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UNIDADE I
Introdução: conceito, objeto e método da Psicopatologia
	A psicopatologia é o estudo organizado e metódico do psiquismo humano, sob a perspectiva de um transtorno mental. Psicopatologia contém a palavra grega pathos. Embora em sua origem pathos possua vários significados, dois conceitos, bastante diferentes, interessam-nos sobremaneira: o passional, a paixão a passividade; e o patológico, a doença, presente no diagnóstico médico. A fronteira que separa estas duas perspectivas é frágil e varia de acordo como as épocas e as civilizações.
Estas duas posições, aqui resumidamente apresentas, suscitam profundas e decisivas questões ético-ideológico-econômicas ligadas à noção de psicopatologia e, conseqüentemente, ao que entendemos por saúde mental e como abordar a questão. Se, para uma posição, deve-se entender o pathos para tirar proveito dele, na outra, ele deve ser destruído por tratar-se de uma doença. É nesta perspectiva que se defende que subjugado por uma paixão - o crime passional, por exemplo - a culpabilidade do sujeito fica reduzida. Já a outra posição, que vê as paixões como constitutivas do ser humano e defende a necessidade de integrá-las, sustenta que todo adulto normal deve ser responsável por suas paixões e arcar com as conseqüências de seu mau uso. 
Na contemporaneidade, a linha que separa os dois conceitos de pathos - o passional e o patológico - tem-se mostrado cada vez mais tênue. Observa-se um crescente deslocamento do domínio da ética para o da terapêutica. A partir do momento em que as raízes do comportamento do indivíduo encontram-se nas pulsões cuja origem ele ignora, a paixão passa a ser entendida como um estrangeiro-interno que, em vez de ser integrado à vida do sujeito - posição ética – é submetido a um procedimento que visa exorcizá-la - posição terapêutica. Tratar as paixões significa, neste contexto, considerá-las patológicas, isto é, não mais entendê-las como parte do indivíduo com as quais ele tem que se haver, mas, sim, como algo perturbador que foge completamente a seu controle. O radical pathos, que quase invariavelmente envia à concepção médica de doença, é a expressão mais vulgar que ele adquiriu na concepção do homem comum. É interessante observar que a definição de "alienado" segue esta mesma linha. O individuo apaixonado não é mais culpabilizado, mas tratado como doente: cada vez mais a terapêutica ocupa o lugar da ética; o desvio, o lugar do erro; e a cura, o do castigo. O que se depreende de tudo isso é que a exigência de normalidade é cada vez maior embora o delito não seja mais imputado a uma incapacidade de controlar as paixões, ao pathos/passional, mas, antes, a uma doença, ao pathos/patologia.
O aparecimento da Psicopatologia como disciplina organizada, marcando ao mesmo tempo o rompimento com a psiquiatria do séc. XVIII, se dá com a publicação da Allgemaine Psychopathologie (Psicopatologia Geral) de Karl Jaspers no início do século XX. 
Hoje, o termo "psicopatologia" encontra-se associado a um grande número de disciplinas que se interessam pelo sofrimento psíquico. Isso trouxe um problema tanto do diálogo intercientífico entre as diferentes abordagens epistemológicas de cada uma destas disciplinas, quanto da confrontação crítica dos modelos por elas utilizados, o que evidencia a irredutibilidade do fenômeno psíquico a uma única forma discursiva. A área da saúde mental, seja na clínica privada, nos hospitais ou nas instituições, é particularmente suscetível às conseqüências, por vezes catastróficas, do confronto das diferentes compreensões clínico-teóricas do pathos.
A tentativa mais conhecida para superar os impasses criados pela pluralidade de abordagens tem o seu expoente máximo no DSM-IV (Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Psiquiátrica Americana), que propõe oferecer uma definição empiro-pragmática das entidades nosográficas . Nele busca-se, acima de tudo, "o ideal de um acordo mínimo com relação à delimitação formal e operacional das categorias diagnósticas empregadas". Objetiva-se a criação de uma nomenclatura única que forneça uma linguagem comum a pesquisadores e clínicos de diferentes orientações teóricas. Esta mesma ideologia está presente no igualmente reputado CID-1O (Classificação Internacional de Doenças). 
Esta abordagem empírico-pragmática das entidades psicopatológicas reivindica elaborar, unicamente a partir da observação direta dos fenômenos em questão, um sistema de classificação independente de qualquer a priori teórico. Isso significa deixar de lado os problemas etiológicos e centrar-se na nosografia. A grande crítica que se faz a esta abordagem é o fato de não levar em conta a subjetividade tanto daquele que está sendo "classificado" quanto daquele que classifica: o olhar de quem olha não é imune à sua própria organização subjetiva.
A isso vem juntar-se o desenvolvimento das neurociências e, sobretudo, o espantoso crescimento dos psicofármacos, que reforça a idéia da origem biológica dos transtornos psíquicos. Nesta perspectiva, não é exagerado supor que, num futuro não muito distante, poder-se-á tratar um determinado transtorno psíquico sem a ajuda da psicopatologia em suas múltiplas vertentes. Ou seja, sem que seja necessário conhecer os aspectos subjetivos, os conflitos interiores e as experiências psíquicas do sujeito: bastará conhecer o uso das moléculas químicas.
É na pluralidade das psicopatologias que surge a Psicopatologia Fundamental, termo proposto em meados dos anos 80s por Pierre Fedida. A preocupação central da Psicopatologia Fundamental é de contribuir para a redefinição do campo do psicopatológico, propondo uma reflexão crítica dos modelos existentes e uma discussão dos paradigmas que afetam nossos objetos de pesquisa, nossas teorias e práticas. Isso significa que a Psicopatologia Fundamental reconhece e dialoga com as outras leituras presentes na polis psicopatológica. 
A Psicopatologia Fundamental é um projeto de natureza intercientífica onde a comparação epistemológica dos modelos teórico-clínicos e de seus funcionamentos propiciaria a ampliação do limite e da operacionalidade de cada um destes modelos e, consequentemente, uma transformação destes últimos. Tal projeto levaria à construção de um espaço teórico-clínico, com fundamentos próprios, que permitiria a coexistência, o diálogo e o intercâmbio, dos diferentes modelos conceituais - neurociências, imunologia, farmacologia, oncologia e outros tantos - que lidam com o pathos. 
Entretanto, é importante frisar que não se trata de uma interdisciplinaridade, mas, antes, de uma transdisciplinaridade, pois, campos diferentes, cada qual com métodos, procedimentos e objetivos que lhe são próprios não se comunicam facilmente.
 A transdiciplinaridade reune, em uma ampla rede de significações, os conhecimentos específicos e singulares de cada modelo em torno de uma concepção ética comum. Trata-se de resgatar o pathos, como paixão, e escutar o sujeito que traz uma voz única a respeito de seu pathos transformando aquilo que causa sofrimento em experiência, em ensinamento interno. Cria-se, então, um discurso sobre as paixões, sobre a passividade, sobre o sofrimento, enfim, sobre o sujeito trágico. Encontramos aqui a essência de "Psicopatologia": o conhecimento, a razão - o logos - a respeito do pathos, da paixão, do sofrimento. O pathos, em si, nada ensina não conduzindo senão à morte. Quando a experiência é, ao mesmo tempo, terapêutica e metapsicológica, estamos no âmbito da Psicopatologia Fundamental. 
Entretanto, é devido a esta experiência única e compartilhada, que a Psicopatologia Fundamental se distingue da Psicopatologia Geral: enquanto a última propõe um discurso classificatório sobre as doenças mentais, a primeira propõe um conhecimento do psiquismo através do pathos.
Na perspectiva da Psicopatologia Fundamental, o aparelho psíquico é um prolongamento do sistema imunológico; uma organização que se desenvolveu a fim de proteger o ser humano contra os ataques, tanto internos quanto externos, que punhamsua vida em perigo. Esta concepção está em filiação direta com as teses freudianas apresentadas em um de seus textos mais polêmicos, Neurose de transferência: uma síntese. Freud defende que a História da Humanidade - filogênese - é repetida a cada ser humano - ontogênese Com isso, Freud resgata a noção grega de pathos colocando-a como ingrediente central da essência do humano.
Freud inaugura um discurso sobre o pathos, uma psicopatologia, onde falar de normalidade, a não ser do ponto de vista estatístico, não faz mais sentido, pois um tal estado sem tensão - o nirvana - só seria alcançado com a morte do organismo. Nesta perspectiva, as neuroses passam a ser compreendidas como criações que garantiriam a sobrevivência da espécie contribuindo, ao mesmo tempo, para a construção do psiquismo humano. Isto significa que, para Freud, em Neuroses de transferência: uma síntese, as neuroses e as perversões são modos de subjetivação encontrados pelos sujeitos. Por outro lado, aquele que não alcança a subjetividade, que não responde ao pathos com a sua "psicopatologia individual", é levado ao extermínio. 
A proposta da Psicopatologia Fundamental é pensar a questão páthica como dimensão inerente do Ser. Trata-se de "criar" uma psicopatologia própria para cada sujeito, que lhe permita transformar em experiência as manifestações de seu pathos. 
Respeitar o princípio da voz única, da singularidade do pathos que constitui o sujeito que fala - proposta central da Psicopatologia Fundamental, como já foi dito - é uma outra maneira de tratar a questão da cidadania.
No entanto, falar de cidadania só faz sentido onde existe um compromisso social não apenas por parte daqueles engajados de maneira mais próxima com as Políticas de Saúde Mental, mas igualmente da sociedade como um todo. 
O respeito à singularidade tem, como contra-partida, oferecer um tratamento mais "personalizado" onde as particularidades das subjetivações ganham contornos mais nítidos. Isto implica a criação de uma estrutura elaborada pela e para a comunidade, mas, sobretudo, a viabilização de um espaço de convivência, que acolhe, cuida e possibilita a utilização de diversos recursos, não se focalizando na doença, e enfatizando um projeto de Invenção Social. 
Trabalhar nesta perspectiva é reconhecer a particularidade psíquica, assim como a genética, de cada um, e acreditar que o portador de um sofrimento psíquico possui um saber sobre o seu pathos. 
	 
UNIDADE II –
Saúde e doença, normal e anormal em Saúde Mental
         Do ponto de vista epistemológico, a dificuldade de conceituar saúde é reconhecida desde a Grécia antiga. A carência de estudos sobre o conceito de saúde propriamente definido parece indicar uma dificuldade dos paradigmas científicos dominante nos mais diversos campos científicos de abordar a saúde positivamente. Por outro lado, tal pobreza conceitual pode ter sido resultado da influência da indústria farmacêutica e de certa cultura da doença, que têm restringido o interesse e os investimentos de pesquisa a um tratamento teórico e empírico da questão da saúde como mera ausência de doença. Entretanto, a divisão do corpo humano, a tecnologização das práticas e a fragmentação do saber, com o surgimento das várias especialidades médicas, têm gerado reações contra a expropriação da saúde e, desde a década de 1970, vêm propiciando um movimento que busca ressuscitá-la como objeto científico. 
 Do ponto de vista das práticas e políticas de saúde, os sistemas de saúde do mundo ocidental, e, nele, do Brasil, têm sido questionados por sua dependência em relação a um modelo assistencial individualista, com ênfase na dimensão curativa da doença, além dos elevados custos e da baixa efetividade. Ganha força, então, a idéia de promover a saúde, e não apenas de curar a doença, emergindo daí os conceitos de vigilância da saúde, políticas públicas saudáveis e cidades saudáveis, articulados à noção de promoção da saúde pela mudança das condições de vida e de trabalho da população.
     Surgem, assim, propostas para uma nova política de saúde que estão centradas em uma formulação positiva de teoria e prática, buscando romper com concepções estabelecidas sobre o processo saúde-doença-cuidado. Com relação à noção de saúde, a pretensão tem sido de pensá-la positivamente, e não apenas como ausência de doença. Embora o conceito de promoção da saúde tenha surgido na década de 1940, com Sigerist (Mendes, 1996), ainda hoje essa perspectiva vem se sustentando, muitas vezes apenas no plano retórico e ideológico, visto que tanto as políticas e as ações quanto as pesquisas no campo da saúde têm-se pautado predominantemente pelo conceito de doença. 
1) Normalidade, rotulação e desvio no campo da sociologia 
     	A questão da normalidade tem ocupado uma posição de flagrante centralidade na sociologia, desde a sua constituição como disciplina científica. Um de seus fundadores, Émile Durkheim, afirmou que o objetivo principal de qualquer ciência da vida, seja ela individual ou social, é a definição e a explicação do estado normal, bem como a diferenciação do seu estado patológico. Posteriormente, as teorias sociológicas sobre o papel de doente e o rótulo, dominantes no campo das ciências sociais aplicadas à saúde nos anos 1950 e 1960, de certa forma buscaram realizar tal intento, ao explorar os fatores envolvidos na definição dos fenômenos normais e patológicos e suas implicações.
 	Centrada na categoria de doença, a teoria do papel de doente reafirmou a adequação do estado patológico às normas sociais. Ou seja, a enfermidade pode desviar o indivíduo do seu funcionamento biossocial normal, mas não consistiria em um desvio no sentido estrito de violação das normas da ação social. O doente teria um papel definido, que implicaria isenção das responsabilidades sociais, da impossibilidade do cuidado de si mesmo, do desejo de ficar bem e ter dever de procurar e cooperar com o tratamento médico. (Possuir uma condição enferma ou ocupar legitimamente a posição de doente não constituiria em si um comportamento desviante). Não se esperaria que as pessoas se abstivessem da condição de enferma, do mesmo modo como se esperaria que elas não cometessem um crime ou um pecado.    
 A teoria do rótulo, sistematizada nos Estados Unidos na década de 1960 (Goffman, 19), significou uma oposição à perspectiva parsoniana em dois aspectos: na consideração da enfermidade mental como desvio e na aceitação do papel de doente como iatrogênico. Segundo os teóricos do rótulo, a sociedade estabelece os meios de classificar as pessoas em categorias, de acordo com os seus atributos (Goffman, 19). Os sujeitos que apresentam atributos socialmente desejados são categorizados como normais, enquanto aqueles que possuem um ou mais atributos indesejáveis são considerados desviantes. 
    
     No que se refere à saúde mental, o psiquiatra é visto por essa teoria como o principal rotulador legitimado socialmente, embora outros profissionais possam confirmar ou até mesmo serem os únicos responsáveis pelo rótulo. O diagnóstico psiquiátrico implicaria uma poderosa operação de rotulação capaz de produzir um tipo especial de desvio secundário: a doença mental. O diagnóstico engendraria um estereótipo que orientaria a ação da sociedade no sentido de demandar dos 'desviantes' um comportamento 'louco', levando a que eles se comportem como tal. 
O desempenho ou não do papel de desviante teria como conseqüência a recompensa ou a punição. Com isso, os comportamentos se estabilizariam ao longo do tempo, e o indivíduo passaria a se comportar de um modo mais estranho e bizarro do que quando foi inicialmente rotulado. O resultado desse processo de legitimação foi denominado por Goffman (2005) de “carreira do doente mental", correspondendo a um complexo processo microssocial de reconhecimento, rotulação, estigmatização e institucionalização de sujeitos.
A polêmica em torno da questão de se a enfermidade é ou não um desvio das regras normativas parece superada, à medida querestringe a exploração e o entendimento da relação entre enfermidade e desvio. Nem toda enfermidade implica comportamentos desviantes, e vice-versa. Nesse sentido, uma enfermidade pode ou não ser considerada um desvio, a depender da natureza dos seus signos, do alcance individual e social do seu desenlace e de suas conseqüências e do sistema de valores e normas do grupo social no qual se insere o sujeito doente.
     Assim, a aceitação do papel de doente não garante a saúde ou a doença. Nesse nível individual e microssocial, uma hipótese preliminar é a de que o resultado da interação entre o desejo do doente e a ação social daqueles com os quais ele convive mais diretamente será a manutenção da saúde ou a ocorrência de doença. Tomando a questão em um plano de referência para além do nível individual, deve-se considerar o imenso e intricado complexo de fatores em jogo nesse processo, desde os processos biológicos e os fatores ecossociais de exposição até os efeitos simbólicos e práticos sobre a sociedade. 
De todo modo, tanto na teoria do papel de doente quanto na teoria da rotulação identifica-se o suposto implícito de que, de alguma maneira, todos somos doentes, e que a saúde resultaria de uma interação social com alto grau de esforço para sua manutenção da realidade. Enquanto a saúde se caracteriza pela abertura às modificações e pela instituição de novas normas de saúde, o patológico corresponde à impossibilidade de mudança e à obediência irrestrita às normas. Sendo a normatividade uma dimensão da saúde, cada indivíduo tem, para si mesmo, sua própria concepção de saúde. Se a fronteira entre saúde e doença é imprecisa para indivíduos diferentes considerados simultaneamente, ela tampouco é precisa para um único indivíduo considerado sucessivamente, pois a fronteira pode variar ao longo do tempo, e o que é normal, em uma situação, pode se tornar patológico, em outra. Além disso, a saúde implica o adoecimento e a saída do estado patológico, se a possibilidade de testar a saúde pela doença fosse eliminada, o ser humano não teria mais a segurança de ser saudável.     Tal proposição possui implicações éticas e políticas de longo alcance. A exclusão dos estados temporários de doença do conceito tradicional de saúde poderia justificar o surgimento de propostas eugenistas de criação de uma sociedade totalmente saudável e sem diferenças. 
     Essa nova concepção rompe com a visão, característica do século XIX, de saúde como adequação a uma norma, a um modelo predefinido. A saúde passa a expressar diferentes padrões e deixa de se limitar à perspectiva da adaptação. Em algumas situações, ela pode ser veiculada, justamente, pelo que foi definido convencionalmente como signo de doença. 
     Ao mesmo tempo em que se diferenciou qualitativamente saúde e doença, estabeleceu-se uma distinção original entre normalidade e saúde. A normalidade, como norma de vida, constitui uma categoria mais ampla, que engloba saúde e patologia como distintas subcategorias. Tanto saúde quanto doença situam-se no âmbito da normalidade, pois ambas implicam certa norma de vida. Nesse sentido, o patológico não é o contrário lógico do conceito de normal, mas sim o contrário vital de sadio. A saúde é uma normalidade, tanto quanto a doença. O aspecto comum a essas diferentes manifestações normais da vida é a presença de uma lógica, de uma organização própria, de uma norma.
Essas proposições nos levam a uma reformulação da prática clínica da medicina. Nessas bases, o diagnóstico e o tratamento deveriam estar calcados, sobretudo na observação do doente, e não nas modernas técnicas de exame. Eles podem até mesmo contrariar o resultado dos exames. A perspectiva do doente deve ser privilegiada, pois ela antecede o saber científico. A terapêutica deve respeitar o novo modo de vida instaurado pela doença, não agindo intempestivamente no sentido do retorno ao normal. Além do mais, a cura não implica necessariamente saúde. A cura pode estar mais próxima da doença ou da saúde se, na estabilidade que ela proporciona, encontra-se ausente ou presente uma abertura às modificações.
          Em termos práticos, será preciso promover todas 'saúdes', planejando-se políticas e concretizando programas e serviços capazes de gerar bem-estar e de evitar riscos, tanto para os indivíduos quanto para os grupos sociais, respeitadas as condições de contexto social e sanitário tanto quanto a autonomia e a capacidade de criação dos sujeitos históricos.
UNIDADE III –
Elementos de diagnóstico em psicopatologia
Desde os primórdios da psicanálise, Freud (1904/1948e) reconheceu a importância do estabelecimento de um diagnóstico provisório antes do início efetivo do tratamento. 
Pensamos que a atual desvalorização do diagnóstico da personalidade resulta de uma confusão entre os conceitos de método e técnica. 
Em resumo, se a unicidade do método for confundida com unicidade de técnica, não existirá, realmente, sentido na elaboração do psicodiagnóstico. Por outro lado, se o método psicanalítico tiver que se conformar a diferentes procedimentos técnicos e estratégias de atendimento, não poderemos abrir mão do diagnóstico. Cabe, neste momento, para dar continuidade a nosso pensamento, esclarecermos o que entendemos por psicodiagnóstico. Consiste o psicodiagnóstico na realização de discriminações que visam, primordialmente, orientar intervenções psicoterapêuticas e psicoprofiláticas. Ou seja, a nosso ver, o psicodiagnóstico só tem sentido no contexto de uma prática psicológica, pois existe um vínculo essencial entre o tipo de discriminação diagnóstica apreendida e o tipo de operação interventora que se pretenda aplicar à questão. Tanto é absurdo utilizar, na clínica psicológica, distinções que orientam outras práticas, médicas ou religiosas, como entender que outros agentes, operando a partir de diferentes perspectivas de entendimento, adotem nossas discriminações. Qualquer conclusão diagnóstica, seja psicológica, psiquiátrica ou qualquer outra, é significativa apenas no âmbito de uma certa operatividade, teoricamente orientada, postura que evita, inclusive, o uso fetichizado do diagnóstico. Sabemos que é este tipo de uso, baseado na crença a respeito da possibilidade de uma afirmação essencial sobre o ser humano, que legitima rotulações e práticas segregacionistas mais ou menos disfarçadas. Em outras palavras, considerar qualquer diagnóstico desvinculadamente das condições de sua produção resulta em duplo equívoco, ético e epistemológico, que pode gerar conseqüências humanamente lamentáveis.
De nossa parte, propomos enfaticamente a consideração do psicodiagnóstico como tentativa de apreensão de aspectos da realidade intersubjetiva a partir do reconhecimento das limitações inerentes às condições mentais humanas do pesquisador. Pensamos que esta é uma postura baseada em pretensões mais realistas, podendo resultar em maior eficácia clínica. Evidentemente, nesta concepção do psicodiagnóstico como orientação para certos tipos de intervenções, que guardam em comum o fato de sempre se realizarem em termos simbólicos, ao nível psicológico de organização do fenômeno da vida (Bleger, 1977), encontramos diferentes práticas. 
Lembramos que esta idéia é, no nosso entender, uma das mais valiosas contribuições da psicanálise, pelo fato de enfatizar a importância do ambiente, mais precisamente das experiências emocionais em tenra idade, para a formação da personalidade do ser humano. Está presente na obra de Freud (1917/1948c), em suas considerações referentes às três séries complementares, a saber, fatores hereditários e constitucionais, experiências infantis e fatores desencadeantes ou atuais, cuja interação complexa seria responsável pela etiologia das neuroses. Embora, ao desenvolver sua metapsicologia baseada na teoria pulsional, Freud trouxe uma contribuição original por maximizar o valor dos acontecimentos vitais, ou seja, nos termos de Bleger (1977), da dramática humana, para a compreensão do fenômeno psíquico.
Assim, qualquer que seja a psicopatologiaenvolvida, um atendimento psicoterápico embasado no método psicanalítico, que considere as características estruturais da personalidade do paciente, pode aliviar o sofrimento psíquico e facilitar a atualização de potencialidades. Aliás, é muitíssimo importante salientar que, no nosso entender, a estrutura de personalidade deixa de ser, no plano concreto da temporalidade de cada um, mutável, porque, em última instância, ela expressa posições libidinais e localizações tópicas do sujeito, as quais, fixadas na infância, passam a se constituir como determinações. Na prática clínica, as estruturas podem manter-se, mas seu funcionamento pode ser transformado. Por outro lado, as organizações limítrofes podem chegar a se estruturar verdadeiramente.
A psicanálise destaca-se de outros enfoques psicopatológicos na medida em que distingue o plano sintomatológico, que pertence ao registro descritivo, superficial e manifesto, do plano latente da estrutura de personalidade, que diz respeito a angústias, defesa e fantasias não diretamente acessíveis à consciência. 
Desta feita, os sintomas são considerados de modo bastante relativizado, acreditando-se que qualquer estrutura de personalidade pode apresentar qualquer tipo de sintoma, neurótico ou psicótico, em virtude de todos os seres humanos partilharem todos os tipos de situações de ansiedade, como já apontava Freud (1926/1948a). Fundamental é o contexto de personalidade no qual o sintoma tem lugar, da mesma forma que este contexto orientará primordialmente as intervenções psicoterápicas ou psicoprofiláticas a serem desenvolvidas, com vistas a permitir a cada estrutura encontrar sua melhor realização. Não se menospreza, contudo, o valor da discriminação sintomatológica psiquiátrica, a partir da qual eventuais medidas devem ser tomadas, em caráter de urgência, para a preservação da integridade e da vida. Trata-se, entretanto, de prática que, sendo desenvolvida por outro profissional, o psiquiatra clínico, não se confunde com as intervenções psicológicas propriamente ditas, a cargo do psicoterapeuta.
Psicanaliticamente falando, pensa-se que, no plano mais profundo da personalidade, cada estrutura é produto do alcance e da realização de determinadas etapas do desenvolvimento psicoemocional. Entende-se, assim, que a estrutura psicótica seja resultado do enfrentamento de frustrações bastante precoces, numa fase da vida em que não foi suficientemente alcançada e consolidada a integração da personalidade, a diferenciação eu/não-eu e estabelecidas relações objetais. 
O sintoma neurótico expressa, portanto, o conflito entre a censura psíquica e o desejo sexual inconsciente, constituindo-se como um compromisso entre ambos. A angústia de base, reverso do desejo, é, neste caso, a de castração, que, simbolicamente implicaria na perda de acesso ao prazer, temido e desejado.
Resumindo, cada uma das estruturas pode se apresentar compensada ou descompensada, enquanto as organizações, pela sua labilidade e pelo desgaste emocional que custam, nunca estão, rigorosamente falando, realmente compensadas, ainda que possam passar por períodos de sofrimento mais ou menos agudo.
O psicodiagnóstico estrutural psicanalítico vem a ser, portanto, a discriminação da estrutura/organização de base da personalidade, a partir da qual diferenciamos, em um primeiro momento, se estamos, ou não, diante de psicopatologia resultante, essencialmente, de deficiências ambientais, para, a seguir, diferenciarmos, excluída a possibilidade de estruturação neurótica, a magnitude e momento desenvolvimental de ocorrência da falha básica. Discrimina-se a estrutura/organização em pauta por meio do exame de alguns critérios metapsicológicos, a partir dos quais, segundo se supõe, esta ou aquela se configura ao longo da história e do desenvolvimento individuais. São eles: a angústia organizadora, as modalidades de relação objetal predominantes, as técnicas defensivas mais intensa e freqüentemente utilizadas e o grau do desenvolvimento egóico e pulsional. Trata-se, como é possível notar, de critérios passíveis de apreensão tão somente na relação transferencial, vale dizer, no contato intersubjetivo peculiar que o enquadre psicanalítico oferece, de modo a possibilitar produção de conhecimento sobre o analisando. Como é sabido, a compreensão e o manejo da transferência exigem certa perícia por parte do profissional, resultante tanto de sua formação teórica, como de sua experiência pessoal de análise.
Acreditamos que o campo transferencial pode se configurar em qualquer tipo de contato clínico, isto é, durante entrevistas psicoterapêuticas, psicoprofiláticas ou psicodiagnósticas, as quais podem incluir o emprego de métodos projetivos. Tais procedimentos facilitam, em apreciável medida, o trabalho psicodiagnóstico justamente quando são usados para o desvelamento da relação transferencial estabelecida, com a vantagem, não dispensável para profissionais iniciantes, de serem facilmente supervisionáveis.
UNIDADE IV
Funções psíquicas: consciência, atenção, sensopercepção tempo-espaço, memória, afetividade, vontade, pensamento, consciência do Eu e inteligência.
1. Consciência
Para designar quadros em que há um rebaixamento do nível da consciência são empregados termos tão diferentes quanto obnubilação, embotamento, entorpecimento, ofuscamento, turvação,perturbação e obtusão da consciência; embriaguez; torpor; sonolência; pré-coma; estado para-sônico, onírico e oniróide; confusão mental; onirismo; alucinose aguda; e amência. Estupor, estado crepuscular e delírio (delirium) também são usados, apesar de representarem, para a maioria dos autores, abolição da psicomotricidade, estreitamento da consciênciae uma síndrome, respectivamente. 
Vários autores empregam diversos termos para designar diferentes níveis de rebaixamento de consciência, só que o fazem de forma não-uniforme. Entre a lucidez e o coma, de um grau menor para um maior de rebaixamento, teríamos: embotamento, sonolência e sopor; sonolência, obnubilação e delirium; obnubilação, sonolência, estupor e pré-coma; embotamento (ou obnubilação simples), estado crepuscular e confusão; obnubilação e sopor; obnubilação, confusão mental e torpor; turvação e sonolência; obnubilação, sonolência e torpor; obnubilação e sonolência; ou leve, moderado, intenso e estuporoso. 
Também se encontra com freqüência nos livros de psicopatologia uma classificação qualitativa, considerando se, paralelamente ao rebaixamento da consciência, há ou não sintomas psicóticos, como delírios e alucinações. No primeiro caso, ou seja, quando ocorre sintomatologia produtiva, são utilizadas as seguintes expressões: obnubilação, obnubilação acompanhada de onirismo, obnubilação delirante, estado confusional, turvação, delírio, turvação oniróide, estado oniróide, estado onírico ou oniróide, alteração oniróide da consciência e onirismo. E no segundo caso, ausência de sintomatologia produtiva, as expressões adotadas são: entorpecimento, obnubilação simples, obnubilação, embotamento,15 torpor e confusão mental simples. Como se vê, o termo obnubilação, dependendo do autor, é usado num ou no outro sentido, podendo ser o oposto de entorpecimento ou, alternativamente, o oposto de estado confusional. 
Alguns autores falam em elevação do nível da consciência, hiperlucidez, hipervigilância, ou hiperfrenia. Trata-se de um quadro caracterizado por hipermnésia evocativa, maior alerta, aumento da intensidade das percepções, hiperatividade e exaltação do humor, que ocorre na mania, na intoxicação por estimulantes ou alucinógenos, em algumas auras epilépticas e no início da esquizofrenia. Todavia, um nível de consciência acima do normal é meramente uma possibilidade teórica, não observada empiricamente. De acordo com esse autor, se ocorre um incremento de algumas funções psíquicas, ao mesmo tempo há um claro prejuízo em outras: observa-se diminuição da capacidade de concentração, hipomnésia de fixação, incoerência, desorganização da conduta e hipopragmatismo. 
2. Atenção 
Descrevem-sedois aspectos da atenção: a tenacidade e a vigilância. A tenacidade, ou capacidade de concentração, é a capacidade de manter a atenção em um determinado objeto por certo tempo. A vigilância é a capacidade de a qualquer momento desviar a atenção de um objeto para um outro. Tenacidade e vigilância são qualidades opostas: se uma aumenta, a outra tende a diminuir de intensidade. Surge aqui, contudo, uma dificuldade, pois o termo vigilância também é utilizado com outro significado, correspondendo à definição neuropsicológica de consciência. Estar vigilante é estar desperto, lúcido, ter a consciência clara. 
O termo hiperprosexia tem sido utilizado com dois significados diferentes e oposto: para designar quadros de hipertenacidade e hipovigilância, e quadros de hipotenacidade e hipervigilância. No primeiro caso, são empregadas ainda as expressões despolarização da atenção, distração, absorção, pseudo-aprosexia e estreitamento da atenção, Já no segundo caso, em que há um excesso de mobilidade da atenção, as expressões adotadas são labilidade da atenção, instabilidade da atenção, distração e distraibilidade.
 3. Sensopercepção 
A pareidolia consiste numa imagem (fantástica e extrojetada) criada intencionalmente a partir de percepções reais, a partir de elementos sensoriais incompletos ou imprecisos. Por exemplo: ver figuras humanas, cenas, animais, objetos, etc, em nuvens, em manchas ou relevos de paredes, no fogo, na Lua, etc; ou "ouvir" sons musicais com base em ruídos monótonos. Nesses casos, o objeto real passa para um segundo plano. Apesar de a pareidolia ser incluída por diversos autores entre as formas de ilusão, diferencia-se desta, pelo fato de o indivíduo estar todo o tempo consciente da irrealidade da imagem e de sua influência sobre ela. 
Há três espécies de vivências alucinatórias: as alucinações verdadeiras, as pseudo-alucinações e as alucinoses. As pseudo-alucinações distinguem-se das alucinações verdadeiras pela ausência de corporeidade e localização no espaço subjetivo interno, o que as torna mais semelhantes às imagens representativas do que às perceptivas. Ainda de acordo com esta descrição, a crença na realidade do fenômeno é a mesma observada nas alucinações verdadeiras. Todavia, o conceito de pseudo-alucinações é controverso e, poderia haver crítica por parte do paciente. Além disso, muitos psiquiatras empregam o termo pseudo-alucinação com outros significados, como, por exemplo, referindo-se a certas experiências sensoriais em quadros dissociativos histéricos. 
Nas alucinoses, a imagem é percebida no espaço objetivo externo, mas, ao contrário das alucinações verdadeiras, é adequada e imediatamente criticada pelo indivíduo, que reconhece o fenômeno como patológico. Elas ocorrem sob lucidez de consciência, sendo também chamadas de alucinações neurológicas, já que estão relacionadas a distúrbios de origem orgânica. O mesmo termo alucinose, porém, é usado com significado bem diverso. Foi introduzido para designar delírios alucinatórios agudos e crônicos. Um exemplo desse tipo de condição é a categoria nosológica alucinose alcoólica, na qual em geral não há crítica por parte do enfermo em relação às vivências alucinatórias (auditivas), as quais constituem, portanto, alucinações verdadeiras e não alucinoses. 
4. Memória 
A fabulação (ou confabulação) foi descrita por Korsakoff, mas tal denominação foi dada por Kraepelin. Ela é observada em quadros clínicos nos quais há um importante déficit de memória, como a síndrome de Korsakoff e a demência, e consiste no preenchimento de lacunas de memória com falsas recordações, as quais são tidas pelos doentes como verdadeiras. A alucinação de memória, por sua vez, é definida como a recordação de algo que de fato não ocorreu. Trata-se de uma falsa lembrança, produzida pela imaginação do paciente. Pode ocorrer na esquizofrenia e em outros transtornos psicóticos, em virtude da atividade delirante. Já o termo paramnésia é utilizado em dois sentidos. Ele pode ter um significado mais genérico, correspondendo ao conjunto de alterações qualitativas da memória. Neste caso, a fabulação é considerada uma forma de paramnésia. Mas, para outros autores, paramnésia é sinônimo de alucinação de memória. Dependendo do autor, a fabulação e a alucinação de memória são consideradas alterações psicopatológicas distintas; a fabulação representa um subtipo de alucinação de memória; ou a alucinação de memória está incluída entre as fabulações. Por fim, Pio Abreu distingue fabulação de confabulação, no que não é seguido; e Schneider não fala em paramnésia nem em alucinação de memória, preferindo o termo pseudomnésia.
 5. Linguagem 
Na esquizofrenia e na afasia sensorial eventualmente ocorre uma completa desorganização da linguagem, cuja sintaxe se torna inteiramente incoerente. Palavras reconhecíveis, em geral articuladas corretamente, são emitidas numa ordem caótica e ilógica, podendo ainda ser misturadas com neologismos, o que torna o discurso sem qualquer sentido, ininteligível. Aqui, encontramos um bom exemplo de uma mesma anormalidade psicopatológica que recebe múltiplas denominações: jargonofasia, esquizofasia, salada de palavras, confusão de linguagem, confusão de fala e paragramatismo. Sá fala ainda em glossolalia, termo em geral empregado em uma outra situação clínica: o indivíduo parece estar falando uma outra língua; ele produz sons ininteligíveis, porém mantém os aspectos prosódicos da fala normal. 
Para-respostas são respostas totalmente disparatadas em relação às perguntas. Por exemplo: "Qual é o seu nome?" - Resposta: "Acho que vai chover". São encontradas na esquizofrenia e na demência. Em alguns livros, recebem a denominação de para-respostas fenômenos bem diferentes do que foi descrito acima. O paciente, embora compreenda perfeitamente a pergunta e conheça a resposta correta, deliberadamente dá uma resposta errada, mas que está relacionada à pergunta. Por exemplo: "Quantos patas tem um cachorro?" - Resposta: "Cinco"; ou então: "Quanto dá o resultado da multiplicação '3 x 3'?" - Resposta: "10". Essas respostas aproximadas, designação adotada por alguns, ocorrem num quadro de pseudodemência (dissociativa) conhecido como síndrome de Ganser. 
6. Pensamento 
Diversos autores incluem entre as alterações do pensamento o roubo, a imposição, a divulgação e a sonorização do pensamento. Esta última, no entanto, é em geral classificada como um distúrbio da sensopercepção, enquanto que os demais sintomas costumam ser relacionados à consciência do eu. Esses quatro fenômenos não representam por si só alteração do curso, da forma ou do conteúdo do pensamento, embora possam se acompanhar de alterações do pensamento: a presença de alterações da consciência do eu implica em atividade delirante; e o roubo do pensamento leva a uma interrupção do curso. 
As descrições de pensamento desagregado, dissociado, incoerente confuso, descarrilado e disparatado, assim como de escapamento e de afrouxamento dos enlaces associativos são, na essência, idênticas. Há uma perda do sentido lógico na associação de idéias, com a formação de associações novas, que são incompreensíveis, irracionais e extravagantes. Como conseqüência, altera-se a sintaxe do discurso, que se torna incoerente, fragmentado e, muitas vezes, ininteligívelPor costume ou tradição, observa-se que, na prática, os termos desagregado, dissociado, descarrilado e disparatado são mais usados na esquizofrenia, enquanto que incoerente e confuso são empregados mais freqüentemente nos quadros de delirium.
 A prolixidade caracteriza-se por um discurso tedioso, repleto de detalhes irrelevantes, no qual a idéia-alvo jamais é alcançada ou só o é tardiamente. Decorre de uma incapacidade de síntese, de distinguir o essencial do acessório. Alguns autores, alternativamente, utilizam o termo circunstancialidade com o mesmo significado. Outros falam em circunstancialidade e em tangencialidade, que seriam subtipos de prolixidade ou alterações do pensamento distintas desta. 
 	A idéia sobrevalorada,que pode ocorrer em pessoas normais _ convicções políticas, científicas ou religiosas, por exemplo _ e ainda em alguns transtornos mentais _ como a hipocondria _ ganha preponderância em relação às demais e orienta unilateralmente a conduta. Os demais autores, via de regra, distinguem as idéias sobrevaloradas das deliróides, inclusive Alonso Fernández que, porém, afirma que algumas idéias sobrevaloradas, aquelas em que há um grau de convicção maior, poderiam ser classificadas como idéias deliróides. 
7. Vontade 
Os termos hipobulia e abulia são amplamente utilizados nos textos de psicopatologia, com o significado de diminuição (e abolição) da energia, do sentimento de força, do vigor, da motivação, da espontaneidade, da iniciativa e da capacidade de decisão. Hipobulia e abulia são associados a vários transtornos mentais, especialmente à depressão. Contudo, o termo hiperbulia é menos freqüentemente encontrado e é definido de forma heterogênea: como aumento da "força de vontade" ou persistência, da capacidade de decisão, dos impulsos ou do sentimento de força. Se hipobulia e hiperbulia são opostos, seria esperado que esta fosse associada à síndrome maníaca, o que porém só Sá e Roxo fazem. 
8. Psicomotricidade 
Diversos autores consideram flexibilidade cerácea e catalepsia como sinônimos. Porém, para outros, há uma clara distinção: embora em ambos os fenômenos haja rigidez muscular, somente no caso da flexibilidade cerácea essa rigidez é facilmente vencida. A catalepsia representa uma estereotipia de posição, posição esta que a doente espontânea e ativamente mantém. Já na flexibilidade cerácea, o examinador coloca um segmento do corpo do paciente, - um membro, a cabeça ou o tronco - nas mais diversas posições e o paciente irá manter passivamente a postura corporal por bastante tempo, mesmo que esta seja desconfortável. O corpo do paciente é amoldável, como se fosse de cera. Em muitos livros de psicopatologia publicados em português, ao invés de cerácea _ adjetivo relativo a cera _, encontramos o termo "cérea", o qual, como nos alerta Nobre de Melo, não pertence à nossa língua. Diferentemente dos demais, Leme Lopes classifica a flexibilidade cerácea como uma forma de catalepsia 
9. Afetividade 
Vários autores restringem a definição de hipertimia a uma alegria (ou irritabilidade) patológica, como a que ocorre na síndrome maníaca, reservando para os estados depressivos o termo hipotimia. “Contudo, hipertimia e hipotimia correspondem, respectivamente, ao aumento e à diminuição da intensidade e duração dos afetos e, coerentemente com essas definições, o termo hipertimia seja o mais adequado para designar um estado de exaltação afetiva, seja para o pólo da alegria ou para o pólo da tristeza. 
10. Consciência do eu 
A consciência da existência do eu, conceito criado por Schneider, foi considerada por Jaspers como um subtipo da consciência da atividade do eu. Vários psicopatólogos falam em diminuição da consciência da existência do eu, que é relacionada à depressão e à esquizofrenia. 
O termo transitivismo, em geral é usado para designar uma alteração da consciência dos limites do eu em que o indivíduo atribui vivências que na verdade são suas - como sentimentos, pensamentos, ou alucinações - a uma outra pessoa ou a um animal. 
Como vimos,m diferentes termos são utilizados para designar um mesmo conceito. Exemplos disso foram: jargonofasia, esquizofasia, salada de palavras, etc.; prolixidade e circunstancialidade; transitivismo e projeção. Ocorre o mesmo em relação aos estados de rebaixamento da consciência, aos distúrbios qualitativos da atenção e aos distúrbios formais do pensamento em que há perda do nexo lógico entre as idéias. Os distúrbios qualitativos da atenção são aqueles em que a tenacidade e a vigilância se alteram em sentidos opostos. Um dos termos empregados para caracterizar a situação de hipervigilância com hipotenacidade é "distraibilidade", palavra esta que não existe na língua portuguesa. Quando aos estados de diminuição do nível da consciência são classificados em função da presença ou não de sintomas psicóticos, também não há uma uniformidade terminológica. No entanto, parece ser útil uma classificação dos quadros de delirium com base em sua expressão fenomenológica, pois se acredita que haja algum tipo de relação entre esta e a sua etiopatogenia. 
Por outro lado, também acontece de um mesmo termo ou expressão psicopatológica ser usado com significados diferentes, como são os casos de obnubilação, vigilância, hiperprosexia, distração, pseudo-alucinação, alucinose, paramnésia, para-resposta, idéia deliróide, hipertimia e transitivismo. O termo hiperprosexia poderia ser excluído do vocabulário psicopatológico, não só em função de sua ambigüidade, mas também porque ele só seria adequado para designar estados em que houvesse um aumento global da atenção, o que não é possível na prática, pois tenacidade e vigilância (mobilidade da atenção) nunca se encontram simultaneamente exacerbadas. 
Faltam universalidade e uniformidade a alguns dos mais importantes conceitos e termos da psicopatologia descritiva. Comparando-se importantes textos, observa-se que: um mesmo termo é utilizado com diferentes sentidos pelos diversos autores; determinados conceitos são considerados por alguns autores, mas ignorados por outros; e um mesmo conceito é designado por termos diferentes. Essa falta de consenso, que afeta alguns dos principais tópicos em psicopatologia, irá inevitavelmente se refletir em qualquer discussão de um caso clínico, prejudicando qualquer argumentação, pela ausência de uma linguagem comum. Torna-se assim imperativo um estudo aprofundado das obras dos mais importantes autores em psicopatologia para que, a partir da observação do que há em comum entre elas e de suas divergências, possa ser produzida uma síntese e uma revisão crítica dos principais conceitos e se alcance uma maior uniformização da terminologia
Unidade V –
Principais transtornos em Psicopatologia – etiologia, diagnóstico e tratamento
Os distúrbios da saúde mental (psiquiátricos) envolvem as alterações do pensamento (raciocínio), das emoções e do comportamento. Esses distúrbios são causados por interações complexas entre influências físicas, psicológicas, sociais, culturais e hereditárias. 
Na medicina, a classificação das doenças muda constantemente, à medida que o conhecimento avança. De modo similar, na psiquiatria, o conhecimento da função cerebral e como ela é influenciada pelo ambiente e por outros fatores vem se tornando cada vez mais sofisticado. Apesar dos avanços, o conhecimento dos intricados mecanismos envolvidos no funcionamento cerebral encontra-se ainda no início. Entretanto, como muitas pesquisas demonstraram que as doenças mentais podem ser diferenciadas entre si com um alto grau de confiabilidade, vêm sendo estabelecidos protocolos de diagnósticos cada vez mais refinados. Em 1952, a American Psychiatric Association publicou pela primeira vez o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-I). A edição mais recente – o DSM-IV – foi publicada em 1994. 
Foram realizados avanços nos métodos diagnósticos e, atualmente, existem diversas técnicas recentes de diagnóstico por imagem do cérebro, como a tomografia computadorizada (TC), a ressonância magnética (RM) e a tomografia por emissão de pósitrons (TEP), um tipo de escaneamento que mede o fluxo sangüíneo em áreas específicas do cérebro. Essas técnicas de diagnóstico por imagem vêm sendo utilizadas no mapeamento de estrutura e funções do cérebro em indivíduos com comportamento normal e anormal, provendo aos cientistas uma maior compreensão de como o cérebro funciona em indivíduos com e sem doença mental. As pesquisas que conseguiram diferenciar um distúrbio psiquiátrico de outro levaram a uma maior precisão diagnóstica. 
A maioria dos métodos de tratamento psiquiátrico pode ser categorizada como somáticos ou psicoterapêuticos. Os tratamentos somáticos incluem as terapias medicamentosas e eletroconvulsivantes.Os tratamentos psicoterapêuticos incluem a psicoterapia (individual, em grupo ou familiar), as técnicas de terapia comportamental (como os métodos de relaxamento e a hipnose) e a hipnoterapia. Muitos distúrbios psiquiátricos dependem de uma combinação de terapia medicamentosa e psicoterapia. De fato, muitos estudos sugerem que, para os principais distúrbios psiquiátricos, uma abordagem terapêutica que inclua tanto medicamentos quanto a psicoterapia é mais eficaz que qualquer um desses métodos terapêuticos utilizado isoladamente. 
1)Tratamento Medicamentoso 
Durante os últimos quarenta anos, foram desenvolvidos vários medicamentos psiquiátricos de eficácia comprovada e amplamente utilizados pelos psiquiatras e outros médicos. Freqüentemente, esses medicamentos são categorizados de acordo com o distúrbio para o qual foram prescritos inicialmente. Por exemplo, os antidepressivos (p.ex., imipramina, fluoxetina e bupropiona) são utilizados no tratamento da depressão, enquanto que os antipsicóticos (p.ex., clorpromazina, aloperidol e tiotixeno) são úteis no tratamento de distúrbios psicóticos como a esquizofrenia. Novos medicamentos antipsicóticos (p.ex., clozapina e risperidona), são úteis para alguns pacientes que não respondem a outros medicamentos antipsicóticos. Por sua vez, os medicamentos contra a ansiedade (ansiolíticos), como o clonazepam e o diazepam, são os indicados no tratamento dos distúrbios da ansiedade (p.ex., síndrome do pânico e fobias). Os estabilizadores do humor (p.ex., lítio e carbamazepina) vêm sendo utilizados com algum êxito em pacientes com doença maníaco-depressiva. 
2)Terapia Eletroconvulsivante 
Na terapia eletroconvulsivante, eletrodos são fixados à cabeça do paciente e é realizada uma série de descargas elétricas no cérebro visando induzir convulsões. Já foi claramente demonstrado que esse procedimento é o mais eficaz para a depressão grave. Ao contrário do que é propagada pelos meios de comunicação, a terapia eletroconvulsivante é segura e raramente causa qualquer complicação grave. O uso moderno de anestésicos e miorrelaxantes (relaxantes musculares) reduziram enormemente qualquer tipo de risco para o paciente. 
3)Psicoterapia 
Nos últimos anos, têm sido obtidos avanços significativos no campo da psicoterapia. A psicoterapia é o tratamento que o terapeuta aplica ao paciente através de técnicas psicológicas, fazendo uso sistemático da relação terapeuta-paciente. Os psiquiatras não são os únicos profissionais da saúde mental especializados na prática da psicoterapia. Também estão incluídos os psicólogos clínicos, os assistentes sociais, os enfermeiros, alguns conselheiros religiosos e muitos profissionais paramédicos. No entanto, os psiquiatras são os únicos profissionais da saúde mental que podem prescrever medicamentos. Embora a psicoterapia individual seja praticada de muitas formas diferentes, quase todos os profissionais da saúde mental estão filiados a uma das quatro escolas de psicoterapia: a dinâmica, a cognitiva-comportamental, a interpessoal ou a comportamental. A psicoterapia dinâmica deriva da psicanálise e a sua base é ajudar o paciente a compreender as estruturas e padrões inconscientes que podem estar criando sintomas e dificuldades de relacionamento. A escola cognitiva-comportamental centraliza-se principalmente nas distorções do pensamento do paciente. A terapia interpessoal enfoca como uma perda ou uma alteração em uma relação afeta o paciente. A terapia comportamental visa ajudar os pacientes a modificarem as maneiras condicionadas de reagir a eventos que ocorrem ao seu redor. Na prática, muitos psicoterapeutas combinam técnicas, de acordo com as necessidades do paciente. A psicoterapia é adequada em uma grande variedade de condições. Mesmo os indivíduos que não apresentam qualquer distúrbio psiquiátrico podem considerar que a psicoterapia lhes é útil para enfrentar problemas como, por exemplo, dificuldades no trabalho, perda de um ente querido ou uma doença crônica na família. A psicoterapia de grupo e a terapia familiar também são amplamente utilizadas.
4) Hipnose e Hipnoterapia 
A hipnose e hipnoterapia vêm sendo cada vez mais utilizadas no tratamento da dor e de distúrbios físicos que possuem um componente psicológico. Essas técnicas podem promover o relaxamento e, conseqüentemente, reduzem a ansiedade e a tensão. Por exemplo, a hipnose e a hipnoterapia podem ajudar os indivíduos com câncer que, além da dor, apresentam ansiedade ou depressão.
 
PRINCIPAIS TRANSTORNOS
1) Depressão
O termo Depressão pode significar um sintoma que faz parte de inúmeros distúrbios emocionais sem ser exclusivo de nenhum deles, pode significar uma síndrome traduzida por muitos e variáveis sintomas somáticos ou ainda, pode significar uma doença, caracterizada por marcantes alterações afetivas. 
A sintomatologia depressiva é muito variada e muito diferente entre as diferentes pessoas. Para entendermos melhor essa diversidade de sintomas depressivos, vamos considerar que, entre as pessoas, a Depressão seria como uma bebedeira geral, onde cada pessoa alcoolizada ficasse de um jeito; uns alegres, outros tristes, irritados, engraçados, dorminhocos, libertinos... 
A psicopatologia recomenda como válida a existência de três sintomas depressivos básicos, os quais darão origem a variadíssimas manifestações desta alteração afetiva. Essa tríade sintomática da Depressão seria:
1 - Sofrimento Moral
2 - Inibição Global 
3 - Estreitamento Vivencial.
2)Depressão com Ansiedade 
Alguns deprimidos podem apresentar sintomas somáticos (físicos), juntamente ou ao invés dos sintomas emocionais de tristeza, angústia, medo, etc. Esses sintomas físicos podem ser, por exemplo, dores vagas e imprecisas, tonturas, cólicas, falta de ar, e outras queixas de caracterização clínica complicada. Outras pessoas podem manifestar sua Depressão com irritabilidade aumentada, como por exemplo, crises de raiva, explosividade, sentimentos exagerados de frustração, tendência para responder a eventos com ataques de ira ou culpando os outros.
Na Depressão também é muito freqüente certo prejuízo na capacidade de pensar, de se concentrar ou de tomar decisões. Os depressivos podem se queixar de enfraquecimento da memória ou mostrar-se facilmente distraídos. A produtividade ocupacional costuma estar também prejudicada, notadamente nas profissões intelectualmente exigentes. Em crianças deprimidas pode haver uma queda abrupta no rendimento escolar, como resultado da dificuldade de concentração.
Freqüentemente existem pensamentos sobre a morte nos quadros depressivos. Trata-se, não apenas da ideação suicida típica, mas, sobretudo, da preferência em estar morto a viver "desse jeito". Nos idosos as dificuldades de memória podem ser a queixas principal e ser confundido com os sinais iniciais de demência.
Atualmente tem-se enfatizado muito a teoria unitária, pela qual a Ansiedade e a Depressão seriam duas modalidades sintomáticas da mesma afecção. As atuais escalas internacionais de Hamilton para avaliação de Depressão e de Ansiedade, não separaram nitidamente os dois tipos de manifestações. Outras escalas anteriores também mostravam a mesma falta de clareza para diferenciação entre esses dois quadros emocionais. 
A tendência unitária Ansiedade-Depressão se reforça ainda na eficácia do tratamento com antidepressivos, tanto para quadros ansiosos, como é o caso do Pânico, da Fobia Social, do Transtorno Obsessivo-compulsivo e mesmo da Ansiedade Generalizada, quanto para os casos de Depressão, com ou sem componente ansioso importante.
O número de autores que não acreditam na Ansiedade e Depressão como sendo a mesma coisa, aos quais nos juntamos, é maioria expressiva, entretanto, quase todos reconhecem existir alguma coisa em comum nesses dois fenômenos.
Acreditamos, pois, na necessidade imperiosa de um antecedente afetivo e de caráter depressivo para que a ansiedade se manifeste patologicamente. O mesmo requisito afetivo não se necessita para a ansiedade normale fisiológica. Talvez seja por isso que os quadros ansiosos respondem tão bem à terapêutica antidepressiva.
Saber com certeza se a Ansiedade pode ser uma das causas de Depressão ou se, ao contrário, pode surgir como conseqüência desta ou, ainda, se uma nova entidade clínica independente se constitui quando ambos os fenômenos coexistem num mesmo paciente tem sido uma questão aberta às pesquisas e reflexões.
O estado de Hipotimia ou Depressão se caracteriza, essencialmente por uma tristeza profunda, normalmente imotivada, que se acompanha de lentidão e inibição de todos os processos psíquicos. Em suas formas leves a Depressão se revela por um sentimento de mal-estar, de abatimento, de tristeza, de inutilidade e de incapacidade para realizar qualquer atividade.
Os pacientes hipotímicos estão dominados por um profundo sentimento de tristeza imotivada. No doente deprimido, as percepções são acompanhadas de uma tonalidade afetiva desagradável: tudo Ihe parece negro. Os doentes perdem completamente o interesse pela vida. Nada lhes interessa do presente nem do futuro e, do passado, são rememorados apenas os acontecimentos desagradáveis. As percepções são lentas, monótonas, descoloridas. Ao paciente parece que os alimentos perderam o sabor habitual. Nos estados depressivos, as ilusões são mais freqüentes do que as alucinações.
As idéias deliróides nos pacientes hipotímicos são comuns, expressando geralmente idéias de culpa, de indignidade, ruína, pecado e de auto-acusação. O pensamento é lento e o próprio ato de pensar é acompanhado de um sentimento desagradável. O conteúdo do pensamento exprime motivações dolorosas. O paciente é incapaz de livrar-se de suas idéias tristes pela simples ação de sua vontade ou dos "pensamentos positivos", como se diz.
O quadro clínico do estado afetivo depressivo é caracterizado pela inibição geral da pessoa, pela baixa performance global refletida pela lentidão e pobreza dos movimentos, pela mímica apagada, pela linguagem lenta, monótona e pelas dificuldades pragmáticas.
Nas Distimias, nas Reações Agudas ao Estresse e nas neuroses de modo geral, a Depressão costuma ser mais reativa, isto é, mais psicogênica (mais anímica que vital), originando-se de situações psicologicamente compreensíveis e de experiências desagradáveis. A anormalidade do sentimento depressivo nesses quadros psicogênicos está na intensidade e na duração desse afeto em comparação às pessoas normais e não em sua qualidade, como acontece nos Transtornos Afetivos Bipolares.
3) Estresse 
Há autores que definem a era moderna como a Idade da Ansiedade, associando a este acontecimento psíquico a agitada dinâmica existencial da modernidade; sociedade industrial, competitividade, consumismo desenfreado e assim por diante. 
Nas últimas décadas, a expressiva mudança em todos os níveis da sociedade passou a exigir do ser humano uma grande capacidade de adaptação física, mental e social. Muitas vezes, a grande exigência imposta às pessoas pelas mudanças da vida moderna e, conseqüentemente, a necessidade imperiosa de ajustar-se à tais mudanças, acabaram por expor as pessoas à uma freqüente situação de conflito, ansiedade, angústia e desestabilização emocional. 
O endocrinologista canadense Hans Selye (1907-1982) foi o primeiro a pesquisar seriamente o estresse na década de 1930. Ele observou que organismos diferentes apresentam um mesmo padrão de resposta fisiológica para estímulos sensoriais ou psicológicos. E isso teria efeitos nocivos em quase todos os órgãos, tecidos ou processos metabólicos. fungos, etc. 
O estresse patológico surge como uma conseqüência direta dos persistentes esforços adaptativos da pessoa à sua situação existencial. 
Seria impossível e, ao mesmo tempo, extremamente indesejável eliminar completamente todos os tipos de Estresses. Fisiologicamente, a ausência total de Estresse equivale à morte. O que devemos tentar fazer é reduzir, nas pessoas, os efeitos danosos do Estresse que sociedade proporciona e sensibilizá-las para os meios capazes ajudar a administrar melhor os estressores do cotidiano.
Procurando significados para a palavra Estresse (stress, em inglês), vamos entender que estar estressado significa "estar sob pressão" ou "estar sob a ação de estímulo persistente". Mas essa reação do organismo aos agentes estressores tem um propósito evolutivo. É uma resposta que a natureza dotou os animais superiores ao perigo. A função de toda essa revolução orgânica é preparar o organismo para a ação, para adaptação imediata à situação causadora do Estresse para, em essência, favorecer a sobrevivência. Portanto, o Estresse não implica, obrigatoriamente, numa alteração patológica e doentia. 
Longe de considerarmos o Estresse uma armadilha da natureza, esse conjunto de alterações fisiológicas tem como principal objetivo adaptar o indivíduo à situação proporcionada pelo estímulo estressor. O estado de Estresse está, então, intimamente relacionado com a capacidade de adaptação do indivíduo à circunstância atual. Ele contribui para a sobrevivência das espécies, incluindo a nossa. 
 O Estresse envolve o organismo como um todo e, assim como o aumento de adrenalina e cortisona possam ser considerados componentes endócrinos do Estresse, a ansiedade seria, igualmente, um dos componentes psíquicos.
A própria classificação internacional das doenças (CID.10), agrupa num mesmo capítulo as Reações Agudas ao Estresse Grave e os Transtornos do Ajustamento (adaptação), sugerindo assim que uma pode levar ao outro.
Nossos conturbados tempos modernos não têm sido favoráveis ao equilíbrio e ao desenvolvimento pleno e sadio do corpo humano, apesar de todo o progresso da medicina, das conquistas científicas, técnicas e sociais que sempre têm objetivado isso. Hábitos alimentares inadequados, a poluição do ar e da água, a agressão sonora e visual do ambiente, a insegurança social e no trabalho, a violência urbana, as crises econômicas e muitas outras fontes de estresse importantes acabam esgotando a capacidade adaptativa da pessoa.
Assim sendo, a maioria dos autores acredita que parte expressiva das razões para o estresse é determinada pelo modo como nossa sociedade está organizada, pela industrialização, pelo consumo e pela concorrência, especifica os tipos de relações que serão mantidas e as exigências que deverão ser cumpridas, gerando condições mais ou menos estressantes de trabalho, das estruturas familiar e social.
Assim, o ser humano moderno, ao se confrontar com estímulos estressores do cotidiano, do trabalho, da vida social e pelas ruas é impedido de manifestar reações de agressão ou de medo sincero, sendo obrigado a apresentar um comportamento emocional ou motor politicamente correto, porém, incongruente com sua real situação neuroendócrina. Se a situação estressante persiste indefinidamente pode sair muito caro, organicamente, o custo de desempanhar um papel social incompatível com a natureza biológica do estresse. Haverá um elevado desgaste do organismo, predispondo certas doenças psicossomáticas.
Entre os estressores de peso social temos o fracasso, a carga, a manutenção, momnotonia e a satisfação com o trabalho, a pressão para corrida contra o tempo, as ameaças sociais e financeiras, indução do medo através da violência urbana, as situações involuntárias de competição, os trabalhos em condições de perigo, a submissão involuntária aos tabus, a contestação e contrariedade com certos valores, a contrariedade ou privação de vida social e submissão contrariada às normas. 
Nossa capacidade de perceber o mundo individualmente proporciona uma representação pessoal da realidade. Essa percepção pessoal da realidade, diferente em cada um de nós, é chamada de procepção da realidade. O principal conhecimento que devemos ter disso é que a realidade será sempre representada intimamente e de acordo com os filtros afetivos de cada um. 
De qualquer forma é fundamental ter em mente que a força dos estressores depende mais da sensibilidade do sujeito do que do valordo objeto, ou seja, depende de como e com que peso a pessoa valoriza o evento (interno ou externo), mais do que o evento em si. Há pessoas que vivenciam as mesmas experiências que outros e regem diferentemente, experimentando estresse de grau variado ou, às vezes, nem se estressando. 
A percepção pessoal da realidade engloba toda a realidade ou toda nossa maneira de ver e sentir o mundo e só essa realidade (única para nós) nos interessa. Nossa percepção pessoal da realidade engloba não apenas a concepção que temos das coisas que estão fora da gente, como os fatos, eventos, objetos, pessoas, etc., mas também os conceitos que cultivamos dentro da gente, nossas escalas de valores, nossos conflitos e complexos. Dentro de todo esse material interno ou intra-psíquico inclui-se, também, a imagem que nós temos de nós mesmos, ou seja, inclui nossa auto-estima.
Nossa auto-estima, por exemplo, poderá ser representada mais negativamente ou mais positivamente, de acordo com a tonalidade afetiva de cada um. Algumas pessoas se vêem ótimos, outras se vêem péssimos. Assim sendo, a idéia que temos de nós mesmos pode, por si só, ser um estímulo agressivo e causador de ansiedade, caso seja uma idéia de nós seja uma idéia ruim e que nos perturba constantemente.
A Afetividade é, pois, quem dá valor e Representa nossa realidade. Essa Afetividade também é capaz de Representar um ambiente cheio de gente como se fosse ameaçador, estressante. A Afetividade valoriza tudo em nossa vida, tudo aquilo que está fora de nós, como os fatos e acontecimentos, bem como aquilo que está dentro de nós (causas subjetivas), como nossos medos, nossos conflitos, nossos anseios, etc. A Afetividade valoriza também os fatos e acontecimentos de nosso passado e nossas perspectivas futuras.
4) Síndrome do Pânico
O Distúrbio do Pânico habitualmente se inicia depois dos 20 anos, é igualmente prevalente entre homens e mulheres, portanto, em sua maioria, as pessoas que tem o Pânico são jovens ou adultos jovens na faixa etária dos 20 aos 40 anos e se encontram na plenitude da vida profissional. Normalmente são pessoas extremamente produtivas, costumam assumir grandes responsabilidades e afazeres, são perfeccionistas, muito exigentes consigo mesmas e não costumam aceitar bem os erros ou imprevistos. 
Os portadores de Pânico costumam ter tendência à preocupação excessiva com problemas do cotidiano, têm um bom nível de criatividade, excessiva necessidades de estar no controle da situação, têm expectativas altas, pensamentos rígidos, são competentes e confiáveis. Freqüentemente esses pacientes têm tendência a subestimar suas necessidades físicas.
Psicologicamente eles costumam reprimir alguns ou todos os sentimentos negativos, sendo os mais comuns o orgulho, a irritação e, principalmente, seus conflitos íntimos.Essa maneira da pessoa ser acaba por predispor a situação de stress acentuado e isso pode levar ao aumento intenso da atividade de determinadas regiões do cérebro, desencadeando assim um desequilíbrio bioquímico e conseqüentemente o aparecimento do Pânico.
Depois das primeiras crises de Pânico, durante muito tempo os pacientes se recusam aceitar tratar-se de um transtorno psicoemocional. Normalmente costumam ser pessoas que não se vêem sensíveis aos problemas da emoção, julgam-se perfeitamente controladas, dizem que já passaram por momentos de vida mais difíceis sem que nada lhes acontecesse, enfim, são pessoas que até então subestimavam aqueles que sofriam problemas psíquicos.
Psicologicamente constata-se, na expressiva maioria dos pacientes portadores de Pânico, a existência de conflitos intra-psíquicos. Algumas vezes nem mesmo os pacientes têm a nítida noção de estarem vivenciando tais conflitos, os quais atuam, nestes casos, mais à nível inconsciente. Porque, afinal, as emoções neste determinado paciente desencadearam a Síndrome do Pânico e não a Depressão franca e típica?
Como vimos diante de um mesmo agente agressor nem todos foram sensibilizados e, dos que foram sensíveis, tivemos três tipos de reação diferente. Emocionalmente algo semelhante pode acontecer. Diante da tensão, do stress, da angústia, dos conflitos, ou da ansiedade exagerada às pessoas podem reagir diferentemente; algumas necessitam de muito mais estímulos para reagirem que outras, das que reagem cada qual reagirá à sua maneira. Algumas com Depressão Típica, outras com Fobias, Pânico, Obsessão-Compulsão, Ansiedade Generalizada, etc.
Apesar dessas características, depois do primeiro episódio de Pânico, normalmente de gravidade suficiente para atendimento em Pronto-Socorro, essas pessoas tornam-se mais amedrontadas, tensas e inseguras. Considerar que o extremo mal estar pelo qual passaram tenha tido origem puramente emocional é a última coisa que acreditam.
Os ataques de pânico são recorrentes (voltam) e caracterizam essencialmente este distúrbio. Essas crises se manifestam por ansiedade aguda e intensa, extremo desconforto, sintomas vegetativos (veja a lista) associados e medo de algo ruim acontecer de repente, como por exemplo da morte iminente, de passar mal, desmaiar, perder o controle, etc. As crises de ansiedade no Pânico duram minutos e costumam ser inesperadas, ou seja, não seguem situações especiais, podendo surpreender o paciente em ocasiões variadas. Não obstante, existem alguns pacientes que desenvolvem o episódio de pânico diante de determinadas situações pré-conhecidas, como por exemplo, dirigindo automóveis, diante de grande multidão, dentro de bancos, etc. Neste caso dizemos que o Distúrbio do Pânico é acompanhado de Agorafobia. 
Uma vez que os Ataques de Pânico ocorrem em diversos quadros de Ansiedade, o texto e o conjunto de critérios para um Ataque de Pânico são oferecidos separadamente nesta seção.
A característica essencial de um Ataque de Pânico é um período distinto de intenso medo ou desconforto acompanhado por pelo menos 4 de 13 sintomas físicos citados abaixo. O ataque tem um início súbito e aumenta rapidamente, atingindo um pico em geral em 10 minutos acompanhado por um sentimento de perigo ou catástrofe iminente e um anseio por escapar. 
A falta de ar é um sintoma comum nos Ataques de Pânico. O rubor facial é comum em Ataques de Pânico ligados a situações relacionadas à ansiedade social e de desempenho. A ansiedade característica de um Ataque de Pânico pode ser diferenciada da ansiedade generalizada por sua natureza intermitente (em crises) enquanto na ansiedade generalizada a ansiedade não é em crises mas continuada e a gravidade geralmente é maior nas crises de pânico que na ansiedade generalizada.
Por ser o Pânico considerado também como um estado de Ansiedade Paroxística Episódica, encontra-se classificado na CID-10 dentro dos Transtornos de Ansiedade (F41.0). 
O DSM-IV enfatiza e a CID-10 cita que, muito freqüentemente, um Distúrbio Depressivo coexiste com o Transtorno do Pânico. Nós, particularmente, achamos que a Síndrome do Pânico é, literalmente, uma forma atípica de doença depressiva. O sentimento de pânico é, em essência, uma grave sensação de insegurança e temor. De qualquer forma a mobilidade social 
Qual seria a causa do grande aumento do número de casos? Possivelmente deve-se ao aumento da ansiedade patológica na vida moderna. A cronificação dessa ansiedade patológica irá desencadear estados de stress continuado. Tanto eventos desagradáveis, profissionais ou extra-profissionais, quanto eventos agradáveis, também em ambos os campos, podem se constituir em agentes estressores: morte de ente querido, nascimento de filho, despedida ou promoção no emprego, casamento ou separação, todos são potencialmente estressores.
Sabemos hoje que a síndrome do Pânico está biologicamente associada a uma disfunção dos neurotransmissores a qual criaria um fator agravante na sensação de medo. De acordo com uma das teorias, o sistema de alerta normal do organismo - um conjunto de mecanismos físicos e mentais que permite que uma pessoa reaja à alguma ameaça - é desencadeado desnecessariamente na crise dePânico, sem que haja um perigo iminente a desencadeá-lo de fato, como naturalmente se espera da fisiologia normal do ser humano.
Constata-se também que o Pânico ocorre com maior freqüência em algumas famílias, significando haver uma participação importante de fatores hereditários na determinação de quem está sujeito ao distúrbio. Apesar dessa concordância, muitas pessoas desenvolvem este distúrbio sem nenhum antecedente familiar.
Vale ressaltar ainda que alguns medicamentos como anfetaminas (usados em dietas de emagrecimento) ou drogas (cocaína, maconha, crack, ecstasy, etc.), podem aumentar a atividade e o medo promovendo alterações químicas que podem levar ao Pânico.
5) Transtornos Fóbicos-Ansiosos - Agorabia e Fobia Social
Trata-se de um grupo de transtornos no qual uma ansiedade é desencadeada exclusiva ou essencialmente por situações nitidamente determinadas que não apresentem atualmente nenhum perigo real. Estas situações são, por esse motivo, evitadas ou suportadas com temor. As preocupações do sujeito podem estar centradas sobre sintomas individuais tais como palpitações ou uma impressão de desmaio, e freqüentemente se associam com medo de morrer, perda do autocontrole ou de ficar louco. 
A simples evocação de uma situação fóbica desencadeia em geral ansiedade antecipatória. A ansiedade fóbica freqüentemente se associa a uma depressão. Para determinar se convém fazer dois diagnósticos (ansiedade fóbica e episódio depressivo) ou um só (ansiedade fóbica ou episódio depressivo), reciso levar em conta a ordem de ocorrência dos transtornos e as medidas terapêuticas que são consideradas no momento do exame. 
A característica essencial da Agorafobia é uma Ansiedade que aparece quando a pessoa se encontra em locais ou situações das quais sair dali (escapar) poderia ser difícil ou embaraçoso ou, na maioria das vezes, em situações nas quais um auxílio imediato pode ser difícil, caso a pessoa venha a passar mal. A Ansiedade agorafóbica pode ser, inclusive, antecipatória, ou seja, aparecer diante da simples possibilidade de ter que participar de determinadas situações. Essa Ansiedade antecipatória pode levar ao afastamento (fuga) dessas situações, presumivelmente causadoras de Ansiedade. 
As FOBIAS SOCIAIS estão centradas em torno de um medo de expor-se a outras pessoas e tem, como conseqüência, o afastamento e evitamento sociais. Podem ser específicas às situações de comer ou falar em público mas podem ser mais difusas, envolvendo quase todas as circunstâncias sociais fora do ambiente familiar. Neste caso, entre as situações fóbicas que invariavelmente resultam na evitação do objeto, atividade ou situação socialmente temida, destaca-se o medo de humilhação e embaraço em lugares públicos, o medo de comer em público, falar em público, urinar em banheiro público e, muito freqüentemente, de assinar cheques à vista de pessoas estranhas.
A exposição à situação social ou de desempenho provoca, quase que invariavelmente, uma resposta imediata de ansiedade, a qual pode assumir a forma de um Ataque de Pânico ligado à situação ou predisposto pela situação.
O prejuízo na atividade social de pessoas portadoras da Fobia Social pode chegar ao extremo do isolamento. Nas situações sociais ou de desempenho temidas, os indivíduos com Fobia Social experimentam preocupações acerca de embaraço e temem que outros os considerem ansiosos, débeis, "malucos" ou estúpidos. O medo de falar em público pode ser em virtude da preocupação de que os outros percebam o tremor em suas mãos ou voz. Podem ainda experimentar extrema ansiedade ao conversar com outras pessoas pelo medo não saberem se expressar. Os sintomas de ansiedade que surgem nessas situações costumam ser palpitações, tremores, sudorese, desconforto gastrintestinal, diarréia, tensão muscular, rubor facial, etc.
Apesar de ser um transtorno comum, os pacientes são muito relutantes em buscar tratamento especializado, o que acaba acontecendo muito tardiamente porque a maioria não acredita que possa haver cura. Assim sendo, mesmo a Fobia Social tendo forte impacto pessoal e severo prejuízo sócio-ocupacional, apenas de 4% a 5% dos pacientes procura o auxílio profissional especializado precocemente. Isto se deve, provavelmente, à falta de conhecimento sobre esse transtorno por parte dos pacientes, e mesmo por parte dos profissionais de saúde. Um certo nível de desconforto frente a certas situações sociais pode ser interpretado como normal pelo paciente, ou banalizado pelos familiares e amigos, existindo ainda certo estigma social pela procura de um psiquiatra para tratamento.
Os sintomas físicos, também chamados de sintomas autossômicos (do sistema nervoso autônomo), podem incluir taquicardia, tremores, perda de fôlego, sudorese e dores abdominais. Os sintomas cognitivos dizem respeito a pensamentos de desadaptação e crenças inadequadas sobre situações sociais. Os sintomas comportamentais incluem uma sensação de congelamento e "paralisia", na qual o paciente não consegue reagir, e evitação fóbica da situação ou objeto da fobia.
A causa da Fobia Social parece ser devida à combinação de alterações genéticas e ambientais, portanto, a etiologia parece ter padrão genético-familiar associado a um papel familiar como modelo de resposta às situações sociais (a angústia social dos pais pode ser aprendida e exacerbada pelos filhos, tomando-se patológica). O ambiente influencia na medida em que os pacientes parecem copiar os modelos de medos de seus pais ou familiares mais próximos de modo exacerbado. Existe um risco familiar aumentado de 16% para esse transtorno. Em termos neurobiológicos, parece haver uma disfunção do sistema dopaminérgico estriatal, com redução dos níveis desse neurotransmissor e do sistema serotoninérgico, com supersensibilidade do receptor pós-sináptico.
Muitas pessoas utilizam o álcool para relaxar em ocasiões sociais, entretanto, para os pacientes com Fobia Social, a ansiedade associada com situações sociais freqüentemente resultam em dependência ao álcool. Esses pacientes utilizam o álcool para auxiliar em situações sociais que os deixam temerosos, e muitos o usam deliberadamente para aliviar os sintomas da ansiedade antecipatória.
De todos os Transtornos de Ansiedade, as fobias (simples, social ou agorafobia ) são as que mais freqüentemente se associam ao alcoolismo, ao contrário do Transtorno de Ansiedade Generalizada, que tende a ser posterior à ocorrência do abuso de álcool. O Transtorno de Pânico e o Obsessivo-Compulsivo têm uma temporalidade variável em relação ao alcoolismo. Vários estudos encontraram taxas de cerca de 80% a 85% de ocorrência de Fobia Social prévia ao alcoolismo.
Em crianças a Fobia Social pode se apresentar sob a forma de crises de choro, ataques de raiva, imobilidade, comportamento aderente ou permanência junto à mãe ou a uma pessoa.
6) Transtorno Obsessivo-Compulsivo - TOC
As características essenciais do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) são obsessões ou compulsões recorrentes e suficientemente graves para consumirem tempo ou causar sofrimento acentuado à pessoa.  Leigamente diz-se que a pessoa tem várias "manias" e que é esquisito ou estranho mas, normalmente, o portador de TOC sabe que suas "manias", obsessões ou compulsões são excessivas ou irracionais. 
Obsessões são pensamentos ou idéias (p.ex. dúvidas), impulsos, imagens, cenas, que invadem a consciência de forma repetitiva, persistente e estereotipada seguidos ou não de rituais destinados a neutralizá-los. São experimentados como intrusivos inapropriados ou estranhos pelo paciente em algum momento, ao longo do transtorno, causando ansiedade ou desconforto acentuado. A pessoa tenta resistir a eles, ignorá-los ou suprimi-los com ações ou com outros pensamentos, reconhecendo-os, no entanto, como produtos de sua mente e não como originados de fora. Não são simplesmente medos exagerados relacionados com problemas reais. 
Compulsões são comportamentos repetitivos (p.ex.lavar as mãos, fazer verificações), ou atos mentais (rezar,contar, repetir palavras ou frases) que a pessoa é levada a executar em resposta a uma obsessão ou em virtude de regras que devem ser seguidas rigidamente. Os comportamentos ou atos mentais são destinados a prevenir ou reduzir o desconforto gerado pela obsessão, prevenir algum evento ou situação temidos e em geral não possuem uma conexão realística ou direta com o que pretendem evitar, ou são claramente excessivos.
Uma variedade de anormalidades biológicas tem sido associada ao Transtorno Obsessivo-Compulsivo na tentativa de estudarem-se as causas desse transtorno. Nascimentos traumáticos sugerindo papel importante de um sofrimento cerebral precoce comumente fazem parte da história de tais pacientes. Há também, por outro lado, uma concordância significativa entre a ocorrência de sintomas obsessivo-compulsivos e a epilepsia do lobo temporal, bem como o aumento de atividade metabólica no giro orbital esquerdo, constatado pela tomografia por emissão de pósitrons nos pacientes diagnosticados como Obsessivo-Compulsivo. 
Numerosas pesquisas sugerem fortemente um envolvimento da serotonina, um neurotransmissor, na fisiologia do TOC. Esses estudos se baseiam nas respostas terapêuticas de 40 a 60% dos pacientes tratados com antidepressivos que proporcionam a recaptação de serotonina (5HT), tais como a Comipramina, a Fluoxetina, a Fluvoxamina, a Sertralina (veja em tratamentos e em farmacologia). Por outro lado, tricíclicos menos serotonérgicos, como a desipramina, são ineficazes.
A intromissão indesejável de um pensamento no campo da consciência de maneira insistente e repetitiva, reconhecido pelo indivíduo como um fenômeno incômodo e absurdo, é denominado de Pensamento Obsessivo. Portanto, para que seja Obsessão é necessário o aspecto involuntário das idéias, bem como, o reconhecimento de sua conotação ilógica pelo próprio paciente, ou seja, ele deve ter crítica sobre o aspecto irreal e absurdo desta idéia indesejável. 
As Obsessões estão tão enraizadas na consciência que não podem ser removidas simplesmente por um aconselhamento razoável, nem por livre decisão do paciente. Elas parecem ter existência emancipada da vontade e, por não comprometerem o juízo crítico, os pacientes têm a exata noção do absurdo de seu conteúdo mental. Em maior ou menor grau, as Idéias Obsessivas ocorrem em todas as pessoas, notadamente quando crianças.
O TOC é uma doença crônica e de evolução muito variável. Ela tanto pode surgir de forma abrupta, após algum evento desencadeante, ou surge insidiosamente sem que esteja associada à algum evento estressor importante. A evolução pode ser com piora, estabilização dos sintomas ou apresentação sob forma de crises episódicas. As características fundamentais dos pacientes portadores do TOC, como dissemos, são as Compulsões e Obsessões. 
Entretanto esses sintomas costumam estar presentes em vários outros quadros psiquiátricos, notadamente nos quadros afetivos depressivos e ansiosos. Algumas características podem ser apontadas como sugestivas desses sintomas serem, de fato, de natureza primária, ou seja, de refletirem realmente um Transtorno Obsessivo-Compulsivo.
A chamada dúvida patológica é um sintoma marcante da obsessão. Normalmente o paciente é extremamente inseguro em relação a seu arbítrio, tortura-se diante da possibilidade de fazer ou não fazer, se está certo ou errado. Torna-se, assim, extremamente indeciso e incapaz para decidir-se.
O paciente com TOC, por exemplo, costuma ter também uma preocupação exagerada com eventos pouco prováveis de causar-lhe algum dano, tais como a contaminação, roubo, perdas, etc., preocupações estas que acabam obrigando-o a lavagens, recontagens, rechecagens, etc.
Também o constante sentimento de que algo está ainda faltando, incompleto ou imperfeito acaba fazendo com que esse paciente tenha extrema dificuldade prática para concluir tarefas. Vem dessa incerteza patológica a necessidade de repetição, de lavar novamente, de contar de novo. Acredita sempre que o gás não está bem fechado, que as mão não estão tão limpas, etc.
Portanto, a doença é crônica e seu prognóstico não é bom. Há trabalhos atestando que 20 a 40% dos pacientes não obtém melhora apesar do tratamento médico, 40 a 50% tem melhora moderada e apenas 20 a 30% melhoram significativamente. O bom ajustamento social e profissional ajuda a melhorar o prognóstico. Há casos onde a hospitalização é necessária, principalmente quando o paciente submete-se totalmente às compulsões ao invés de resistir à elas.
Acompanhando a manifestação central ou a idéia obsessiva desse transtorno, deve haver sempre um sentimento de medo eou ansiedade. Tal sentimento desagradável freqüentemente leva a pessoa a tomar medidas contra a idéia ou impulso inicial, gerando assim o ato compulsivo ou compulsão. No distúrbio da Personalidade do mesmo nome isso não acontece e a pessoa é concordante com sua maneira metódica e organizada de ser. Observamos ainda, no Transtorno Obsessivo-Compulsivo, o reconhecimento por parte do paciente, do absurdo e da irracionalidade de suas idéias e de seus atos compulsivos bem como da impossibilidade de combatê-los. Estes fatos, por si só, já são suficientes para proporcionar grande ansiedade.
7) Violência e Personalidade
Na realidade a Personalidade Anti-Social pode ser considerada, por alguns autores, como sinônimo da Sociopatia, visto imediatamente antes. Entretanto, preferimos discorrê-la separadamente. Isso facilitaria uma maior compreensão conceitual e a possibilidade do Transtorno Anti-social ser algo mais ameno que a Sociopatia, embora da mesma família. 
Segundo o CID.10, Personalidade Anti-Social é um Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais e falta de empatia para com os outros. Haveria um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas, sendo que esse comportamento não seria modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas correções e punições.
Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe também, na Personalidade Anti-Social, uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade. O CID.10 considera a Personalidade Anti-Social como sinônimo de Transtorno Amoral da Personalidade, Transtorno Associal da Personalidade, Personalidade Psicopática ou Sociopatia. Sendo assim, o tema é mais extenso e complexo do que refere o CID.10. Por isso preferimos subdividí-lo para melhor compreendê-lo. Segundo o DSM.IV, a característica essencial do Transtorno da Personalidade Anti-Social é um padrão invasivo de desrespeito e violação dos direitos dos outros, que inicia na infância ou começo da adolescência e continua na idade adulta. 
 	Uma vez que o engodo e a manipulação são aspectos centrais do Transtorno da Personalidade Anti-Social, pode ser de especial utilidade integrar as informações adquiridas pela avaliação clínica sistemática com informações coletadas a partir de fontes colaterais.
Para receber este diagnóstico, o indivíduo deve ter pelo menos 18 anos e ter tido uma história de alguns sintomas de Transtorno da Conduta antes dos 15 anos. O Transtorno da Conduta envolve um padrão de comportamento repetitivo e persistente, no qual ocorre violação dos direitos básicos dos outros ou de normas ou regras sociais importantes e adequadas à idade.
Os comportamentos específicos característicos do Transtorno da Conduta ajustam-se a uma dentre quatro categorias: agressão a pessoas e animais, destruição de propriedade, defraudação ou furto, ou séria violação de regras.
O padrão de comportamento anti-social persiste pela idade adulta. Os indivíduos com Transtorno da Personalidade Anti-Social não se conformam às normas pertinentes a um comportamento dentro de parâmetros legais. Eles podem realizar repetidos atos que constituem motivo de detenção (quer sejam presos ou não), tais como destruir propriedadealheia, importunar os outros, roubar ou dedicar-se à contravenção. As pessoas com este transtorno desrespeitam os desejos, direitos ou sentimentos alheios.
Esses pacientes freqüentemente enganam ou manipulam os outros, a fim de obter vantagens pessoais ou prazer, podem mentir repetidamente, usar nomes falsos, ludibriar ou fingir. As decisões são tomadas ao sabor do momento, de maneira impensada e sem considerar as conseqüências para si mesmo ou para outros, o que pode levar a mudança súbita de empregos, de residência ou de relacionamentos. Os indivíduos com Transtorno da Personalidade Anti-Social tendem a ser irritáveis ou agressivos e podem repetidamente entrar em lutas corporais ou cometer atos de agressão física, incluindo espancamento do cônjuge ou dos filhos.
Os atos agressivos cometidos em defesa própria ou de outra pessoa não são considerados evidências para este quesito. Eles podem engajar-se em um comportamento sexual ou de uso de substâncias com alto risco de conseqüências danosas. Eles podem negligenciar ou deixar de cuidar de um filho, de modo a colocá-lo em perigo.
Por tudo isso, os indivíduos com Transtorno da Personalidade Anti-Social também tendem a ser consistente e extremamente irresponsáveis. O comportamento laboral irresponsável pode ser indicado por períodos significativos de desemprego apesar de oportunidades disponíveis, ou pelo abandono de vários empregos sem um plano realista de conseguir outra colocação. Pode também haver um padrão de faltas repetidas ao trabalho, não explicadas por doença própria ou na família. A irresponsabilidade financeira é indicada por atos tais como inadimplência e deixar regularmente de prover o sustento dos filhos ou de outros dependentes.
Os indivíduos com Transtorno da Personalidade Anti-Social demonstram pouco remorso pelas conseqüências de seus atos. Eles podem mostrar-se indiferentes ou oferecer uma racionalização superficial para terem ferido, maltratado ou roubado alguém. Esses indivíduos podem culpar suas vítimas por serem tolas, impotentes ou por terem o destino que merecem; podem minimizar as conseqüências danosas de suas ações, ou simplesmente demonstrar completa indiferença. Estes indivíduos em geral não procuram compensar ou emendar sua conduta. Eles podem acreditar que todo mundo está aí para "ajudar o número um" e que não se deve respeitar nada nem ninguém, para não ser dominado. 
Uma grande proporção, em torno de 25% de prisioneiros, mostra muitas características do que a psiquiatria chama de Sociopatia. A DSM-IV (Manual de Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais), define esse quadro como Transtorno da Personalidade Anti-social. Também a Organização Mundial de Saúde (CID-10) classifica a sociopatia sob a denominação de Transtorno da Personalidade Dissocial. 
O Transtorno de Conduta (que é o sociopata infantil) freqüentemente se inicia antes dos 13 anos e muitos pacientes começam o quadro permanecendo fora de casa até tarde da noite, apesar de proibições dos pais, fugindo de casa durante a noite ou outros tipos de desobediência às normas, sejam elas domésticas ou escolares. O DSM-IV é cauteloso quanto às fugas, não considerando para diagnóstico os episódios de fuga que ocorrem como conseqüência direta de abuso físico ou sexual contra o paciente.
Alguns autores preferem a denominação de Delinqüência para o Transtorno de Conduta. As condutas provenientes deste transtorno são normalmente mais graves que as travessuras comuns das crianças e adolescentes. Legalmente o termo "delinqüência" refere-se à transgressão das leis normativas de um determinado lugar por pessoa abaixo de determinada idade definida (16, 18 ou 21 anos). O mesmo ato praticado depois desta idade denomina-se crime. Percebe-se então, que o termo "delinqüência" pode não completar a idéia atrelada aos Transtornos de Conduta, já que muitos atos praticados têm apenas um caráter ético, não jurídico.
A CID-10 caracteriza os Transtornos de Conduta por um padrão repetitivo e persistente de conduta anti-social, agressiva ou desafiadora. Para o diagnóstico devemos levar em conta a época do desenvolvimento da criança. Crises de birra, por exemplo, são comuns até aos 3 anos e não devem servir de base para este diagnóstico. 
Crianças sociopatas manifestam tendências e comportamentos que são altamente indicativos de seu distúrbio. Por exemplo, eles são aparentemente imunes a punição dos pais, e não são afetados pela dor. Nada funciona para alterar seu comportamento indesejável, e conseqüentemente os pais geralmente desistem, o que faz a situação piorar. Os sociopatas violentos mostram uma história de torturar pequenos animais quando eles eram crianças e também vandalismo, mentiras sistemáticas, roubo, agressão aos colegas da escola e desafio à autoridade dos pais e professores.
O Transtorno de Conduta parece preocupar mais os outros do que a própria criança que sofre da perturbação e, nestes, são comuns o uso regular do fumo, bebidas alcoólicas ou drogas e comportamento sexual precoce.
O portador do Transtorno de Conduta pode não ter consideração pelos sentimentos, desejos e bem estar dos outros, demonstrando isso através de comportamento insensível, faltando-lhe um sentimento apropriado de culpa e remorso. Na realidade, conceitualmente, devemos ter em mente que o Transtorno de Conduta é o correspondente infantil daquilo que aprendemos como sociopatia ou Transtorno Anti-Social.
Os pacientes com esse transtorno podem viver acusando seus companheiros, tentando culpá-los por suas ações. A auto-estima está usualmente baixa, embora a pessoa possa projetar uma imagem de dureza. Pouca tolerância à frustração, irritabilidade, explosões temperamentais e negligência provocativa são também características freqüentes. Outros sintomas de ansiedade e depressão, além da redução da auto-estima, são comuns e podem justificar o diagnóstico adicional desses estados. 
O Transtorno de Conduta tem importância clínica, devido ao grande número de encaminhamentos psiquiátricos, intercorrências judiciais, policiais e sociais motivados por comportamentos anti-sociais e agressivos. Normalmente o comportamento anti-social da infância costuma ser precursor de comportamento anti-social no adulto. É incomum encontrar comportamento anti-social adulto na ausência de uma história de transtorno semelhante ou delinqüência na infância. A não diminuição destes comportamentos problemáticos à medida que o tempo passa tem sido visto como um mau prognóstico para a socialização adulta normal.
Quanto a classificação do grau de gravidade os critérios são: 
Leve - poucos ou nenhum problema de conduta a mais daqueles exigidos para o diagnóstico, e os problemas de conduta apenas causam pequenos danos aos outros.
Moderado - número de problemas de conduta e efeito nos outros, intermediário entre leve e grave.
Grave - Os problemas de conduta causam danos consideráveis a outros, p.ex.: graves lesões corporais às vítimas, amplo vandalismo ou roubo, ausência prolongada de casa.
 
8)Episódio Maníaco 
Um Episódio Maníaco é uma das fases do Transtorno Afetivo Bipolar, durante a qual existe um humor anormal e persistentemente elevado, expansivo ou irritável. A perturbação do humor deve ser acompanhada por pelo menos três sintomas adicionais de uma lista que inclui:
- auto-estima inflada ou grandiosidade 
- necessidade de sono diminuída,
- pressão por falar
- fuga de idéias
-distrabilidade
- maior envolvimento em atividades
- agitação psicomotora
- envolvimento excessivo em atividades prazerosas
O humor no Episódio Maníaco pode ser irritável, ao invés de elevado ou expansivo. Essa perturbação afetiva costuma ser suficientemente severa para causar prejuízo acentuado no funcionamento social ou ocupacional ou para exigir a hospitalização, ou é marcada pela presença de aspectos psicóticos.
O Episódio Maníaco não deve decorrer dos efeitos fisiológicos diretos de uma droga de abuso, como por exemplo, a cocaína, álcool ou maconha, de um medicamento, como os redutoresdo apetite ou outros tratamentos somáticos para a depressão.
O humor elevado de um Episódio Maníaco pode ser descrito como eufórico incomumente bom, alegre ou excitado. A qualidade expansiva do humor é caracterizada por entusiasmo incessante e indiscriminado por interações interpessoais, sexuais ou profissionais. Embora esse humor elevado seja considerado o sintoma prototípico, a perturbação predominante do humor pode ser irritabilidade, particularmente quando os desejos da pessoa são frustrados. Aí é que entra o potencial agressivo e violento do maníaco.
A auto-estima inflada tipicamente está presente, indo desde uma autoconfiança sem crítica até uma acentuada grandiosidade que pode alcançar proporções delirantes. Os delírios grandiosos no Episódio Maníaco são comuns, como por exemplo, ter um relacionamento especial com Deus ou com alguma figura pública do mundo político, religioso ou artístico.
8)Transtorno Psicótico. 
Um dos sintomas mais exuberante e característico dos Transtornos Psicóticos é o Delírio. Há, normalmente, alguma relação entre a psicose franca atual e algum tipo característico de personalidade pré-mórbida. Essa personalidade pré-mórbida problemática dos psicóticos costuma ser do tipo Transtorno Paranóide ou Esquizóide da Personalidade. 
Esses transtornos de personalidade se caracterizam com acentuado traço de desconfiança, ressentimento, frigidez no relacionamento interpessoal, conforme se pode ver no capítulo dos Transtornos de Psicóticos.
Um dos sintomas mais exuberante e característico dos Transtornos Psicóticos é o Delírio. Há, normalmente, alguma relação entre a psicose franca atual e algum tipo característico de personalidade pré-mórbida. Essa personalidade pré-mórbida problemática dos psicóticos costuma ser do tipo Transtorno Paranóide ou Esquizóide da Personalidade. Esses transtornos de personalidade se caracterizam com acentuado traço de desconfiança, ressentimento, frigidez no relacionamento interpessoal, conforme se pode ver no capítulo dos Transtornos de Psicóticos.
Os delírios nas Psicoses são normalmente de cunho persecutório (de perseguição), ou seja, giram em torno de uma temática de prejuízo, perseguição e referência à pessoa do paciente, são também sistematizados e bem organizados. A idéia de referência do paranóide diz respeito à crença de que o mundo e os acontecimentos têm-no como um ponto de referência, ou seja, ele é observado, ele é perseguido por complôs misteriosos, ele é predestinado a executar um plano de salvação da humanidade, ele detém a capacidade de percepção extra-sensorial, ele é o mais prejudicado, etc.
Desta forma, o paciente edifica sua realidade particular e assume neste seu mundo uma posição central servindo de referência aos eventos que se sucedem, como se seu Ego sofresse uma gigantesca hipertrofia.
As manifestações de agressividade do paciente paranóide, ainda que incomuns, têm para ele um caráter eminentemente defensivo, contra um sistema que deseja prejudicá-lo, influir sobre ele, roubar seu pensamento, matá-lo através de influências estranhas. 
A Psicose Delirante Crônica, que é sinônimo do atual Transtornos Delirante Persistente (CID.10), já foi chamada de Paranóia, muito apropriadamente. De acordo com Kraepelin, a Paranóia é uma entidade clínica caracterizada, essencialmente, pelo desenvolvimento insidioso de um sistema delirante duradouro e inabalável mas, apesar desses Delírios há uma curisosa manutenção da clareza e da ordem do pensamento, da vontade e da ação. 
Ao contrário dos esquizofrênicos e doentes cerebrais, onde as idéias delirantes são um tanto desconexas, nesta Psicose Delirante Crônica as idéias se unem num determinado contexto lógico para formar um sistema delirante total, rigidamente estruturado e organizado.
A característica essencial desse Transtorno Delirante Persistente é a presença de um ou mais delírios não-bizarros que persistem por pelo menos 1 mês. Para o diagnóstico é muito importante que o delírio do Transtorno Delirante Persistente não seja bizarro nem seja desorganizado, ou seja, ele deve ter seu tema e script organizado e compreensível ao ouvinte, embora continue se tratando de uma falsa e absurda crença. 
As alucinações não são proeminentes e nem habituais, embora possam existir concomitantemente. Quando existem, a alucinações táteis ou olfativas costumam ser mais freqüentes que as visuais e auditivas.
Normalmente o funcionamento social desses pacientes Paranóicos não está prejudicado, apesar da existência do Delírio. A maioria dos pacientes pode parecer normal em seus papéis interpessoais e ocupacionais, entretanto, em alguns o prejuízo ocupacional pode ser substancial e incluir isolamento social. A impressão que se tem é a de uma ilha de delírio num mar de sanidade, portanto, uma espécie de delírio insular.
Um paciente, por exemplo, convencido de que será assassinado por perseguidores implacáveis pode desenvolver isolamento social e abandonar o emprego. Em geral, além do funcionamento social comprometido, também o relacionamento conjugal pode sofrer prejuízos. Na Esquizofrenia o comprometimento social mais acentuado costuma ser a regra. 
Esses Delírios normalmente são interpretativos, egocêntricos, sistematizados e coerentes. Pode ser de prejuízo, de perseguição ou de grandeza, impregnado ou não de tonalidade erótica ou com idéias de invenção ou de reforma. Também é freqüente o delírio de ciúme, mais encontradiço nas mulheres. Estas estão sempre se deparando com provas "contundentes" acerca dos muitos relacionamentos sexuais de seus maridos. 
9)Psicose Reativa Breve (Transtorno Psicótico Transitório)
A Psicose Reativa Breve se caracteriza pelo aparecimento abrupto dos sintomas psicóticos sem a existência de sintomas pré-mórbidos e, habitualmente, seguindo-se à um estressor psicossocial. Os sinais e sintomas clínicos são similares àqueles vistos em outros distúrbios psicóticos, como na Esquizofrenia e nos Transtornos Afetivos com Sintomas Psicóticos. O prognóstico é bom e a persistência de sintomas residuais não ocorre. Durante o surto observa-se incoerência e acentuado afrouxamento das associações, delírios, alucinações e comportamento catatônico ou desorganizado. Há componentes afetivos com mudanças bruscas de um afeto para outro, perplexidade e confusão.
A Organização Mundial de Saúde, através da Classificação Internacional de Doenças (CID), recomenda que esta categoria de psicose deva ser restringida ao pequeno grupo de afecções psicóticas, em grande parte ou totalmente atribuídas a uma experiência existencial recente. Deve ser entendida como uma alteração psicótica na quais os fatores ambientais têm a maior influência etiológica.
Trata-se de reações cuja natureza não é só determinada pela situação psicotraumática, mas também pelas predisposições da personalidade. A maioria das reações psíquicas mórbidas desenvolve-se em função de uma perturbação de caráter que predispõe a elas. Tal perturbação será fruto de um desenvolvimento psicorreativo anormal.
10)Esquizofrenias
São várias as tendências de reflexão sobre a Doença Mental, notadamente sobre as Psicoses que, embora provenientes de diversos momentos históricos do pensamento psicológico, estimulam bastante as discussões sobre o tema. 
Temos o modelo Sociogênico, no qual a sociedade, complexa e exigente, é a responsável exclusiva pelo enlouquecimento humano. Temos também o modelo Organogênico, diametralmente oposto ao anterior, onde os elementos orgânicos da função cerebral seriam os responsáveis absolutos pela Doença Mental. 
Tem ainda o enfoque Psicogênico, onde a dinâmica psíquica é responsável pela doença e subestimam-se as disposições constitucionais. Há ainda o modelo Organodinâmico, que compatibiliza todos três anteriores, onde participariam requizitos biológicos, motivos psicológicos e determinantes sociais. Na realidade esse modelo é mais comnhecido como Bio-Psico-Social
Tem sido quase unanimemente aceito na psiquiatria clínica a associação de determinadas configuraçõesde personalidade predispostas e a eclosão de psicoses. Estas personalidades são as chamadas Personalidades Pré-mórbidas, cujo conceito é abordado neste trabalho no capítulo sobre os Transtornos da Personalidade; constituições que por si transtornam a vida do indivíduo ou incapacitam um desenvolvimento pleno, ou ainda, em certas circunstâncias, encerram uma maior aptidão para o desenvolvimento de determinadas doenças psíquicas.
A Constituição (Personalidade) Pré-mórbida é considerada pela psicopatologia como uma variação do existir humano e traduz uma possibilidade mais acentuada para o desenvolvimento de certa vulnerabilidade psíquica. Aqui o termo "possibilidade" deve ser considerado em toda sua plenitude, ou seja, um caráter não-obrigatório mas que deve ser levado muito a sério.
Clinicamente e a grosso modo, podemos dizer que as neuroses diferenciam-se das psicoses pelo grau de envolvimento da personalidade, sendo sua desorganização e desagregação muito mais pronunciadas nas psicoses. 
O vínculo com a realidade é muito mais tênue e frágil nas psicoses que nas neuroses, nestas a realidade não é negada mas vivida de maneira mais sofrível, valorizada e percebida de acordo com as lentes da afetividade e representada de acordo com as exigências conflituais. 
Já nas psicoses, alguns aspectos da realidade são negados e substituídos por concepções particulares e peculiares que atendem unicamente às características da doença.
A sintomatologia psicótica caracteriza-se, principalmente, pelas alterações em nível do pensamento e da afetividade e, conseqüentemente, todo comportamento e toda desempenho existencial do indivíduo serão comprometidos. Na psicose o pensamento e a afetividade se apresentam qualitativamente alterados, tal como uma novidade cronologicamente delimitada na história de vida do paciente e que passa a atuar morbidamente em toda sua performance psíquica.
Essa alteração confere ao paciente uma maneira patológica de representar a realidade, de elaborar conceitos e de relacionar-se com o mundo objectual. Não contam tanto aqui as variações quantitativas de percepção do real, como pode ocorrer na depressão, por exemplo, mas um algo novo e qualitativamente distinto de todas nuances anteriormente permitidas, um algo essencialmente patológico, mórbido e sofrível.
A Esquizofrenia é uma doença da Personalidade total que afeta a zona central do eu e altera toda estrutura vivencial. Culturalmente o esquizofrênico representa o estereotipo do "louco", um indivíduo que produz grande estranheza social devido ao seu desprezo para com a realidade reconhecida. Agindo como alguém que rompeu as amarras da concordância cultural, o esquizofrênico menospresa a razão e perde a liberdade de escapar às suas fantasias.
O principal modelo para a integração dos fatores etiológicos da esquizofrenia é o modelo estresse-diátese, o qual supõe o indivíduo possuidor de uma vulnerabilidade específica colocada sob a influência de fatores ambientais estressantes (causa excitante). Em determinadas circunstâncias o binômio diátese-estresse proporcionaria condições para o desenvolvimento da esquizofrenia. Até que um fator etiológico para a doença seja identificado, este modelo parece satisfazer as teorias mais aceitas sobre o assunto.
Os sintomas característicos da esquizofrenia podem ser agrupados, genericamente, em 2 tipos: positivos e negativos. Os sintomas positivos são os mais floridos e exuberantes, tais como as alucinações (mais freqüentemente, as auditivas e visuais e, menos freqüentes as táteis, e olfativas), os delírios (persecutórios, de grandeza, de ciúmes, somáticos, místicos, fantásticos), perturbações da forma e do curso do pensamento (como incoerência, prolixidade, desagregação), comportamento desorganizado, bizarro, agitação psicomotora e mesmo negligência dos cuidados pessoais. 
Os sintomas negativos são, geralmente, de déficits, ou seja, a pobreza do conteúdo do pensamento e da fala, embotamento ou rigidez afetiva, prejuízo do pragmatismo, incapacidade de sentir emoções, incapacidade de sentir prazer, isolamento social, diminuição de iniciativa e diminuição da vontade. 
Os Delírios na Esquizofrenia podem sugerir ainda uma interpretação falsa da realidade percebida. É o caso, por exemplo, do paciente que sente algo sendo tramado contra ele pelo fato de ver duas pessoas simplesmente conversando. Trata-se, neste caso, de uma Percepção Delirante. Desta forma, a Percepção Delirante necessita de algum estímulo para ser delirantemente interpretado (no caso, duas pessoas conversando). Outras vezes não há necessidade de nenhum estímulo à ser interpretado, como por exemplo, julgar-se deus. Neste caso trata-se de uma Ocorrência Delirante. O tipo de Delírio mais freqüentemente encontrado na Esquizofrenia é do tipo Paranóide ou de Referência, ou seja, com temática de perseguição ou prejuízo no primeiro caso e de que todos se referem ao paciente (rádios, vizinhos, televisão, etc) no segundo caso.
Embora os delírios bizarros sejam considerados especialmente característicos da Esquizofrenia, pode ser difícil avaliar o grau de "bizarria", especialmente entre diferentes culturas. Os delírios são considerados bizarros se são claramente implausíveis e incompreensíveis e não derivam de experiências comuns da vida. Um exemplo de delírio bizarro é a crença de uma pessoa de que um estranho retirou seus órgãos internos e os substituiu pelos de outra, sem deixar quaisquer cicatrizes ou ferimentos. Um exemplo de delírio não-bizarro é a falsa crença de estar sob vigilância policial.
As alucinações, outro sintoma típico (mas não exclusivo) da Esquizofrenia, podem ocorrer em qualquer modalidade sensorial, ou seja, auditivas, visuais, olfativas, gustativas e táteis. As alucinações auditivas são, de longe, as mais comuns e características da Esquizofrenia, sendo geralmente experimentadas como vozes conhecidas ou estranhas, que são percebidas como distintas dos pensamentos da própria pessoa. O conteúdo pode ser bastante variável, embora as vozes pejorativas ou ameaçadoras sejam especialmente comuns. Certos tipos de alucinações auditivas, como por exemplo ouvir duas ou mais vozes conversando entre si ou comentando os pensamentos ou o comportamento da pessoa, têm sido considerados particularmente característicos da Esquizofrenia e foram incluídos na lista de sintomas de primeira ordem de Schneider.
A desorganização do pensamento é defendida por alguns autores, como o aspecto mais importante da Esquizofrenia. Em vista da dificuldade inerente ao exame do pensamento, este será feito pela qualidade do discurso do paciente, portanto, o conceito de discurso desorganizado foi salientado na definição de Esquizofrenia usada neste manual.
As Alucinações mais comuns na Esquizofrenia são do tipo auditivas, em primeiro lugar e visuais em seguida. Conforme diz Schneider, "de valor diagnóstico extraordinário para o diagnóstico de uma Esquizofrenia são determinadas formas de ouvir vozes: ouvir os próprios pensamentos (pensar alto), vozes na forma de fala e respostas e vozes que acompanham com observações a ação do doente". Esta Sonorização do Pensamento, juntamente com alguns outros sintomas que envolvem alucinações auditivas e sensações de ter os próprios pensamentos influenciados por elementos externos, compõem a sintomatologia que Schneider considerou como sendo de Primeira Ordem.
Um esquizofrênico pode estar ouvindo sua própria voz, dia e noite, sob a forma de comentários e antecipações daquilo que ele faz ou pretende fazer , como por exemplo: "ele vai comer" ou ainda, "o que ele está fazendo agora ? Está trocando de roupas". Outro sintoma importante no diagnóstico da esquizofrenia é a sensação de que o pensamento está sendo irradiado para o exterior ou mesmo sendo subtraído ou "chupado" por algo do exterior: Subtração e Irradiação do pensamento, também considerados de Primeira Ordem. Igualmente podemos encontrar a sensação de que os atos estão sendo controlados por forças ou influências exteriores.
11) AspectosAtuais da Dependência
Os hospitais detectam cada vez mais drogadictos com quadro de psicose concomitante a drogadicção (principalmente a psicose cocaínica) a ponto de se constatar que 70% dos cocainômanos sofrem alguma patologia mental. A psicose cocaínica começa a ser cada vez mais freqüente nas consultas psiquiátricas, sugerindo existir uma relação muito estreita entre a cocaínomania e outras enfermidades psíquicas.
Até 75% dos pacientes que recorrem aos hospitais por consumo de cocaína apresentam ou apresentaram antes alguma patologia mental.
Em torno de 70% dos cocainômanos sofrem algum transtorno mental.
As áreas cerebrais onde esta droga atua provocando disfunções são as mesmas dos casos de crises de angústia, crises compulsivas ou da psicose paranóide. Os psiquiatras não podem ignorar este novo fenômeno clínico e essa nova informação da neurobiologia.
As alterações cerebrais ocasionados pela adicção de cocaína interessam à psiquiatria e psiconeurologia devido às recentes constatações da atuação da droga em neuroreceptores e em determinadas áreas que estão igualmente implicadas nos sintomas de outras enfermidades mentais.
 	Muitos sintomas associados com a esquizofrenia e com a adicção são causados por um excesso ou um defeito de dopamina e GABA, sustâncias químicas cerebrais que regulam o aprendizado, a memória, a emoção e o conhecimento. Os investigadores têm comprovado como as proteínas poderiam modificar entre elas suas funções mútuas, incluindo a capacidade dos neurônios de aceitar ou recusar a dopamina e outros neurotransmissores, ao unir-se entre eles.
A adicção a drogas é uma doença crônica e o adicto deve ser tratado como um paciente susceptível a tratamento e que, assim como sucede com outras patologias, o êxito o fracasso vai a depender do conhecimento de sua fisiopatologia, bem como de uma adequação dos tratamentos. Esses devem ser sempre individualizados e a abordagem de cada caso deve ser multidisciplinar.
A grande importância do tratamento multifatorial e individual da adicção requerem que a terapia considere múltiplos aspectos. O tratamento baseado exclusivamente na farmacologia conduz ao fracasso.
Além disso, o autor tem insistido no fato da adicção a drogas ser uma patologia crônica do funcionamento do cérebro, equiparada talvez à esclerose múltipla, a diabetes ou a hipertensão arterial, ou seja, respeitando os problemas de todas as doenças crônicas.
Especialistas têm destacado a complexidade do estudo da neurobiologia das adicções. Neste estudo temos que acrescentar que o usuário de drogas não o é de uma droga só, senão de várias que se reforçam, daí a necessidade de se trabalhar com o conceito de poliabuso.
Alguns autores já têm reconhecido a existência de um modelo de síndrome de abstinência a cannabinoides (maconha) como indícios de um primeiro passo para o conhecimento de mecanismos moleculares implicados no desenvolvimento da dependência a tais compostos e nos possíveis tratamentos para este tipo de adicção. 
12) Delitos Sexuais (Parafilias)
Parafilia é o termo atualmente empregado para os transtornos da sexualidade, anteriormente referidos como "perversões", uma denominação ainda usada no meio jurídico. Estudar as Parafilias é conhecer as variantes do erotismo em suas diversas formas de estimulação e expressão comportamental.
Estudar a sexologia implica em estudar os seres humanos como indivíduos sexualizados, portadores de um caráter sexual de homens, mulheres e ambíguos, incluindo a abordagem dos sentimentos sexuais harmônicos ou desarmônicos, das condutas e fantasias sexuais, bem como das dificuldades e resoluções dos problemas sexuais. Na parte onde a sexologia aborda o estudo das variáveis sexuais ou das condutas variantes estamos falando das Parafilias.
O DSM-IV fala das Parafilias como uma sexualidade caracterizada por impulsos sexuais muito intensos e recorrentes, por fantasias e/ou comportamentos não convencionais, capazes de criar alterações desfavoráveis na vida familiar, ocupacional e social da pessoa por seu caráter compulsivo. Trata-se de uma perturbação sexual qualitativa e, na CID.10, estão referidas como Transtornos da Preferência Sexual, o que não deixa de ser absolutamente verdadeiro, já que essa denominação reflete o principal sintoma da Parafilia.
Está configurada a Parafilia quando há necessidade de se substituir a atitude sexual convencional por qualquer outro tipo de expressão sexual, sendo este substitutivo a preferida ou única maneira da pessoa conseguir excitar-se. Assim sendo, na Parafilia os meios se transformam em fins, e de maneira repetitiva, configurando um padrão de conduta rígido o qual, na maioria das vezes, acaba por se transformar numa compulsão opressiva que impede outras alternativas sexuais.
Algumas Parafilias incluem possibilidades de prazer com objetos, com o sofrimento e/ou humilhação de si próprio ou do parceiro(a), com o assédio à pessoas pre-púberes ou inadequadas à proposta sexual. Estas fantasias ou estímulos específicos, entre outros, seriam pré-requisitos indispensáveis para a excitação e o orgasmo.
Em graus menores, às vezes, a imaginação fantasiosa do parafílico encontra solidariedade com o(a) parceiro(a) na iniciativa, por exemplo, de transvestir-se de sexo oposto ou de algum outro personagem para conseguir o prazer necessário ao orgasmo.
Quanto ao grau, a Parafilia pode ser leve, quando se expressa ocasionalmente, moderada, quando a conduta é mais freqüentemente manifestada e severa, quando chega a níveis de compulsão.
A Psiquiatria Forense se interessa, predominantemente, pela forma grave, que para se caracterizar exige os seguintes requisitos:
1. Caráter opressor, com perda de liberdade de opções e alternativas. O parafílico não consegue deixar de atuar dessa maneira.
2. Caráter rígido, significando que a excitação sexual só se consegue em determinadas situações e circunstâncias estabelecidas pelo padrão da conduta parafílica.
3. Caráter impulsivo, que se reflete na necessidade imperiosa de repetição da experiência.
Essa compulsão da Parafilia severa pode vir a ocasionar atos delinqüenciais, com severas repercussões jurídicas. É o caso, por exemplo da pessoa exibicionista, a qual mostrará os genitais a pessoas publicamente, do necrófilo que violará cadáveres, do pedófilo que espiará, tocará ou abusará de crianças, do sádico que produzirá dores e ferimentos deliberadamente, e assim por diante.
Os delitos sexuais mais comuns são: violação, abuso sexual desonesto, estupro, abuso sexual de menores, exibicionismo, prostituição, sadismo, etc, mais ou menos nessa ordem. 
A psicopatia sexual tem lugar quando a atividade sexual convencional ou desviada se dá através de um comportamento psicopático. Esta atitude psicopática deve ser suspeitada quando, por exemplo, há Transgressão, através de uma conduta anti-social, voluntária, consciente e erotizada, realizada como busca exclusiva de prazer sexual.
Também deve ser suspeitada de psicopatia sexual quando há maldade na atitude perpetrada, isto é, quando o contraventor é indiferente à idéia do mal que comete, não tem crítica de seu desvio e nem do fato deste desvio produzir dano a outros. O sexopata goza com o mal e experimenta prazer com o sofrimento dos demais. Ainda de acordo com o perfil sociopático (ou psicopático), seu delito sexual costuma ser por ele justificado, distanciando-se da autocrítica. Normalmente dizem que foram provocados, assediados, conduzidos, etc.
A delinqüência sexual dos sociopatas ou psicopatas correspondem à uma atuação teatral premeditada (longe de ser tão impulsiva como alegam), consciente e precisamente dirigida à um objetivo prazeroso. Não se trata, absolutamente, de uma atitude compulsiva, incontrolável, irrefreável ou um reflexo automático em resposta à uma idéia obsessivamente patológica.
O que se observa, nos delitos sexuais, é que eles podem ser cometidos, em grande número de vezes, por pessoas consideradas "normais" e que o acontecimento sexual delituosoocorreu numa determinada circunstância momentânea. Isso acontece porque muitos desses delitos são cometidos não diretamente pela perturbação sexual do agressor mas, freqüentemente, por situações favorecedoras do delito, como por exemplo, a intoxicação alcoólica ou por drogas (estupefacientes).
Não obstante, e é obvio, tais delitos sexuais também podem ser cometidos por pessoas portadoras de transtornos da sexualidade, como por exemplo as parafilias. Só enaltecemos as tais circunstâncias ambientais favorecedoras do delito, para que não se tenha a idéia errada de que a existência de um transtorno da sexualidade já seja suficiente, por si, para que a pessoa. 
13) Algumas Epilepsias e a Lei
Psiquiatricamente a Epilepsia não pode ser considerada uma entidade patológica de sintomatologia única, mas sim, um complexo de sintomas diversos e variáveis que se caracterizam por episódios paroxísticos (periódicos) e transitórios, capazes de alterar o estado da consciência, associar-se a alterações dos movimentos, convulsões e mesmo transtornos do sentimento, das emoções, da conduta, ou tudo isso junto. 
A abordagem da Epilepsia tem sido muito diferente entre as duas disciplinas médicas que se ocupam do problema: a neurologia e a psiquiatria. Neurologicamente a epilepsia pode ser entendida como uma disritmia cerebral paroxística capaz de provocar alterações no sistema nervoso central e, conseqüentemente, em todo organismo.
Sob o ponto de vista psiquiátrico, também se entende a epilepsia como uma disritmia cerebral paroxística, com alterações funcionais do sistema nervoso central e, conseqüentemente, manifestações no comportamento, nas emoções e nos padrões de reações do indivíduo. Portanto, preferimos tomar a Epilepsia como uma síndrome neuropsiquiátrica, onde suas manifestações clínicas terão importância para a psiquiatria 
Há uma grande variedade de crises epilépticas, e a freqüência e forma dos ataques variam muito de pessoa para pessoa. Devido a grande quantidade de nuances na Epilepsia e tantos tipos diferentes de crises, um sistema específico de classificação está sendo promovido pela Liga Internacional Contra a Epilepsia. A Classificação Internacional de Crises Epilépticas foi adotada pela comunidade médica e gradualmente está substituindo terminologias ultrapassadas como grande mal e pequeno mal.
A nova classificação descreve dois grandes tipos de crises: Parcial e Generalizada. Ela também divide cada uma destas categorias em subcategorias incluindo Parcial simples, Parcial complexa, Ausência, Tônica-Clônicaentre outros tipos.
A diferença entre crises parciais e generalizadas diz respeito ao tipo de descarga elétrica excessiva no cérebro. Se essa descarga elétrica está limitada só a uma área cerebral, diz-se que a crise é parcial, se todo o cérebro está envolvido, é generalizada.
Alguns autores acham que a Epilepsia que acomete o lobo temporal seria aquela com maior probabilidade de transtornos de personalidade. De fato, Penfield em seus estudos sobre a anatomia funcional do cérebro humano, realizados com pacientes neurocirúrgicos, descreveu a localização de diversas funções sensoriais e motoras do córtex cerebral e observou a existência de zonas do lobo temporal cuja estimulação era acompanhada por experiências de estados emocionais diversos.
Para melhor compreensão desse tema, é fundamental entendermos esse epiléptico, não necessariamente como aquela pessoa que tem convulsões. Quase pelo contrário. A prática clínica nos tem ensinado que os epilépticos convulsivos são, inclusive, menos propensos a alterações de personalidade do que aqueles não convulsivos. Essas observações decorrem de um diagnóstico retrógrado, ou seja, primeiramente constatamos algum traço ou mesmo alteração de personalidade para, depois, constatarmos alterações eletroencefalográficas. Notadamente, são alterações do lobo temporal.
Outro fato a ser lembrado, é em relação aos termos usados: estamos falando em traços e alterações de personalidade e não, necessariamente, em Transtornos de Personalidade. Isso quer dizer que esses traços nem sempre constituem uma doença. Para tal, de acordo com o conceito de Transtornos de Personalidade, há necessidade de haver concomitante prejuízo social e ocupacional.
Há uma maneira de ser do epiléptico caracterizada, principalmente, por irritabilidade, explosividade, agressividade, querelância, viscosidade, instabilidade de humor e outros sinais muitos bem delineados pelo trabalho de Lúcia Coelho. Também se vêem na prática clínica, outras alterações mais patológicas e responsáveis por alterações da sensopercepção, tais como alucinações e ilusões, não citadas por essa autora e encontradas em pacientes com alterações eletroencefalográficas do lobo temporal.
Inegavelmente a epilepsia resulta de um distúrbio fisiológico do Sistema Nervoso Central e não de conflitos intrapsíquicos, embora, sem dúvida, estes possam coexistir. Assim, os transtornos epileptiformes da personalidade seriam muito mais secundários a alterações funcionais do Sistema Nervoso Central, do que motivados por razões exclusivamente emocionais, cogitando-se, inclusive, que muitos dos sentimentos esboçados por tais pacientes sejam conseqüências deste distúrbio funcional. Entendido isto, vamos ter que a epilepsia é uma síndrome com diversas manifestações clínicas e, entre as quais, pode apresentar um conteúdo psicopatológico de perda da consciência. Este é um dos elementos na Epilepsia que adquire maior significação jurídica, tendo em vista que a Lei nº 9.777 de 26/12/98, em seu Art. 26, diz que "é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento".
Nosso problema é saber se esta síndrome, por si, seria um determinante inexorável para a impunidade ou não. É por isso que o enfoque pericial da síndrome epiléptica deve levar em consideração propostas conceituais, como é o caso, por exemplo, da concepção da Personalidade Epileptiforme.
Uma vez elaborado o diagnóstico da Epilepsia e/ou de algum Transtorno de Personalidade, caberá tentar determinar se o delito cometido pode ser conseqüente a alguma das modalidades das diversas formas sintomatológicas da Epilepsia, notadamente se pode ser atribuído a algum dos elementos psicopatológicos fundamentais deste quadro, ou seja, da inconsciência ou dos automatismos.
Dentro do primeiro elemento psicopatológico, cabe destacar a possível ocorrência de amnésia, respeitando-se suas características de ser espontânea, total, completa, homogênea e compacta. Nas Crises Tônico-Clônicas (convulsões), nas Crises Parciais Complexas (psicomotoras) e nas Crises Generalizadas de Ausência há perda da consciência. Nas duas primeiras modalidades a recuperação da consciência é gradual. Existe uma fase intermediária que precede a lucidez total e completa, a qual se caracteriza por uma grande sensação de estranheza, perplexidade e desorientação, durante a qual alguns comportamentos automáticos podem ter lugar.
É extremamente importante a psiquiatria forense reconhecer que o epiléptico pode produzir delitos não só durante as crises de sua doença, como também antes ou depois das mesmas. Quando o ato se dá antes das crises, pode ser que tenha ocorrido durante as chamadas auras epilépticas ou pródromos da crise.
Não se deve atribuir à Epilepsia os variados transtornos de conduta, seja por agressividade ou atitudes anti-sociais, quando cronicamente detectados na vida da pessoa. Nada impede que, além de epiléptico, o indivíduo seja também uma "má pessoa", perfeitamente capaz de cometer delitos ou crimes e, nada também, nos autoriza a permitir que os epilépticos possam 
Além isso, a psiquiatria tem opinião mais ou manos consensual de que, fora tais crises epilépticas, precisamente delimitas no tempo, ainda existe o problema da Personalidade Epiléptica, cujos traços podem ser responsáveispelo desenrolar do delito. Mesmo em se tratando dessa maneira crônica de ser, proporcionado por um tipo de personalidade, como a Personalidade Epiléptica, mesmo assim os momentos propícios ao delito são extremamente paroxísticos e imprevisíveis.
14) Personalidade Criminosa
A criminalidade atual tem constatado violações cada vez mais peculiares da lei, da moral e da ética, tem se surpreendido pela produção de delitos em faixas etárias cada vez menores, pela atitude criminosa cada vez mais presente em pessoas "normais", do ponto de vista sócio-cultural, por delitos motivados cada vez mais por questões de difícil compreensão. Isso tudo exige novas reflexões sobre as relações entre a psicopatologia e o ato delituoso. 
Cogitar sobre a existência de uma personalidade propensa ao crime e ao delito sempre foi uma preocupação de muitos autores da sociologia, psiquiatria e antropologia. Alguns identificam nessas pessoas naturalmente más, portadores de Transtorno Anti-Social da Personalidade, ou Sociopatas, ou Psicopatas e coisas assim. Vamos refletir sobre algumas questões dessa natureza. 
A sociedade em geral e, em particular, a justiça penal, carece de noções mais precisas corroborando ou contestando da forma mais clara possível, a idéia de Traços de Personalidade ou de uma Personalidade Criminosa determinante de comportamentos delinqüentes. Essa também é a grande dúvida da psiquiatria. 
Especular sobre o grau de noção ou de juízo crítico que o criminoso tem de seu ato, e até que ponto ele seria senhor absoluto de suas ações ou servo submisso de sua natureza biológica, social ou vivencial, sempre foi preocupação da sociologia, antropologia e psiquiatria. Isso se aplica aos inúmeros casos de assassinos seriais, estupradores contumazes, gangues de delinqüentes, traficantes, estelionatários, etc.
Como veremos nessa revisão, dois pontos se destacam na literatura mundial; primeiro, é que parece aceitar-se, unanimemente, a existência uma determinada personalidade marcantemente criminosa ou, ao menos, inclinada significativamente para o crime. Em segundo, que a diferença principal entre as várias tendências doutrinárias diz respeito à flexibilidade ou inflexibilidade dessa personalidade criminosa, atribuindo ora uma predominância de fatores genéticos, ora de fatores emocionais e afetivos e, ora ainda, fatores sociais e vivenciais. E essa última questão estará diretamente relacionada ao arbítrio, juízo e punibilidade do infrator. 
O reconhecimento da existência de uma personalidade em estado perigoso (periculosidade), fez com que a sociedade não se preocupasse mais, e exclusivamente, com a gravidade do ato criminoso mas, sobretudo, com a incômoda e problemática natureza do criminoso. A noção de Periculosidade, então, nasceu da conceituação de alguma patologia incrustada na personalidade do criminoso, tal como a antiga Monomania Homicida, atenuando assim a responsabilidade plena dos atos cometidos e, ao mesmo tempo, prevenindo a sociedade da presença incômoda desses mutilados éticos através da segregação manicomial.
O conceito de periculosidade se mantém indissociável do conceito de personalidade (criminosa), e ambos seriam conceitos fundamentais para o desenvolvimento da criminologia clínica. Através desta, acredita-se poder concentrar esforços na procura de índices capazes de identificar características de risco e fatores desencadeantes. Aqui ficam patentes a avaliação da periculosidade do sujeito e a eventual argüição de seu potencial de socialização.
Determinismo à parte, não se consegue esquecer o fato do conceito de personalidade ser, por si próprio, problemático. As principais teorias psicológicas da criminalidade que hoje em dia dominam a investigação nesta área poderão ser agrupadas em duas grandes linhas gerais. Uma delas, centrada na pesquisa das diferenças que caracterizam a dita Personalidade Criminosa, específica do criminoso e determinadora do ato delinqüente e uma outra linha, a de investigação, mais ligada à análise do vivido do criminoso e de seu percurso na criminalidade, partindo de uma abordagem fenomenológica do autor da ação delituosa.
A criminalidade moderna, entretanto, particularmente considerando-se crimes curiosos entre escolares, franco-atiradores, ideológicos, religiosos e outros, exige o desenvolvimento de outros modelos criminais. Alguns autores partem da constatação de que não existem diferenças de personalidade entre delinqüentes e não delinqüentes. A pesquisa atual se orienta cada vez mais para a compreensão dos processos complexos pelos quais uma pessoa se envolve numa conduta delinqüente, adquire uma identidade criminosa e adota, finalmente, um modo de vida delinqüente.
Desta forma, não estaríamos diante um conjunto de traços de personalidade determinantes de uma conduta criminosa, mas diante de uma ação delituosa resultante da interação entre determinados contextos e situações do meio, juntamente com um conjunto de processos cognitivos pessoais, afetivos e vivenciais, os quais acabariam por levar a pessoa a interpretar a situação de uma forma particular e a agir (criminosamente) de acordo com o sentido que lhe atribui. Aqui também se pensa numa determinada Personalidade Criminosa, entretanto, personalidade esta produzida não apenas pelo arranjo genético mas, sobretudo, pelo desenvolvimento pessoal. 
Essa nova tendência reconhece que a personalidade e o ato são inter-relacionados da seguinte forma: a personalidade é a matriz de produção da ação e define as condições e modalidades do agir, enquanto o ato seria o processo de materialização dessa personalidade. 
 	Hoje em dia, alguns autores que pesquisam crimes e delinqüências comuns do cotidiano perpetrados por delinqüentes primários e reincidentes, não têm encontrado entre eles déficits ou psicopatologias relevantes o suficiente para se associar ao que se entende por Personalidade Criminosa ou comportamento criminal, verificando-se, pelo contrário, que esses sujeitos não se distinguem significativamente dos indivíduos ditos normais.
Tem sido simpática a idéia de que os comportamentos transgressivos não resultam da incapacidade para agir de outra forma que não a criminosa, como pretendiam os positivistas, nem de uma determinação biológica para só agir desta forma, como acreditavam os deterministas. Os atos, delituosos ou não, estariam relacionados com processos da personalidade ao nível da construção de significados e de valores da realidade, bem como com as opções de relacionamento da pessoa com essa realidade. Tal conceito implica na existência de uma estrutura da personalidade que determina certos padrões de ação e certos padrões de inter-relação particular do indivíduo com a realidade, fazendo com que ela aja em conformidade com a visão pessoal que tem da realidade.
 Atualmente é difícil aceitar-se a existência de uma personalidade tipicamente criminosa, composta por traços imutáveis e pré-definidos. Defende-se sim a existência de diferentes formas de organização e estruturação da personalidade, de diferentes maneiras de integrar os estímulos do meio e os processos psíquicos e de diferentes maneiras de relação com o mundo exterior. Essa estruturação típica e própria da personalidade é que produziria diferentes representações da realidade nas diferentes pessoas e, em função dessa personalidade, as pessoas definirão também suas diferentes formas de agir e de se relacionar com os outros e com o mundo.
 15) Transtornos de narcisismo
As "depressões", "síndromes do pânico" (essas duas grandes vedetes dos consultórios atuais) e as toxicomanias decorreriam de frustração narcísica. A necessidade de manter a satisfação narcísica alimentaria o narcotráfico e a própria ênfase atual da psiquiatria na farmacologia, a seu ver, seria uma contrapartida, um movimento próximo ao do narcotráfico, por enfatizar a crença na possibilidade de ter rápidas e fáceis satisfações químicamente condicionadas, ignorando a importância do mundo simbólico do paciente. 
Vejo a grande incidência dos distúrbiosnarcísicos atuais de uma forma um tanto diferente. Se entendemos o narcisismo como o momento de fusão com o objeto primário, as disfunções narcísicas apontam para a existências de sujeitos nos quais a castração simbólica não operou adequadamente, deixando-os permanentemente numa atitude de adição frente a suprimentos narcísicos dos quais não podem abrir mão, sem os quais não podem subsistir. Esses suprimentos narcísicos poderão ser fornecidos pela droga ou pelo outro, ao qual há uma aderência, uma dependência fusional pouco reconhecida. 
Nesses casos não há o reconhecimento de uma efetiva alteridade, pois o sujeito não se discrimina inteiramente do objeto, está nele entranhado sem o reconhecer e sem se reconhecer. Aparentemente ele "usa" o outro, na verdade ele necessita vitalmente deste outro, não poderia existir sem ele.
Esse mundo da patologia narcísica é alimentado pela midia e pela sociedade do consumo. A mídia, especialmente a toda-poderosa televisão, nos bombardeia initerruptamente com imagens de sucesso sexual e financeiro, mostrando um novo olimpo, onde desfilam os atuais deuses cheios de beleza, juventude, dinheiro e fama. Ela promete o acesso a este ‘olimpo’, desde que sigamos suas instruções de consumo, insistemente propagadas através da publicidade. Isso tem um efeito altamente nocivo. Sabemos que a publicidade em si é enganosa, é uma falácia. Para vender seu produto, apela para a fantasia de todos, promete a realização de secretos desejos inconscientes.
Dizendo de outra forma, a televisão impõe padrões narcísicos absolutamente irrealísticos veiculados massivamente através da publicidade, frente aos quais todos nós reagimos desenvolvendo uma forma de pensar perversa. 
Frente ao narcisismo inevitavelmente ferido pela realidade, só restam duas alternativas. A primeira é tentativa desesperada de restaurá-lo, numa insana procura de subsídios narcísicos. Drogas, relações fusionais, negação da alteridade, intolerância, projeção do insuportável, o querer acreditar que tudo se resolve facil e rapidamente. Às vezes parece que a psiquiatria, talvez inadvertidamente, entre por esta via, acreditando tudo poder fazer com as drogas, dispensando a dimensão humana, subjetiva, simbólica do paciente. Por outro lado é a psicanálise que oferece, indo na contra-mão do espírito do tempo, nadando contra a atual maré. É proporcionar o confronto com a inevitável ferida narcísica da castração, única via para uma integração maior do psiquismo e um contato mais efetivo com a realidade interna e externa de cada um. Não deve nos produzir muita admiração, constatar que os compradores de ilusão, não se interessam muito por tal mercadoria. 
Unidade VI –
Transtornos mentais da infância e adolescência
Tem havido solicitação crescente aos profissionais da saúde mental o estudo, conduta e intervenção nas necessidades de crianças e adolescentes expostos a eventos traumáticos individualmente ou em grupos. Alguns estudos revelam que crianças e adolescentes têm alto risco de desenvolver diferentes problemas comportamentais, psicológicos e neurobiológicos como conseqüência das vivências traumáticas ou experiências de vida estressantes. Outros trabalhos referem que, em algumas pessoas, as experiências traumáticas podem não produzir efeitos psiquiátricos desastrosos e mesmo até alguns efeitos positivos. 
Cada vez mais se analisam as variedades de eventos traumáticos precoces ou em tenra idade e sua verdadeira importância no desenvolvimento de quadros conhecidos como Transtorno de Estresse Pós-Traumático, Transtornos de Ansiedade, Depressivos ou mesmo nos sintomas de luto traumático das crianças. Apesar do empenho dos pesquisadores, ainda faltam de estudos bem desenhados e cientificamente expressivos para análise dos sintomas, quadro clínico, conseqüência e tratamento do Transtorno de Estresse Pós-Traumático em crianças e adolescentes. 
Há interesse cada vez maior sobre o impacto de eventos traumáticos em crianças e adolescentes, até por conta dos recentes desastres naturais (tufões, furacões, terremotos, tsunamis) e dos “cataclismos” criados pelo homem, através dos atos de violência (guerras, violência urbana e doméstica, etc).
O que se observa na clínica diária, é que algumas crianças e adolescentes vítimas desses traumas se adaptam e se recuperam de maneira surpreendente, apesar da experiência sofrível pela qual passaram ou que testemunharam. Portanto, constata-se através da revisão de pesquisas sobre o tema, existir uma grande variedade de respostas aos eventos traumáticos que acometem crianças e adolescentes e, assim, fica cada vez mais difícil atribuir às mazelas das condutas e emoções posteriores uma causalidade exclusivamente vivencial precoce. 
A pergunta que se faz é se existiriam, e quais seriam os fatores protetores individuais, fazendo com que algumas pessoas parecem menos vulneráveis que outras em relação às vivencias traumáticas.
Discute-se se existiria uma personalidade mais imune às vivências traumáticas ou, por outro lado, se o apoio social e familiar seria o fator decisivo para essas crianças a se recuperarem, impedindo assim uma conseqüência mais patológica do trauma. O que se vê na clínica e na vida em geral, embora não seja “politicamente correto”, é que as conseqüências psicológicas das vivências parecem depender muito mais da personalidade sobre a qual agem essas vivências do que das próprias vivências em si. Isso corresponderia a dizer que as reações dependem muito mais do agente “agredido” do que do agente “agressor”. Entre os variáveis potenciais que determinam as conseqüências dos traumas vividos por crianças e adolescentes em longo e médio prazo, devemos considerar fortemente as eventuais psicopatologias e predisposições preexistentes nessas pessoas.
O perfil afetivo a pessoa que reage é fundamental para a valorização da experiência vivida, a ponto dos eventos serem mais traumáticos para uns que para outros
Juntando isso ao fato do Transtorno de Estresse Pós-Traumático ser acompanhado de taxas elevadíssimas de depressão (comorbidade), aparece a clássica pergunta; a Depressão e o Transtorno de Estresse Pós-Traumático seriam síndromes distintas ou, ao contrário, seriam aspectos diferentes de um mesmo fenômeno emocional. Se assim fosse, então o Transtorno de Estresse Pós-Traumático seria apenas uma manifestação clínica diferente da depressão.
O maior volume de pesquisas sobre o impacto psicológico dos traumas em crianças e adolescentes, entretanto, se concentra em abusos, maus-tratos e violência doméstica em geral. Em graus muito variáveis de adaptação e superação, crianças que sofreram abuso e maus-tratos correm maiores riscos de desenvolverem os seguintes quadros: 
1)Transtorno Obsessivo-Compulsivo em Crianças
As “manias”, alguns tiques e pensamentos absurdos que não saem da cabeça podem fazer parte do quadro de Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) e, embora esse quadro tenha geralmente início na adolescência ou começo da idade adulta, ele pode aparecer na infância de forma tão comum quanto em adultos. A idade de início costuma ser um pouco mais precoce nos homens mas, de qualquer forma, cerca de 33 a 50% dos pacientes com TOC referem que o início do transtorno foi na infância ou adolescência, 
Com mais freqüência o início do transtorno é gradual, mas em alguns casos pode ser agudo e a média de idade para seu surgimento é dos 6 aos 11 anos. A maioria dos indivíduos tem um curso crônico de vaivém dos sintomas, com exacerbações possivelmente relacionadas a ansiedade, depressão e ao estresse. 
Fisiologicamente costuma existir um pequeno grau de obsessões nas crianças, como por exemplo, quando de carro, contar as árvores ou postes que passam, não pisar nos riscos das calçadas, e coisas assim. Com o amadurecimento esses pensamentos intrusivos vão desaparecendo mas, não é incomum que adultos tenham algum resquício desses pensamentos e até de comportamentos compulsivos, como verificar várias vezes se a porta está fechada, por exemplo. 
Na infânciaas idéias obsessivas mais comuns têm como foco a contaminação ou germes, seguido pelo medo de alguma coisa de mal que possa acontecer para si ou para familiares, moralização ou religiosidade excessivas, incluindo pensamentos em pecados. 
As compulsões mais comuns incluem rituais para andar (não pisar aqui e ali), lavagem excessiva, repetição, checagem, tocar, contar e ordenar. 
Os rituais de lavagem (mãos, banho, escovação) chegam a ocorrer em uma freqüência de 85% das crianças com TOC. Com o passar do tempo a sintomatologia do TOC infantil pode mudar. 
O declínio do rendimento escolar, conseqüente à diminuição da capacidade de concentração, pode ser uma valiosa pista para que os pais comecem a pensar em algum problema dessa natureza. Também alguns problemas dermatológicos devem chamar atenção, sobretudo as dermatites eczematóides,  geralmente ocasionadas por lavagens excessivas com água ou detergentes. De modo geral a criança com TOC tem crítica da estranheza de suas atitudes e escondem essas “manias”, por isso elas procuram executar seus rituais em casa e não diante de professores ou estranhos. 
O TOC, tanto em adultos como em crianças, é uma doença crônica, e de dois a catorze anos depois de feito o diagnóstico inicial, ainda não acontece eliminação de todos os sintomas em 43% a 68% dos casos, porém, cerca de 30% dos pacientes apresenta remissão espontânea depois de alguns anos de doença. Infelizmente, 10% dos pacientes têm piora progressiva e acabam por apresentarem múltiplas obsessões e compulsões, as quais mudam em conteúdo e severidade com o passar do tempo. 
2) Depressão Infantil
O Transtorno Depressivo Infantil é um transtorno do humor capaz de comprometer o desenvolvimento da criança ou do adolescente e interferir com seu processo de maturidade psicológica e social. São diferentes as manifestações da depressão infantil e dos adultos, possivelmente devido ao processo de desenvolvimento que existem na infância e adolescência.
 	Apesar da tamanha importância da Depressão da Infância e Adolescência em relação à qualidade de vida, ao suicídio, às dificuldades na escola, no trabalho e no ajuste pessoal, esse quadro não tem sido devidamente valorizado por familiares e pediatras e nem adequadamente diagnosticado. Embora na maioria das crianças a sintomatologia da Depressão seja atípica, alguns podem apresentar sintomas clássicos de Depressão, tais como tristeza, ansiedade, expectativa pessimista, mudanças no hábito alimentar e no sono ou, por outro lado, problemas físicos, como dores inespecíficas, fraqueza, tonturas, mal estar geral que não respondem ao tratamento médico habitual.
Na criança e adolescente a Depressão, em sua forma atípica, esconde verdadeiros sentimentos depressivos sob uma máscara de irritabilidade, de agressividade, hiperatividade e rebeldia. As crianças mais novas, devido a falta de habilidade para uma comunicação que demonstre seu verdadeiro estado emocional, também manifestam a Depressão atípica, notadamente com hiperatividade
A depressão na criança e/ou adolescente pode ter início com perda de interesse pelas atividades que habitualmente eram interessantes, manifestando-se como uma espécie de aborrecimento constante diante dos jogos, brincadeiras, esportes, sair com os amigos, etc, além de apatia, adinamia e redução significativa da atividade. Às vezes pode haver tristeza. 
De forma complementar aparece diminuição da atenção e da concentração, perda de confiança em si mesmo, sentimentos de inferioridade e baixa autoestima, idéias de culpa e inutilidade, tendência ao pessimismo, transtornos do sono e da alimentação e, dependendo da gravidade, ideação suicida. 
A Depressão Infantil não se traduz, invariavelmente, por tristeza e outros sintomas típicos. A diferença entre os momentos nos quais as crianças podem estar tristes ou aborrecidas com quaisquer fatores vivenciais que as molestem e a Depressão verdadeira está, principalmente, no tempo e na motivação para esse sentimento. A Depressão Infantil tem sido cada vez mais observada devido, em parte, à atualização conceitual e atenção médica crescente sobre esta doença.
 	Apesar da Depressão, tanto no adulto quanto na criança, ter como modelo de diagnóstico a conhecida constelação de sintomas, decorrentes da tríade sofrimento moral, a inibição psíquica global e no estreitamento do campo vivencial, as diferentes características pessoais e as diferentes situações vivenciais entre o adulto e a criança, farão com que os sintomas secundários decorrentes dos sintomas básicos sejam bem diferentes. O sofrimento moral, por exemplo, responsável pela baixa autoestima, no adulto pode se apresentar como um sentimento de culpa e, na criança, como ciúme patológico do irmão mais novo.
Nas crianças e adolescentes é comum a Depressão ser acompanhada também de sintomas físicos, tais como fadiga, perda de apetite, diminuição da atividade, queixas inespecíficas, tais como cefaléias, lombalgia, dor nas pernas, náuseas, vômitos, cólicas intestinais, vista escura, tonturas, etc. Na esfera do comportamento, a Depressão na Infância e Adolescência pode causar deterioração nas relações com os demais, familiares e colegas, perda de interesse por pessoas e isolamento. As alterações cognitivas da Depressão infantil, principalmente relacionadas à atenção, raciocínio e memória interferem sobremaneira no rendimento escolar.
Os sintomas mais freqüentes da Depressão na Infância e Adolescência costumam ser os seguintes: insônia, choro, baixa concentração, fatiga, irritabilidade, rebeldia, tiques, medos lentidão psicomotora, anorexia, problemas de memória, desesperança, ideações e tentativas de suicídio. A tristeza pode ou não estar presente.
O Transtorno Depressivo na Infância e Adolescência se caracteriza por uma sintomatologia afetiva de longa duração e está associado a vários outros sinais e sintomas vistos acima, tais como, insônia, irritabilidade, rebeldia, medo, tiques, mudanças nos hábitos alimentares, problemas na escola, na vida social e familiar.
É tão comum o Transtorno Depressivo na Infância e Adolescência, a ponto de alguns autores recomendarem que, sempre que a criança manifestar tais alterações por um tempo prolongado, deve-se considerar a possibilidade desse diagnóstico. Entretanto, é muito importante determinar se esses sintomas estão, de fato, relacionados com um quadro depressivo ou se são parte das ebulições emocionais normais do desenvolvimento.
As Disforias, que são alterações do humor, são encontradas comumente no cotidiano e não têm, obrigatoriamente, uma conotação de doença. Tratam-se de respostas afetivas aos eventos diários, caracterizando-se pela brevidade do quadro emocional sem comprometimento das condutas adaptativas, sociais, escolares e familiares. Na realidade as Disforias seriam apenas momentos de tristeza, angústia e abatimento moral que surgem em decorrência da problemática existencial normal e cotidiana, tais como as correções dos pais, desinteligências com irmãos, aborrecimentos na escola, etc.
As diferenças entre as Disforias e a Depressão seria em relação à evolução benigna das Disforias, o que não acontece quando há importante componente depressivo. A recuperação das vivências traumáticas e estressoras é mais demorada e sempre há algum prejuízo da adaptação. 	Grosso modo, podemos dizer que as Disforias são mais ou menos fisiológicas na lide com as adversidades diárias, enquanto a Depressão seria uma maneira patológica de reagir à vida. 
 	Os quadros que se apresentam como Fobia Escolar, caracterizada pela evitação da escola, por dores inespecíficas, febre sem causa aparente, e outros sintomas obscuros para fugir das aulas, podem refletir altos índices de ansiedade e depressão. Deve-se avaliar a presença de baixa autoestima, perda de prazer e, muitas vezes, até ideação suicida. Podem ser encontradas também, nesses casos, expectativas negativas e pessimistas da vida, mas, como a criança tem grandes dificuldades para expressar esses aspectos vivenciais de sua vida ou de seu mundo,essa investigação tem sido muito difícil.
A socialização da criança em idade escolar com Depressão Infantil pode estar comprometida e se manifesta através do isolamento social, das dificuldades de relação interpessoal, com sintomas de alteração afetiva (irritabilidade). Na primeira infância, entretanto, se detectam estas alterações quando o lactente é pouco comunicativo, confundido normalmente com um bebê muito bonzinho ou, por outro lado, podem manifestar a depressão com irritabilidade (bebês irritáveis, com tendência a a hiperexcitabilidade), ou ainda, com aversão à estranhos (bebês que estranham demasiado as mínimas mudanças em seu entorno).
3) Deficiência Mental
A partir do século XX começou-se a estabelecer uma definição para o Deficiente Mental e essa definição diz respeito ao funcionamento intelectual, que seria inferior à média estatística das pessoas e, principalmente, em relação à dificuldade de adaptação ao entorno.
Segundo a descrição do DSM.IV, a característica essencial do Retardo Mental é quando a pessoa tem um “funcionamento intelectual significativamente inferior à média, acompanhado de limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas de habilidades: comunicação, auto-cuidados, vida doméstica, habilidades sociais, relacionamento interpessoal, uso de recursos comunitários, auto-suficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança”
 Teoricamente, deveriam ficar em segundo plano as questões mensuráveis de QI, já que a unidade de observação é a capacidade de adaptação.Acostumamos a pensar na Deficiência Mental como uma condição em si mesma, um estado patológico bem definido. Entretanto, na grande maioria das vezes a Deficiência Mental é uma condição mental relativa. A deficiência será sempre relativa em relação aos demais indivíduos de uma mesma cultura, pois, a existência de alguma limitação funcional, principalmente nos graus mais leves, não seria suficiente para caracterizar um diagnóstico de Deficiência Mental, se não existir um mecanismo social que atribua a essa limitação um valor de morbidade. E esse mecanismo social que atribui valores é sempre comparativo, portanto, relativo.
Como vimos nas definições acima, Deficiência Mental é um estado onde existe uma limitação funcional em qualquer área do funcionamento humano, considerada abaixo da média geral das pessoas pelo sistema social onde se insere a pessoa. Isso significa que uma pessoa pode ser considerada deficiente em uma determinada cultura e não deficiente em outra, de acordo com a capacidade dessa pessoa satisfazer as necessidades dessa cultura. Isso torna o diagnóstico relativo.
 	Academicamente, é possível diagnosticar o Retardo Mental em indivíduos com QIs entre 70 e 75, porém, que exibam déficits significativos no comportamento adaptativo. Cautelosamente o DSM.IV recomenda que o Retardo Mental não deve ser diagnosticado em um indivíduo com um QI inferior a 70, se não existirem déficits ou prejuízos significativos no funcionamento adaptativo.
Na Deficiência Mental, como nas demais questões da psiquiatria, a capacidade de adaptação do sujeito ao objeto, ou da pessoa ao mundo, é o elemento mais fortemente ligado à noção de normal. Teoricamente, já que a unidade de observação é a capacidade de adaptação, deveriam ficar em segundo plano as questões mensuráveis de QI.
 	De um modo geral, resumindo, costuma-se ter como referência para avaliar o grau de deficiência, mais os prejuízos no funcionamento adaptativo que a medida do QI. Por funcionamento adaptativo entende-se o modo como a pessoa enfrenta efetivamente as exigências comuns da vida e o grau em que experimenta uma certa independência pessoal compatível com sua faixa etária, bem como o grau de bagagem sócio-cultural do contexto comunitário no qual se insere.
O diagnóstico de Deficiência Mental é muitas vezes difícil. Numerosos fatores emocionais, alterações de certas atividades nervosas superiores, alterações específicas de linguagem ou dislexia, psicoses, baixo nível sócio econômico ou cultural, carência de estímulos e outros elementos do entorno existencial podem estar na base da impossibilidade do ajustamento social adaptativo adequado, sem que haja necessariamente Deficiência Mental. 
4) Déficit de Atenção
Na realidade o nome atualmente mais correto para esse problema é Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e normalmente essas crianças costumam ser descritas mais ou menos assim: Desde pequeno já é inquieto. Em casa, corre daqui para lá o dia todo, sem que nada o detenha, nem sequer o perigo. Tira brinquedos de seu lugar, esparrama todos eles pelo chão e, quase sem usa-los, pega outros e outros, sem deter-se em nenhum. Interrompe permanentemente os adultos e as outras crianças, respondendo impulsivamente e de forma exagerada àqueles que o molestam. Seus companheiros de escola o evitam, mesmo assim ele sempre termina chamando-os para pedir-lhes ajuda nas lições que não consegue copiar a tempo. 
Essa criança sempre perde os objetos, é desordenado, tendo que cobrá-lo o tempo todo, não só para que complete as tarefas, mas também porque, distraído, se esquece de que é hora de almoçar, de jantar ou de banhar-se.
Quando começa fazer alguma coisa, se esquece de terminar, para na metade. Quando vai a algum lugar para no caminho, se detém para falar com alguém, para entreter-se numa brincadeira, com algum animal ou passarinho que passa voando.
Tal criança pode ser portadora de Transtorno de Déficit de Atenção por Hiperatividade (TDAH). Trata-se de um dos transtornos mentais mais freqüentes nas crianças em idade escolar, atingindo 3 a 5% delas. 
Apesar disto, o TDAH continua sendo um dos transtornos menos conhecidos por profissionais da área da educação e mesmo entre os profissionais de saúde. Há ainda muita desinformação sobre esse problema.
O desconhecimento desse quadro freqüentemente acaba levando à demora no diagnóstico e no tratamento dos portadores do TDAH, os quais acabam sofrendo por vários anos sem saber que a sua situação pode ser (facilmente) tratada.
O TDAH é agora um conceito diagnóstico universalmente aceito que engloba o antigo conceito de Disfunção Cerebral Mínima, que era um termo empregado dos anos 50 aos anos 80. Segundo Gillberg (2003), o TDAH é a mais prevalente entre todos os transtornos neuropsíquicos e de desenvolvimento neurológico da criança. Esse pesquisador refere uma taxa relativamente estável de 3-6% de todas as crianças da Suécia , Dinamarca, EUA, Austrália, Espanha, e Brasil, para mencionar somente alguns dos países em que os estudos epidemiológicos foram realizados.
A prevalência do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e da condição sobreposta do Déficit de Atenção, do Controle Motor e da Percepção (DAMP), entre crianças escolares é de aproximadamente 5%, sendo 1,5% de casos mais severos (Modigh, 1998). Geralmente os meninos são afetados mais do que meninas, embora se suspeite que as meninas sejam, provavelmente, subdiagnosticadas. 
De forma geral, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e o Déficits da Atenção, do Controle Motor e da Percepção (DAMP) são uma combinação de sintomas comuns na infância, sendo que cada uma dessas alterações acomete, aproximadamente, uma criança em cada 20,  na faixa etária dos 6 anos. 
Na realidade, determinar qual o nível de atividade normal de uma criança é um assunto polêmico. A maioria dos pais tem uma certa expectativa em relação ao comportamento de seus filhos e, normalmente, esta expectativa inclui um certo grau agitação, bagunça e desobediência, características que são aceitas como indicativos de saúde e vivacidade infantil.
Porém, algumas vezes podemos estar diante de um quadro de Hiperatividade Infantil, que foge da simples questão de comportamento. É um transtorno que vive a desafiar a teimosia dos avós, os quais continuam achando que "crianças são assim mesmo" (eles não vivem 24h por dia com essas crianças), ou que os pais delastambém eram assim quando crianças, ou que esses pais de hoje em dia não têm paciência. 
Devido à série de problemas psicológicos, sociais, educacionais e até mesmo criminais que pode ocorrer como conseqüência do não tratamento do TDAH, é muito importante que os profissionais da área de saúde mental e educação, além das famílias, estejam pelo menos informados sobre a existência do TDAH e os seus principais sintomas.
As crianças portadoras de TDAH ultrapassam a festiva barreira das travessuras engraçadinhas, deixam de ser adoráveis diabinhos e se transformam em um verdadeiro transtorno na vida dos pais, professores e todos que estiverem a sua volta. Elas parecem ignorar as regras de convívio social e, devido ao incômodo que causam, acabam sendo consideradas de má índole, caráter ou coisa parecida. 
No entanto, é preciso deixar claro que as crianças hiperativas não são, de forma nenhuma, más. Além disso, elas não se convencem facilmente e não conseguem se concentrar na argumentação lógica dos pais já que essas crianças têm extrema dificuldade em sentar e dialogar.
Por outro lado, ainda é comum encontrar entre leigos, a noção de que a criança hiperativa seja apenas malcriada, ou mal educada pelos pais. Este tipo de acusação freqüentemente resulta em sensação de fracasso pelos pais. Por isso, é muito importante que os profissionais estejam preparados para suportar e desfazer este mito.
O diagnóstico de TDAH pode ser difícil, pois os sintomas demonstrados pelos pacientes podem ocorrer não só devido ao TDAH, como também a uma série de problemas neurológicos, psiquiátricos, psicológicos e sociais. Entre estes distúrbios neuropsiquiátricos podemos mencionar a Síndrome de Tourette, Epilepsias, transtornos de humor ou ansiedade, transtornos de personalidade, retardo mental, ambiente estressante, problemas familiares, etc... 
Normalmente o diagnóstico começa pela eliminação outras patologias ou problemas sócio/ambientais, possivelmente causadoras dos sintomas. Além disso, os sintomas devem, obrigatoriamente, trazer algum tipo de dificuldade na realização de tarefas ou devem causar algum tipo de impedimento para a realização de tarefas.
A idade e a forma do surgimento dos sintomas também são importantes, devendo ser investigados, já que no TDAH, a maioria dos sintomas está presente na vida da pessoa há muito tempo, normalmente desde a infância. Portanto, por se tratar de um transtorno de natureza crônico e atrelado à constituição da pessoa, os sintomas de dificuldade de atenção/concentração ou hiperatividade semelhantes ao TDAH, mas que apareçam de repente, de uma hora para outra, tem uma grande possibilidade de NÃO serem TDAH.
Para que se considere um TDAH, os sintomas devem se manifestar em vários ambientes (escola, casa, viagens, etc..). Os sintomas que só aparecem em um ambiente, como por exemplo, só em casa, só na escola, só quando sai de casa, etc., devem ser investigados com mais cuidado, para se verificar se não são de origem psicológica.
A criança com TDAH deve aparentar uma inteligência normal. Trabalhos escolares e testes de inteligências tendem a produzir "falsos positivos" para retardo mental em crianças com TDAH, devido à dependência destas atividades na atenção da criança.
Em casos onde há dúvidas sobre o diagnóstico de TDAH, pode ser interessante o uso de alguma experiência com medicamentos, somado ao uso de observações comportamentais e testes de inteligência. Neste caso a criança é testada e observada anteriormente, medicada e depois de 6 a 8 semanas, ela é novamente observada e testada, verificando se houve ou não mudança nos sintomas. Na maior parte dos casos de TDAH, há um aumento significativo na pontuação do teste de inteligência e uma diminuição dos sintomas observados.
5) Abuso Sexual Infantil
Seja qual for o número de abusos sexuais em crianças que se vê nas estatísticas, seja quantos milhares forem, devemos ter em mente que, de fato, esse número pode ser bem maior. A maioria desses casos não é reportada, tendo em vista que as crianças têm medo de dizer a alguém o que se passou com elas. E o dano emocional e psicológico, em longo prazo, decorrente dessas experiências pode ser devastador.
O abuso sexual às crianças pode ocorrer na família, através do pai, do padrasto, do irmão ou outro parente qualquer. Outras vezes ocorre fora de casa, como por exemplo, na casa de um amigo da família, na casa da pessoa que toma conta da criança, na casa do vizinho, de um professor ou mesmo por um desconhecido.
Em tese, define-se Abuso Sexual como qualquer conduta sexual com uma criança levada a cabo por um adulto ou por outra criança mais velha. Isto pode significar, além da penetração vaginal ou anal na criança, também tocar seus genitais ou fazer com que a criança toque os genitais do adulto ou de outra criança mais velha, ou o contacto oral-genital ou, ainda, roçar os genitais do adulto com a criança.
Às vezes ocorrem outros tipos de abuso sexual que chamam menos atenção, como por exemplo, mostrar os genitais de um adulto a uma criança, incitar a criança a ver revistas ou filmes pornográficos, ou utilizar a criança para elaborar material pornográfico ou obsceno. 
Devido ao fato da criança muito nova não ser preparada psicologicamente para o estímulo sexual, e mesmo que não possa saber da conotação ética e moral da atividade sexual, quase invariavelmente acaba desenvolvendo problemas emocionais depois da violência sexual, exatamente por não ter habilidade diante desse tipo de estimulação. 
A criança de cinco anos ou pouco mais, mesmo conhecendo e apreciando a pessoa que o abusa, se sente profundamente conflitante entre a lealdade para com essa pessoa e a percepção de que essas atividades sexuais estão sendo terrivelmente más. Para aumentar ainda mais esse conflito, pode experimentar profunda sensação de solidão e abandono. 
Quando os abusos sexuais ocorrem na família, a criança pode ter muito medo da ira do parente abusador, medo das possibilidades de vingança ou da vergonha dos outros membros da família ou, pior ainda, pode temer que a família se desintegre ao descobrir seu segredo.
A criança que é vítima de abuso sexual prolongado, usualmente desenvolve uma perda violenta da auto-estima, tem a sensação de que não vale nada e adquire uma representação anormal da sexualidade. A criança pode tornar-se muito retraída, perder a confiança em todos adultos e pode até chegar a considerar o suicídio, principalmente quando existe a possibilidade da pessoa que abusa ameaçar de violência se a criança negar-se aos seus desejos. 
Algumas crianças abusadas sexualmente podem ter dificuldades para estabelecer relações harmônicas com outras pessoas, podem se transformar em adultos que também abusam de outras crianças, podem se inclinar para a prostituição ou podem ter outros problemas sérios quando adultos.
Comumente as crianças abusadas estão aterrorizadas, confusas e muito temerosas de contar sobre o incidente. Com freqüência elas permanecem silenciosas por não desejarem prejudicar o abusador ou provocar uma desagregação familiar ou por receio de serem consideradas culpadas ou castigadas. Crianças maiores podem sentir-se envergonhadas com o incidente, principalmente se o abusador é alguém da família.
Mudanças bruscas no comportamento, apetite ou no sono pode ser um indício de que alguma coisa está acontecendo, principalmente se a criança se mostrar curiosamente isolada, muito perturbada quando deixada só ou quando o abusador estiver perto. 
O comportamento das crianças abusadas sexualmente pode incluir:
- Interesse excessivo ou evitação de natureza sexual; 
- Problemas com o sono ou pesadelos;
- Depressão ou isolamento de seus amigos e da família;
- Achar que têm o corpo sujo ou contaminado;
- Ter medo de que haja algo de mal com seus genitais;
- Negar-se a ir à escola, 
- Rebeldia e Delinqüência;
- Agressividade excessiva;
- Comportamento suicida;
- Terror e medo de algumas pessoas ou alguns lugares;
- Retirar-se ounão querer participar de esportes;
- Respostas ilógicas (para-respostas) quando perguntamos sobre alguma ferida em seus genitais;
- Temor irracional diante do exame físico;
- Mudanças súbitas de conduta. 
Algumas vezes, entretanto, crianças ou adolescentes portadores de Transtorno de Conduta severo fantasiam e criam falsas informações em relação ao abuso sexual. 
 Mais comumente quem abusa sexualmente de crianças são pessoas que a criança conhece e que, de alguma forma, podem controlá-la. De cada 10 casos registrados, em oito o abusador é conhecido da vítima. 
Esta pessoa, em geral, é alguma figura de quem a criança gosta e em quem confia. Por isso, quase sempre acaba convencendo a criança a participar desses tipos de atos por meio de persuasão, recompensas ou ameaças.
Mas, quando o perigo não está dentro de casa, nem na casa do amiguinho, ele pode rondar a creche, o transporte escolar, as aulas de natação do clube, o consultório do pediatra de confiança e, quase impossível acreditar, pode estar nas aulas de catecismos da paróquia. Portanto, o mais sensato será acreditar que não há lugar absolutamente seguro contra o abuso sexual infantil.
Em geral, aqueles que abusam sexualmente de crianças podem fazer com que suas vítimas fiquem extremamente amedrontadas de revelar suas ações, incutindo nelas uma série de pensamentos torturantes, tais como a culpa, o medo de ser recriminada, de ser punida, etc. Por isso, se a criança diz ter sido molestada sexualmente, os pais devem fazê-la sentir que o que passou não foi sua culpa, devem buscar ajuda médica e levar a criança para um exame com o psiquiatra.
Os psiquiatras da infância e adolescência podem ajudar crianças abusadas a recuperar sua auto-estima, a lidar melhor com seus eventuais sentimentos de culpa sobre o abuso e a começar o processo de superação do trauma. O abuso sexual em crianças é um fato real em nossa sociedade e é mais comum do que muita gente pensa. Alguns trabalhos afirmam que pelo menos uma a cada cinco mulheres adultas e um a cada 10 homens adultos se lembra de abusos sexuais durante a infância.
O tratamento adequado pode reduzir o risco da criança desenvolver sérios problemas no futuro, mas a prevenção ainda continua sendo a melhor atitude. Algumas medidas preventivas que os pais podem tomar, fazendo com que essas regras de conduta soem tão naturais quanto as orientações para atravessar uma rua, afastar-se de animais ferozes, evitar acidentes, etc. Se considerar que a criança ainda não tem idade para compreender com adequação a questão sexual, simplesmente explique que algumas pessoas podem tentar tocar as partes íntimas (apelidadas carinhosamente de acordo com cada família), de forma que se sintam incomodadas.
 	No momento em que esse incidente vem à tona, devemos considerar que o bem estar da criança é a prioridade. Se os familiares estão emocionalmente muito perturbados nesse momento, o assunto deve ser interrompido para que as emoções e idéias possam ser mais bem organizadas. Depois disso, deve-se voltar a tratar do assunto com a criança, explicando sempre que as emoções negativas são dirigidas ao agressor e nunca contra a criança.
Não devemos apressar insensivelmente a criança para relatar tudo de uma só vez, principalmente se ela estiver muito emocionada. Mas, por outro lado, devemos encorajá-la a falar com liberdade tudo o que tenha acontecido, escutando-a carinhosamente para que se sinta confiante. Responda a qualquer pergunta que a esteja angustiando e esclareça qualquer mal entendido, enfatizando sempre que é o abusador e não a criança o responsável por tudo. 
Se o abusador é um familiar a situação é bastante difícil para a criança e para demais membros da família. Embora possam existir fortes conflitos e sentimentos sobre o abusador, a proteção da criança deve continuar sendo a prioridade. 
As principais seqüelas do abuso sexual são de ordem psíquica, sendo um relevante fator na história da vida emocional de homens e mulheres com problemas conjugais, psicossociais e transtornos psiquiátricos.
Antecedentes de abuso sexual na infância estão fortemente relacionados a comportamento sexual inapropriado para idade e nível de desenvolvimento, quando comparado com a média das crianças e adolescentes da mesma faixa etária e do mesmo meio sócio-cultural sem história de abuso.
Em nível de traços no desenvolvimento da personalidade, o abuso sexual infantil pode estar relacionado a futuros sentimentos de traição, desconfiança, hostilidade e dificuldades nos relacionamentos, sensação de vergonha, culpa e auto-desvalorização, à baixa autoestima à distorção da imagem corporal, Transtorno Borderline de Personalidade e Transtorno de Conduta.
Em relação a quadros psiquiátricos francos, o abuso sexual infantil se relaciona com o Transtorno do Estresse Pós-traumático, com a depressão, disfunções sexuais (aversão a sexo), quadros dissociativos ou conversivos (histéricos), dificuldade de aprendizagem, transtornos do sono (insônia, medo de dormir), da alimentação, como por exemplo, obesidade, anorexia e bulimia, ansiedade e fobias.
6) Crianças Adotadas e de Orfanato
 	 Em tese, alguns estudos têm sugerido que as possíveis alterações no desenvolvimento de crianças adotadas podem ser estudadas, juntamente, com as eventuais alterações que sofre também a criança interna em orfanato. De certa forma isso é verdadeiro em grande número de casos, partindo do pressuposto que as crianças adotadas passaram, antes, algum tempo em instituições asilares, portanto, mesmo adotadas elas carregam as vivências da instituição. 
Há ainda quem compare as possíveis alterações observadas no desenvolvimento das crianças de orfanato, com as possíveis alterações de outras crianças que vivem em seus lares mas, não obstante, também são vítimas da Negligência Precoce. São os casos onde a mãe pode até estar fisicamente presente, mas é emocionalmente distante.
7) Negligência Precoce
Vamos considerar Negligência Precoce a situação onde não há uma interação satisfatória entre mãe e filho durante uma fase crítica na vida da criança. Essa ocorrência caracteriza uma das condições capazes de interferir no desenvolvimento infantil. 
Dependendo da dimensão psicológica e neurológica dessa Negligência Precoce, mesmo que a criança tenha recebido cuidados materiais e físicos adequados mas, tenha sido, esse relacionamento, emocionalmente indiferente ou carente, os danos causados podem ser permanentes. Os estudos sobre a formação do vínculo afetivo do recém nato não se limitam à humanos. Alguns etologistas constataram que chimpanzés também têm um atraso no desenvolvimento quando privados do contato materno adequado.
 	Entre os casos que podem ser considerados Negligência Precoce, o abandono é a forma mais grave e são vários os estudos sobre os efeitos deletérios de um abandono precoce da criança e da insuficiência vínculo mãe-filho para o bom desenvolvimento afetivo e neurológico. Trata-se de uma situação onde a criança está privada, cronicamente, das necessidades básicas para seu desenvolvimento pleno e normal.
Spitz, mais tarde Robertson e Bowlby, desenvolveram estudos sobre o abandono em fases precoces do desenvolvimento infantil. Esses autores demonstraram claramente, prejuízos no desenvolvimento físico e psíquico das crianças vítimas de abandono. Um exemplo desses efeitos nocivos é a chamada Depressão Anaclítica, descrita por Spitz, e traduzida por um quadro de perda gradual de interesse pelo meio, perda ponderal, comportamentos estereotipados (tais como balanceios) eventualmente, até a morte.
Em crianças precoces há uma sucessão de eventos que ocorrem depois de abandonadas denominadas de Reação de Abandono ou, por outros autores de Reação de Aflição prolongada, que é específica das situações onde falta a figura materna ou de um cuidador afetivamente adequado, parece não reconhecer essas pessoas.
A negligência é entendida, moral e juridicamente, como um tipo de violência onde o agressor é passivo, e a agressãoacontece justamente pela falta de ação; portanto é muitas vezes é tida como menos importante. A mãe ou pai negligente é culpado mais pelo que não fez.
7)Autismo Infantil
Para que a palavra autismo não perca sua precisão médica, especialistas do mundo todo concordam em utilizar alguns critérios de diagnóstico internacionalmente reconhecido. O mais recente esquema de diagnóstico é aquele descrito no Manual de Diagnóstico e Estatístico (DSM-IV) da Associação Americana de Psiquiatria.  Muito parecido e igualmente válido é a recomendação para diagnóstico da Classificação Internacional de Doenças (CID-10). Essas classificações passam a denominar o Autismo Infantil com o nome de Transtorno Autista. 
Na classificação do DSM.IV, o Transtorno Autista está localizado dentro dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento, portanto, essencialmente, o Autismo Infantil é um transtorno do desenvolvimento da pessoa, em outras palavras, é um transtorno constitucional. A classificação CID.10, da mesma forma, fala do Transtorno Autista como um transtorno global do desenvolvimento, caracterizado assim um desenvolvimento anormal ou alterado, o qual deve se manifestar antes da idade de três anos e apresentar uma perturbação característica das interações sociais, comunicação e comportamento.
Consideramos desenvolvimento, as mudanças sofridas pela pessoa, ao longo de sua vida, resultantes de sua interação com o ambiente. O ambiente é, para o indivíduo, uma fonte de estímulos das mais variadas naturezas, estímulos que determinarão no indivíduo uma série de interações e respostas e estas, finalmente, determinarão mudanças significativas no curso de sua vida. Os estímulos, sejam físicos, alimentares, sensoriais, cognitivos ou emocionais, são necessários para ocorrer uma mudança na pessoa, mudança esta que pode ser entendida como desenvolvimento. 
 	Como nosso tema é o sistema psíquico, interessa aqui o desenvolvimento neuropsicológico. Sem estímulos sensoriais, cognitivos ou emocionais não haverá mudanças neuropsicológicas e, sem estas, não haverá possibilidade de crescimento ou desenvolvimento neuropsicológico do indivíduo. Mas, para que essa seqüência evolutiva se dê a contento, há necessidade de um suporte biológico global suficiente e capaz de receber adequadamente esses estímulos. Um sistema neuropsicológico alterado ou funcionando precariamente, seja por razões orgânicas ou emocionais, não poderá se aproveitar plenamente dos estímulos recebidos. 
Não havendo condições psiconeurológicas para um adequado recebimento de estímulos, não haverá adequado desenvolvimento, não havendo desenvolvimento adequado, haverá prejuízo de várias áreas da performance humana. No Transtorno Autista há prejuízo severo das interações interpessoais, da comunicação e do comportamento global.
Porém, independentemente de critérios de diagnóstico, é certo que a síndrome atinge principalmente crianças do sexo masculino. As taxas para o transtorno são quatro a cinco vezes superiores para o sexo masculino, entretanto, as crianças do sexo feminino com esse transtorno estão mais propensas a apresentar um Retardo Mental mais severo que nos meninos.
 Até hoje o Transtorno Autista carece de maiores explicações médicas para seu aparecimento. Alguns autores tentaram estabelecer uma relação da frieza emocional das mães e dos pais com o desenvolvimento autista. O próprio Kanner julgava que a atitude e comportamento dos pais pudessem influir no aparecimento da síndrome. Ele havia observado em seus 11 pacientes iniciais que ele seus pais eram intelectualizados e emocionalmente frios, na grande maioria dos casos.
Tem sido evidente que, embora seja muito importante no desenvolvimento do transtorno a dinâmica emocional familiar, esse elemento não é suficiente em si mesmo para justificar o seu aparecimento. Portanto, o autismo não parece ser, em sua essência, um transtorno adquirido e, atualmente, o autismo tem sido definido como uma síndrome comportamental resultante de um quadro orgânico.
Trabalhos em todo o mundo já propuseram teorias psicológicas e psicodinâmicas para explicar o autismo e as psicoses infantis, principalmente numa época onde a investigação funcional e bioquímica do sistema nervoso central era ainda muito acanhada.
Se for preciso apontar um sintoma essencial, básico e primário para o Autismo Infantil, esse sintoma seria o severo déficit cognitivo, a mais importante desvantagem dessas crianças em relação às outras. Mesmo as profundas alterações no inter-relacionamento social, típicas do autismo, seriam secundárias ao déficit cognitivo básico. A prevalência sintomatológica começa a ser dada aos déficits cognitivos, em relação ao social. E existe a hipótese do autismo constituir-se num específico prejuízo do mecanismo cognitivo de representação da realidade.
 	Também é universalmente reconhecida a grande dificuldade que os autistas têm em relação à expressão das emoções. Faria parte dessa anormalidade específica uma incapacidade de reconhecer a emoção no rosto dos outros, uma falha constitucional envolvendo os afetos, uma ausência de coordenação sensório- afetivo e déficits afetivos comprometendo as habilidades cognitivas e de linguagem.
 Para um diagnóstico médico preciso do Transtorno Autista, a criança deve ser muito bem examinada, tanto fisicamente quanto psiconeurologicamente. A avaliação deve incluir entrevistas com os pais e outros parentes interessados, observação e exame psicomental e, algumas vezes, de exames complementares para doenças genéticas e ou hereditárias.
Hoje em dia podem-se proceder alguns estudos bioquímicos, genéticos e cromossômicos, eletroencefalográficos, de imagens cerebrais anatômicas e funcionais e outros que se fizerem necessários para o esclarecimento do quadro. Não obstante, o diagnóstico do Autismo continua sendo predominantemente clínico e, portanto, não poderá ser feito puramente com base em testes e/ou algumas escalas de avaliação.
De maneira mais ou menos comum, esses Transtornos se manifestam nos primeiros anos de vida e, freqüentemente, estão associados com algum grau de Retardo Mental. Os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento são observados, por vezes, juntamente com um grupo de várias outras condições médicas gerais, como por exemplo, com outras anormalidades cromossômicas, com infecções congênitas e com anormalidades estruturais do sistema nervoso central.
Embora termos como "psicose" e "esquizofrenia da infância" já tenham sido usados no passado com referência a indivíduos com essas condições, evidências consideráveis sugerem que os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento são distintos da Esquizofrenia, entretanto, um indivíduo com Transtorno Invasivo do Desenvolvimento ocasionalmente pode, mais tarde, desenvolver também a Esquizofrenia.
 	A CID.10 fala do comportamento ritualizado do autista, com hábitos anormais, resistências às mudanças (sameness), apego à objetos singulares e brincadeiras estereotipadas. A capacidade de pensamento abstrato ou simbólico e de fazer fantasias está muito diminuída neste transtorno. O nível de inteligência varia do retardo profundo ao normal ou acima do normal. O desempenho é habitualmente melhor para as atividades que requerem aptidões mnêmicas ou visoespaciais automáticas do que para as que necessitam das aptidões simbólicas ou lingüísticas.
 	Portanto, sobre o Autismo Infantil a CID.10 diz tratar-se de um transtorno invasivo de desenvolvimento definido pela presença de desenvolvimento anormal e/ou comprometido que se manifesta antes da idade de 3 anos e pelo tipo característico de funcionamento anormal em todas as três áreas de interação social, comunicação e comportamento restrito e repetitivo. Sublinha que o transtorno ocorre em garotos três ou quatro vezes mais freqüentemente que em meninas.
8) Transtornos Alimentares na Adolescência
Atualmente já se descreve o que poderia ser chamado de comportamento de risco para desenvolver um distúrbio alimentar. Em geral, os pacientes bulêmicos ou anoréticos, muitoantes da doença estabelecida, já apresentavam alguma alteração emocional e do comportamento. 
 	Emocionalmente esses pacientes de risco apresentavam alguma crítica constante a alguma parte do corpo, insatisfação com o peso, enfim, alguma alteração na percepção corporal (Dismorfia) com diminuição gradativa de suas atividades sociais.
Comportamentalmente apresentavam hábito de fazer dieta mesmo quando o peso estava proporcional à estatura e, mesmo ao perderem peso, continuavam com a dieta (Fisher, 1995).
É importante lembrar que todas essas modalidades de comportamento são de avaliação muito difícil quando se trata de adolescente, visto que nessa faixa etária, o isolamento, os problemas de relacionamento, a preocupação e vergonha com o corpo, a distorção da auto-imagem, aumento do apetite, modismos alimentares, etc., são característicos e esperados, fazendo parte da chamada Síndrome da Adolescência Normal.
Sabemos que para se desenvolver a Anorexia Nervosa e a Bulimia é necessário que o paciente experimente antes a Dismorfia Corporal. A característica essencial da a Dismorfia Corporal (Transtorno Dismórfico Corporal pela CID.10 e DISM.IV ou, historicamente, Dismorfofobia) é uma preocupação com algum aspecto na aparência, sendo este aspecto obsessivamente imaginado ou, se realmente houver algo presente, a preocupação sobre isso é acentuadamente excessiva e desproporcional. Essa preocupação exagerada causa sofrimento significativo ou prejuízo no funcionamento sócio-ocupacional.
Mas, como vimos antes, sendo a psiquiatria uma área caracteristicamente pautada em graus de variações em suas alterações, a Dismorfia Corporal pode ser leve, moderada e grave. Para alterações na Conduta Alimentar é necessário que a pessoa tenha uma auto-imagem alterada quantitativamente ou qualitativamente. Pode estar se achando muito gorda, quando na realidade seria apenas “cheinha”, pode estar se vendo apenas gorda, quando na realidade é normal ou até magra, enfim, pode estar se vendo (e sentindo) distante de algum padrão ideal de configuração. 
 	A psiquiatria - onde não deve ser absolutamente obrigatória a concomitância entre o bem estar emocional e a adequação estética - quer saber se as pessoas podem estar vivendo numa cultura altamente estimulante para o desenvolvimento de transtornos emocionais, numa sociedade que faz crer a todos que o preço da não conformidade aos valores estéticos vigentes é obrigatoriamente a angústia e infelicidade. E até que ponto essa angústia e depressão levariam aos Transtornos da Conduta Alimentar.
Outros comportamentos impulsivos podem estar presentes nesses pacientes como: roubar, gastar desmesuradamente, abuso de drogas, e promiscuidade. Por outro lado, a severidade na distorção da percepção da imagem corporal, extremamente grave nos pacientes com Anorexia e Bulimia, pode ser um sério fator de risco no desenvolvimento de Transtornos da Conduta Alimentar.
No que diz respeito à imagem corporal e propensão aos Transtornos Alimentares, numerosas investigações têm documentado o importantíssimo papel da auto-avaliação e da insatisfação da pessoa sobre sua imagem corporal. Os estudos indicam também que as alterações da imagem corporal podem ser as causas de problemas emocionais importantes na adolescência e início da juventude, podendo atuar como um fator de risco predisponente, precipitante ou mantenedor dos Transtornos da Conduta Alimentar.
9)Transtorno de Conduta 
	Dentro da psiquiatria da infância e da adolescência, um dos quadros mais problemáticos tem sido o chamado Transtorno de Conduta, anteriormente (e apropriadamente) chamado de Delinqüência, o qual se caracteriza por um padrão repetitivo e persistente de conduta anti-social, agressiva ou desafiadora, por no mínimo seis meses (segundo a CID10). E é um diagnóstico problemático, exatamente por situar-se nos limites da psiquiatria com a moral e a ética, sem contar as tentativas de atribuir à delinqüência aspectos também políticos. 
 	Trata-se, sem dúvida, de um sério problema comportamental, entretanto, muitos são os autores que se recusam a situá-lo como uma doença, uma patologia capaz de isentar seu portador da responsabilidade civil por seus atos, responsabilidade esta comum a todos nós. 
Para ser considerado Transtorno de Conduta, esse tipo de comportamento problemático deve alcançar violações importantes, além das expectativas apropriadas à idade da pessoa e, portanto, de natureza mais grave que as travessuras ou a rebeldia normal de um adolescente, ainda que extremamente enfadonhos. Este tipo comportamento delinqüencial parece preocupar muito mais os outros do que a própria criança ou adolescente que sofre da perturbação. Seu portador pode não ter consideração pelos sentimentos alheios, direitos e bem estar dos outros, faltando-lhe um sentimento apropriado de culpa e remorso que caracteriza as "boas pessoas". Normalmente há, nesses delinqüentes, uma demonstração de comportamento insensível, podendo ter o hábito de acusar seus companheiros e tentar culpar qualquer outra pessoa ou circunstância por suas eventuais más ações. A baixa tolerância a frustrações das pessoas com Transtorno de Conduta favorece as crises de irritabilidade, explosões temperamentais e agressividade exagerada, parecendo, muitas vezes, uma espécie de comportamento vingativo e desaforado. Entende-se por "baixa tolerância a frustrações" uma incapacidade em tolerar as dificuldades existenciais comuns a todas as pessoas que vivem em sociedade, uma falta de capacidade em lidar com os problemas do cotidiano ou com as situações onde as coisas não saem de acordo com o desejado. 
 	Essas crianças ou adolescentes costumam apresentar precocemente um comportamento violento, reagindo agressivamente a tudo e a todos, supervalorizando o seu exclusivo prazer, ainda que em detrimento do bem-estar alheio. 
 	Elas podem também exibir um comportamento de provocação, ameaça ou intimidação, podem iniciar lutas corporais freqüentemente, inclusive com eventual uso de armas ou objetos capazes de causar sério dano físico, como por exemplo, tacos e bastões, tijolos, garrafas quebradas, facas ou mesmo arma de fogo. 
 	Outra característica no comportamento do portador de Transtorno de Conduta é a crueldade com outras pessoas e/ou com animais. Não é raro que a violência física possa assumir a forma de estupro, agressão ou, em outros casos, homicídio. 
 	As perturbações do comportamento no Transtorno de Conduta acabam por causar sérios prejuízos no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional, favorecendo uma espécie de círculo vicioso: transtornos de conduta, prejuízo sócio-ocupacional, repressões sociais, rebeldia, mais transtorno de conduta. O Transtorno de Conduta é um diagnóstico especialmente infantil ou da adolescência, pois, depois dos 18 anos, persistindo os sintomas básicos (contravenção), o diagnóstico deve ser alterado para Transtorno da Personalidade Anti-Social. 
 	Outra característica do Transtorno de Conduta é que esse padrão sociopático de comportamento costuma estar presente numa variedade de contextos sociais e não apenas em algumas circunstâncias, ou seja, não só na escola, não só no lar, só na rua..., por exemplo. O portador desse transtorno causa mal estar e rebuliço na comunidade em geral. 
 	O diagnóstico de Transtorno de Conduta deve ser feito muito cuidadosamente, tendo em vista a possibilidade dos sintomas serem indício de alguma outra patologia, como por exemplo, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, ou Retardo Mental, Episódios Maníacos do Transtorno Afetivo Bipolar ou mesmo a Esquizofrenia. Devido à excelente capacidade das pessoas com Transtorno de Conduta manipular o ambiente e dissimular seus comportamentos anti-sociais, o psiquiatra precisa recorrer a informantes para avaliar com mais precisão o quadro clínico. 
 	Também a destruição deliberada da propriedade alheia é um aspecto característico do Transtorno de Conduta, podendo incluir a provocação deliberada de incêndios com a intenção de causarsérios danos ou destruição de propriedade de outras maneiras, como por exemplo, quebrar vidros de automóveis, praticar vandalismo na escola, etc. Atualmente a psiquiatria tende a considerar dois subtipos de Transtorno de Conduta com base na idade de início, isto é, o Tipo com Início na Infância e Tipo com Início na Adolescência. Ambos os subtipos podem ocorrer de 3 formas: leve, moderada ou severa. 
Níveis de Gravidade
 Leve 
No nível leve do Transtorno de Conduta há poucos problemas de comportamento, e tais problemas causam danos relativamente pequenos a outros, tais como, por exemplo, mentiras, gazetas à escola, permanência na rua à noite sem permissão. 
Moderado 
O número de problemas de conduta e o efeito sobre os outros são intermediários entre "leves" e "severos", onde já pode haver furtos sem confronto com a vítima, vandalismo, uso de fumo e/ou outra droga. 
Severo 
Muitos problemas de conduta estão presentes na forma severa do Transtorno de Conduta, problemas que causam danos consideráveis a outros, tais como, sexo forçado, crueldade física, uso de arma, roubo com confronto com a vítima, arrombamento e invasão. 
Classificação  
 	Uma das dúvidas de quem não está familiarizado com os Transtornos de Conduta é saber onde, dentro da psiquiatria, se classificam esses quadros. Essa categoria de diagnóstico é classificado naquilo que chamamos de Transtornos de Comportamentos Disruptivos (TCDs), segundo o DSM.IV. Os TCDs englobam o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, o Transtorno Desafiador e Opositivo e o Transtorno de Conduta, propriamente dito, sob o código 312.8. Na CID.10 os Transtorno de Conduta são chamados de Distúrbios de Conduta e estão classificados como uma categoria isolada no código (veja) F91. 
 	Quando dissemos no início que os Transtornos de Conduta se situam nos limites da psiquiatria com a moral e a ética, é porque o diagnóstico desses casos se baseia em conceitos sociológicos, uma vez que se pautam nas conseqüências que as relações sociais divergentes e mal adaptadas podem ter sobre a argüição das pessoas. O comportamento de portadores de Transtorno de Conduta é definitivamente "mau" para todos os envolvidos. 
 	Com freqüência o resultado desse tipo de conduta, além dos dissabores à boa convivência social, acaba por determinar investimentos em classes de educação especial, colocação em lares adotivos, hospitais e clínicas psiquiátricas e programas de tratamento de abuso de substâncias, cadeias, além da periculosidade social à qual toda sociedade se sujeita. Mesmo que esses comportamentos da infância e adolescência acabem por desaparecer com a idade, muitas vezes deixam importantes cicatrizes policiais, jurídicas, familiares e sociais durante toda a idade adulta. Se eles persistirem (transformando-se em Transtornos Anti-Social da Personalidade), a regra será perda de emprego, crimes, prisão e falhas terríveis de relacionamentos. 
 	Uma vez que os Transtornos de Conduta se apresentam, há uma forte tendência do entorno sócio-familiar em reagir, e essa resposta da família, da escola, dos pares, do sistema policial e da justiça criminal podem acompanhar a pessoa a vida toda, empurrando-o definitivamente para a marginalidade. 
Sintomas 
 	Como dissemos, as pessoas com Transtorno de Conduta costumam ter pouca empatia e pouca preocupação pelos sentimentos, desejos e bem-estar dos outros. Elas podem ter uma sensibilidade grosseira para as questões sentimentais e emocionais (dos outros) e não possuem sentimentos próprios e apropriados de culpa, ética, moral ou remorso. Entretanto, como essas pessoas são extremamente manipuladoras e aprendem que a expressão de culpa pode reduzir ou evitar punições, não titubeiam em demonstrarem remorso sempre que isso resultar em benefício próprio. 
 	Por outro lado, costumam delatar facilmente seus companheiros e tentar culpar outras pessoas por seus atos. Uma característica marcante nesse quadro é a baixíssima tolerância à frustração, irritabilidade, acessos de raiva e imprudência quando contrariados. O Transtorno de Conduta está freqüentemente associado com um início precoce de comportamento sexual, consumo de álcool, uso de substâncias ilícitas e atos imprudentes e arriscados. 
 	Os comportamentos do Transtorno de Conduta podem levar à suspensão ou expulsão da escola, problemas de ajustamento no trabalho, dificuldades legais, doenças sexualmente transmissíveis, gravidez não planejada e ferimentos por acidentes ou lutas corporais. 
 	Os sintomas do transtorno variam com a idade, à medida que o indivíduo desenvolve maior força física, capacidades cognitivas e maturidade sexual. Comportamentos menos severos (por ex., mentir, furtar em lojas, entrar em lutas corporais) tendem a emergir primeiro, enquanto outros (por ex., roubo, estupro...) tendem a manifestar-se mais tarde. Entretanto, existem amplas diferenças entre os indivíduos, sendo que alguns se envolvem em comportamentos mais prejudiciais em uma idade mais precoce. 
 	O diagnóstico de Transtorno de Conduta é importante, tendo em vista o grande número de encaminhamentos psiquiátricos motivados por comportamentos anti-sociais e agressivos, notadamente depois da criação do Estatuto do Menor e do Adolescente. 
 	Interessa ao sistema (família, juizado de menores e polícia, nessa ordem) que adolescentes problemáticos sejam deixados aos cuidados médicos e psiquiátricos, poupando à muitos o dissabor de deparar-se com o fato de "não ter o que fazer". Boa parte da importância do diagnóstico está no fato de, muito freqüentemente, o Transtorno de Conduta ser um precursor do Transtorno Anti-social no adulto. 
 	De modo geral, é muito incomum encontrar um adulto com Transtorno Anti-social da personalidade na ausência de uma história pregressa Transtorno de Conduta na infância ou adolescência. Apesar dos modismos atrelados ao comportamento inconseqüente e irrequieto da juventude, as estatísticas sobre a delinqüência refletem o fato de que, embora algum tipo de comportamento delinqüente seja relativamente comum na adolescência, apenas um pequeno percentual de jovens torna-se infrator crônico ou anti-social depois de adulto. 
 	Há alguma crença de que o Transtorno de Conduta seja mais freqüente nas classes sociais mais baixas, notadamente em famílias que apresentam, concomitantemente, instabilidade familiar, desorganização social, alta mortalidade infantil e incidência mais alta de doenças mentais graves. 
 	Entretanto, essa não é uma opinião unânime, acreditando-se que entre o comportamento delinqüencial das classes mais baixas e mais altas haja diferenças apenas no modo de apresentação do comportamento, sugerindo assim uma falsa idéia de que os mais pobres têm mais esse transtorno. 
 	A prevalência do Transtorno de Conduta tem aumentado nas últimas décadas, podendo ser superior em circunstâncias urbanas, em comparação com a rural. As taxas variam amplamente, mas têm sido registradas, para os homens com menos de 18 anos, taxas que variam de 6 a 16%; para as mulheres, as taxas vão de 2 a 9%. O Transtorno de Conduta pode se iniciar já aos 5 ou 6 anos de idade, mas habitualmente aparece ao final da infância ou início da adolescência. 
 	O início após os 16 anos é raro. Alguns pesquisadores crêem que a maioria dos portadores o Transtorno de Conduta apresenta remissão na idade adulta, entretanto, acreditamos que essa visão otimista reflita mais um erro de diagnóstico que uma evolução benéfica do quadro. O início muito precoce indica um pior prognóstico e um risco aumentado de Transtorno Anti-Social da Personalidade e/ou Transtornos Relacionados a Substâncias na vida adulta. As pessoas que não apresentam mais o quadro delinqüencial depois de adulto eram, exatamente, aquelas que tinham essa postura motivada por modismo ou adequação ao grupo social. 
 	De fato, não se tratava de Transtorno de Conduta propriamente dito. É por isso que muitos indivíduos com Transtorno de Conduta, particularmente aqueles com Início na Adolescência e aqueles comsintomas mais leves conseguem um ajustamento social e profissional satisfatório na idade adulta. De verdade, uma proporção substancial de pessoas diagnosticadas com o Transtorno de Conduta continua apresentando, na idade adulta, comportamento próprios do Transtorno Anti-Social da Personalidade. 
Causas   
 	Não está estabelecido ainda uma causa única para o Transtorno de Conduta. Uma multiplicidade de diferentes tipos de estressores sociais e a vulnerabilidade de personalidade parece associada com esses comportamentos anti-sociais. Durante muitos anos, as teorias sobre comportamentos eram de natureza sociológica. O princípio básico desta tendência afirmativa era que jovens socialmente e economicamente desprivilegiados, incapazes de adquirirem sucesso através de meios legítimos e socialmente aceitos, se voltariam para o crime.  
 	Atualmente os sociólogos têm se mostrado mais dispostos a considerar como fatores causais a integração entre características individuais e forças ambientais (veja elementos históricos em Personalidade Criminosa). Certamente devem influenciar no desenvolvimento do Transtorno de Conduta as atitudes e comportamentos familiares, assim como a exclusão sócio-econômica, a má distribuição de rendas, a inversão dos valores, a desestrutura familiar e mais um sem número de ocorrências sociais, políticas e econômicas propaladas por pesquisadores das mais variadas áreas. 
 	De qualquer forma essas tentativas de explicações causais são sempre muito vagas e imprecisas. É difícil estabelecer claras relações causais entre condições familiares adversas e caóticas com delinqüência, pois, como se exige em medicina, não se observa constância satisfatória dessa regra e, muitas vezes, jovens provenientes de famílias conturbadas ou mesmo sem famílias não desenvolvem a delinqüência, enquanto seus irmãos, que vivenciam o mesmo ambiente. 
 	Observa-se, variavelmente em diversas estatísticas, que muitos pais de delinqüentes sofrem de psicopatologias‚ assim como histórias de crianças com perturbações comportamentais graves podem revelar, muitas vezes, um quadro de abuso físico e/ou sexual por adultos, geralmente os pais e padrastos. 
 	Existem estudos mostrando relações entre certos tipos de violência episódica e transtornos do SNC, particularmente do sistema límbico. Alguns portadores de Transtornos de Conduta podem mostrar, no exame clínico, sinais e sintomas indicativos de algum tipo de disfunção cerebral. 
 	Uma das ocorrências neuropsiquiátricas mais comumente encontradas nos Transtornos de Conduta é o de Hiperatividade com Déficit de Atenção, outras vezes o diagnóstico se confunde com casos atípicos de depressão grave em crianças e adolescentes. 
Tratamento 
 	Um dos fatores que mais desanimam a psiquiatria em relação aos portadores de Transtornos de Conduta é o fato de não haver nenhum tratamento efetivo e reconhecido especificamente para esse estado. Este é um fator que contribui, significativamente, para alguns autores não considerarem este modo de reagir à vida como doença. Tratar-se-ia de uma alteração qualitativa do caráter que caracteriza uma maneira de ser, não exatamente um processo ou desenvolvimento patológico. 
Evidentemente quando esse Transtorno de Conduta reflete uma depressão subjacente ou uma Hiperatividade o tratamento é dirigido para esses estados patológicos de base e, é claro, o prognóstico é substancialmente melhor (veja tratamento da Depressão Infantil e da Hiperatividade). Outros programas têm tentado lidar com o comportamento disruptivo dessas crianças com fármacos, tais como o carbonato de lítio, a carbamazepina ou antidepressivos, conforme o caso. O sucesso não tem sido muito animador 
9)Violência e Agressão da Criança e do Adolescente
 	A legislação brasileira considera como criança a pessoa com idade entre zero e doze anos, e passíveis apenas da aplicação de medidas protetoras quando cometem infração (delinqüência) ou se encontram em situação de risco, de acordo com o art. 101 da Lei n. 8069/90, que é o Estatuto da Criança e do Adolescente. 
 	A adolescência, por sua vez, se considera para pessoas entre os doze e os dezoito anos, encontrando-se as mesmas sujeitas à aplicação das mesmas medidas protetoras e à aplicação de medidas sócio-educativas (art. 112 do mesmo Estatuto da Criança e do Adolescente).
 	Concomitantemente, a legislação imputa aos pais as medidas previstas no art. 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente, em caráter administrativo, possibilitando ainda a aplicação de multa por infração ao art. 249 da mesma lei.
 	Tais medidas citadas decorrem da filosofia de proteção integral ao menor. A pergunta que emocionalmente e moralmente fazemos é a seguinte: menor de que ou de quem? - Menor de altura, de idade, de maturidade... Menor que a vítima, menor que a vontade política, que a capacidade da justiça... Enfim, menor do que o que?
 	Pretensamente as medidas de proteção ao menor almejam um caráter eminentemente desenvolvimentista e formador da cidadania, enquanto as medidas sócio-educativas, pretendem-se com caráter punitivo ou recuperadoras, bem como administrativo/punitivo.
 	A agressividade é sempre um tema da atualidade, especialmente a agressividade juvenil, atualmente relacionada às ações das gangues, dos franco-atiradores de escolas, dos queimadores de mendigos, dos homicidas de grupos étnicos, ou simplesmente dos agressivos intrafamiliares.
 	Os adolescentes e jovens que se destacam pela hostilidade exagerada, podem ter um histórico de condutas agressivas que remonta a idades muito mais precoces, como no período pré-escolar, por exemplo, quando os avós, pais e "amigos" achavam que era apenas um "excesso de energia" ou uma travessura própria da infância.
 	A família influi através do vínculo, do contexto interacional (das interações entre seus membros), da eventual psicopatologia e/ou desajuste dos pais e do modelo educacional doméstico. A televisão, os videogames, a escola e a situação sócio-econômica podem ser os elementos ambientais relacionados à conduta agressiva. Embora esses três fatores (individuais, familiares e ambientais) sejam inegavelmente influentes, eles não atingem todas as pessoas por igual e nem submete todos à mesma situação de risco.
 	O que se sabe, estatisticamente, é que a agressividade manifestada em idade pré-escolar, infelizmente evolui de forma negativa. Por isso necessitamos estudar e esclarecer os limites entre as travessuras da infância dos Transtornos de Conduta, o tão propalado excesso de energia do Transtorno Hipercinético, a responsabilidade tão meritosa, comum na criança "tipo adulto", da Depressão Infantil. Precisamos estudar e esclarecer os limites entre a "personalidade forte" da criança, relatada pelo pai com certa ponta de orgulho, das condutas completamente desadaptadas da infância e com enorme possibilidade de evoluir para um quadro mais grave. 
 	A agressividade, por si só, não pode ser considerada um transtorno psiquiátrico específico, ela é, antes disso, sintoma que reflete uma conduta desadaptada. Como sintoma ela pode fazer parte de certos transtornos. Podemos dizer até, que a conduta agressiva costuma ser normal em certos períodos do desenvolvimento infantil, está vinculada ao crescimento e cumpre uma função adaptativa. Essa agressividade normal e fisiológica também é chamada de agressividade manipuladora. 
 	De qualquer forma, hoje se acredita que a agressividade já pode aparecer em idades pré-escolares e, quando se manifesta, tende a continuar. Além disso, quando a agressividade é combinada com outras condutas problemáticas e desadaptadas a evolução será muito pior. 
 	O modelo explicativo para pessoas com agressividade precoce consta da seguinte sucessão de acontecimentos: 
1. Há uma interação agressiva entre pai e filho caracterizada por reprimendas e disciplina inconsistente, conduta irritável e explosiva, ou que leva ao menino a adquirir um comportamento agressivo como modelo.
2. Esta agressividade acaba determinando uma rejeiçãopor parte dos outros, fracasso escolar e humor depressivo.
3. Este processo é seguido por atos delituosos, aderência a grupos de risco e abuso de sustâncias, assim como por fracassos ocupacionais. 
 	Outro aspecto a considerar é a educação num meio de agressividade. Crianças agressivas, proveniente de famílias agressivas, com poucas habilidades sociais, tendem a repetir, à idade de 30 anos, o mesmo padrão educacional desadaptado adquirido de seus pais, com em sus próprios filhos.
 	As formas conscientes de processar informações do mundo, ou as maneiras de representar a realidade, podem ser transmitidos de mães para filhos. Crianças agressivas e suas mães se caracterizam por atribuir natureza hostil ou provocativa aos eventos originalmente neutros. 
 	Essas crianças teriam uma interação familiar deficitária, seguramente pertenceriam a classes sociais desfavorecidas e suas relações na escola seriam problemáticas, teriam más companhias e evoluiriam negativamente. Mas, mesmo considerando a implicação de muitos destes fatores de risco, além de outros, encontramos crianças que cumprem perfeitamente com essa base de alto risco e não desenvolvem condutas agressivas. Estamos diante da eterna discrepância entre constatações clínicas e conjecturas teóricas do desenvolvimento.
 	Isso quer dizer que, enquanto na clínica, muitos casos de agressividade coincidem com vários destes aspectos de risco assinalados acima, o acompanhamento de muitas pessoas que partem desta base de alto risco nem sempre mostra o desenvolvimento de condutas agressivas. Então, o que faz com que, partindo de um presumível mesmo contexto de risco, algumas crianças adotem um comportamento agressivo e outros não?
 	A conclusão que se pode tirar é que a conduta agressiva tem uma origem e uma evolução multifatorial, e que se deveriam realizar mais estudos sobre possíveis fatores implicados nessa fisiopatologia.
Unidade VII –
Transtornos mentais e a realidade do sistema prisional
 	O cumprimento das penas impostas em juízo, através de sentenças passadas em julgado, é regulamentado pela Lei de Execuções Penais. De acordo com a legislação, a pena privativa de liberdade tem duas finalidades principais, quais sejam: 
1º) o propósito retributivo: a pena deve ser aflitiva, ou seja, agir de modo a dissuadir o agente de futuras transgressões à lei; 
2º) o fim restaurador: o cumprimento da pena deve propiciar a obtenção de benefícios e a reintegração do indivíduo à sociedade.
 	Porém, o Sistema Penitenciário, encarregado das execuções, é um nicho específico da nossa sociedade onde várias distorções vêm se refletir, de forma às vezes facilmente identificáveis, como ecos da tirania, do autoritarismo e da arbitrariedade.
 	Além dos agravos sofridos pelos reclusos, e que se devem a ações de outros indivíduos, existe toda uma gama de situações de menor ou maior gravidade, que são geradas pelo próprio ambiente penal, o qual é fruto das condições históricas e culturais próprias da sociedade.
	Estudo realizado por Palma (2006) mostrou que há indícios de inúmeros fatores que podem interferir no com dados de pesquisa da população carcerária (entrevista de 230 detentos, em dois anos), observação de diversos transtornos presentes no ambiente penal, análise da documentação legal com as regras mínimas para presos, e fatores relacionados às sobrepenas. Os resultados apresentados são frutos de sua vivência profissional, ao longo de quase vinte anos no quadro próprio do Sistema Penitenciário do Estado do Paraná, em contato direto com a rotina e os procedimentos de diversos estabelecimentos penais e de delegacias de polícia, localizados na Região Metropolitana de Curitiba. 
TRANSTORNOS PRESENTES NO AMBIENTE PENAL
 	Entre os principais transtornos observados no Sistema Penitenciário, destaca-se a ocorrência de transtornos psicossomáticos e de transtornos psíquicos, detalhados a seguir:
1) Transtornos psicossomáticos
 	É apenas acessório o interesse da medicina psicossomática pelas repercussões psico-afetivas das doenças do corpo. O que se procura distinguir aqui é justamente o caminho inverso: o adoecer que se inicia nas emoções, sejam estas expressas claramente ou estejam recalcadas, sem um acesso direto. Temos então:
- problemas mentais secundários a lesões do sistema nervoso central, como demência degenerativa, doença de Alzheimer, síndrome frontal de etiologia orgânica e outras;
- afecções mentais de origem endocrinológica e metabólica: excitação conseqüente do hipertireoidismo, síndrome confusional na insuficiência renal, na febre tifóide, na hipoglicemia;
- os quadros mentais devido a intoxicações agudas por substância que tenham efeito sobre o psiquismo.
 	Ao delimitar assim o fenômeno psicossomático, permitimo-nos melhor compreensão do sintoma. A respeito do câncer, por exemplo, podemos propor uma leitura imunológica, virológica, citológica, bioquímica e mesmo uma leitura psicossomática. Há teorias a respeito da origem multifatorial de toda condição clínica, que enriquecem as abordagens possíveis.
Estudos clínicos demonstram a existência de relações bastante claras entre o estado emocional e o agravamento, a cura, a evolução e até mesmo o aparecimento de patologias na área imunológicas, no aparelho cárdio-vascular, respiratório, digestivos, etc..
2) A Ocorrência de Neuroses no Ambiente Penal
 	No indivíduo submetido à pressão carcerária, são freqüentes os quadros ansiosos e depressivos, bem como os ligados a transtornos somáticos, em relação de causa ou efeito. Outros quadros clínicos assimilados às neuroses são também encontrados entre os reclusos, identificando-se casos de síndrome do pânico, transtorno de conversão, fobias, transtorno obsessivo-compulsivo.
 	No ambiente penal, os conflitos trazidos de fases anteriores da vida muitas vezes têm sua abordagem dificultada pelas próprias defesas do indivíduo: evocar sua história é revivê-la, e há resistência em fazê-lo. Mostrar suas próprias fraquezas pode ser perigoso. Confissões são sempre penosas e às vezes extraídas à força. A causa da ansiedade pode ser uma conduta socialmente reprovável ou mesmo um crime, a exemplo o envolvimento com drogas. Em geral não são encontrados casos em que se manifesta uma único transtorno, mas lida-se com a superposição de patologias. Diversas situações como traços de deficiência cognitiva, transtornos de personalidade e de comportamento, impulsividade, ansiedade, deficiência verbal, intoxicações crônicas, transtornos do desenvolvimento e seqüelas de traumatismo craniano podem estar associadas nos reclusos.
 	Dessa forma, com a manifestação associada de diversos transtornos, o condenado à medida de reclusão ingressa no cárcere a fim de ser recuperado para a sociedade, ao mesmo tempo em que cumpre pena retributiva à violação da Lei. O contato com os agentes penitenciários, responsáveis pela segurança dos presídios, com sua problemática individual e coletiva, terá obrigatoriamente influência no aspecto e na evolução das patologias observadas.
3) As Psicoses Carcerárias e as Restrições Impostas pela Reclusão
 	Outra consideração a ser feita em relação aos transtornos psíquicos dos reclusos diz respeito às psicoses carcerárias. Há determinados quadros clínicos que parecem ser próprios do ambiente penal, sem que se possa delimitar para eles uma categoria à parte, pois não são exclusivos desse ambiente. Costumam se agravar com o isolamento e incluem traços paranóides, por vezes associados a fenômenos alucinatórios. Pode-se postular a existência de delírios induzidos pela detenção em pessoas que previamente não apresentavam sintomas psicóticos. A temática delirante gira freqüentemente em torno das idéias de inocência, culpa e castigo. Uma forma clínica que às vezes passa despercebida tem o aspecto de marasmo, uma retração autística, com fuga de contato com o exterior, mesmo sem a expressão de sentimentos depressivos. A aparência é de um empobrecimento global na subjetividade, com a adoção de condutasautomáticas e indiferença ao meio. O indivíduo com estas manifestações não é acessível ao manejo terapêutico.
 	As restrições impostas pela reclusão podem desencadear quadros psicóticos previamente em estado de latência. Uma vez instalados, limitam gravemente o funcionamento individual e a interação com o ambiente, gerando novos conflitos. Suas manifestações podem incluir: comportamento auto-agressivo e, em casos extremos, auto-mutilação; reações agressivas desproporcionais para com os outros, por vezes ataques físicos potencialmente fatais; negligência total a si próprio, que se estende ao asseio corporal, alimentação, tratamentos, etc.; distúrbios sexuais; agitação delirante, muito freqüente no caso de abstinência de drogas; transtornos do humor e da afetividade.
4) Sentimento Religioso e Fé Alienante
 	A esperança é observada entre os detentos, através do sentimento de que haverá um futuro melhor. Ao falar de si próprios, se dizem esperançosos e confiantes no futuro, em que pese a pobreza de perspectivas propiciadas pelo ambiente penal. Ao serem perguntados sobre planos para o futuro, costumam mencionar: voltar para casa (quando esta existe), procurar emprego, criar filhos, casar, morar em outra cidade, ir para o campo, recomeçar.
 	Por outro lado, uma expressão muito usada pelos detentos é correr atrás do prejuízo, geralmente indicativa de que há a intenção de retomar o fio da carreira criminal no ponto em que ele havia sido interrompido. A prisão é um acidente de percurso e as lições que ela ensina servem para tornar determinados delinqüentes menos vulneráveis à repressão, além de diminuir as probabilidades de nova queda nas malhas da lei.
 	Para a maioria dos detentos, porém, o estar na prisão é uma transição entre dois estados diferentes: como tudo está em mutação contínua, cada um pode vir a ser um outro. Cumprida a pena, o indivíduo voltaria a ser um cidadão honesto e equilibrado.
 	Esta expectativa de mudança, de se tornar uma outra pessoa após deixar o cárcere, é facilmente catalisada por seitas religiosas (especialmente messiânicas e neo-pentecostais), que acenam com a mensagem de transformação através da fé.
 	Aliás, a palavra transformação é muito utilizada pelos grupos religiosos que atuam no ambiente penal. O que se observa é que se trata de uma proposta mágica de renascimento ritual, como atalho para o resgate de si próprio. À partir da pregação de certos preceitos religiosos, o recluso se tornaria nova criatura. A promessa é de que este homem novo tem todas as suas faltas perdoadas, todos os males curados, a salvação assegurada. Assim sendo, cumprir a pena a que foi condenado passa a ser uma provação que deve ser aceita de forma resignada, sem que isso implique no resgate de sua cidadania e de seu interesse no convívio social. Como servo de Deus, ele não participa mais do mundo, a não ser no apostolado militante em busca de novos fiéis. Os fatos do mundo passam a ser irrelevantes, são o cumprimento de antigas profecias que marcam o fim dos tempos. A proposta escatológica termina por seduzir uma parcela da população penitenciária, já despojada de opções.
 	Ao que tudo indica o sentimento religioso, para aqueles que cumprem medida de reclusão, é permeada de resignação alienante, uma forma de submissão que os entorpece ao invés ajudar em sua recuperação. A participação subseqüente na prática religiosa, com suas exigências e hierarquias, traz novos desencantos, novas buscas e um aprofundamento da alienação. No ambiente penal, muitas vezes, é possível observar a eclosão de quadros delirantes, decorrentes de manifestações religiosas.
As implicações do sentimento religioso no ambiente penal são muito complexas e ainda não foram pesquisadas de forma sistemática. É possível afirmar, com base no exercício profissional junto ao Sistema Penitenciário, que essas manifestações delirantes atingem uma parcela considerável dos reclusos e constitui, sem dúvida, uma mazela a mais a atingi-los. Por uma conjugação de fatores adversos, é pouco provável que o vínculo religioso seja capaz de reforçar aspectos positivos entre os reclusos, tais como serenidade e segurança interior, de forma a torná-los em condições de enfrentar melhor a vida ao deixar o cárcere.
5) O Efeito da Prisionização sobre Presos e Agentes Penitenciários
 	A prisionização é a aquisição, por parte do preso e de outros funcionários do Sistema Penitenciário, de valores, hábitos, modos de pensar e de agir (por exemplo, a linguagem) e conhecimentos próprios da subcultura estruturada no estabelecimento penal. Ocorre segundo os moldes da aculturação e da inculturação (adaptação a uma nova cultura e incorporação de novos elementos e valores) e se processa num tempo relativamente longo, podendo obedecer a necessidade de convívio (apagamento dos contrastes para maior aceitação ou para suprimir a discriminação). Em certos indivíduos, especialmente suscetíveis, o processo pode ser mais rápido, atingir camadas mais profundas da realidade pessoal e se tornar definitivo. Podemos destacar como principais efeitos da prisionização:
- aquisição de nova identidade mediante a supressão de valores e características próprias da anterior;
- sentimento de auto-desvalorização, associados a sintomas depressivos;
- estabelecimento de novos modos de se relacionar com a vida, com o tempo, consigo próprio, que se percebem nas abordagens mais restritas da realidade, perda da capacidade de planejar a médio e a
longo prazo, conteúdos de pensamento dicotomizados, cada vez mais pobres e estereotipados, recusa aos desafios, às novas experiências e à reflexões sobre o momento atual, perda do senso de humor;
- atitudes defensivas, busca de soluções mágicas, atribuição de responsabilidades a um outro indefinido, institucional, oculto;
- desinteresse mais ou menos generalizado, adoção de uma atitude de pessimismo sarcástico.
 	A prisionização pode atingir, em diferentes graus de profundidade, tanto os presos quanto os agentes penitenciários, pessoal técnico e a própria direção do estabelecimento penal. Aparentemente não é um processo controlável nem mensurável, podendo depender de atitudes individuais que se somam, emergindo em algo que já não é reconhecível como produto. Eventualmente, a prisionização se estende a outros membros da família do preso. A perplexidade diante da abrangência do fato vem do desconhecimento (que afeta a todos nós) a propósito de outros aspectos relativos à vida prisional, que ocorre em território obscuro, ainda que seja um produto de nossa atividade e das nossas necessidades grupais. A verdade é que não compreendemos como e por quê os valores, os princípios básicos de convívio se relativizam e se distorcem nas relações de cumplicidade ambivalente que se estabelecem no universo punitivo que nos dispomos caracterizar e explicar.
Unidade VIII –
Elementos sobre a ‘luta antimanicomial’
 	O Movimento Nacional da Luta Antimanicomial existe no Brasil desde 1987, reunindo profissionais de diversas áreas interessados em pesquisar e tratar transtornos de sáude mental. As primeiras manifestações se fizeram sentir ainda na década de 70 como uma crítica ao modelo assistencial centrado no hospital psquiátrico e trouxeram à tona as questões relativas à exclusão da loucura em nossa sociedade. Inspirado na experiência italiana de desinstitucionalização psquiátrica a partir do trabalho de Franco Basaglia e tendo como interlocutor Michel Foucault (1926-1984), o movimento, de caráter social, buscou no início uma humanização do hospital psquiátrico através da complementação deste modelo com ambulatórios, hospitais-dia, etc;
 	Entretanto, reflexões e práticas acabaram por mostrar que a existência mesma do hospital psquiátrico encontrava-se indissociavelmente atrelada a uma concepção excludente da loucura: o mito da periculosidade dos loucos assim como o da sua incapacidade.Uma grande vitória nesta luta aconteceu em 2001 quando o Senado aprovou o Projeto de Lei nº 10.216 de autoria do deputado PauloDelgado (PT/MG) que prevê a extinção progressiva dos manicômios.
 	Ora, sabemos que a sociedade atual é levada por uma lógica capitalista e excludente. Segundo esta lógica é segregado e excluído todo indivíduo que lhe quebra o padrão ou denuncia, através de sua ação ou reação, as suas contradições. Este é muitas vezes o caso do doente mental pois sua doença o torna um improdutivo social e econômico. Nesta lógica que forja a diferença como sendo uma coisa ruim, exclui-se e segrega-se também o doente mental devido à sua não participação ativa e direta no modelo econômico.
Transformada, pelos saberes médicos, em doença, alienação, desajuste, irracionalidade e perversão, a loucura carrega um conjunto de práticas, concepções e saberes que, ancorados em uma moralidade ditada pelos bons costumes, pela ordem e pelo trabalho produtivo, faz desligar, de forma explicitamente violenta, os diferentes laços de construção e pertencimento humanos. O manicômio é a tradução mais completa dessa exclusão, controle e violência. Seus muros escondem a violência (física e simbólica) através de uma roupagem protetora que desculpabiliza a sociedade e descontextualiza os processos sócio-históricos da produção e reprodução da loucura. 
A ruptura com o modelo manicomial significa, para o movimento, muito mais do que o fim do hospital psiquiátrico, pois toma como ponto de partida, a crítica profunda aos olhares e concepções acerca deste fenômeno.
Respeitar, ainda que na loucura, o "saber-sobre-si-mesmo" deve ser o ponto de partida para toda e qualquer discussão sobre as políticas de saúde mental. Embora uma nova perspectiva tenha estado presente na chamada Reforma Psiquiátrica que começou a estruturar-se no Brasil na década de 80, nunca é demais lembrar que não se trata apenas de melhorar a qualidade do atendimento ao usuário nas instituições especializadas, mas, sobretudo, dar continuidade ao trabalho terapêutico além da crise que levou o sujeito a procurar a instituição; ou seja, reconhecer a todos os direitos de cidadãos: sem este reconhecimento, é o tecido social que se apresenta de forma perversa. Isso significa a implantação, de espaços de atendimento tanto institucionais quanto extra-institucionais cujos objetivos visariam, além do trabalho assistencial, profundas transformações na própria concepção de sofrimento psíquico. 
 
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