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Curso Auxiliar Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos Leitura: efeitos de sentido II Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 2 Leitura: efeitos de sentido II Oração do Internauta Satélite nosso que estais no céu, acelerado seja o vosso link, venha a nós o vosso host, seja feita vossa conexão, assim em casa como no trabalho. O download nosso de cada dia nos daí hoje, perdoai nosso tempo perdido no Chat, assim como nós perdoamos os banners de nossos provedores. Não nos deixeis cair a conexão e levrai-nos do Spam, Amém! Você, certamente, percebeu que o texto “Oração do Internauta”, que circulou pela Internet, dialoga com a oração do Pai Nosso. De maneira geral, podemos afirmar que sempre recorremos a outros textos quando produzimos um texto. Por isso, nossos textos estão sempre dialogando explicita ou implicitamente com outros textos. O conceito de intertextualidade foi criado, justamente, para dar visibilidade à relação que se estabelece entre dois ou mais textos. Normalmente, um deles faz referência a elementos existentes no outro com objetivo de causar determinados efeitos de sentido: Oração do Internauta Pai Nosso Satélite nosso que estais no céu Pai Nosso que estais no Céu O download nosso de cada dia nos daí hoje O pão nosso de cada dia nos daí hoje Não nos deixeis cair a conexão e levrai-nos do Spam Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do Mal O texto “Oração do Internauta” é um intertexto, uma vez que retoma e modifica uma das mais frequentes orações cristãs. Segundo o Envagelho segundo Mateus e Lucas, o “Pai Nosso” seria uma oração ensinada por Jesus Cristo a seus discípulos, com o objetivo de eles terem um modelo de como orar corretamente a Deus. A “Oração do Internauta” apóia-se na forma da oração e no conteúdo, substituindo algumas palavras que simbolizam discursos específicos no campo religioso (pai, pão, tentação, mal) por outras comuns na era digital: satélite, download, conexão, spam, etc. O trabalho do leitor consiste em perceber a presença de outros textos, identificando o texto “fundador” para compreender o “intertexto”. Essa percepção dependerá essencialmente do conhecimento textual, enciclopédico e de mundo do leitor, telespectador e ouvinte. Segundo Koch e Elias (2008, p.78), “é importante destacar que a inserção de “velhos” enunciados em novos textos promoverá a constituição de novos sentidos”. Ao ler a “Oração do Internauta”, percebemos claramente que o jogo intertextual provoca várias alterações de sentido. Ao mesmo tempo, há um trabalho do autor para relacionar elementos, como os aspectos negativos: cair a conexão cair em tentação; Mal spam. No mundo virtual, circulam também outras orações, como a Oração dos Programadores: “Sistema operacional que estais na memória/ Compilado seja o vosso programa/ Venham à tela os vossos comandos/ Seja executada a nossa rotina/ Assim na memória como na impressora (...)i. Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 3 Intertextualidade As autoras Koch e Elias (2006) afirmam que podemos dizer que ocorre intertextualidade “quando, em um texto, está inserido outro texto (intertexto) anteriormente produzido, que faz parte da memória social de uma coletividade” (p.86). Nos exemplos do quadro abaixo, podemos perceber que há intertextualidade justamente porque vários artistas procuram parodiar o famoso quadro “Mona Lisa”, do pintor italiano Leonardo da Vinci, utilizando muitas vezes outros textos que fazem parte de nossa memória social. O leitor precisa, então, relacionar seu conhecimento da obra de arte com outros conhecimentos (personagens de histórias em quadrinhos e desenhos animados, personagens de contos de fadas, etc. Neste caso, o quadro da Mona Lisa é retomado por outros artistas. Existem várias formas de dialogar com os textos. Em alguns momentos, como estudamos no módulo 5, a citação da fonte é direta ou indireta. Ao encontrar uma citação de um romance em um artigo de opinião, podemos dizer que houve uma intertextualidade explícita (Koch & Elias, 2006). Em outros textos, temos uma intertextualidade implícita. Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 4 Nos casos de intertextualidade implícita, não há uma citação direta ou expressa. Neste caso, o leitor precisará recuperar informações de sua memória para (re)construir o texto e sua relação com o intertexto, produzindo assim diversos efeitos de sentido. Como destacam Koch e Elias (2006), o leitor precisa também perceber quais os objetivos do produtor do texto para inserir implicitamente um texto em outro. Vejamos um exemploii: O texto produzido por Ziraldo, publicado em O Pasquim (1969-1971), retoma de forma intertextual a campanha publicitária do governo Emílio Garrastazu Médici. O slogan “Ame-o ou deixo-o” fez parte da campanha como forte sentimento nacionalista, com intuito de ampliar o apoio ao governo ditatorial. As pessoas não podiam protestar, mas deveriam amar o seu país. A tirinha mostra um discurso contrário à ditadura imposta pelos militares. O leitor precisa perceber o intertexto e a ironia. A tirinha dividida em duas partes mostra um homem beijando o chão, numa posição submissa, e depois sendo chutado, violentamente. Tais informações informam de forma irônica a falta de opções oferecida pela ditadura, ou seja, quem não se submete é expulso (ame-o...deixe-o). No outdoor abaixo, o leitor tem outro exemplo de como ele precisa ativar outros conhecimentos para a construção do sentido. Além de perceber que se trata de uma propaganda, veiculada no Carnaval, torna-se importante perceber o intertexto com a letra da música “Mamãe eu quero”, feita pelo compositor Jararaca em 1937. A música teve uma repercussão internacional na voz de Carmem Miranda, tornando-se um clássico da música popular brasileira. Mamãe eu quero, mamãe eu quero Mamãe eu quero mamar Dá a chupeta, dá a chupeta Dá a chupeta pro bebê não chorar Mamãe, mamãe, mamãe eu quero Mamãe eu quero Mamãe eu quero mamar Dá a chupeta, dá a chupeta Dá a chupeta pro bebê não chorar O leitor precisa ativar conhecimento intertextual para perceber o efeito de sentido provocado por esse jogo com os textos. Muitas vezes, o leitor precisa também ativar seus conhecimentos sobre os gêneros. No exemplo a seguir, vemos como um cartaz de propaganda institucional “brinca” com as informações e estilo presentes nas caixas de remédio. Os enunciados “Turbeculose® tem remédio” e “Procure um posto de saúde. É grátis”, estampados na camisa do artista, fazem referência ao formato, ao estilo de letras, a cores e organização espacial de caixas de remédio. O reconhecimento do gênero e de algumas de suas características pode auxiliar o leitor na construção dos sentidos, pois fornecem “uma chave para a interpretação do texto” (Kleiman e Moraes, 1999, p. 63). Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 5 Nas propagandas, é bastante comum o recurso da intertextualidade. Em uma publicidade que trata de seguro de vida, observamos o seguinte enunciado “Pela estrada afora eu não vou bem sozinha. I. Seguros. Nossa especialidade é cuidar de você”. O leitor percebe aqui que a agência publicitária apostou na intertextualidade estabelecida entre o enunciado e a música cantada por Chapeuzinho Vermelho: “Pela estrada afora, eu vou bem sozinha”. Ao introduzir o advérbio “não” no enunciado da propaganda, o texto faz com que os leitores acreditem que eles não ficarão sozinhos na estrada como a Chapeuzinho Vermelho, uma vez que estão seguros com oproduto que lhes garantirá segurança. Observe a propaganda e procure perceber qual é o intertexto que provoca efeitos de sentido: Conforme Discini (2005), a intertextualidade é a “imitação de um texto por outro, para captá-lo ou para subvertê-lo”. Na propaganda anterior, você teve ter percebido como o texto publicitário de uma marca de papel retoma outra publicidade de uma esponja de aço. O enunciado “só não dá brilho em panela, ou seja, tem mil utilidades” retoma implicitamente outro texto da esponja de aço que dá brilho em panela: “tem mil e uma utilidades”. Desta forma, vemos como as relações textuais são complexas, exigindo do leitor um trabalho de recuperação dos implícitos. Os textos conversam entre si Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 6 Para construção de sentido de alguns textos, o leitor precisará, como já comentamos, mobilizar um conjunto de conhecimentos prévios, especialmente de outras leituras e experiências. Leia a letra da música a seguir, procurando encontrar os intertextos: Bom Conselho Ouça um bom conselho Que eu lhe dou de graça Inútil dormir que a dor não passa Espere sentado Ou você se cansa Está provado, quem espera nunca alcança Venha, meu amigo Deixe esse regaço Brinque com meu fogo Venha se queimar Faça como eu digo Faça como eu faço Aja duas vezes antes de pensar Corro atrás do tempo Vim de não sei onde Devagar é que não se vai longe Eu semeio o vento Na minha cidade Vou pra rua e bebo a tempestade BUARQUE, Chico (1972) Você deve ter percebido que o compositor modifica vários provérbios para produzir determinados efeitos de sentido na letra da música. O intertexto, neste caso, são os provérbios que representam a voz do povo, de uma memória popular transmitida de boca em boca e de geração em geração. O que seria, de fato, um “bom conselho?” O leitor perceberá uma “subversão” dos conselhos, pois Chico Buarque ironiza justamente pelo fato de retomar os provérbios e ditos populares com outros sentidos. Vejamos alguns exemplos no quadro: Letra da música: Bom Conselho (1972) Provérbios: tradição oral popular Espere sentado Ou você se cansa Tudo alcança quem não espera sentado Está provado, quem espera nunca alcança Quem espera, sempre alcança Devagar é que não se vai longe Devagar se vai ao longe Ao negar os provérbios, o compositor estabelece outra relação com os provérbios, levando o leitor a fazer uma reflexão sobre os discursos que estão ao nosso redor. De forma também bem humorada, encontramos os “improvérbios”, escritos por Jô Soares: Devagar se vai a pé; A cavalo comprado se olha tudo; Quem madruga dorme cedo; Quem semeia vento não colhe coisa nenhuma; Quem conta um conto contou o cruzeiro, o cruzado e o real. Os provérbios são, assim, imitados, captados, subvertidos com objetivos específicos. Como aponta Discini (2005, p.152), “subvertem-se figuras, temas e modo de dizer”, instaurando a ludicidade de um outro modo de dizer. Na revista Veja, Jô Soares faz outra subversão, agora do poema Canção do Exílio de Gonçalves Dias (1847). Compare os dois textos: Canção do Exílio (1847) Minha terra tem palmeiras Onde canta o sábia As aves que aqui gorjeiam Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas Canção do Exílio às avessas (2006) Minha Dinda tem cascatas Onde canta o curió, Não permita Deus que eu tenha De voltar pra Maceió... Minha Dinda tem coqueiros Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 7 Nossas várzeas têm mais flores Nossos bosques têm mais vida Nossa vida mais amores. Não permita Deus que eu morra Sem que eu volte para lá, Sem que desfrute os primores Que tais não encontro eu cá, Sem que’inda aviste as palmeiras Onde canta o sabiá Da ilha de Marajó As aves, aqui, gorjeiam Não fazem cocoricó... Observa-se assim um jogo de enunciados, uma intensa conversa entre os textos. Na letra da música, o enunciado 1 “Pense duas vezes antes de agir” é negado, em parte, pelo enunciado implícito 2 “Aja duas vezes antes de pensar”. O poema de Jô Soares traz já um trabalho intertextual no próprio título: “Canção do Exílio às avessas”, ou seja, o poema será retomado em sentido inverso ou oposto. A intertextualidade aqui é visível pela retomada de alguns versos: Minha terra tem palmeiras (Enunciado 1) Minha Dinda tem cascatas (Enunciado 2) No enunciado 1, Gonçalves Dias encontra-se fora do Brasil e retoma seu ufanismo pela expressão “minha terra”. Jô Soares retoma o poema, alterando as palavras e os sentidos. “Dinda” faz referência a “Casa da Dinda”, nome da mansão da família Collor de Mello em Brasília, escolhida como moradia oficial na sua passagem pela Presidência da República. O termo “cascatas” reforça o sentido de mansão, expresso pela ironia do verso. Onde canta o sábia Enunciado 1 Onde canta o curió Enunciado 2 No enunciado 1, o poeta faz referência ao pássaro “sábia”, representando a fauna brasileira. O “sábia” é um pássaro popular, pois tornou-se símbolo por sua imensa notoriedade no Brasil. A paródia de Jô Soares traz um outro pássaro: curió, animal famoso por seu canto. As aves que aqui gorjeiam Não gorjeiam como lá. Enunciado 1 As aves, aqui, gorjeiam Não fazem cocoricó... Enunciado 2 Se no enunciado 1, percebemos uma voz social mais ufanista que compara as aves da Europa (aqui) com as brasileiras (lá), no enunciado 2 a ironia aponta para outros referentes. O advérbio “aqui” retoma o termo “Dinda”, ou seja, as aves são tão “ricas” que não fazem cocoricó, mas soltam sons agradáveis, cantam, gorjeiam. O poeta José Paulo Paes também retomou o poema “Canção do Exílio” para fazer um trabalho intertextual. Assim como a paródia de Jô Soares, o texto de José Paulo Paes retoma o texto original desde o título: “Canção de Exílio Facilitada”. Vejamos o diálogo intertextual: Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 8 Canção do Exílio (1847) Minha terra tem palmeiras Onde canta o sábia As aves que aqui gorjeiam Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas Nossas várzeas têm mais flores Nossos bosques têm mais vida Nossa vida mais amores. Não permita Deus que eu morra Sem que eu volte para lá, Sem que desfrute os primores Que tais não encontro eu cá, Sem que’inda aviste as palmeiras Onde canta o sabiá Canção do Exílio Facilitada lá? ah! sabiá... papá... maná... sofá... sinhá... cá? bah! Veja no quadro a seguir, outros exemplos que demonstram a riqueza das formas de diálogo entre os textos, envolvendo a reconstrução de modelos de estruturas textuais e discursos preexistentes para a produção de novos textos, além do trabalho de citação e alusão a outros. Verde que te quero verde Com 90 mil metros quadrados, o Jardim Botânico Municipal Chico Mendes é considerado a segunda maior área verde de Santos, perdendo apenas para os jardins da orla da praia, cuja extensão é de sete quilômetros (...) Gênero: Notícia Verde que te quero verde. Verde vento. Verdes ramas. O barco via sobre o mar E o cavalo na montanha. Com a sombra pela cintura Ela sonha na varanda, Verde carne, tranças verdes, Com olhos de fria prata. Verde que te quero verde. Por sob a lua gitana, As coisas estão mirando-a E ela não pode mirá-las. Autor: Frederico García Lorca (1898-1936), poeta e escritor espanhol. Gênero: poema Verde que te quero rosa Verde como o céu azul, a esperança Branco como a cor da paz a se encontrar Rubro como o rosto fica Juntoà rosa mais querida É negra toda tristeza Se há despedida na avenida É negra toda tristeza desta vida (...) Verde que te quero rosa, é a Mangueira Rosa que te quero verde, é a Mangueira Autor: Cartola (1977) Gênero: Letra de música Enunciado 1: As Meninas Cahen d’Anvers – Rosa e Azul (1881) de Renoir . Enunciado 2: Versão criada por Maurício de Souza (1989). Enunciado 1: As meninas, de Diego Velázquez (1656). Enunciado 2: As meninas (segundo Velázquez), de Pablo Picasso (1957). Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 9 “Os autores se apropriam, por meio de colagens, paródias, citações, reestruturações, etc, de textos construídos em outras épocas ou em outros lugares. E assim constroem outros textos, e muitas vezes, outras significações... Identificar esses diálogos entre os textos e compreender como se estabelecem essas relações é fundamental para a (re)construção dos sentidos do texto” (Takasaki, 2007, p.89). Nas questões de concurso, procure perceber as relações entre os textos... Atividades 1. (ENEM) Quem não passou pela experiência de estar lendo um texto e defrontar-se com passagens já lidas em outros? Os textos conversam entre si em diálogo constante. Esse fenômeno tem a denominação de intertextualidade. Leia os seguintes textos: Texto 1 Quando nasci, um anjo torto Desses que vivem na sombra Disse “Vai Carlos! Ser “gauche” na vida ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia. Rio de Janeiro: Aguilar, 1964. Texto 2 Quando nasci veio um anjo safado O chato dum querubim E decretou que eu tava predestinado A ser errado assim Já de saída a minha estrada entortou Mas vou até o fim. BUARQUE, Chico. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. Texto 3 Quando nasci um anjo esbelto Desses que tocam trombeta, anunciou: Vai carregar bandeira. Carga muito pesada pra mulher Esta espécie ainda envergonhada. PRADO, Adélia. Bagagem. Rio de Janeiro, Guanabara, 1986. Adélia Prado e Chico Buarque estabelecem intertextualidade, em relação à Carlos Drummond de Andrade, por: a) reiteração de imagens. b) oposição de ideias. c) falta de criatividade. d) negação dos versos. e) ausência de recursos. 2. Leia o fragmento: Devo registrar aqui uma alegria. É que a moça num aflitivo domingo sem farofa teve uma inesperada felicidade que era inexplicável: no cais do porto viu um arco-íris. Experimentando o leve êxtase, ambicionou logo outro: queria ver, como uma vez em Maceió, espocarem mudos fogos de artifício. Ela quis mais porque é mesmo uma verdade que quando se dá a mão, essa gentinha quer todo o resto, o zé-povinho sonha com fome de tudo. E quer mas sem direito algum, pois não é? LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Considerando no contexto da obra o trecho sublinhado, é correto afirmar que, nele, o narrador: a) assume momentaneamente as convicções elitistas que, no entanto, procura ocultar no restante da narrativa. b) reproduz, em estilo indireto livre, os pensamentos da própria Macabéa diante dos fogos de artifício. c) hesita quanto ao modo correto de interpretar a reação de Macabéa frente ao espetáculo. d) adota uma atitude panfletária, criticando diretamente as injustiças sociais e cobrando sua superação. e) retoma uma frase feita, que expressa preconceito antipopular, desenvolvendo-a na direção da ironia. Com licença poética Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 10 Quando nasci um anjo esbelto, desses que tocam trombeta, anunciou: vai carregar bandeira. Cargo muito pesado pra mulher, esta espécie ainda envergonhada. Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir. Não sou tão feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e ora sim, ora não, creio em parto sem dor. Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina. Inauguro linhagens, fundo reinos - dor não é amargura. Minha tristeza não tem pedigree, já a minha vontade de alegria, sua raiz vai ao meu mil avô. Vai ser coxo na vida é maldição pra homem. Mulher é desdobrável. Eu sou. PRADO, Adélia. Poesia reunida. São Paulo: Siciliano, 1995, p.11. 3. Questão 03 Adélia Prado é considerada uma das mais importantes escritoras brasileiras contemporâneas. Sua poesia trata de temas que vão do mistério da criação poética à vida cotidiana, passando pela condição feminina. Leitora contumaz, ela estabelece uma série de diálogos com obras e autores de nossa literatura. Como podemos explicar o título do poema?iii 4. A tela de Tarsila do Amaral apresenta um tema que também se encontra nos versos transcritos em a) “Pensem nas meninas / Cegas inexatas / Pensem nas mulheres Rotas alteradas.” (Vinícius de Moraes) b) “Somos muitos severinos / iguais em tudo e na sina: / a de abrandar estas pedras/ suando-se muito em cima.” (João Cabral de Melo Neto) c) “O funcionário público não cabe no poema / com seu salário de fome / sua vida fechada em arquivos.” (Ferreira Gullar) d) “Não sou nada. / Nunca serei nada. / Não posso querer ser nada. /À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.” (Fernando Pessoa) e) “Os inocentes do Leblon / Não viram o navio entrar (...) / Os inocentes, definitivamente inocentes / tudo ignoravam, / mas a areia é quente, e há um óleo suave que eles passam pelas costas, e aquecem.” (Carlos Drummond de Andrade) Leia os textosiv: Texto I Iria morrer, quem sabe se naquela noite mesmo? E que tinha ele feito de sua vida? Nada. Levara toda ela atrás da miragem de estudar a pátria, por amá-la e querê-la muito, no intuito de contribuir para a sua felicidade e prosperidade. Gastava a sua mocidade nisso, a sua virilidade também; e, agora que estava na velhice, como ela o recompensava, como ela o premiava, como ela o condecorava? Matando-o . E o que não deixava de ver, de gozar, de fruir, na sua vida? Tudo. Não brincara, não pandegara, não amara _ todo esse lado da existência que parece fugir um pouco à sua tristeza necessária, ele não vira, ele não provara, ele não experimentara. (...) E, bem pensando, mesmo na sua pureza, o que vinha a ser a Pátria? Não teria levado a sua vida norteado por uma ilusão, por uma idéia a menos, sem base, sem apoio, por um Deus ou uma Deusa cujo império se esvaía? (Triste Fim de Policarpo Quaresma - Lima Barreto) Texto II Quando o português chegou Debaixo duma bruta chuva Vestiu o índio Que pena! Fosse uma manhã de sol Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 11 O índio tinha despido O português. (Poesias Reunidas - Oswald de Andrade) Texto III A cada canto um grande conselheiro, Que nos quer governar cabana e vinha; Não sabem governar sua cozinha, E podem governar o mundo inteiro. Em cada porta um bem freqüente olheiro, Que a vida do vizinho e da vizinha Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha, Para o levar à praça e ao terreiro. Muitos mulatos desavergonhados, Trazidos sob os pés os homens nobres, Posta nas palmas toda picardia, Estupendas usuras nos mercados, Todos os que não furtam muitos pobres: E eis aqui a cidade da Bahia. (Satírica, vol 1 - Gregório de Matos) 5. Considerando os textos lidos anteriormente, marque a análise errada: (A) Os textos II e III são próximos entre si, no que diz respeito à dominação estrangeira sobre a cultura local. (B) Também no texto I é possível entrever a presença de um dominador, mas diferenciado comparativamente aos outros dois textos (C) No texto II percebe-se uma expectativa quanto a uma forte reação indígena contra o invasor (D) Em que pese a atitude nacionalista nos três textos, apenas o autor do III faz alusão a um dos males do Brasil:a corrupção. (E) Tendo em vista a ordem cronológica dos aspectos históricos implícitos, a ordem dos textos é II, III e I. 6. Ainda sobre os textos lidos, aponte o erro: (A) O foco narrativo de 3ª pessoa e o fato de não ter o componente satírico são diferenciadores do texto I, relativamente aos outros dois (B) No texto II não se faz presente o artificialismo típico da linguagem poética (C) Dois quartetos e dois tercetos, em versos decassílabos, são componentes do soneto, como no texto III (D) A intertextualidade que aproxima e equaliza os três textos origina-se da abordagem cultural (E) Quanto aos períodos literários a que pertencem, os textos são, respectivamente, pré-moderno, moderno e barroco Confira o gabarito das questões: 1. A 2. E 3. “Duas expressões cristalizadas são evocadas no título, a saber, "com licença" e "licença poética". O jogo de palavras permite condensar uma série de aspectos presentes no poema. A expressão "com licença" evoca a idéia de pedido de permissão, associável no poema, entre outras coisas, à apropriação do texto de um outro poeta e à caracterização da condição ainda submissa da mulher. Já a expressão licença poética remete às liberdades especiais franqueadas pela linguagem poética, ao espaço aberto pela poesia para a transgressão e para o inusitado”. 4. B 5. C 6. D Curso Preparatório para Concurso de Promoção LC 1080/2008 Leitura e Interpretação de Textos 12 Referências Bibliográficas DISCINI, Norma. Comunicação nos textos. São Paulo: Contexto, 2005. KOCH, Ingedore; ELIAS, Vanda. Ler e compreender os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2006. KOCH, Ingedore; BENTES, Anna; CAVALCANTE, Mônica. Intertextualidade: diálogos possíveis. São Paulo, Cortez. KLEIMAN, A. MORAES, S. Leitura e interdisciplinaridade: tecendo redes nos projetos da escola. São Paulo: Mercado de Letras, 1999. TAKASAKI, Heloísa. Língua Portuguesa. São Paulo: IBEP, 2005. i Exemplos retirados de Koch, Bentes e Cavalcante (2007). ii O segundo texto encontra-se em Fortuna, O Pasquim: Antologia, Vol. 1 (1969-1971). Rio de Janeiro: Desiderata, 2006, p. 211. iii O comentário da questão foi retirado de: http://www.puc-rio.br/vestibular/repositorio/provas/2003-2/portugues- todos.html iv Questão retirada do site: http://www.enem.coc.com.br/simulado.asp
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