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Arquitetura como segmento da cultura

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ARQUITETURA COMO SEGMENTO DA CULTURA 
Nivaldo Andrade – Professor da UFBA e Vice‐Presidente do IAB‐BA 
Os  teóricos  franceses da arquitetura do  século XIX definiram a arquitetura  como a  “arte de 
construir”.  A  arquitetura  é,  portanto,  construção  –  isto  é,  técnica  – mas,  também,  arte.  E, 
sendo arte, corresponde a uma manifestação cultural, logo está vinculada a uma determinada 
cultura e variando no tempo e no espaço. 
A arquitetura, porém, possui uma especificidade frente às demais produções artísticas: ela é o 
que  podemos  chamar  de  arte  compulsória.  Como  observou  um  dos  mais  importantes 
arquitetos  contemporâneos,  o  italiano  Renzo  Piano  –  co‐autor  do  projeto  do  Centro 
Pompidou, em Paris –, “uma música ruim pode não ser escutada, e é possível não olhar para 
um quadro feio, mas um prédio feio está ali, diante de nós, e nós o vemos, necessariamente. E 
essa  é  uma  responsabilidade  pesada,  até  para  as  gerações  futuras,  pois  permanece 
fisicamente”. Dessa  forma, o  interesse pela produção de uma  arquitetura de qualidade – e 
também  do  urbanismo  de  qualidade  –  vai  além  da  questão  da  beleza,  extrapola  o  círculo 
restrito dos arquitetos e urbanistas e diz respeito diretamente a toda a sociedade.  
Por  essas  razões,  tanto  no  exterior  quanto  no  Brasil,  o  poder  público  vem,  há  décadas, 
patrocinando a discussão e fomentando a difusão da arquitetura e do urbanismo. A Prefeitura 
do  Rio  de  Janeiro  mantém  o  Centro  de  Arquitetura  e  Urbanismo  (CAU),  em  um  palacete 
eclético no bairro de Botafogo,  com visitação gratuita. Dentre outras exposições, desde  sua 
criação, em 1997, o CAU já apresentou à população o projeto do Museu do Amanhã, no Porto 
do Rio, do arquiteto espanhol Santiago Calatrava, e uma retrospectiva da obra do importante 
arquiteto moderno carioca Affonso Eduardo Reidy, autor dos projetos do Aterro do Flamengo 
e  do  Museu  de  Arte  Moderna  do  Rio.  Em  outros  países,  os  Ministérios  da  Cultura  locais 
mantêm  e/ou  patrocinam  centros  culturais  que  expõem  e  promovem  a  discussão  sobre  a 
arquitetura e o urbanismo, como a Cidade da Arquitetura e do Patrimônio, em Paris, França, e 
o Instituto Holandês de Arquitetura (NAI), em Roterdã, Holanda. 
O  reconhecimento  da  arquitetura  como  importante  segmento  da  cultura  já  foi  feito  pelo 
Ministério  da  Cultura  brasileiro  que,  no  ano  passado,  passou  a  incluí‐la  nas  Conferências 
Nacionais  de  Cultura,  junto  a  outras  áreas,  como moda  e  design,  que  até  então  não  eram 
contempladas. Essas iniciativas demonstram que, não só no exterior como também no Brasil, a 
arquitetura  vem  sendo  reconhecida  como  atividade  artística  e  cultural  cuja  produção  e 
reflexão crítica devem ser fomentadas pelo poder público através de suas instâncias culturais.   
Enquanto isso, a Secretaria de Cultura da Bahia parece ignorar que a produção de arquitetura 
e  o  urbanismo  se  constitua  em  manifestações  artísticas  e  culturais.  Os  principais  editais 
lançados pela Secult, como os relativos à utilização dos recursos do Fundo de Cultura da Bahia 
ou  aquele  recentemente  lançado  pela  Fundação  Cultural  do  Estado  (FUNCEB),  visando 
fomentar  a  crítica  de  artes,  contemplam  praticamente  todas  as  manifestações  artísticas  e 
culturais:  artes  plásticas  e  gráficas,  literatura,  dança,  teatro,  música,  patrimônio  cultural, 
cinema, vídeo, fotografia, circo, folclore, artesanato, museus, bibliotecas e arquivos, saberes e 
fazeres. Entretanto, não prevêem o apoio à produção de bens e de atividades culturais tendo 
como temática a arquitetura e o urbanismo.  Por que a Secult não pode financiar exposições, 
publicações e seminários ou premiar a crítica da arquitetura e do urbanismo, como  faz com 
relação às outras manifestações artísticas citadas acima? 
Segundo nota publicada pelo MinC no ano passado, quando a arquitetura, a moda e o design 
foram  incluídos nas Conferências Nacionais de Cultura,  “as produções dessas áreas passam, 
definitivamente, a ser consideradas manifestações da  identidade brasileira e por  isso devem 
ser contempladas nas ações do próprio MinC e de outras instituições que fomentam e apóiam 
a cultura”. É preciso que o Governo do Estado da Bahia assimile essa lição e cumpra seu papel!

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