hemoterapia a cifra subiu a partir da 1ª hora chegando após 8 horas a 22%. Manteve-se em 22% durante cinco dias e finalmente declinou para 5% no 7º dia após a aplicação. A auto-hemoterapia virou a coqueluche do momento. Existem vídeos explicativos sobre a técnica sendo vendidos e distribuídos na internet. Muitas pessoas estão se submetendo à auto-hemoterapia depois de assistir o vídeo. E muitas pessoas já se submetem à técnica há muitos anos. A técnica promete melhorar o sistema imunológico e até a cura de doenças como câncer e AIDS. Muitos pacientes comprovaram os benefícios que a auto-hemoterapia proporciona, restabelecendo assim a saúde. Diante de tanta polêmica, a Secretaria de Saúde de Olinda, no estado do Pernambuco, está desenvolvendo de maneira experimental a auto-hemoterapia. Testes com pessoas estão sendo realizados pelo próprio secretário da saúde João Veiga, médico, responsável pela aplicação das injeções. Das pessoas submetidas à terapia até o momento, 90% afirmaram ter tido melhoras no estado de saúde. Entretanto, muitos médicos condenam esse tratamento e acreditam que essa melhora pode ser decorrente do próprio curso da doença, ou ainda, consideram que a terapia pode funcionar como “efeito placebo”. O efeito placebo apresenta efeitos terapêuticos em razão aos 54 efeitos fisiológicos da crença do paciente de que está sendo tratado. O efeito placebo é considerado como um fator psicológico, devido a um efeito real causado pela crença ou por uma ilusão subjetiva. Especialistas afirmam que o uso do tratamento pode causar danos à saúde do paciente. Entre os riscos, está o de abscessos (acúmulo de pus) e, consequentemente infecção generalizada no organismo que se dá por meio da via sanguínea. No final do mês de março de 2007, a Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (SBHH) diante dos questionamentos recebidos relacionados à prática de auto- hemoterapia, divulgou um comunicado contra. No dia 13 de abril de 2007, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) divulgou uma nota técnica também contra a realização do procedimento. De acordo com a SBHH “não existe na literatura médica, tanto nacional quanto internacional, qualquer estudo com evidências científicas sobre o referido tema” e “por não existirem informações científicas sobre o referido procedimento, são desconhecidos os possíveis efeitos colaterais e complicações desta prática, podendo colocar em risco a saúde dos pacientes a ela submetidos”. O comunicado é assinado pelo presidente (2007) da SBHH, Dr. Carlos Chiattone e proíbe aos médicos a utilização dessa prática terapêutica não reconhecida cientificamente. A nota técnica da ANVISA afirma que "Este procedimento não foi submetido a estudos clínicos de eficácia e segurança, e a sua prática poderá causar reações adversas, imediatas ou tardias, de gravidade imprevisível". O item 7 da nota técnica a ANVISA informa: "O procedimento 'auto-hemoterapia' pode ser enquadrado no inciso V, Art. 2º do Decreto 77.052/76, e sua prática constitui infração sanitária, estando sujeita às penalidades previstas no item XXIX, do artigo 10, da Lei nº. 6.437, de 20 de agosto de 1977". A ANVISA informa que a fiscalização dessa prática é de responsabilidade dos conselhos de medicina. Por não existir nenhuma comprovação científica sobre a eficácia da técnica a ANVISA está com um grupo de estudo para dar um parecer oficial sobre auto- hemoterapia. O comunicado e a nota técnica sobre a auto-hemoterapia divulgada pelo SBHH e http://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%A9 55 ANVISA, respectivamente, podem ser encontrados por inteiro nos sites: http://www.sbhh.com.br/home/imunoterapia.htm http://www.anvisa.gov.br/sangue/informes/01_130407.htm O médico conselheiro do Conselho Regional de Medicina Rui Tavares ressalta que o médico registrado no conselho que praticar ou ensinar essa técnica vai sofrer sanções. E aqueles que realizam a técnica e não são médicos estão enquadrados em prática ilegal de medicina. O procedimento e o acesso são fáceis. A técnica é simples de baixo custo financeiro (de 10 a 20 reais por aplicação) e estava sendo realizada em farmácias e por alguns técnicos laboratoriais, assim como por estudantes de enfermagem e farmácia. Os defensores da auto-hemoterapia afirmam que o procedimento traz muitos benefícios aos pacientes, como a potencialização do sistema imunológico através da estimulação do sistema retículo endotelial; a ativação das funções do macrófago (apresentam papel importante na remoção de restos de células e de elementos intercelulares alterados); desintoxicação e revitalização do organismo (já que aumenta o número de leucócitos nos órgãos abdominais, e assim, incrementa as funções orgânicas e os processos de desintoxicação); e prevenção de doenças, partindo do princípio que todas as doenças são causadas por uma deficiência do sistema imunológico. 4.1.4 Sistema MN Aespécie humana apresenta, além do sistema ABO, o sistema MN. No sistema MN dois antígenos são encontrados nas hemácias: m e n. Assim, indivíduos que apresentam o antígeno m são do grupo M, aqueles que apresentarem o antígeno n são do grupo N, e os indivíduos que apresentarem os dois antígenos (m e n) nas suas hemácias pertencem ao grupo MN (Figura 5). http://www.sbhh.com.br/home/imunoterapia.htm http://www.anvisa.gov.br/sangue/informes/01_130407.htm 56 O sistema MN não tem influência nas transfusões sanguíneas, já que pessoas que recebem sangue diferente do seu, quanto ao sistema MN, apresentam baixa produção de anticorpos e sensibilização quase nula. Por isso, no caso de transfusões de sangue o sistema MN não é levado em conta, e sim o sistema ABO e o fator RH. O sistema MN é utilizado na medicina legal nos casos de exclusão de paternidade. Para esse sistema existem dois alelos: LM e LN que funcionam como alelos mendelianos simples, sem dominância. FENÓTIPOS GENÓTIPOS Grupo M LMLM Grupo N LNLN Grupo MN LMLN Figura 5. Quadro demonstrativo dos fenótipos e genótipos correspondentes do sistema MN. 57 5 FATOR Rh O fator Rh foi descoberto em 1940 pelos médicos Karl Landsteiner e Alex Wiener, ao trabalharem com o sangue de macacos Rhesus. Os médicos injetaram o sangue do macaco Rhesus em coelhos, e observaram a formação de anticorpos específicos que aglutinaram as hemácias de todos os macacos. Para que o anticorpo tenha sido produzido, antígenos deveriam estar presentes nas hemácias dos macacos. Assim, esse antígeno foi denominado de fator Rh, devido o nome da espécie Rhesus dos macacos. Por sua vez, o anticorpo produzido nos coelhos foi denominado de anti-Rh. Na espécie humana, amostras sanguíneas foram testadas com o anticorpo anti-Rh. Demonstrou-se que cerca de 85% dos indivíduos sofreram aglutinação sanguínea ao receber o anticorpo. Portanto, tais indivíduos apresentam antígenos Rh (fator Rh) no sangue, sendo denominados como Rh positivos (Rh+). Os 15% restantes dos indivíduos não apresentaram aglutinação no sangue ao receberem o anti-Rh. Isso significa que esses indivíduos não apresentam o fator Rh em suas hemácias, ou seja, não apresentam antígenos. Tais indivíduos são denominados como Rh negativos (Rh-). Enquanto os grupos ABO possuem antígenos e anticorpos naturais, no caso do fator Rh essa propriedade antigênica não está associada à presença de anticorpos naturais – os anticorpos correspondentes são imunes, isto é, são produzidos por indução do antígeno. O fator Rh é condicionado pelo par de genes Rr, sendo R o gene dominante e r o gene recessivo. Os alelos do fator Rh são considerados simples e não múltiplos. Os fenótipos e genótipos correspondentes podem ser vistos no quadro abaixo: GENÓTIPOS FENÓTIPOS ANTÍGENO Rh RR Rh+ Presente Rr Rh+ Presente rr Rh- Ausente 58 Os indivíduos que apresentarem o gene dominate R, seja em dose simples (Rr) ou em dose dupla (RR) terão o genótipo Rh+ e os indivíduos que apresentarem o gene recessivo r em dose dupla (rr) Rh-. Entretanto, a herança do sistema Rh é mais complexa. Existem seis tipos comuns de antígenos Rh designados por C, D, E, c, d e e. A pessoa que possui antígeno C não apresentará antígeno c, e vice-versa. O mesmo ocorrerá com os antígenos D/d e E/e. Além disso, em razão ao modo de herança desses fatores, cada pessoa terá um antígeno de cada um dos três pares. O antígeno tipo D é muito prevalente na população, sendo também consideravelmente mais antigênico do que os outros antígenos Rh, por conseguinte, os indivíduos cujas hemácias são aglutinadas pelos anticorpos imunes do coelho (anti-Rh ou Anti-D), são Rh positivos (possuem o antígeno D) e aqueles cujas hemácias não se aglutinam na presença do soro anti- Rh, são Rh negativos (Figura 6). No caso do macaco Rhesus, todos os animais são Rh positivos. Figura 6. Ilustração do teste de aglutinação com o fator Rh. Na primeira amostra (primeiro círculo) não houve aglutinação, portanto a amostra é considerada Rh-. Na segunda amostra (segundo círculo) houve aglutinação, portanto a amostra é considerada Rh+. A produção de anti-D quase sempre é posterior a exposição por transfusão ou gravidez a eritrócitos que possuem o antígeno D. Qualquer antígeno deste sistema é capaz de provocar a produção de anticorpos, e assim a gerar situações de incompatibilidade. A maioria dos casos de Doença Hemolítica do Recém-nascido (DHRN) é em consequência ao anti-D. A profilaxia por imunoglobulinas anti-D diminuiu o número de 59 aloimunizações maternas contra o antígeno D, mas não contra E, e, C e c. Na rotina, é realizada a tipagem, apenas, para o antígeno D nesse sistema. Os outros antígenos (E, e, C, c), são determinados em situações em que ocorre incompatibilidade, e é necessário obter sangue que não possua algum desses antígenos. A produção de anticorpos contra estes antígenos ocorre de forma semelhante à produção de anti-D. A capacidade de provocar a produção de anticorpos destes antígenos varia. Em ordem decrescente sobre imugenicidade temos D > c > E > C > e. No cruzamento entre um homem Rh+ com o gene dominante em dose dupla (RR) e uma mulher Rh- (rr), todos seus descendentes serão Rh+ porém, o gene dominante aparecerá em dose simples (Rr). Rh+ Rh- (RR) (rr) I II Rh+ (Rr) 60 5.1 Transfusão do fator Rh Para efeito de transfusão, é considerado que pacientes Rh positivos podem tomar sangue Rh positivo ou negativo, e que pacientes Rh negativos só devem tomar sangue Rh negativo (Figura 7). Figura 7. Diagrama de transfusão sangüínea considerando o fator Rh. O tipo sangüíneo Rh positivo pode doar apenas para Rh positivo, porém pode receber sangue Rh positivo e negativo. Já o tipo sangüíneo Rh negativo pode doar para sangue Rh positivo e negativo, mas só pode receber de Rh negativo. No caso de pacientes D fraco, deve-se analisar se o antígeno D está enfraquecido por interação gênica, estando o mesmo presente integralmente, o paciente poderá tomar Rh positivo ou negativo. Porém nos casos em que o antígeno D está enfraquecido por ausência de um dos componentes, pode ocorrer produção de anticorpos contra o antígeno D na sua forma completa. Habitualmente a identificação da causa que leva a expressão enfraquecida do antígeno não é feita, portanto dá-se preferência, ao uso do sangue Rh negativo para os pacientes Rh fraco. Caso, indivíduos que apresentem sangue do tipo Rh- doem para indivíduos do tipo Rh+, nada acontece, pois as hemácias Rh- não apresentam antígeno. No caso de indivíduos com tipo sanguíneo Rh+ doarem sangue para indivíduos do tipo Rh- ele estará entregando uma proteína estranha (fator Rh), logo, no soro do receptor pode haver anticorpos, podendo resultar na aglutinação do sangue. 61 5.1.2 Eritroblastose fetal A Eritroblastose fetal ou doença hemolítica do recém-nascido é causada pela incompatibilidade sanguínea do Fator Rh entre o sangue materno e o sangue do bebê. Isso ocorre quando a mãe tem Rh-, o pai apresenta Rh+ e o filho também apresenta Rh+. Na primeira gestação não há maiores problemas, mas o organismo materno passa a produzir anticorpos anti- Rh contra o Rh+, que em uma segunda gestação poderá levar o feto a óbito. A doença sempre ocorrerá quando a mãe Rh- estiver gerando um filho Rh+. Nos últimos meses de gravidez, a criança comprime o abdômen da mãe. A placenta é o órgão presente na maior parte dos mamíferos, por meio do qual ocorrem as trocas de substâncias entre mãe e filho, normalmente
Compartilhar