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1
TEXTO 7 
Escola em ciclos: uma escola inquieta - o papel da avaliação1 
Claudia de Oliveira Fernandes2 
 
 Gostaria de iniciar o texto, lembrando um de nossos educadores mais comprometidos e competentes: 
Paulo Freire. Por que lembrar Paulo Freire em um texto que se refere ao tema dos ciclos e suas 
possíveis relações com as questões de avaliação educacional? 
 Freire nos aponta todo o tempo para a necessidade do educador ser alguém que tem esperança, que 
acredita na utopia. Não aquela utopia que nos cega, mas a que nos impulsiona e que nos faz mais 
humanos. Todo educador precisa acreditar, senão, como praticar educação? 
 Pois bem, pensar uma escola em ciclos significa do meu ponto de vista, pensar uma escola diferente 
da que hoje conhecemos. Uma escola possível. Defendo a tese de que, provavelmente, a escola em 
ciclos de hoje, é uma escola necessária e transitória para uma escola que estamos construindo, que seja 
mais coerente com nossas questões contemporâneas. Uma escola que precisa reformar, ressignificar 
seus tempos, espaços, sua gestão, sua concepção de conhecimento escolar, sua concepção de ensino 
e aprendizagem, incluindo aí, a avaliação escolar. 
 Feita essa breve introdução, passo a apresentar os aspectos que se referem à temática específica do 
texto, qual seja: ciclos e avaliação, iniciando com uma pequena contextualização do cenário dos ciclos 
no Brasil. Após essa contextualização, passo a discutir as questões referentes à avaliação e suas 
práticas em uma escola com essa proposta pedagógica. 
 É importante ressaltar que temos avançado nas pesquisas, estudos e experiências brasileiras e 
estrangeiras que apontam a escola em ciclos como uma proposta de escola possível e, que organizar a 
escola em ciclos, significa reorganizar, ressignificar, replanejar e por que não, reinventar as questões 
relativas à organização e dinâmica escolar. Porém, ainda há um entendimento no senso comum de que 
a questão dos ciclos refere-se apenas às questões de avaliação e, mais especificamente, ao sistema de 
promoção dos alunos ao longo de sua escolaridade. Sem retirar a questão da promoção que se coloca 
como um fator importante a ser repensado na escola em ciclos, devemos ampliar nosso olhar e tentar 
visualizar a organização em ciclos para além das discussões acerca da avaliação e da aprovação ou 
reprovação dos estudantes. No entanto, embora o tema dos ciclos não esteja somente relacionado às 
questões de repetência e evasão, historicamente, há uma construção que o coloca como uma possível 
solução para tal problemática. E isso também deve ser considerado. Num país onde, uma grande 
parcela dos estudantes fica reprovada nas séries iniciais e por esta razão, mas não somente, terminam 
por evadir da escola, há de se entender legítimas as tentativas para que esses estudantes permaneçam 
na escola. Mas, não a qualquer custo. É importante assinalar que, se a repetência nas escolas das redes 
públicas de ensino brasileiras, já era motivo de preocupação desde o início do século XX, com o 
propósito de reverter o grave quadro de repetência e evasão, tal preocupação ainda permanece no início 
do século XXI. Não podemos atravessar um século inteiro sem que tenhamos resolvido minimamente 
tais questões. 
 A organização da escolaridade em ciclos, que pretende, dentre outros propósitos, dar resposta a 
essa problemática, é recente, tendo suas primeiras experiências na década de 60. Cabe destacar que as 
experiências em ciclos desde então, são bastante particulares do Brasil, tendo suas origens em 
diferentes redes de ensino municipais e estaduais, como veremos adiante. 
A origem dos ciclos 
 A construção dos ciclos no Brasil data das décadas de 60/70 no Brasil e tem um crescimento nos 
anos 80 para as séries iniciais do Ensino Fundamental (os Ciclos Básicos de Alfabetização), tendo se 
ampliado para as demais séries ao longo dos anos 90. Essa construção histórica foi tecida por 
educadores, especialistas, professores que participaram de congressos, fóruns e não somente por 
 2
gestores ou técnicos de secretarias de educação. A forma como a experiência aconteceu em cada 
região do país foi diferenciada e fez parte da construção histórica e das condições de produção de cada 
comunidade educativa. 
 É importante entendermos tais experiências como fruto da construção histórica de educadores e 
administrações comprometidas com a escola pública e com a defesa do acesso da população à escola e 
de qualidade. 
 As discussões travadas ao final da década de 70 e início dos anos 80 marcavam pontualmente que o 
sistema público de ensino excluía da escola os alunos das classes menos favorecidas tanto social 
quanto economicamente da população. Em 1983, na rede estadual de São Paulo, instituiu-se o Ciclo 
Básico de Alfabetização para todas as escolas, e constituía-se numa medida de natureza político-
pedagógica com o objetivo de reorganizar gradativamente a escola pública de 1° grau, tendo como 
marca principal alterar o sistema de seriação: as duas séries iniciais foram transformadas em um ciclo de 
dois anos e o aluno não poderia ser reprovado no primeiro ano de escolarização. Em Minas Gerais, o 
Ciclo Básico de Alfabetização foi implantado em toda a rede estadual a partir de 1985 em caráter 
experimental e em 1990 tomou caráter oficial. No Rio de Janeiro implantou-se nas escolas públicas de 1º 
grau, ainda ao final da década de 70 e início dos 80, o Bloco Único, dois primeiros anos da alfabetização 
como um único ciclo e sem reprovação. Santa Catarina teve experiência semelhante também ainda na 
década de 80. No Paraná, o Ciclo Básico foi implantado em 1988/1989, e em 1990 atingiu todas as 
escolas estaduais.3 
 Embora, essas diferentes experiências e propostas tivessem suas peculiaridades, tinham em comum, 
partir da premissa de que era necessário no ensino fundamental um sistema de avaliação que não 
excluísse o aluno da escola, tentando amenizar ou até resolver o problema da evasão e repetência e, 
desta forma, contribuir para a melhoria da qualidade do ensino público. 
 As justificativas para a implantação dos Ciclos eram semelhantes: o processo ensino-aprendizagem 
deveria ser contínuo e sem retrocessos e desenvolver-se através de metodologia que contemplasse 
esses princípios, sendo assim, a avaliação deveria ser também um processo contínuo. 
 Podemos notar que a origem da implantação dos ciclos acontece a partir de justificativas não 
só pedagógicas, quanto políticas. Vale ressaltar também que as experiências de ciclos básicos são 
especialmente brasileiras e não “importadas” de fora, como usualmente pode-se achar. Inicialmente, a 
idéia de uma escolaridade por ciclos nas escolas brasileiras está associada aos estudantes das classes 
menos favorecidas tanto social quanto economicamente. 
 Como essa proposta se amplia e conquista o discurso e a prática pedagógica ao final dos anos 90 e 
início do século XXI? 
 O quadro atual 
 A apropriação de novas teorias por parte da pedagogia, principalmente os estudos de Piaget e 
Ferreiro, durante as décadas de 70, 80 e 90, subsidiaram o fundamento teórico para as propostas 
pedagógicas dos ciclos, cujo princípio, reside no fato de que os sujeitos constroem seu conhecimento, 
sendo a aprendizagem algo de ordem interna e, que por isso, demanda diferentes ritmos e tempos para 
que ela se realize. O argumento teórico, aliado às experiências já em curso no país, bem como aliado à 
nova lei de Diretrizes e Bases (LDBEN/96), que introduz mecanismos que referendam a implementação 
de ciclos e aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) que também institucionalizam os ciclos e 
propõem que sejam organizados de dois em dois anos, fazem com que, ao final dos anos 90, algumas 
escolas privadas4, escolas destinadas à elite cultural, comecem a introduzir em suas propostaspedagógicas, experiências de ciclos e de não retenção dos estudantes ao longo da escolarização. O que 
surgiu como solução para o problema da repetência nas séries iniciais nas redes públicas de ensino, 
amplia-se também para a rede privada, modifica-se e passa a ter destaque como proposta de ensino e 
de aprendizagem. 
 3
 Nas redes públicas de ensino, as experiências em ciclos têm sido revisadas no sentido de ampliar as 
possibilidades de uma nova escola possível, como por exemplo, a Escola Plural (BH), a Escola Cidadã 
(POA), as experiências em São Paulo, Brasília, Mato Grosso, Ceará, em alguns municípios do Rio de 
Janeiro, como Niterói, Duque de Caxias, etc. 
 No Brasil, de 1999 a 2002, segundo dados do Censo Escolar sobre a organização da escolaridade, o 
percentual de escolas organizadas unicamente em ciclos cresceu de 10% para 10,9% e para escolas 
organizadas em séries e ciclos cresceu também de 7,6% para 8,5%. Representando um total de 19,4% 
das escolas de todo o Brasil que trabalham no regime de ciclos. 
 O debate acerca da organização da escolaridade em ciclos e da não reprovação dos alunos no Ensino 
Fundamental tem tomado corpo, nos últimos tempos, pelos meios de comunicação. 
 A importância de tal debate se constitui por, pelo menos, duas razões: o acesso da população a 
temas da Educação Escolar e a oportunidade de se desvelar alguns mitos do que seja uma educação de 
qualidade para a opinião pública. 
 O debate, no entanto, para se tornar profícuo, necessita de alguns esclarecimentos conceituais. 
 Inicialmente, é preciso clarificar que os ciclos não são um método de ensino, nem tampouco um 
sistema de ensino. Os ciclos dizem respeito à forma de distribuição/organização/partição dos anos que 
os alunos passam na escola. Podemos organizar esse tempo dividido ano a ano (séries/organização 
seriada), como podemos organizar/dividir esse tempo de dois em dois anos, três em três anos, quatro 
em quatro anos (ciclos/ organização em ciclos). Tal distribuição diferenciada (por ciclos) traz implicações 
não só na forma de avaliar, como também na forma de se organizar o conhecimento escolar ao longo do 
tempo, na relação professor-aluno, nas relações família/escola, na cultura escolar. Portanto, podemos 
entender que organizar a escolaridade em ciclos está para além de se repensar os tempos escolares, 
embora estes sejam um ponto central na proposição. 
 Como vimos, o que fundamenta a concepção dos ciclos são teorias que defendem que a 
aprendizagem dos sujeitos não se dá de forma linear, nem ao mesmo tempo e nem a partir somente de 
estímulos externos. Embora, essas teorias já sejam estudadas há pelo menos 50 anos, a instituição 
escolar ainda mantém uma certa organização de seu currículo, de distribuição de seu tempo e seu 
espaço e seu sistema de avaliação coerente com princípios e concepções de aprendizagem anteriores a 
essas teorias. 
 Não podemos negar que as experiências que visam a não-reprovação dos alunos têm melhorado a 
taxa de evasão escolar. O que isso significa? A população está mais na escola, embora ainda se conte 
com um grande percentual de estudantes que não completam o Ensino Fundamental, mesmo que 
muitos permaneçam mais do que os oito anos regulares. Do ponto de vista social, essa questão, como já 
apontei, parece-me importante de ser considerada. No entanto, encontramos um outro ponto muito 
polêmico e sério: os estudantes estão dentro da escola mas sem aprender aquilo que deveriam estar 
aprendendo. O senso-comum diz que “Estão saindo sem aprender, porque não são avaliados e não são 
reprovados!” Eis aí, um grande equívoco que podemos cometer, pois ele nos remete à máxima, que já 
faz parte de nossa cultura escolar, de que a reprovação é garantidora de uma maior qualidade do 
ensino. Outro equívoco na frase acima é entender que, se os alunos não serão aprovados ou 
reprovados, então não são avaliados. Confundir avaliação como medida pura e simples e com uma 
concepção classificatória é muito comum e faz parte mesmo do senso-comum. 
 Sabe-se que o desempenho dos estudantes das escolas seriadas e das escolas em ciclos é 
semelhante5. Ou seja, a questão não está na organização da escolaridade em si. Tal resultado serve 
para que possamos perceber que não é aí que devemos colocar nosso foco. O problema é que as 
experiências são tidas como redentoras e dessa forma, cria-se um equívoco, deixando-se de se discutir 
soluções para o problema da educação escolar de uma forma mais ampliada. Tendemos a olhar para os 
problemas dicotomicamente, procurando soluções simplistas. Não basta tratar apenas da avaliação e do 
sistema de promoção para se resolver os problemas educacionais. 
 4
 Essas questões são responsabilidades de todos os educadores e não apenas dos gestores da 
educação. Tais questões dizem respeito também aos professores, da mesma forma que os seus 
planejamentos diários, suas provas, seus alunos. O aspecto macro da organização escolar deve ser 
preocupação de todos. 
 A qualidade da educação não passa pela opção de séries ou ciclos. A avaliação não pode ser 
colocada no lugar de bode expiatório, como ocorre há décadas. Nós educadores, precisaríamos colocar 
o debate no lugar correto, pois somos nós quem nos profissionalizamos no assunto e nosso 
compromisso é esclarecer a população acerca dos equívocos que são cometidos, por diferentes e 
diversas razões. Se deixarmos que novamente o centro do debate se volte para as políticas de 
avaliação, para um retorno mais ferrenho ainda, à idéia de que é reprovando que se obtém qualidade em 
educação, estaremos contribuindo para o acirramento da concepção classificatória, excludente da 
avaliação e da escola. E, assistiremos, daqui há dez anos novamente, o mesmo debate, só que com 
nova roupagem, novos nomes, etc. 
 Pois bem, se a avaliação não pode e não deve ser colocada num papel central em toda a discussão 
e debate sobre as escolas cicladas, qual o seu papel nessa nova organização escolar? 
 O papel da avaliação nas escolas em ciclos 
 De qual avaliação estamos falando e qual a relação entre avaliação e função social da escola? 
 A educação escolar com a qual convivemos, crescemos e nos habituamos, portanto, aquela com a 
qual nos naturalizamos, traz em sua origem e, em sua lógica de organização e dinâmica escolar, uma 
concepção de avaliação marcada por uma forte idéia de que as aprendizagens devem ser classificadas 
em certas ou erradas, de acordo com os programas das disciplinas, correspondentes às expectativas 
externas. Dessa forma, esse entendimento acerca do papel da avaliação, termina por selecionar aqueles 
estudantes que aprenderam os conteúdos programados para a série em que se encontram, daqueles 
que não aprenderam. 
 Essa perspectiva de avaliação que podemos denominar de classificatória e seletiva, coerente com a 
lógica de uma escola planejada a partir da idéia de uma aprendizagem meritocrática, que se dá de forma 
linear e que acontece a partir de motivações externas aos sujeitos, ou seja, essa avaliação, torna-se uma 
forte concorrente para ser um fator de exclusão escolar, na medida em que seleciona apenas aqueles 
estudantes que se adeqüam aos padrões normais. Mas, o que são os padrões normais? Quantos de nós 
professores, já não tivemos alunos brilhantes, interessantes, mas que não se adaptavam às exigências 
dos programas, das tarefas, por diferentes razões? Mas, se entendemos que, esses estudantes não 
devem abandonar a escola, não podem ser simplesmente excluídos, devemos repensar o papel da 
escola e, nessa esteira, repensar seu currículo, sua dinâmica, sua organização de tempos e espaços, 
seus processos e concepções de avaliação das aprendizagens. Nesse ponto, encontramos a relação 
entre ciclos (organização de tempos, espaços, currículo, relações professores e alunos) e avaliação. 
 Retomandoa dimensão da utopia de Paulo Freire, não seria próprio daquele que trabalha com 
educação, pensar sempre uma possibilidade nova de escola, de educação? 
 Seria possível concebermos uma perspectiva de avaliação cuja vivência seja marcada pela lógica da 
inclusão, do diálogo, da construção da autonomia, da mediação, da participação, da construção da 
responsabilidade com o coletivo? Tal perspectiva de avaliação alinharia-se com a proposta de uma 
escola mais democrática, inclusiva, que considera as infindáveis possibilidades de realização de 
aprendizagens por parte dos estudantes. Seria possível construir uma escola assim? É o que queremos? 
Essa concepção de avaliação parte do princípio de que todas as pessoas são capazes de aprender e 
que as ações educativas, as estratégias de ensino, os conteúdos das disciplinas devem ser planejados a 
partir dessas infinitas possibilidades de aprender dos estudantes. 
 Pode-se perceber, portanto, que as intenções e usos da avaliação estão fortemente influenciadas 
pelas concepções de educação que orientam a sua aplicação. Hoje, é senso-comum afirmar-se que a 
avaliação não deve ser usada com o objetivo de punir, de classificar ou excluir. Nenhum educador dirá 
 5
isso! Entretanto, o quê, a princípio, poderá transformar as práticas de avaliação, não será alterar o 
sistema de avaliação, mexer no sistema de medição (notas/conceitos), modificar a maneira de registrar 
os resultados da avaliação... Tudo isso é dependente das concepções que norteiem o processo 
educativo e, portanto, avaliativo. Essa mudança é a primeira. E essa mudança não está dissociada da 
concepção de escola que temos, das expectativas que construímos sobre o papel da educação na 
sociedade. Algumas perguntas tornam-se cruciais: a escola é para todos mesmo? Todas as crianças e 
adolescentes são capazes de aprender? Não devemos com isso, pensar que todos são iguais para 
realizar aprendizagens! Somos diferentes! Mas, a questão é: todos podem e devem aprender? Ou, em 
nossa sociedade, é assim mesmo: alguns fazem trabalhos manuais, outros são mais afortunados e são 
destinados a um trabalho intelectual mais nobre? Enfim, essa questão de fundo político, filosófico, não 
pode e não deve ser desconsiderada. Discutir ciclos e avaliação é discutir essas questões. 
 A prática da avaliação pode acontecer de diferentes maneiras. Ela deve estar relacionada com a 
perspectiva de avaliação que entendemos como sendo a coerente com os princípios de aprendizagem 
que adotamos e com o entendimento da função que a educação escolar deve ter na sociedade. Se 
entendermos que os estudantes aprendem de variadas formas, em tempos nem sempre tão 
homogêneos, a partir de diferentes vivências pessoais e experiências anteriores e, junto a isso, se 
entendermos que o papel da escola deva ser o de incluir, promover crescimento, desenvolver 
possibilidades para que os sujeitos realizem aprendizagens, socializar experiências, perpetuar e 
construir cultura, devemos entender a avaliação como promotora desses princípios e, portanto, seu 
papel não deve ser o de classificar e selecionar os estudantes, mas sim o de auxiliar professores e 
estudantes a compreenderem de forma mais organizada seus processos de ensinar e aprender. Essa 
perspectiva exige uma prática avaliativa que não deve ser concebida como algo distinto do processo de 
aprendizagem e afina-se com a organização de uma escola ciclada, uma vez que a proposta política da 
escola em ciclos, é democrática e inclusiva. 
 Veja bem, dizer isso, não significa dizer que a escola seriada não possa ser democrática e inclusiva. 
Mas, historicamente, como já vimos, a origem da escola em ciclos, no Brasil, orienta-se para a busca de 
uma escola com tal perspectiva. 
 Considerando todas essas questões, a implementação dos ciclos nas escolas, traz implicações para 
a sociedade, para o cotidiano da escola e para as práticas avaliativas. 
 Do ponto de vista político-social, é forte e arraigada em nossa sociedade uma cultura escolar que tem 
como máxima que a boa escola, a escola “forte” é aquela que reprova. O mecanismo de reprovação tem 
sido, ao longo da história de nossa escola, o único eficaz no sentido de manter a qualidade da escola, 
mas não exatamente a aprendizagem dos alunos. Diversas práticas existem há muito tempo como: 
recuperação ao final do ano, recuperação paralela, dependência, etc. com o propósito de fazer com que 
os alunos aprendam e se adeqüem aos programas das séries. Mas nenhuma delas compartilha da forte 
crença existente na sociedade, de que é a reprovação que faz o estudante aprender. Nesse sentido, a 
função da avaliação ao longo dos tempos, torna-se prioritariamente, verificar aqueles que passarão de 
ano, daqueles que ficarão reprovados: estuda-se para passar de ano, ou seja, ser selecionado; estuda-
se nas vésperas da prova (existem, claro, as exceções); a família cobra boas notas; o valor do 
conhecimento modifica-se. 
 Do ponto de vista do cotidiano escolar e das práticas avaliativas, uma nova concepção de avaliação, 
como na escola em ciclos, traz implicações para o cotidiano escolar: mudanças nos projetos político-
pedagógicos, nos currículos, nas condições de funcionamento da escola, nas relações no interior das 
escolas e suas hierarquias, nas relações famílias e escola. Para Perrenoud (1999), trabalhar com uma 
avaliação formativa, avaliação mais coerente com a organização em ciclos, significa mudar a escola. Ao 
se mudar a prática avaliativa, mudam-se as relações dentro do espaço escolar, tanto as relações com o 
saber, quanto entre os agentes, como a relação com a profissão, com o tempo escolar e sua gerência e 
administração; muda-se a didática, muda-se a proposta curricular. 
 Seria um grande equívoco teórico, pensar que na escola em ciclos não se avalia. Pois, sem uma 
prática avaliativa, a proposta dos ciclos se inviabiliza. Mas que prática seria essa então, se elimina-se a 
avaliação classificatória ao final de uma série? Uma avaliação contínua e formativa torna-se condição 
 6
para os processos das aprendizagens e de regulação dos rumos e caminhos, pois não se poderia passar 
três ou quatro anos sem se avaliar as aprendizagens dos estudantes. A avaliação formativa é aquela em 
que o professor está atento para os processos e aprendizagens de seus estudantes. O professor não 
avalia com o propósito de dar uma nota, pois a nota é uma decorrência desse processo, mas não o seu 
fim último. O professor entende que a avaliação é essencial para dar prosseguimento aos percursos de 
aprendizagem. Continuamente, ela faz parte do cotidiano das tarefas propostas, das observações 
atentas do professor, das práticas de sala de aula. Por fim, podemos dizer que avaliação formativa é 
aquela que orienta os estudantes para a realização de seus trabalhos e de suas aprendizagens, 
ajudando-os a localizar suas dificuldades e suas potencialidades, redirecionando-os em seus percursos. 
A avaliação formativa, assim, favorece os processos de auto-avaliação. Essa prática de avaliação mais 
constante e contínua exigiria uma autodisciplina muito maior do professor, para que não “perdesse o 
tempo” adequado das regulações. Exigiria também uma autonomia muito maior dos professores e um 
trabalho de equipe muito mais afinado. Dos estudantes, exigiria uma autonomia também maior para 
gerenciar seus avanços e suas necessidades de revisão dos conteúdos, o que implicaria também numa 
prática de auto-avaliação a ser incorporada, aspecto não contemplado em nossa cultura de avaliação, na 
qual o processo de aprendizagem e de avaliação ainda está muito mais posto na mão do professor e na 
força dos programas, do que no estudante. 
 Segundo Hadji (1994), pode-se distinguir três tarefas para a avaliação: a de adaptar o ensino ao aluno 
(individualização); a de saber onde se está, para se fazer o ponto da situação nosmomentos 
importantes: por exemplo, no fim ou no começo de um ciclo de estudos; a de facilitar a aprendizagem. 
Nesse espaço da gestão pedagógica, as escolhas do professor são comandadas pelo imperativo de 
regular as aprendizagens, função essencial da avaliação e uma escolha obrigatória do professor. 
 A escola em ciclos, por ser uma escola na qual exige-se uma mudança, torna-se mais do que as 
outras, uma escola em conflito, inquieta, uma vez que tudo está sendo questionado: a forma de 
avaliar, a maneira de se entender o conhecimento, a didática utilizada, a organização dos tempos e dos 
espaços, pois bem, essa escola solicita muito mais do corpo docente, das famílias, da sociedade, no 
sentido de mobilizá-los para encontrar soluções em conjunto, para mediar estratégias, para repensar 
valores, para gerir situações curriculares, como decidir o quê, porquê, como e quando ensinar e avaliar. 
Tais demandas acabam por comprometer muito mais a todos e com a construção de um projeto de 
escola que ainda está sendo construído6. Com isso, podemos entender que tal movimento não é por ser 
uma escola em ciclos, mas por ser uma escola que se descobre necessitando mudar, uma escola 
inquieta, que não pode abrir mão da utopia freiriana. 
 
 Referências bibliográficas 
BARRETTO, E.S.S.; MITRULIS, E. Trajetória e desafios dos ciclos escolares no país. Revista de 
Estudos Avançados. São Paulo, USP, v.15, n.42, p.105-142, 2001. 
HADJI, C. A Avaliação: regras do jogo – Das intenções aos instrumentos. Porto, Editora Porto, 1994. 
FERNANDES, C. A Escolaridade em Ciclos: práticas que conformam a escola dentro de uma nova lógica 
- a transição para a escola do século XXI. Rio de Janeiro, PUC-RIO, tese de doutorado, 362 p. 
______________. A Escolaridade em Ciclos: a escola sob uma nova lógica. Cadernos de Pesquisa. 
Fundação Carlos Chagas /FCC, São Paulo, 2005. 
PERRENOUD, P. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens - entre duas lógicas. Porto 
Alegre, ed. Artmed, 1999. 
Referência: 
FERNANDES, C. O. Escola em ciclos: uma escola inquieta - o papel da avaliação. In: Krug, Andréa 
(org.) Ciclos em Revista – A construção de uma outra escola possível. V1. Rio de Janeiro, Ed. WAK, 
2008, 3ª edição.

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