Buscar

A Toupeira que queria ver o cometa

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 12 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 12 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 12 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Com-vivência
Segedam/Segep/Dsaud/SBE
A toupeira que queria ver o cometa
Era uma vez uma toupeira.
As toupeiras são míopes: só enxergam coisas que estão 
bem pertinho, encostadas na ponta do focinho.
É que elas moram em túneis. Este é o seu mundo: 
debaixo da terra. Quem mora em túneis não precisa ver. Lá 
dentro é tudo escuro. Não há quase nada para ser visto.
Eu não sei por que é que elas resolveram viver assim, se 
aqui fora é tão bonito. Acho que foi medo. Por medo dos 
bichos que eram mais fortes resolveram se enterrar. A pena 
é que, lá no fundo, se não vão os bichos perigosos, também 
não vão nem os pássaros e nem as borboletas, e não se vê 
nem o luar e nem o arco-íris.
As toupeiras são ruins de ver, mas muito boas para 
cavar. Passam assim sua vida inteira: cavando túneis e se 
escondendo dentro deles. Como certas pessoas...
A toupeira de nossa estória tinha um apelido: 
Ceguinha.
Os outros bichos se riam dela, porque ela nunca via 
nada.
No jogo de cabra-cega nem precisavam pôr a venda 
nos seus olhos. Ela não via nada, mesmo com seus olhos 
abertos.
E ficava sempre de fora das conversas, porque ela não 
sabia sobre o que falar. Só falava sobre o seu túnel. Como 
certas pessoas...
Enquanto a bicharada falava de frutas que cresciam 
no alto das árvores, ou de nuvens que ameaçavam chuva, 
ou da beleza do arco-íris, ou da brancura do luar, ela 
perguntava:
- O que é isto? Eu nunca vi...
E piscava seus olhinhos míopes.
Certo dia ela percebeu algo incomum. Um alvoroço 
entre os animais. Falavam de uma coisa nova, sobre o que 
nunca haviam conversado antes.
- É – disse D. Coruja, professora, que se especializara nas 
coisas que acontecem durante a noite. – Dizem que o 
brilho dele é maior que o de muitas luas cheias. Na última 
vez que apareceu, o rabo era tão grande que ia do 
horizonte até o umbigo do céu, bem em cima de nossas 
cabeças.
Todo mundo olhou para cima, pra ver onde ficava o 
umbigo do céu. Ceguinha também. Só que ela não viu 
nada.
- Ele vem de muito longe, de muito longe mesmo. Só 
passa por aqui de 76 em 76 anos...
Mas vem de onde? – perguntou um esquilinho 
espantado.
- Das lonjuras do céu. Dizem que ele é um brinquedinho 
do sol. Uma espécie de ioiô. Às vezes está bem pertinho e 
depois vai para muito longe. Nós, aqui na terra, somos 
brinquedos também. Só que diferentes. Não somos ioiôs. 
Somos um grande carrossel, girando, girando, sem nunca 
chegar perto, sem nunca chegar longe, sempre no mesmo 
caminho...
E os bichos paravam, assombrados com D. Coruja, que 
sabia tanto.
Ceguinha criou coragem. Ela não sabia o que era 
aquilo sobre o que falavam.
- Vocês estão falando sobre o quê? – perguntou 
acanhada.
- Falamos do cometa que vai chegar – disse o castor, 
que sempre morria de dó da toupeira.
- Cometa? Onde? – e Ceguinha começou a dar voltas, 
procurando, como se um cometa fosse coisa que estivesse 
por ali. Assim era o mundinho dela. Nele não havia coisas 
longe, nem coisas diferentes... Eram só aquelas, a que ela já 
estava acostumada desde criança, coisas que se 
encontravam próximas dos seus olhinhos míopes. Como 
acontece com certas pessoas também...
A bicharada riu. E explicaram que um cometa é coisa 
brilhante que aparece no céu, parecia estrela mas não 
era, porque as estrelas estavam sempre lá, no mesmo lugar, 
mas um cometa fazia uma visita e desaparecia, por muitos 
e muitos anos. Imagine só: a última vez que esteve por aqui 
foi em 1910... Mas era tudo inútil. As explicações não 
adiantavam nada, porque a toupeira nunca havia visto 
coisa alguma nos céus, nem o azul, nem as nuvens, nem as 
estrelas. E se a coisa estava tão longe assim, que diferença 
iria fazer em sua vida e em seu túnel? E já se preparava para 
voltar para casa, pois a conversa não lhe interessava.
Mas aí D. Coruja disse uma coisa que a fez parar.
- O cometa tem poderes mágicos. Ele tem o poder de 
realizar os desejos de quem o vir. Se alguém, ao olhar para 
ele, de todo o coração desejar alguma coisa, esta coisa 
acontece mesmo...
E foi aquele reboliço, cada qual dizendo daquilo que 
iria desejar quando visse o cometa.
Ceguinha se virou, tristemente, e duas lágrimas caíram 
de seus olhos.
Tudo o que eu desejo é ver, para poder brincar, para 
ser companheira, para poder dizer das coisas que vi e os 
outros não. Quero ser igual aos outros... Ah! Se isto 
acontecesse, se eu pudesse ver, então eles parariam para 
me ouvir e gostariam das minhas estórias. E eu seria feliz. 
Mas o milagre só acontece para aqueles que vêem o 
cometa. Meus olhinhos míopes nunca o verão. Por isto o 
meu desejo nunca se realizará... 
O falatório era muito grande e ninguém notou 
Ceguinha, em silêncio, voltando para sua toca escura. E foi 
pensando. A verdade é que ela nunca quisera ver, pois 
estava sempre preocupada em fugir. Não fora para isto 
que ela construíra o seu túnel, para se esconder? Quem 
vive no escuro não precisa ver. Ver é coisa que se 
desaprende, se não se deseja. E foi assim que seus olhinhos 
foram ficando míopes: não serviam para nada... Pois é, ela 
construíra o seu túnel como uma proteção. Mas agora 
sentia que ele se transformara numa prisão. É que agora ela 
estava diferente por dentro: queria ver as coisas bonitas do 
mundo. Não havia nada que ela desejasse mais do que 
isto. E com este desejo imenso ela adormeceu.
E sonhou.
Sonhou com o que mais desejava.
É sempre assim: nos sonhos os nossos desejos se 
transformam em realidade.
Sonhou com o milagre: o cometa que ela nunca veria.
Ele aparecia no céu, cauda imensa, multicolorida 
como se fosse um arco-íris, e era um grande olho que 
refletia, como se fosse um espelho, as coisas que ela 
sempre desejara ver, e outras que nunca imaginara. Ao seu 
redor tudo ficava luminoso. Que bom se ela tivesse um olho 
assim...
Foi então que ela notou uma coisa curiosa: aquele olho 
que tinha tanta luz e refletia tanto lhe parecia por demais 
familiar, conhecido, como se ela já o tivesse visto em algum 
lugar. Ah! Era o olho que ela vira vezes sem conta refletido 
na água da fonte, quando ela ia beber água. Era o seu 
próprio olho que ela via agora como nunca vira, porque via 
dentro as coisas que sempre estiveram lá, escondidas, 
guardadas, mas que ela nunca parara para ver...
Primeiro ela viu, lá no fundo, uma gota de orvalho que 
uma folha havia recolhido durante a noite e guardado. 
Nunca prestara atenção, pois coisa tão pequena não 
podia ter muita importância. Ela brilhava, e os raios de sol 
que passavam por dentro dela se partiam em sete cores. 
Também as folhas gostam de jóias... E ela se admirou que 
pudesse haver tanta beleza em uma gota de orvalho e 
uma folhinha, tão escondidas. Seus companheiros nunca 
haviam notado esta coisa mágica, tão próxima, tão bela. 
Se viram, não falaram. E se não falaram, é porque não 
amaram. E, no entanto, era mais mágica que o cometa. 
Porque o cometa vai e volta. Mas esta gota de orvalho 
acontece uma única vez, para nunca mais...
Depois foi uma poça de água barrenta. Ceguinha não 
entendeu por que tal coisa deveria estar lá dentro do 
cometa. Mas resolveu prestar atenção. Para se ver bem é 
preciso ficar parado, namorando a coisa. É só então que 
ela mostra as coisas bonitas que ela tem, escondidas. E 
então percebeu. Não, não era uma poça de água suja. A 
superfície da água se transformava num espelho e lá, 
dentro dele, apareciam refletidos pinheiros verdes, o azul 
do céu, o brilho do sol. Dentro de uma poça de água 
barrenta, um mundo de coisas bonitas. E Ceguinha se 
perguntou, espantada:
- Como é possível isto, que coisas tão grandes e belas 
se mostrem em coisas tão pequenas e feias?
E sorriu, percebendo que estava vendo coisas que 
nunca vira. Não, não é que nunca tivesse visto. Seus olhos 
as haviam notado, mas o seu coração não ashavia 
acolhido. E ela compreendeu que o olho só vê aquilo que o 
coração deseja. Quando o desejo é belo, o mundo fica 
cheio de luz, mas quando o desejo é ruim, o mundo se 
entristece...
Seus olhinhos passaram então para a superfície da 
lagoa, sua velha conhecida, que ela via agora como 
nunca vira antes. Havia os reflexos das coisas de fora, 
árvores invertidas, cabeça para baixo, como se morassem 
no fundo das águas. Depois, coisas do lado de fora que 
brincavam com a lagoa, folhas que flutuavam na 
superfície e deslizavam leves, barquinhos. E peixes 
sonolentos, grandes olhos abertos, habitantes das 
funduras. Três mundos: o das coisas de dentro, o das coisas 
de fora, e o dos reflexos.
Não, a mágica não era de ver mais longe. O 
maravilhoso não estava escondido nas funduras do céu. A 
mágica era ver diferente aquilo que os olhos haviam visto 
sempre, sem ver. Ah! De que adiantavam olhos de ver 
longe se eles não tinham o desejo de ver o maravilhoso que 
morava perto? E Ceguinha entendeu que o cometa só faz 
milagres para quem deseja muito...
Ela acordou num sobressalto e saiu correndo do túnel, 
esquecida do medo, rindo à toa, e enquanto andava via 
gotas de orvalho guardadas em folhas, mundos coloridos 
refletidos em poças de lama, espelhos mágicos na 
superfície de lagoas... Sim, ela estava vendo, como nunca 
antes, que este mundo é encantado, lindo, bastando que, 
no fundo dos olhos, haja desejos de bondade e de beleza. 
Para ela o milagre acontecera.
Com o coração a galope, ela chegou onde estavam 
reunidos os seus amigos, que ainda falavam sobre o que 
iriam pedir ao cometa. O macaco queria uma floresta de 
bananeiras só para ele. O tamanduá passava a língua 
comprida no focinho e falava de apetitosos formigueiros. 
Os gambás e as raposas conversavam sobre ovos e 
galinhas. Finalmente surgira a chance de acertar na 
quina...
Ceguinha tentou contar o seu sonho. Mas ninguém lhe 
deu atenção. O macaco continuou a falar de bananas, o 
tamanduá continuou a falar de formigas, os gambás e as 
raposas continuaram a falar de ovos e galinhas. E assim 
com todos os outros... Todos sonhavam com as mesmas 
coisas de antes: só que maiores, em maior número. Todos 
queriam ficar do mesmo jeito, como sempre haviam sido.
Ninguém sonhava em ficar diferente, em ver coisas 
nunca vistas.
E Ceguinha percebeu então que cada bicho vivia 
também dentro de um túnel, que os seus olhos só podiam 
ver aquilo que estavam acostumados a ver, que eram 
cegos para as coisas novas, diferentes, nunca vistas, 
mesmo que elas estivessem bem debaixo dos seus 
focinhos. É fácil sair de túneis que existem por fora. O difícil é 
sair dos túneis que existem por dentro, porque ninguém os 
vê.
E ela se sentiu muito solitária.
Antes, a sua solidão era porque os outros viam o que 
ela não via. Agora ela estava só porque via aquilo que os 
outros não viam. Isto era triste, mas ela nada podia fazer. 
Seria preciso que a mágica acontecesse também com 
eles. Mas, para isto, um cometa com a aparência de um 
olho deveria aparecer nos seus sonhos, vindo das 
profundezas do desejo... E continuou o seu velho caminho, 
agora novo e encantado, vendo as coisas que sempre 
nunca vira, brilhando magicamente ao leve toque do seu 
desejo...
ALVES, Rubem. A toupeira que queria ver o cometa, 
Edições Loyola, 13ª Edição, 2006.
Imagem da capa retirada do livro.
	Página 1
	Página 2
	Página 3
	Página 4
	Página 5
	Página 6
	Página 7
	Página 8
	Página 9
	Página 10
	Página 11
	Página 12

Continue navegando