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Unidade III FORMAÇÃO SÓCIO-HISTÓRICA DO BRASIL Prof. Daniel Mariani A questão social A distância entre os indicadores econômicos e sociais no Brasil revela o atraso do país em não conseguir converter sua potência econômica em conquistas sociais. Os agentes políticos, preocupados com os dilemas e as lutas sociais e com o rumo político do país, como os sindicatos, os movimentos sociais e os movimentos de estudantes, acompanham as crises de perto. A questão social Tentam participar das decisões políticas acirrando antigas tensões entre o campo e a cidade, os ricos e os pobres, aguçando os conflitos não resolvidos pelo pacto social brasileiro. A questão social apresenta-se como básica simultaneamente, inesgotável em nossa sociedade. A necessidade de inteirar-se dela é grande, assim como a importância dos que tentam resolvê-la. As desigualdades sociais A história brasileira está repleta de governos que transpareceram a desigualdade no Brasil e, durante o século XX, nenhuma das formas de organização do poder político mostrou-se capaz de resolver esse problema. Do autoritarismo à democracia, os impasses sociais se mostraram presentes, assim como as lutas protagonizadas por movimentos que as colocaram como pautas. As desigualdades sociais A partir de 1920 e 1930, as classes dominantes e o governo começaram a reconsiderar a abordagem exclusivamente policial em relação aos protestos e à questão social subjacente, pois perceberam que o problema era, essencialmente, político. O progresso nas negociações políticas de classe não é constante, pois o militarismo e o conservadorismo, em geral, pretendem o tempo todo desconstruir essa abordagem e retornar ao uso da repressão. As desigualdades sociais Em se tratando de determinadas lutas por direitos sociais, a repressão nunca cessou. A relação entre o progresso econômico e a exploração dos trabalhadores pobres é percebida como fundamental para explicar essa contradição. O dualismo é estrutural, pois o desenvolvimento capitalista do campo e da cidade recria continuamente a impossibilidade de transitar entre as classes, uma vez que a mobilidade social permanece horizontal. As desigualdades sociais Os trabalhadores de todas as origens e tipos, no campo ou na cidade, carregam o país, mas se mantêm em condições paupérrimas. A sociedade brasileira é, portanto, uma fábrica de produção de antagonismo e desigualdade social. A criminalização da questão social As diferentes fórmulas e termos utilizados para analisar as questões sociais – desemprego, subemprego, vandalismo, caos, pobreza, marginalidade – resultam em diferentes abordagens do problema que, por sua complexidade, permitem que coexistam. Entretanto, é dominante a percepção da elite, militares e civis que manifestações do proletariado e das classes mais pobres sejam distúrbios à ordem pública. A criminalização da questão social Não existe diálogo fácil entre a classe dominante e os trabalhadores, quando a questão são as reivindicações sociais. O uso do aparelho repressor do Estado, legitimado por uma visão pejorativa do povo, acaba por solucionar permanentemente a falta de diálogo. A culpabilização do povo é um fenômeno antigo, travestido de análise social, que vê a causa da questão social na própria existência do povo miserável e identifica a existência dos que sofrem como a causa do seu sofrer. A criminalização da questão social Ha duas abordagens mais recorrentes para tentar resolver esse problema: o assistencialismo, que casa com o populismo, pois não reforma nem revoluciona o sistema, apenas concede pequenas benfeitorias que não permitem às pessoas ascenderem socialmente ou modificarem estruturalmente as relações sociais que configuram suas vidas. A criminalização da questão social A segunda abordagem é a criminalização e a repressão, pois quando os conflitos sociais se intensificam, as negociações se demonstram incapazes de dirimir esses conflitos e o assistencialismo falha em acalmar os explorados e os oprimidos, a repressão estatal torna-se o caminho utilizado para resolver os conflitos de classe. A criminalização da questão social As relações de trabalho se formalizaram e a modernização dessas relações levou ao gradativo reconhecimento da questão social pelos governantes. O cerne dessa questão é o trabalho; como instituição maior da sociedade, o trabalho impõe-se como necessário, mas, dependendo das condições, torna-se também um castigo. Contudo, na contramão dessa realidade, a exaltação do trabalho e a abominação do ócio e de tudo que se pode identificar com a preguiça criaram um processo de embelezamento do trabalho que gera o capital. A criminalização da questão social Não aparecem nos discursos públicos os efeitos da ampliação do trabalho em relação ao desenvolvimento do capital, ao desemprego, à crise sistemática e à precarização da vida. Esses fatores, aos quais estão submetidos a maioria dos brasileiros, produzem ciclicamente uma miséria que equivale ao progresso do capital. O desemprego precariza o trabalho e o capital necessita da constante reserva de desempregados para tornar o custo do trabalho o mais barato possível. Interatividade As relações de trabalho se formalizaram e a modernização dessas relações levou ao gradativo reconhecimento de: a) Humanização. b) Questão social. c) Globalização. d) Ser social. e) Nenhuma das alternativas anteriores está correta. Formação sócio-histórica do Brasil A globalização do final do século XX necessitou de classe para exercer o poder de maneira patriarcal, para implantar as diretrizes neoliberais e o clientelismo e para sustentar o poder com as mesmas famílias. As oligarquias se tornaram politizadas, pois seus representantes políticos encarregaram-se da transição entre o Brasil não globalizado para o globalizado, de maneira que tudo se modernizasse, conservando a essência desigual do país. Formação sócio-histórica do Brasil O Brasil também tem um traço fundamental, o catolicismo. A religião e o exercício da vida institucional da Igreja resultaram em uma influência da construção de pensamentos que tem uma matriz católica, ainda que intelectualmente distantes da religião. O catolicismo atuou como doutrina intelectual conciliadora, com o poder de unificar e manter coesos momentos de tensão social e fragmentação ideológica. Formação sócio-histórica do Brasil Apresentou-se e permaneceu nos entremeios das elites, do Estado e das relações de exercício de poder das classes dominantes em geral. Portanto, o catolicismo é peça chave para a integração nacional e a invenção da identidade nacional. Formação sócio-histórica do Brasil Com a globalização em curso, as Ciências Sociais precisavam se confrontar com a mudança substancial que ainda está ocorrendo no mundo por causa do capitalismo. Estudar a sociedade globalizada requer, antes de tudo, rediscutir a epistemologia das Ciências Sociais e as mudanças em seu objeto de estudo. Formação sócio-histórica do Brasil A transformação da sociedade nacional para a sociedade global recodificou as relações sociais de tal forma que o próprio Estado não é mais o centro, capaz de concentrar e organizar o poder econômico e político. Formação sócio-histórica do Brasil A sociedade global já apresenta características que revelam aspectos sobre seu objeto. São estudos que indicam tendências evolucionistas, funcionalistas, estruturalistas, sistêmicas, marxistas e weberianas, e todos priorizam os temascentrais da sociedade global: economia, finanças, tecnologia, religiosidade, conectividade, informação, política, sustentabilidade. Formação sócio-histórica do Brasil Em uma sociedade que se espalha geograficamente, o capital ganha oportunidades para descobrir novos caminhos para realizar antigas e eternas demandas do sistema. Esse processo mundial, as antigas definições de macro e micro já não contemplam as transformações locais que ocorrem em grandes metrópoles, pois o local e o global se determinam reciprocamente, sendo possível que transformações concretas sejam decorrentes de alterações internacionais, nada perceptíveis no espaço físico transformado. Formação sócio-histórica do Brasil Independente do momento que o país atravessa, o mito ganha novas formas e estabelece um eterno vínculo com passado, de tal forma que o sentido da história obedece ao mito fundador; mesmo que aconteçam transformações na forma de narrá-lo, ele continuará sendo alimentado e transmitido. Formação sócio-histórica do Brasil A principal força do mito está em naturalizar os acontecimentos, uma vez que sua potência de construção de sentidos é grande e seu mecanismo de repetição sustenta, por meio das gerações, um senso comum. Formação sócio-histórica do Brasil As elites, sejam militares, religiosas, financeiras etc., controlam o poder em diversas formas; o conhecimento, a riqueza material, o discurso religioso, o poder bélico ou político etc. O poder político, que tem tanto a função social, como uma função coletiva própria, no sentido de acúmulo de poder, de erguer uma nação e um Estado. Formação sócio-histórica do Brasil O público é secundário, pois a unidade nacional é a matriz de toda construção política ou estatal na sociedade moderna. O papel dos intelectuais, da universidade e do conhecimento é de construir e interligar a sociedade para que se apresente como indivisível. Formação sócio-histórica do Brasil O ponto central dessas definições está no surgimento do Estado, que busca legitimar-se como um novo poder perante os que participam dele. Os empecilhos presentes nessa missão política são a inclusão de todos os habitantes pela administração e a obtenção de lealdade independentemente de suas disputas sociais. A ideia de nação é a solução encontrada pelo Estado moderno para unificar as divisões sociais e econômicas. Interatividade O catolicismo é peça chave para a ___________ nacional e a ___________ da identidade nacional. a) Realidade, social. b) Nobreza, capacidade. c) Integração, invenção. d) Classe, trabalhadora. e) Nenhuma das alternativas anteriores está correta. Formação sócio-histórica do Brasil Com a invenção do nacionalismo, o Estado-nação se consolida como símbolo não somente do progresso, mas da sociedade moderna, sendo naturalizado e considerado eterno. Foi criada a impressão de que o Estado sempre existiu no passado e que sempre existirá no futuro. Isso permitiu um elemento de identificação social por toda a população, sem disputar espaço com outras culturas ou crenças, pois a crença no Estado permite o florescimento de todas as outras, servindo como um denominador comum e imprescindível ao povo. Formação sócio-histórica do Brasil A discussão do caráter nacional ganhou fôlego, pois a palavra permitiu sua extensão ao povo e sua percepção a partir da condição unitária de nação. A palavra caráter é autossuficiente, não requer referenciais externos para se definir, assim como é mutável com o tempo. O conceito do caráter nacional depende de três fatores: o momento sociopolítico, a classe social que trabalha a sua construção e as ideias europeias, dominantes naquele momento. Formação sócio-histórica do Brasil O caráter nacional é sempre completo, seja ele positivo ou negativo. A identidade nacional contém características distintas do caráter nacional, pois define dois espaços, o interno e o externo, uma vez que não é possível construir uma identidade sem que exista algo diferente, exterior a ela. Formação sócio-histórica do Brasil O espaço interno é moldado pelo seu núcleo, compreendido como a personalidade, no plano individual, e sua inserção social, no plano coletivo. A identidade nacional harmoniza essas duas dimensões, porque, assim, permite emergir a consciência nacional. Formação sócio-histórica do Brasil Na ideologia originária do “caráter brasileiro” está a ideia de que o povo brasileiro é composto de três raças: o branco, o negro e o índio, e a sociedade mestiça desconhece o preconceito. Desse ponto de vista, há a presença do paternalismo europeu e branco, que se relaciona com o negro de forma carinhosa, como a literatura com frequência retrata. Formação sócio-histórica do Brasil Teria existido uma afeição entre os moradores da casa grande e os da senzala, na ideologia da “identidade nacional”, o negro se torna classe, portanto, escravo, sofredor de uma violência secular e institucionalizada para garantir a produção econômica de bens, mas também a própria manutenção de seu status de propriedade dos brancos. As regras do comércio e da vida no reino A divergência entre o “caráter nacional” e a “identidade nacional” estaria na plenitude do conceito, pois o “caráter nacional” planifica o país, tornando irrelevantes as classes sociais e utilizando a mestiçagem como aspecto unificador e homogeneizante. A “identidade nacional” não unifica, pois considera as classes sociais e suas condições de alienação, sempre pautando a organização nacional pela ação equivocada das classes baixas, perante as propostas da classe dominante, que, por esse motivo, tem razões suficientes para ser a classe opressora. Formação sócio-histórica do Brasil Contudo, as duas frentes foram absorvidas ainda nas primeiras décadas do século XX, pois o Modernismo se nacionalizou, em parte, construindo culturalmente o verde-amarelismo e apoiando a ditadura de Getúlio Vargas, estruturando, inclusive, a versão brasileira do fascismo europeu, com o Movimento Integralista. Formação sócio-histórica do Brasil A burguesia industrial emplacou o projeto nacional desenvolvimentista, que originou o segundo verde-amarelismo, agora, não mais de caráter nacional, mas de identidade nacional. Inicialmente, inimigo dessas elites, o verde-amarelismo permaneceu forte, sendo capaz de se transformar em ferramenta sustentada por elas também. As regras do comércio e da vida no reino A segunda grande tentativa de desmantelar o verde-amarelismo, por parte da esquerda, foi no governo de João Goulart, deposto pelos militares. A industrialização, mesmo nos governos militares, não teve forças para retirar o verde-amarelismo de cena. A suposta obrigação das empresas internacionais se tornarem brasileiras (por exemplo, a Ford do Brasil ou a Volkswagen do Brasil) não tornaram a indústria, realmente, brasileira. As regras do comércio e da vida no reino O período militar, que corresponde ao momento da “questão nacional”, a qual substituiu a ideia de “identidade nacional”, utilizou-se do verde-amarelismo como ferramenta política para sustentar a opinião publica a seu favor e para se legitimar politicamente perante aqueles que afrontavam o regime. Formação sócio-histórica do Brasil A necessidade de transformar a imagem para que ela pudesse se perpetuar pela história brasileira nascia nas elites que ocupavam um novo espaço no topo da sociedade. Por isso, o verde-amarelismo tradicional, antigo, que versava sobre as maravilhas naturais, foi substituído por outro, uma vezque os setores produtivos tidos como atrasados ainda o mantinham vivo. Interatividade Na ideologia originária do caráter brasileiro está a ideia de que o povo brasileiro é composto por quais raças? a) O branco. b) O índio e o negro. c) O branco, o negro e o índio. d) O negro. e) Nenhuma das alternativas anteriores está correta. O mito fundador Uma ideia que consiste em diferenciar a postura das ideias e da América; as primeiras não estariam esperando que homens as encontrassem, enquanto a América estaria à espera de Colombo. Contudo, a autora discorda, pois afirma que a América não esperava ninguém. O mito fundador As navegações e o descobrimento são desdobramentos do capitalismo em formação na Europa, mas simbolicamente representam o alargamento de fronteiras e a descoberta de territórios impossíveis. As Américas estariam representando as profecias bíblicas que supunham existir cidades utópicas, guiadas pelo Sol, como um paraíso terrestre e abundante. O mito fundador A novidade desse mundo está menos relacionada ao fato de que era a primeira vez que se chegava à América ou de que nada de europeu existia aqui. A novidade consiste na semelhança das imagens descritas pelos navegadores, com o imaginário de uma perfeição original, uma terra nova, pois intocada e pura, anterior à queda do homem. Formação sócio-histórica do Brasil Essa ordenação jurídica legitima e permite dizer que as populações nativas devem ser salvas e catequizadas, pois se encontram em condição de inocência, ignorantes quanto a Deus e a tudo. Todas as formas de exploração e captura eram possíveis e obras da natureza, justamente porque esses seres eram desprovidos de razão e vontade, não podendo ser considerados seres humanos e, portanto, detentores de direitos subjetivos. A descrição da independência no Brasil A palavra utilizada para descrever a sociedade indígena é nação, no sentido antigo, que designava um agrupamento de pessoas de descendência comum, vivendo sem Estado ou estatuto social. Com as tentativas de escravidão indígena e a constante captura e fuga, os portugueses começam a perceber que os índios tinham a capacidade e a faculdade para escolher não se submeterem ao domínio português. Assim surgiu a percepção portuguesa de que o índio tinha uma indisposição ao trabalho escravo. Formação sócio-histórica do Brasil O projeto a ser construído o governo deve ser único, centralizado e forte, simultaneamente as navegações e os governos absolutistas desmontam o feudalismo europeu e estruturam o capitalismo mercantil, consequentemente, o problema da administração das colônias ultramar. Formação sócio-histórica do Brasil A representatividade política, no sistema brasileiro, também sustenta-se e está pautada pela sagração da figura do líder, no caso do Rei e do Imperador, que são representantes de Deus e não dos governados. O mesmo ocorre na República, pois entende o povo que os políticos representam o Estado e não seus interesses. Decorrente dessa organização, não se institui no povo uma relação democrática, pelo contrário, criou-se um sistema de clientela e favores. Formação sócio-histórica do Brasil Toda essa construção é mantida por instrumentos e dispositivos que buscam naturalizar as convivências com essa desigualdade de classes, pois as classes sociais são escondidas sob discursos nacionais, os quais enfatizam o país como uma nação una, indivisível. Formação sócio-histórica do Brasil O autoritarismo não é um fenômeno político que acontece de vez em quando no Brasil, ele existe por conta da forma autoritária de ser que os brasileiros consideram normal em nossa cultura. Por isso parece que é insuperável quando não se percebe isso na cultura brasileira, qualquer análise, que não deixe essa característica muito clara, é falha. Formação sócio-histórica do Brasil Os níveis de violência e de desigualdade, mascarados por relações essencialmente privadas e pela construção histórica da confusão entre público e privado, normalizam-se junto com cenários de luta política e miséria social. Os sem-teto, os sem-terra e as lutas sociais são vistos com apatia ou desprezo pela opinião pública, pois se atribui a origem da pobreza ou da falta de acesso a propriedade ao indivíduo e a seu caráter. Formação sócio-histórica do Brasil A polarização entre privilégio e carência desaparece sob a ótica da ordem e do progresso, que ocultam a realidade social e sustentam um imaginário econômico de pai economicamente forte. A classe média regional e nacional sustenta esse modelo, aderindo aos constructos de senso comum sustentados pelos políticos que, manejando sempre o Estado em seu favor, também o fazem em favor dos oligopólios privados que os sustentam eleitoralmente. Formação sócio-histórica do Brasil A política econômica dos governos mantém as pautas de privatização, ou seja, doar aos oligopólios construções realizadas com o dinheiro público, e também submetem os direitos individuais a lógica do mercado, permitindo que esses mesmos grupos lucrem com a ausência da tutela do Estado. Interatividade A construção é mantida por instrumentos e dispositivos que buscam naturalizar as ___________ com essa ____________ de classes, pois as classes sociais são escondidas sob discursos nacionais: a) Culturas, realidade. b) Convivências, desigualdade. c) Economias, responsabilidade. d) Realidades, autonomia. e) Nenhuma das alternativas anteriores está correta. ATÉ A PRÓXIMA!
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