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Estratégia para o trabalho com a leitura

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Estratégia para o trabalho com a leitura 
Sandra Patrícia de Faria – UnB / SEEDF 
 
Segue a descrição do planejamento da aula desenvolvida no estágio a 
partir da qual se sistematizou o modelo proposto neste trabalho. Diante do 
sucesso alcançado pela atividade desenvolvida, a mesma aula foi 
readaptada e aplicada as quatorze turmas de crianças surdas da escola 
campo, sítio de desenvolvimento das aulas praticas dos professorandos-
surdos, no ano de 2004. 
 
Planejou-se uma aula para ser desenvolvida em quatro horas/aulas. Como 
se tratava de uma aula de leitura, o conteúdo trabalhado seria gerado a 
partir de um texto. O texto escolhido foi adaptado de uma musica de 
Toquinho Gente tem Sobrenome. Escolheu-se por habilidades a serem 
desenvolvidas pelos alunos surdos, o conhecimento de seu nome e 
sobrenome e o entendimento da diferença entre um e outro no registro de 
nascimento das pessoas. 
 
Antes de se trabalhar o texto foram discutidos os sinais a serem 
empregados no mesmo. Elegeu-se, ainda, o sinal para sobrenome que 
ficou entre NOME ÚLTlMO e NOME FAMíLIA TER - a maioria dos 
professorandos-surdos optou pela primeira forma, apesar de alguns 
considerarem que a segunda forma contempla melhor o conceito de 
sobrenome. Prevaleceu a opinião da maioria. Os substantivos concretos 
encontrados no texto foram agrupados em categorias e, posteriormente, 
cada um deles foi ilustrado: (a) Coisas: casa, janela, jardim; (b) Flores: 
violeta, margarida, rosa; (c) Brinquedos: bola, boneca, patins; (d) 
Alimentos: bolo, mingau, chocolate, doces; (e) Pessoas: apresentadores 
de programas de auditório, da TV Brasileira - Silvio Santos, Augusto 
Liberato, Fausto Silva e os alunos da turma que foram previamente 
fotografados - por máquina digital -, articulando seu sinal. As ilustrações 
selecionadas e as fotografias dos alunos impressas foram coladas, 
individualmente, em pequenos cartazes. 
 
Na introdução da aula, apresentou-se, então, a imagem de cada objeto do 
texto, sem que os alunos soubessem que teria alguma relação daquela 
atividade com um possível texto a ser apresentado em seguida. Após a 
apresentação de cada imagem, aproveitou-se a estratégia desenvolvida 
na contação de histórias e se abriu espaço também para o ''tempo de 
visualização da imagem". Perguntava-se o sinal e o nome dactilologizado 
de cada ilustração. Quando os alunos não sabiam o nome do objeto, 
apresentava-se uma ficha com o nome, por frações de segundos - de 
forma "relâmpago" - e se repetia a solicitação. Fixava-se cada figura, no 
quadro de giz, e, abaixo dela, ficha com seu respectivo nome. O mesmo 
se repetia com as fotografias dos apresentadores de TV e dos alunos. A 
ficha do nome das pessoas, porém, vinha acompanhada de sobrenome. 
Ao concluir a fixação das imagens, perguntava-se se o nome das pessoas 
é igual ao nome das coisas. Esclarecia-se que os pais podem escolher o 
nome para o bebê, mas não pode escolher o sobrenome, pois sobrenome 
é nome de família. Em seguida, os professorandos-surdos exemplificavam 
com seu próprio nome, destacando seu nome de seu sobrenome e 
identificando cada um deles. Ressaltava-se a importância da certidão de 
nascimento por ser um documento que identifica cada pessoa e registra-a 
na sociedade. Distribuía-se a certidão de nascimento de cada aluno e 
propunha-se, em seguida, a verificação desta informação na mesma: 
localização do nome do pai, da mãe e seu e dos respectivos sobrenomes 
e solicitava-se que marcassem o sobrenome do pai, da mãe e o seu, com 
caneta marcadora de texto. 
 
Propunha-se, aos alunos, a colagem da cópia da certidão de nascimento 
no caderno. O professorando-surdo contava toda a história do texto, em 
LIBRAS, sem acompanhar o texto escrito e sem anunciar que a proposta 
seguinte seria de leitura de texto cuja historia equivaleria a contada em 
língua de sinais. Perguntava-se: (a) Tudo tem nome? (b) Quais os nomes 
das flores? (c) Qual o sobrenome do seu pai e da sua mãe? (d) Vocês 
conhecem o sobrenome dos colegas? Distribuía-se o texto impresso 
"Gente tem sobrenome", para leitura individual, sob a orientação de que 
não se podia ler fazendo sinais. Era preciso ler o texto com os olhos, 
acompanhando, quando necessário, com régua ou com a ponta do dedo 
indicador. Após a leitura, pedia-se a cada aluno que circulasse no texto as 
palavras que representassem, em língua portuguesa, o sinal feito pelo 
professorando-surdo. Dividia-se o texto de cada aluno, em três partes; 
misturavam-se as partes e pedia-se a cada aluno para ordenar as partes 
do texto e colá-Ias no caderno. 
 
Ainda, com base no texto, cada aluno marcava o seu sobrenome e os 
sobrenomes dos colegas. O professor apresentava faixas com os nomes 
completos dos alunos e cada aluno buscava a sua. Ao receber a faixa 
com seu nome, cada um separava o seu nome do seu sobrenome e 
devolvia-a ao professorando-surdo. No centro da sala, misturava-se nome 
e sobrenome de todos os alunos. Cada aluno recolhia o seu nome e o seu 
sobrenome, encaixava-o e montava um painel com o auxilio do 
professorando-surdo. O painel era composto da foto de cada criançaa 
(apresentada no inicio da aula) e, abaixo, do nome completo de cada uma 
delas, 
 
Os recursos utilizados para a aula foram: cartolina: pincel atômico; cola; 
tesoura; papel pardo; régua: caneta marcadora de textos; texto adaptado 
com o nome dos alunos; fichas com os nomes completos dos alunos; 
cópia da certidão de nascimento de cada aluno; pequenas fichas, em 
cartolina, com figuras de revista representando objetos do texto; fichas 
com os nomes de todas as ilustrações a serem apresentadas na 
introdução da aula; fotografia dos alunos fazendo seu sinal e fotografia 
dos apresentadores de TV, presentes no texto. 
 
Sistematização do modelo 
Em síntese, da aula supracitada, extraiu-se a seguinte seqüência de 
trabalho que compõe o modelo que se apresenta como estratégia para 
uma educação surda, no desenvolvimento de atividades que envolvem a 
leitura: (a) apresentação de imagens relacionadas ao texto e trabalho do 
vocabulário em língua de sinais, língua portuguesa escrita e digitada com 
o alfabeto dactilológico da língua de sinais; (b) contação da história, em 
língua de sinais, equivalente ao texto a ser lido; (c) distribuição do texto 
para leitura com os olhos - sem sinais e sem oralidade -. Se for 
necessário, para evitar que o aluno sinalize o texto em bimodalismo, 
sugere-se passar o dedo no decorrer da leitura do mesmo, ou, ainda, 
lançar mão do auxílio de uma régua; (d) dialogo professor-aluno, em 
língua de sinais sobre a interpretação do texto; (e) atividades pontuais na 
interpretação do texto em língua portuguesa escrita, tais como, 
segmentação do texto em partes para ordenação do mesmo; marcas de 
blocos de sentido etc. 
 
Conseqüência do modelo 
Alguns podem questionar: como saber se o aluno esta lendo se não fará 
nenhum sinal para a representação da leitura do texto? Certamente que 
as atividades que precedem e sucedem a leitura propriamente dita serão 
cruciais ao alcance desse objetivo. Percebe-se pelo modelo, que a 
introdução da aula e mais longa, pois tem um papel definitivo na 
interpretação que o surdo dará ao texto, pois sem ela fica impossibilitado o 
input visual contextualizado. 
 
Trabalhar com modelos não é uma estratégia muito adequada, 
principalmente se o modele for tratado como um paradigma único a ser 
seguido. Entretanto, desde que se façam as adaptações necessárias, ele 
pode ser bastante útil a reflexão sobre o ensino. Ele tem sido 
experimentado repetidamente nas aulas da Profª NICE, professora da 
escola campo e que presenciou a aplicação da estratégia e vem 
utilizando-a como modelo para suas aulas de leitura. Ela argumenta que 
os alunos estão desenvolvendo bem a leitura. Apesar disso, a criatividade 
do professor não pode falhar, pois não se trata de um modelo fechado.E 
preciso ampliá-Io e adaptá-Io a cada novo tema, a cada nova aula. 
 
Com base nos resultados obtidos com a aplicação do modelo, acredita-se 
que ele propicia o desenvolvimento das capacidades cognitivas elencadas 
por Bloom et alii, (1973:55-165 apud Faulstich, 1985:26-9), e habilita o 
leitor a interpretar-entender textos: (1) compreensão; (2) analise; (3) 
síntese; (4) avaliação; (5) aplicação. Todas, capacidades cognitivas que 
devem ser desenvolvidas. Ele também auxilia na solução de problemas de 
leitura, pois corrobora estratégias como as propostas por Rubin,1975 
(apud Cavalcanti, 1989) como clarificação; (b) a associação - proposta 
por Cavalcanti (1989) e (c) inferência.

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