Buscar

Manual Direito Processual Civil Ação Recisória

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

62. AÇÃO RESCISÓRIA
Sumário: 62.1. Natureza jurídica – 62.2.
Conceito de rescindibilidade – 62.3. Objeto da
rescisão: 62.3.1. Decisão de mérito; 62.3.2.
Decisão que não é de mérito – 62.4. Hipóteses
de cabimento: 62.4.1. Prevaricação, concussão,
corrupção passiva do juiz; 62.4.2. Impedimento
do juiz e incompetência absoluta do juízo; 62.4.3.
Dolo ou coação da parte vencedora e simulação
ou colusão entre as partes para fraudar a lei;
62.4.4. Ofensa à coisa julgada; 62.4.5. Violação
manifesta de norma jurídica; 62.4.6. Prova
falsa; 62.4.7. Obtenção de documento novo;
62.4.8. Erro de fato – 62.5. fundamento para
invalidar sentença homologatória de mérito –
62.6. Legitimidade – 62.7. Competência – 62.8.
Prazo: 62.8.1. Prazo e termo inicial gerais;
62.8.2. Termos iniciais diferenciados – 62.9.
Ação rescisória e cumprimento executivo do
julgado – 62.10. Procedimento: 62.10.1. Petição
inicial; 62.10.2. Reações do juiz diante da petição
inicial; 62.10.3. Resposta do réu; 62.10.4.
Atividade saneadora; 62.10.5. Fase probatória;
62.10.6. Manifestações finais; 62.10.7.
Julgamento.
62.1. NATUREZA JURÍDICA
Como o próprio nome sugere, a ação rescisória tem natureza
jurídica de ação378, sendo uma espécie de sucedâneo recursal
externo, ou seja, meio de impugnação de decisão judicial que se
desenvolve em processo distinto daquele no qual a decisão
impugnada foi proferida, comumente chamada de ação autônoma
de impugnação. Enquanto o recurso é meio de impugnação cabível
durante o trâmite processual, a ação rescisória é remédio
processual cabível somente após o trânsito em julgado, fenômeno
processual que se verifica com o esgotamento dos recursos cabíveis
contra a decisão judicial ou a ausência de interposição do recurso
cabível. Além do trânsito em julgado, o art. 966, caput, do Novo
CPC exige que a decisão a ser impugnada por meio de ação
rescisória seja de mérito.
Diante da necessidade de a decisão impugnada resolver o
mérito da demanda (ao menos em regra, como se verá), é correta
a conclusão de que a ação rescisória é uma ação autônoma de
impugnação que busca desconstituir decisões judiciais que tenham
gerado coisa julgada material, daí ser considerada uma excepcional
hipótese, legalmente prevista, de “relativização da coisa julgada”,
como já analisado no Capítulo 25, item 25.10. No eterno conflito
entre dois essenciais valores de nosso sistema processual, o
legislador, ao prever, ainda que de forma excepcional, a ação
rescisória, dá uma derradeira chance à justiça em detrimento da
segurança jurídica. É possível tratar a ação rescisória como o
último suspiro de justiça do sistema processual pátrio.
62.2. CONCEITO DE RESCINDIBILIDADE
Não se deve confundir decisão rescindível com decisão nula.
Tampouco se admite tal confusão entre decisão rescindível e
decisão inexistente.
É natural que, para ser desconstituída por meio da ação
rescisória, a decisão deve existir juridicamente, uma vez que aquilo
que não existe não precisa ser desconstituído, bastando uma mera
declaração da inexistência jurídica. Dessa forma, sentença
proferida em processo juridicamente inexistente (p. ex., tramitado
perante órgão sem jurisdição), ou que tenha vício in procedendo
intrínseco que a torne juridicamente inexistente (p. ex., ausência de
dispositivo), não é objeto de ação rescisória379.
Por outro lado, todas as nulidades se convalidam com o trânsito
em julgado, de forma que não é correta a afirmação de que as
nulidades absolutas permitem o ingresso de ação rescisória. Aquilo
que antes do trânsito em julgado era considerado uma nulidade
absoluta, após esse momento procedimental pode tornar-se, por
vontade do legislador, um vício de rescindibilidade, sendo esse o
vício que legitima a ação rescisória380. Ademais, é importante
notar que mesmo as sentenças válidas poderão ser desconstituídas
pela ação rescisória, como ocorre, por exemplo, na hipótese de
rescisória com fundamento em documento novo.
O vício de rescindibilidade, portanto, não se confunde com a
inexistência jurídica nem com a nulidade absoluta, sendo o
resultado de uma opção de política legislativa em prever
determinadas situações aptas a afastar a segurança jurídica gerada
pela coisa julgada material.
62.3. OBJETO DA RESCISÃO
62.3.1. DECISÃO DE MÉRITO
Segundo prevê o art. 966, caput, do Novo CPC, a “decisão de
mérito” é passível de desconstituição por meio da ação rescisória.
Conforme a previsão expressa não só a sentença pode ser objeto de
rescisão, mas também a decisão interlocutória381, a decisão
monocrática do relator e o acórdão. Basta que seja de mérito e
tenha transitado em julgado.
A ação rescisória pode ser parcial, nos termos do § 3º do art.
966 do Novo CPC, ou seja, que não precisa necessariamente
impugnar todos os capítulos da decisão rescindenda, seguindo nesse
sentido jurisprudência já consolidada no Superior Tribunal de
Justiça.382 O legislador poderia, entretanto, ter sido mais cuidadoso
com a redação legal, considerando-se que o autor da rescisória
pode impugnar apenas um dos capítulos, como prevê o dispositivo
legal, bem como apenas alguns capítulos da decisão rescindenda.
Trata-se, como já afirmado, da possibilidade de impugnação
parcial da decisão rescindenda.
O art. 701, § 3º, do Novo CPC prevê o cabimento de ação
rescisória de decisão que expede o mandado monitório e que, diante
da ausência de embargos, constitui-se de pleno direito em título
executivo judicial. A norma entra no rol “do que abunda não
prejudica”, porque a única dúvida a respeito de tal decisão é ser ela
interlocutória ou uma sentença, conforme analisado no Capítulo 36,
itens 36.10 e 36.11. Como o art. 966, caput, Novo CPC prevê que a
decisão de mérito é rescindível, não era necessária a previsão
expressa de cabimento da ação rescisória na hipótese ora analisada.
Existem decisões de mérito que não são impugnáveis por meio
de ação rescisória em razão de expressa vedação legal:
(i) acórdão proferido em ação direta de inconstitucionalidade
(ADIN) ou em ação declaratória de constitucionalidade
(ADECON) (art. 26 da Lei 9.868/1999);
(ii) acórdão proferido em arguição de descumprimento de
preceito fundamental (ADPF) (art. 12 da Lei 9.882/1999); e
(iii) decisões proferidas nos Juizados Especiais (art. 59 da Lei
9.099/1995).
Existe majoritária corrente doutrinária que inadmite a ação
rescisória contra as decisões proferidas em processo cautelar, com
ressalva ao previsto no art. 310 do Novo CPC383 e em processos de
jurisdição voluntária384, afirmando que nesses casos a inexistência
de coisa julgada material afastaria o interesse de agir no ingresso da
ação rescisória.
62.3.2. DECISÃO Q UE NÃO É DE MÉRITO
O Novo Código de Processo Civil inova ao prever
expressamente o cabimento de ação rescisória contra duas decisões
que não julgam o mérito.
Nos termos do art. 966, § 2º, I, do Novo CPC, é cabível ação
rescisória contra decisão terminativa que impeça a repropositura da
ação. O dispositivo deve ser combinado com o art. 486, § 1º, do
Novo CPC, devidamente analisado no Capítulo 23, item 23.2.2.1.10,
que prevê que a repropositura da ação em determinadas hipóteses
de extinção terminativa do processo depende da correção do vício
que levou à sentença sem resolução de mérito.
Entendo que sempre que essa correção do vício
necessariamente envolver a modificação de um dos elementos da
ação não caberá sua repropositura, mas a propositura de uma nova
ação. Nesse caso, ainda que a sentença não seja de mérito, e por tal
razão não seja capaz de gerar coisa julgada material, ela se torna
imutável e indiscutível, sendo apenas nesse caso cabível a ação
rescisória após o trânsito em julgado.
Martina ingressa com ação judicial de cobrança contra Fernanda,
sendo o processo extinto sem resolução de mérito por ilegitimidade
de parte, afirmando o juízo sentenciante que se dívida existisse nem
em tese Fernanda
seria devedora, e sim seu marido, João. A única
forma que Martina tem para cobrar a dívida novamente em juízo é
corrigindo o vício apontado na sentença terminativa transitada em
julgado, mas se modificar o polo passivo da demanda, incluindo
João, estar-se-á diante de uma nova ação. Caso Martina entenda
que a sentença tem alguns dos vícios de rescindibilidade previstos no
art. 966 do Novo CPC poderá ingressar com ação rescisória, nos
termos do art. 966, § 2º, I, do Novo CPC.
O inciso II do § 2º do art. 966 do Novo CPC consagra o
cabimento de ação rescisória contra decisão terminativa que
impeça a admissibilidade do recurso correspondente. Na realidade
essa decisão não existe, porque a admissibilidade recursal será
sempre analisada, podendo ser positiva, quando o recurso será
admitido, ou negativa, quando o recurso será inadmitido. O que
pode não ocorrer, portanto, é a admissão, nunca a admissibilidade.
E o termo correspondente em nada contribui com a clareza do
dispositivo legal.
Ainda que com tais imprecisões redacionais, o dispositivo traz
importante novidade ao sistema processual: o cabimento de ação
rescisória contra decisão que inadmite recurso385. Registre-se que
no silêncio do CPC/1973 o Superior Tribunal de Justiça entendia pelo
não cabimento da ação rescisória com o fundamento de que essa
decisão não é de mérito386. Sob a égide do sistema revogado o
entendimento era compreensível, tirado da letra da lei, mas com a
novidade imposta pelo art. 966, § 2º, II, do Novo CPC, tal
entendimento resta superado.
Há divergência doutrinária a respeito do conteúdo da decisão
impugnada pelo recurso inadmitido. Para parcela da doutrina a
decisão deve ser necessariamente de mérito387, enquanto outra
parcela defende o cabimento de ação rescisória mesmo se a
decisão recorrida pelo recurso inadmitido não tiver decidido o
mérito388. Entendo preferível o segundo entendimento por duas
razões. Primeiro porque a condição de ser a decisão impugnada
pelo recurso inadmitido não está prevista em lei. Segundo porque a
ação rescisória nesse caso não guarda qualquer relação com a
decisão impugnada com o recurso inadmitido, servindo de
impugnação exclusiva da decisão de inadmissão do recurso.
Registre-se que essa hipótese de cabimento da ação rescisória
foi incluída na revisão final do texto do Novo Código de Processo
Civil antes de sua sanção presidencial. Como não houve destaque ou
outra questão constante do Parecer nº 1.099/2014, há doutrina que
aponta a norma como inconstitucional389.
Registre-se que a decisão, de mérito ou terminativa, para ser
objeto de ação rescisória, deve ter transitado em julgado porque,
havendo algum recurso ainda cabível contra tal decisão, não se
admite sua rescisão pela via excepcional da ação rescisória. Na
realidade, faltará interesse de agir – ausência de necessidade – na
ação rescisória ingressada nesse momento procedimental390. Não
é necessário que a parte esgote todos os recursos cabíveis para só
então ser cabível a ação rescisória, basta que no caso concreto o
recurso cabível não tenha sido devidamente interposto391. Uma
sentença pode ser apelada, mas, não o sendo, transitará em julgado
e, sendo de mérito, poderá ser desconstituída por meio de ação
rescisória.
62.4. HIPÓTESES DE CABIMENTO
O art. 966 do Novo CPC prevê em seus oito incisos os vícios de
rescindibilidade, sendo considerado restritivo esse rol, de forma a
não admitir rescisória fundada em qualquer outro vício que não
esteja expressamente previsto em tal dispositivo legal.
62.4.1. PREVARICAÇÃO, CONCUSSÃO, CORRUPÇÃO
PASSIVA DO JUIZ
O art. 966, I, do Novo CPC prevê três crimes que podem ser
cometidos pelo juiz na condução e solução do processo. A
prevaricação está prevista no art. 319 do CP, a concussão, no art.
316 do CP, e a corrupção passiva, no art. 317 do CP. Na superada
redação do Código de Processo Civil de 1939 mencionava-se “juiz
peitado”, em sentido amplo, técnica superada pela atual redação
que indica especificamente as infrações penais que, cometidas pelo
juiz, ensejam a propositura de ação rescisória.
Apesar dos atos ilícitos previstos no dispositivo legal, não se
exige prévia condenação penal ou mesmo a preexistência de
processo criminal a respeito da conduta do juiz392. Significa dizer
que o reconhecimento do crime pode ser feito originariamente, e de
forma incidental, no juízo cível competente para o julgamento da
ação rescisória393. Apesar de não ser necessária a solução prévia
no âmbito penal, havendo sentença penal transitada em julgado, é
importante analisar o conteúdo da decisão e seu reflexo na esfera
cível. Havendo sentença penal condenatória, haverá vinculação
obrigatória do juízo cível, de forma que numa eventual ação
rescisória o fundamento da decisão será necessariamente a
existência do crime. Havendo sentença de absolvição com
fundamento na inexistência material do fato, haverá vinculação do
juízo cível, mas, sendo a absolvição amparada em outro motivo (p.
ex. ausência de provas; prescrição), a decisão penal não vincula o
juízo cível394.
Na hipótese de concomitância entre ação penal e ação
rescisória, é cabível a suspensão da ação rescisória prevista no art.
315 do Novo CPC, cabendo ao juízo cível uma análise da
oportunidade e conveniência dessa suspensão395.
Por fim, tratando-se de decisão colegiada (acórdão), nem
sempre a existência de um juiz que pratique um dos crimes
previstos no art. 966, I, do Novo CPC permite o ingresso da ação
rescisória, sendo necessário que o voto dado por esse juiz tenha
concorrido para unanimidade ou para a maioria396. Na questão da
votação unânime, considera-se a possível influência do juiz
criminoso nos votos proferidos pelos outros integrantes do órgão
colegiado. Só não será cabível a ação rescisória na hipótese de o
juiz criminoso proferir voto minoritário, superado pelos votos dos
outros membros do colegiado que não estejam envolvidos na
prática do crime.
62.4.2. IMPEDIMENTO DO JUIZ E INCOMPETÊNCIA
ABSOLUTA DO JUÍZO
A imparcialidade do juiz é considerada essencial para a
adequada prestação da tutela jurisdicional, sendo que as causas de
parcialidade são dividas pela lei em duas classes:
(a) causas de suspeição (art. 145 do Novo CPC); e
(b) causas de impedimento (art. 144 do Novo CPC).
Ainda que não seja desejável contar com juiz parcial, há uma
preocupação maior com o impedimento do juiz, presumindo-se que
nesse caso exista um vício de maior gravidade. Dessa forma, a
suspeição do juiz não enseja ação rescisória, limitada às causas de
impedimento. Registre-se ser dispensável a alegação de
impedimento durante a tramitação do processo originário397. Na
hipótese de julgamento colegiado, o Superior Tribunal de Justiça já
teve a oportunidade de decidir que não há nulidade se o voto do juiz
impedido não foi decisivo para o resultado final398.
No tocante à incompetência, já se asseverou que a doutrina
majoritária entende que somente a competência absoluta do juízo é
pressuposto processual de validade do processo, de forma que a
rescindibilidade está limitada a essa espécie de vício. Como as
regras de competência absoluta tutelam interesse público, sua
violação gera vício suficiente para ensejar a propositura de ação
rescisória. Registre-se que uma sentença proferida por juízo
absolutamente incompetente, sendo substituída por acórdão
proferido em apelação julgada por Tribunal competente, não
enseja a propositura de ação rescisória399.
Marina ingressa com ação de usucapião que
tramita perante uma vara comum da Justiça
Estadual. Proferida sentença, a parte
sucumbente ingressa com o recurso de
apelação, que é julgado pelo Tribunal de Justiça.
Não obstante ser a vara comum absolutamente
incompetente para a ação de usucapião, de
competência da vara de registros públicos
(naturalmente nas comarcas em que existe essa
vara especializada), o Tribunal de Justiça
é
competente para essa espécie de ação. Tendo
sido substituída a sentença pelo acórdão, não é
cabível a ação rescisória.
A ação rescisória é admissível ainda que o impedimento do juiz
ou a incompetência absoluta do juízo tenham sido arguidas e
resolvidas no processo originário400.
62.4.3. DOLO OU COAÇÃO DA PARTE VENCEDORA E
SIMULAÇÃO OU COLUSÃO ENTRE AS PARTES PARA
FRAUDAR A LEI
Como se nota da mera leitura do art. 966, III, do Novo CPC, o
legislador reúne no mesmo dispositivo legal duas hipóteses de
cabimento nitidamente distintas, o que exige um enfrentamento
individualizado.
O dolo ou coação da parte vencedora (também pode ser do
representante legal ou advogado) diz respeito à ofensa aos princípios
da lealdade e da boa-fé processual, mas só enseja ação rescisória
quando o dolo ou coação impedir ou dificultar a atuação processual
do adversário ou, ainda, quando influenciar significativamente o
juiz, a ponto de afastá-lo da verdade401. É exigido, portanto, um
nexo de causalidade entre o dolo e a coação da parte e o resultado
da demanda, limitando-se o cabimento da ação rescisória somente
aos casos nos quais a postura de má-fé da parte tenha sido
determinante para o resultado do processo402.
A colusão entre as partes está prevista no art. 142 do Novo
CPC, parecendo que tanto a realização de processo simulado como
o processo com objetivo de alcançar algo proibido por lei sejam
alcançados pelo dispositivo legal403. Como se pode notar, adota-se
o entendimento majoritário na doutrina pelo cabimento da ação
rescisória no caso de processo simulado, o que restou
definitivamente consagrado no dispositivo ora analisado. Nesse
caso, mesmo de ofício, cabe ao tribunal, ao julgar procedente a
ação rescisória, condenar as partes nas penalidades da litigância de
má-fé, nos termos do art. 142, do Novo CPC.
Diferente do dolo e da coação, na colusão e na simulação
sempre existirá um acordo prévio entre as partes com o objetivo de
fraudar a lei, de forma que dificilmente a ação rescisória será
proposta por alguma delas, sendo o mais comum a propositura se
dar por terceiro prejudicado ou pelo Ministério Público como fiscal
da ordem jurídica.
62.4.4. OFENSA À COISA JULGADA
Como devidamente analisado no Capítulo 25, item 25.4.,
verifica-se o efeito negativo da coisa julgada quando esta é
entendida como pressuposto processual negativo, ensejando a
extinção da demanda sem resolução de mérito (art. 485, V, do Novo
CPC), na qual se verifica tal fenômeno processual. Para a geração
do efeito negativo, como já visto, exige-se a tríplice identidade. Não
sendo gerado o efeito negativo e verificando-se duas decisões
transitadas em julgado em demandas idênticas, a decisão que
transitou mais recentemente pode ser desconstituída por meio de
ação rescisória. A desconstituição independe do teor da segunda
decisão, que pode ser conforme ou discordante da primeira404.
Também haverá ofensa à coisa julgada quando o efeito
positivo da coisa julgada não é respeitado. Conforme analisado no
Capítulo 25, item 25.5., havendo solução de relação jurídica
protegida por coisa julgada material, cria-se uma vinculação em
outras demandas nas quais a mesma relação jurídica venha a ser
discutida incidentalmente. Nesse caso, a decisão que se busca
rescindir será proferida em demanda diversa daquela que gerou a
coisa julgada material ofendida, o que em nada modifica o direito
da parte em vê-la desconstituída por meio da ação rescisória.
Ressalte-se o cabimento da ação rescisória nesse caso ainda
que o tema da coisa julgada tenha sido devidamente debatido e
decidido no processo originário. O fato de o juízo que proferiu a
decisão que ofenda a coisa julgada tê-lo feito ciente da existência
de outra demanda que impediria o julgamento não afasta o
cabimento da ação rescisória405.
Não é correto julgamento do Superior Tribunal de Justiça que
admitiu a alegação de violação à coisa julgada em sede de exceção
de pré-executividade, com o fundamento de que a sentença que
viola a coisa julgada é juridicamente inexistente, porque faltaria ao
autor do processo em que ela foi proferida o interesse de agir e a
carência de ação conduziria à própria inexistência jurídica do
processo406. Esse julgamento parte da falsa premissa de que a
carência de ação leva à inexistência jurídica do processo e torna
letra morta o art. 966, IV, do Novo CPC.
62.4.5. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA
Pode-se entender que a hipótese de cabimento da ação
rescisória prevista pelo art. 966, V, do Novo CPC tem como
fundamento o erro crasso do juízo na aplicação do direito no caso
concreto, considerando-se que a decisão que violar manifestamente
norma jurídica deva ser desconstituída. O termo normas é
abrangente, mas o Superior Tribunal de Justiça não admite a ação
rescisória por ofensa à súmula407:
(a) de direito material e processual;
(b) constitucionais e infraconstitucionais; e
(c) nacionais e estrangeiras.
Entendo que a amplitude desse entendimento inclui até mesmo
os princípios não escritos408, entendimento corroborado pela
redação do dispositivo se comparada com a redação revogada do
art. 485, V, do CPC/1973. Enquanto a norma revogada mencionava
violação à “lei” a nova norma prevê violação à “norma jurídica”,
reconhecendo que a lei não é a única fonte do Direito que pode ser
violada para ensejar ação rescisória. Apesar da correta lição no
sentido de que decisão proferida contra jurisprudência ou súmula
não pode ser objeto de rescisão, tratando-se de súmula vinculante
do Supremo Tribunal Federal, caberá ação rescisória409.
Não é qualquer violação da lei que admite o ingresso da ação
rescisória, entendendo a melhor doutrina e a jurisprudência que a
literal violação exige que no momento de aplicação da norma por
meio da decisão judicial não exista interpretação controvertida nos
tribunais. Há inclusive súmula nesse sentido410. Significa dizer que,
se havia polêmica à época da prolação da decisão, ainda que à
época da ação rescisória o entendimento tenha se pacificado em
torno da tese defendida pelo autor dessa ação, não será possível a
desconstituição411. Note-se que a divergência deve ser real, ou
seja, que efetivamente haja quantidade significativa de decisões
fundadas em diferentes interpretações.
Esse entendimento, entretanto, não é absoluto, havendo posição
jurisprudencial em sentido contrário na hipótese de declaração de
inconstitucionalidade de lei. Nesse caso, mesmo que à época da
prolação da decisão houvesse divergência interpretativa a respeito
da constitucionalidade, admite-se o ingresso de ação rescisória se
posteriormente a lei que fundamentou a decisão foi declarada
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal412. Em recente
decisão da Corte Constitucional, foi decidido, sob o regime dos
recursos repetitivos, que, havendo no Supremo Tribunal Federal
mudança posterior de entendimento anteriormente consagrado, não
cabe ação rescisória para afastar o antigo entendimento e fazer
valer o posterior413.
A Lei 13.256, de 04.02.2016, responsável pela alteração do
Novo Código de Processo Civil em seu período de vacância,
acrescentou ao art. 966 do Novo CPC dois novos parágrafos. No § 5º
vem previsto que cabe ação rescisória, nos termos do inciso V do
art. 966 do Novo CPC, contra decisão baseada em enunciado de
súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos
que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão
discutida no processo e o padrão decisória que lhe deu fundamento.
Trata-se, na verdade, de uma contrapartida por outra
modificação da mesma lei, que passou a inadmitir agravo para os
tribunais de superposição nas hipóteses de inadmissão de recursos
especial e extraordinário com fundamento em súmulas e
precedentes com eficácia vinculante (art. 1.030, § 2º, do Novo
CPC). A contrapartida é insuficiente por ao menos três razões.
Primeiro porque a ação rescisória nesse caso será de competência
do tribunal de segundo grau, ou seja, a parte continua a não ter
acesso imediato por meio dessa ação aos tribunais superiores, o que
ocorrerá somente em grau recursal. Segundo porque chegar ao
tribunal por meio de recurso em ação rescisória é infinitamente
mais complexo do que fazê-lo por meio de um recurso de agravo.
Terceiro porque a decisão que despreza a distinção no caso concreto
pode ser terminativa, não sendo cabível nesse caso ação rescisória
porque o § 5º do art. 966 do Novo CPC está condicionado pelos
limites traçados pelo caput de referido dispositivo legal.
Como o § 5º do art. 966 do Novo CPC não faz qualquer
distinção, a decisão rescindível pode ser uma sentença transitada
em julgado, um acórdão irrecorrido proferido em segundo grau,
um acordão proferido em segundo grau recorrido por recurso
especial ou extraordinário inadmitidos ou mesmo um acórdão de
agravo interno interposto contra essa inadmissão nos termos do art.
1.030, § 2º, do Novo CPC. Nessa última hipótese entendo inclusive
que havendo decisão terminativa do agravo interno seja cabível a
ação rescisória, não contra essa decisão do agravo interno, mas
contra a decisão impugnada pelo agravo interno.
O § 6º do art. 966 do Novo CPC supostamente cria um ônus
específico ao autor da ação rescisória quando seu fundamento legal
for o inciso V combinado com o § 5º do mesmo dispositivo legal.
Cabe ao autor, “sob pena” de inépcia da petição inicial, demonstrar,
fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por
hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor
outra situação jurídica.
Entendo que a exigência é desnecessária, revelando-se em
excesso de zelo do legislador, conclusão que pode ser explicada por
um simples raciocínio lógico. A causa de pedir na hipótese de ação
rescisória ora analisada é a distinção entre o precedente ou súmula
aplicada no caso concreto e o processo julgado, de forma que sem
a demonstração dessa distinção não haverá causa de pedir, o que,
por si só, é causa de inépcia da petição inicial nos termos do art.
330, § 1º, I, do Novo CPC.
62.4.6. PROVA FALSA
A ação rescisória com fundamento no art. 966, VI, do Novo
CPC, conforme a própria previsão legal, não depende de prévio
processo criminal para a apuração da falsidade da prova,
admitindo-se que a prova dessa falsidade seja produzida na própria
ação rescisória414. É natural que a eventual existência de processo
criminal poderá gerar efeitos no campo cível, mais
especificamente à ação rescisória. Estando ambas as demandas em
trâmite, poderá o juiz da ação rescisória se valer do art. 315 do
Novo CPC e determinar a suspensão da ação rescisória até o
encerramento do processo criminal. Havendo decisão transitada em
julgado no processo criminal, aplicam-se as mesmas conclusões já
apontadas para a hipótese de ação rescisória em razão de juiz
praticante dos crimes de prevaricação, concussão ou corrupção
passiva (art. 966, I, do Novo CPC). Interessante notar que, mesmo
havendo condenação na esfera penal, a ação rescisória pode ser
julgada improcedente, porque, apesar da vinculação do juízo cível à
decisão penal transitada em julgado, ainda caberá a análise da
prova ser fundamento único ou indispensável à sustentação da
decisão impugnada.
É pacífico na doutrina o entendimento de que a decisão só será
rescindível pelo art. 966, VI, do Novo CPC, na hipótese de a prova
falsa ser o fundamento principal da decisão, de forma que, havendo
outros fundamentos aptos a manter a decisão, apesar da existência
de uma prova falsa, não caberá a ação rescisória415. A razão é
óbvia, porque, havendo outros fundamentos aptos à manutenção da
decisão, a eventual procedência da ação rescisória será inútil, não
tendo condições concretas de desconstituir a decisão impugnada.
O debate a respeito da falsidade documental – que pode ser
material ou ideológica416 – durante o processo originário, e mesmo
a existência de decisão incidental sobre o tema em tal processo, não
impede a propositura da ação rescisória. Por outro lado, tendo
pedido pela parte que a decisão sobre a falsidade documental seja
decidida como questão principal, nos termos do art. 430, parágrafo
único, do Novo CPC, a decisão estará protegida pela coisa julgada
material, devendo necessariamente ser respeitada pelo juízo da
ação rescisória (efeito positivo da coisa julgada)417.
O fundamento para invalidar a confissão era vício de
rescindibilidade expressamente previsto no art. 485, VIII, do
CPC/1973, mas não está elencado no rol do art. 966 do Novo CPC.
Se interpretarmos a confissão como espécie de ato de disposição de
direito processual, tal vício pode ser incluído no § 4.º do artigo ora
analisado, sendo a via impugnativa adequada a ação anulatória.
Parece ser nesse sentido o art. 393, caput, do Novo CPC ao prever
que a confissão pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de
coação.
Sob a égide do CPC/1973, a forma procedimental para
impugnar confissão viciada vinha expressamente consagrada nos
incisos do art. 352, a depender do trânsito em julgado: antes, ação
anulatória; depois, ação rescisória. No Novo Código de Processo
Civil, aparentemente, será sempre cabível a ação anulatória, numa
simplificação que promete gerar sérias complicações na praxe
forense.
Tendo transitado em julgado uma decisão de mérito em
processo com fundamento em confissão, não parece viável
imaginar-se que uma ação anulatória tenha condições de rescindir a
decisão e afastar a coisa julgada material. Ainda que essa realidade
tenha sido consagrada pelo Novo CPC (art. 966, § 4.º) para as
sentenças homologatórias transitadas em julgado, no caso em
análise ter-se-á uma sentença genuína de mérito, por meio da qual
o juiz acolherá ou rejeitará o pedido do autor em aplicação do
direito material ao caso concreto.
Nesse caso, portanto, ainda que todos os indicativos legais
presentes no Novo Código de Processo Civil apontem para o
cabimento da ação anulatória, essa terá condições apenas de anular
a confissão, nunca de rescindir a decisão transitada em julgado no
processo em que tal meio de prova foi produzido. E o que é pior,
como não está mais previsto o cabimento de ação rescisória com
fundamento em confissão viciada, a parte não poderia mais
rescindir o julgado.
Afirmo que a parte aparentemente não poderia porque, para
resolver o impasse gerado pelo equívoco do legislador, cabe ao
intérprete incluir a hipótese ora analisada no inciso VI do art. 966 do
Novo CPC. Ainda que seja evidente a diferença entre confissão
viciada e prova falsa, o esforço hermenêutico é indispensável para
que, mesmo sem previsão como aquela presente nos incisos do art.
352 do CPC/1973, a regra continue a ser respeitada e aplicada na
praxe forense. Corroboram o entendimento julgados do Superior
Tribunal de Justiça que alargam o conceito de prova falsa para o
laudo pericial incorreto, incompleto ou inadequado418.
62.4.7. OBTENÇÃO DE DOCUMENTO NOVO
O art. 966, VII, do Novo CPC trata da obtenção de prova nova
cuja existência era ignorada pelo autor da ação rescisória – autor ou
réu da ação originária – ou de que não pode fazer uso por motivo
estranho à sua vontade.
No art. 485, VII, do CPC/1973, o cabimento de ação rescisória
estava condicionado à obtenção de documento novo, entendendo-se
que o documento novo não se confunde com documento produzido
posteriormente, de forma que o documento já deve existir no
momento em que a decisão que se busca desconstituir tiver sido
proferida. Como lembra a melhor doutrina, documento que não era
conhecido ou de que não se pode fazer uso é necessariamente
documento que já existia419.
A ampliação dessa hipótese de cabimento da ação rescisória
passa a contornar a ginástica hermenêutica feita pelo Superior
Tribunal de Justiça para admitir a ação rescisória com fundamento
em exame
de DNA realizado após o trânsito em julgado nas ações
de investigação de paternidade julgadas improcedentes420. É
natural que nesse caso não será um documento novo que
fundamentará a ação rescisória, mas sim uma prova pericial, o que
passa a ser plenamente admissível diante da redação do art. 966,
VII, do Novo CPC.
Numa interpretação mais restritiva do termo “prova nova”
pode-se defender que o legislador passou a admitir como
fundamento de ação rescisória, além da prova documental,
também a prova documentada, ou seja, a prova pericial ou oral
materializada em um documento (laudo pericial e termo de
audiência). Nesse caso a prova a fundamentar a ação rescisória
necessariamente já deve ter como amparo material um
documento, que será juntado à petição inicial, não havendo dilação
probatória na ação rescisória.
Por outro lado, pode-se entender que o termo “prova nova”
permite a ação rescisória com base em prova pericial e
testemunhal a ser produzida na própria ação. Nesse caso, não tendo
que ser a “prova nova” pré-constituída, aparentemente o legislador
teria criado uma espécie sui generis de coisa julgada secundum
eventum probationis sui generis por duas razões: (i) a nova prova
poderia modificar resultado de procedência ou de improcedência
do pedido; (ii) essa modificação da decisão fundada em prova nova
não seria realizada na ação reproposta, mas por meio de ação
rescisória.
Sendo qualquer espécie de prova nova apta a fundamentar
uma ação rescisória, e não mais apenas a prova documental, deve
ser analisado como adequar a exigência de prova já existente no
momento da prolação da decisão rescindenda quanto a prova
pericial e oral.
No tocante à prova pericial parece adequado o entendimento
de que ela só pode ser utilizada como fundamento de ação
rescisória diante da impossibilidade, alheia à vontade da parte, de
sua produção durante o processo. Ou seja, apesar de possível, não
foi produzida por motivo estranho à vontade da parte. Registre-se
que esse entendimento contraria julgamento do Superior Tribunal
de Justiça que não admitiu ação rescisória fundada em exame de
DNA como o fundamento de ser tal exame tecnicamente viável na
referida ação421.
Mantendo-se o mesmo critério para a prova oral, jamais será
cabível ação rescisória com fundamento em depoimento pessoal,
ainda que não realizado no processo de origem, porque essa espécie
de prova é sempre materialmente possível de ser produzida. Quanto
à prova testemunhal, entendo que caberá ao autor da ação
rescisória a comprovação de que não tinha conhecimento, e nem
tinha como ter, da existência da testemunha, razão pela qual a prova
não foi produzida no processo de origem.
O art. 966, VII, do Novo CPC, prevê que para a prova ser nova
ela deve ser obtida pelo autor depois do trânsito em julgado da
decisão que se busca rescindir. Há alteração da redação do
revogado art. 485, VII, do CPC/1973, que indica a obtenção após a
prolação da sentença para qualificar a prova como nova. Os dois
dispositivos são criticáveis, porque, conforme ensina a melhor
doutrina, o momento adequado para qualificar uma prova como
nova é o último momento em que seria lícita a produção da prova
nova no processo originário422.
O art. 966, VII, do Novo CPC, deve ser lido como momento
posterior à última oportunidade de utilizar a prova no processo
originário, porque numa demanda em que a sentença tenha sido
recorrida por apelação e comprovandose que antes de seu
julgamento a parte tomou conhecimento da existência do
documento ou passou a poder utilizá-lo, não o juntando aos autos,
perderá o direito à ação rescisória. O mesmo se diga quanto à prova
oral e pericial, considerando-se possível nesse momento o tribunal
converter o julgamento em diligência para a produção de tais meios
de prova.
Por outro lado, caso tais eventos ocorram em sede de recurso
especial ou extraordinário, não se admitirá a juntada de documento
ou a produção de prova oral ou pericial, considerando-se a
limitação às matérias de direito do efeito devolutivo desses recursos.
Nesse caso, caberá ação rescisória, em curiosa situação na qual a
parte aguarda sua derrota para depois desconstituí-la. Aplicando-se
o dispositivo ora comentado em sua literalidade ter-se-ia um limbo
temporal: durante o trâmite dos recursos excepcionais não se pode
produzir prova nova, mas também não será possível ação rescisória
após o trânsito em julgado.
Para o cabimento da ação rescisória, a prova nova deve ter a
aptidão de, por si só, assegurar um resultado positivo ao autor da
ação rescisória, porque de nada vale a desconstituição da decisão se
a prova nova não tiver força suficiente de convencimento para que
uma eventual nova decisão a ser proferida seja em sentido
contrário ao julgamento rescindido423, ainda que disso não resulte
uma decisão totalmente favorável ao autor da ação rescisória,
bastando que melhore sua situação anterior424.
Não se confunde prova nova com fato novo, ou ainda fato que
somente após o trânsito em julgado passa a ser conhecido pela
parte. Significa dizer que a prova nova que fundamenta a ação
rescisória deve se referir a um fato que tenha sido alegado na ação
originária425. Sendo o fato não alegado um fato simples, a coisa
julgada não poderá ser afastada com a sua alegação em razão da
eficácia preclusiva da coisa julgada; sendo um fato jurídico, a parte
poderá ingressar com nova demanda, já que nesse caso não haverá
mais a tríplice identidade (a causa de pedir é diferente).
62.4.8. ERRO DE FATO
Dispõe o art. 966, § 1.º, do Novo CPC que se verifica erro de
fato quando a decisão rescindenda admite um fato inexistente ou
quando considera um fato inexistente efetivamente ocorrido. Essa
equivocada percepção a respeito de um fato enseja ação rescisória,
registrando-se que o mero equívoco a respeito da qualificação
jurídica de um fato não está abrangido pelo art. 966, VIII do Novo
CPC.
Para que seja admitida a ação rescisória com fundamento no
dispositivo legal ora analisado, é necessário o preenchimento de
quatro requisitos426:
(a) O erro de fato deve ser fundamento essencial da sentença, ou
seja, não fosse o erro de fato, a decisão teria sido em outro
sentido427;
(b) A apuração do equívoco factual deve ser realizada com as
provas produzidas no processo originário, de forma que a
produção de prova na própria ação rescisória nesse caso é
proibida428;
(c) o fato não pode representar ponto controvertido (questão) no
processo originário, ou porque as partes não alegaram e
caberia ao juiz conhecê-los de ofício, ou porque houve
confissão de uma parte ou ainda porque a parte contrária se
absteve de impugnar a alegação de fato429;
(d) Inexistência de pronunciamento judicial a respeito do fato,
entendendo-se que a má apreciação de prova não gera ação
rescisória430.
62.5. FUNDAMENTO PARA INVALIDAR SENTENÇA
HOMOLOGATÓRIA DE MÉRITO
A forma de desconstituição de decisão de mérito
homologatória de renúncia, transação e reconhecimento jurídico do
pedido transitada em julgado era extremamente polêmica sob a
égide do CPC/1973 em razão de aparente duplicidade do tema nos
arts. 485, VIII, e 486 do diploma processual revogado.
Para parcela da doutrina seria cabível a ação anulatória nos
casos de vícios no negócio jurídico homologado, ainda que existisse
sentença de mérito homologatória transitada em julgado; enquanto
a ação rescisória seria utilizada nos casos de vício na própria
sentença homologatória, e não no negócio jurídico homologado431.
Outra corrente doutrinária entendia que a sentença que acolhia ou
rejeitava o pedido com fundamento em renúncia, transação ou
reconhecimento do pedido seria rescindível (art. 485, VIII, do
CPC/1973), mas a sentença que apenas homologasse o ato da parte
ou das partes seria anulável (art. 486 do CPC/1973)432. E uma
terceira corrente doutrinária defendia que o meio de impugnação
adequado dependia do trânsito em julgado da decisão judicial:
havendo o trânsito em julgado, seria cabível a ação rescisória; não
havendo, caberia a ação anulatória, em aplicação por analogia do
art. 352 do CPC/1973433.
O Novo Código de Processo Civil resolveu esse impasse ao
passar a prever expressamente no § 4° do art. 966 que os atos de
disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros
participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os
atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos
à anulação, nos termos da lei. A previsão legal se coaduna com a
jurisprudência majoritária do Superior Tribunal de Justiça a respeito
do tema434.
62.6. LEGITIMIDADE
A legitimação ativa na ação rescisória é determinada pelo art.
967 do Novo CPC:
(a) parte no processo ou seu sucessor a título universal ou
singular;
(b) terceiro juridicamente interessado; e
(c) Ministério Público.
É possível que exista no caso concreto mais de um legitimado
ativo, sendo possível a formação de um litisconsórcio, sempre
facultativo. Apesar de autorizada doutrina afirmar que o
litisconsórcio nesse caso é unitário435, entendo que a lição se aplica
somente para o pedido realizado para julgamento no juízo
rescindendo, porque uma eventual manutenção ou desconstituição
da decisão atingirá todos os litisconsortes indistintamente. Já na
hipótese do juízo rescisório, é possível imaginar que no novo
julgamento o resultado possa ser diferente para os litisconsortes
ativos.
As partes que participam do processo originário têm
legitimidade ativa para propor a ação rescisória, incluídos autor, réu
e terceiros intervenientes, inclusive o assistente. Pouco importa
como se deu a participação desses sujeitos no processo originário,
de forma que o réu revel, mesmo não tendo efetivamente
participado do processo436, tem legitimidade para a ação
rescisória, bem como terceiros intervenientes que tenham se
mantido inertes durante o trâmite processual.
A sucessão inter vivos ou causa mortis torna os herdeiros ou
sucessores legitimados à propositura da ação rescisória. A sucessão
pode ter decorrido antes ou depois do encerramento do processo
originário, desde que não tenha havido naquele processo a sucessão
processual, porque nesse caso os herdeiros ou sucessores terão sido
partes no processo originário, o que já garantirá sua legitimidade
ativa para a propositura da ação rescisória. Interessante
peculiaridade fica por conta da previsão do art. 393, parágrafo
único, do Novo CPC: na ação rescisória com fundamento em
confissão viciada por erro, dolo ou coação, somente o confitente
tem legitimidade para propor a ação rescisória, ficando aos seus
herdeiros a legitimidade de continuar a ação rescisória já iniciada
pelo confitente. Os herdeiros, portanto, só têm legitimidade ativa
superveniente.
O terceiro juridicamente prejudicado é aquele sujeito que
mantém com uma ou ambas as partes da demanda uma relação
jurídica que tenha sido afetada com a decisão que se busca
rescindir. Poderia ter sido litisconsorte facultativo ou assistente no
processo originário, o que lhe garantiria a legitimidade como parte,
mas por não ter participado continua a ser terceiro. Sendo
juridicamente afetado, tem legitimidade para a propositura da ação
rescisória437.
Também o Ministério Público tem legitimidade ativa na ação
rescisória. É natural que o art. 967, III, do Novo CPC, ao tratar
especificamente da legitimidade do Ministério Público, o faz voltado
para as hipóteses em que não houve sua participação no processo
originário, porque nesse caso tem legitimidade como parte, o que
tornaria o dispositivo legal inútil. São duas as hipóteses de
legitimidade do Ministério Público nessas circunstâncias:
(a) quando não tenha sido ouvido como fiscal da lei em processo
no qual sua participação era obrigatória; e
(b) quando a decisão resultar de colusão ou simulação das partes
a fim de fraudar a lei438.
Registre-se posição doutrinária que entende que o Ministério
Público, quando participa do processo originário como fiscal da lei,
é parte no processo, mas não é parte na demanda, de forma que só
passa a ter legitimidade para a ação rescisória na hipótese de
colusão ou de simulação entre as partes (art. 966, III, do Novo
CPC)439. Não é esse, entretanto, o entendimento da jurisprudência,
que entende serem meramente exemplificativas as alíneas “a” e
“b” do art. 487, III, do CPC/1973, admitindo o ingresso de ação
rescisória pelo Ministério Público sempre que existir interesse
público440, tendo sido esse entendimento consagrado pela alínea
“c” do dispositivo ora comentado ao prever a legitimidade ativa do
Ministério Público em outros casos em que se imponha sua atuação.
O inciso IV do art. 967 do Novo CPC inova ao prever a
legitimidade ativa para a ação rescisória daquele que não foi ouvido
no processo em que lhe era obrigatória a intervenção, previsão sem
correspondência no CPC/1973. Não resta dúvida de que a
legitimidade nesse caso é de um terceiro que deveria ter participado
do processo – ou ao menos ter sido ouvido – e que não o integrou.
Para parcela da doutrina, trata-se de entes distintos do
Ministério Público que deveriam ter sido intimados a se manifestar
e isso não ocorreu, como é o caso da Comissão de Valores
Mobiliários, cuja intervenção é obrigatória nos processos em que se
discutam matéria de sua competência (art. 31, Lei 6.385/1976), e do
Conselho Administrativo de Defesa Econômica, cuja intervenção é
obrigatória nos processos em que se discuta matéria de sua
competência (art. 118 da Lei 12.529/2011)441.
Tenho dificuldade de chegar à mesma conclusão diante do
texto legal. Se é verdade que o inciso IV do art. 967 do Novo CPC
fala em não ter sido ouvido, dando a entender que não houve
oportunidade para tanto, o dispositivo legal é claro em prever a
obrigatoriedade da intervenção.
Os arts. 31 da Lei 6.385/1976 e 118 da Lei 12.529/2011 não
preveem intervenção obrigatória da Comissão de Valores
Mobiliários e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica,
respectivamente. Os dois dispositivos preveem uma obrigatória
intimação, mas deixam aos referidos entes a opção de participar ou
não do processo. O art. 31 da Lei 6.385/1976 é mais obscuro, porque
prevê que a Comissão de Valores Imobiliários será intimada para,
querendo, oferecer parecer ou prestar esclarecimentos. Já o art.
118 da Lei 12.259/2011 não deixa margem para dúvida ao prever
que o CADE deverá ser intimado para, querendo, intervir no feito
na qualidade de assistente.
Como se pode notar, em nenhuma das duas hipóteses a
intervenção do ente é obrigatória, já que sua mera intimação não é
capaz de integrá-lo ao processo, o que só pode ser realizado por
meio de citação ou voluntariamente. Até imagino que o legislador
tenha tentado contemplar essas hipóteses quanto à legitimidade para
a ação rescisória, mas com a redação dada ao art. 967, IV, do Novo
CPC tal conclusão fica prejudicada.
Acredito que, não ocorrendo a intimação que a lei prevê como
obrigatória, estar-se-á diante de um vício que acarreta nulidade
absoluta até o trânsito em julgado e depois se transforma em vício
de rescindibilidade. Entendo que nesse caso o ente que deveria ter
sido intimado e não foi tenha legitimidade para o ingresso da ação
rescisória, mas numa interpretação mais flexível de terceiro
prejudicado.
Por outro lado, e sem entrar na discussão sobre a forma
processual adequada para o litisconsorte necessário que não
participou do processo atacar a decisão transitada em julgado –
ação rescisória ou querela nullitatis –, entendo que o dispositivo
também não tenha sido criado para ele. Trata-se indubitavelmente
de terceiro prejudicado e assim sempre teve legitimidade ativa para
a ação rescisória442.
Conclusivamente, o legislador parece ter pretendido ampliar a
legitimidade ativa da ação rescisória, mas criou
dispositivo inócuo e
incapaz de atingir tal objetivo.
Ainda que inexista previsão expressa no tocante à legitimidade
passiva na ação rescisória, a doutrina e jurisprudência entendem
que devem ser réus dessa demanda todos os sujeitos que figuravam
como parte no processo originário e não estejam propondo a ação
rescisória. Na hipótese de desconstituição total da decisão, haverá
litisconsórcio passivo necessário, considerando-se que a eventual
desconstituição da decisão impugnada afetará todos os sujeitos que
participaram como parte no processo originário443. Dessa regra
decorre interessante fenômeno: os sujeitos que participaram do
processo originário no mesmo polo da demanda poderão figurar em
polos opostos na ação rescisória. Visando a ação rescisória a
somente um capítulo da decisão que não afete todos os sujeitos
processuais (por exemplo, rescisão do capítulo que decidiu a
denunciação da lide), não será necessário que todos os sujeitos do
processo originário façam parte da ação rescisória444.
Formado litisconsórcio passivo na ação rescisória, no tocante
ao pedido rescindendo será unitário, não se admitindo que se opere
a rescisão da decisão para alguns litisconsortes e a sua manutenção
para outros. Já no tocante ao pedido rescisório o litisconsórcio é
simples, porque no novo julgamento – do pedido inicial do autor da
ação originária – o resultado poderá ser diferente para os
litisconsortes, desde que, naturalmente, o litisconsórcio da ação
originária tenha sido simples. Tendo sido unitário o litisconsórcio
passivo formado na ação originária, naturalmente que também
relativamente ao pedido rescisório será caso de litisconsórcio da
mesma natureza445.
Nos termos do art. 967, parágrafo único, do Novo CPC, nas
hipóteses do art. 178 (hipóteses gerais de intervenção no processo
civil), o Ministério Público será intimado para intervir como fiscal
da ordem jurídica quando não for parte.
62.7. COMPETÊNCIA
A ação rescisória é uma ação de competência originária de
tribunal, sendo que a determinação de qual o tribunal competente
dependerá dos eventuais recursos interpostos no processo originário
e da espécie de julgamento de tais recursos. Não havendo apelação
contra a sentença, a competência será do tribunal de segundo grau
competente para o julgamento desse recurso que no caso concreto
não existiu. Também não traz nenhuma complicação a competência
na hipótese de o processo originário acabar com o julgamento da
apelação; nesse caso, o próprio tribunal que julgou a apelação será
competente para desconstituir o seu julgamento.
A hipótese mais polêmica diz respeito aos processos nos quais
há interposição de recurso especial e/ou extraordinário. A regra é de
que a competência para a ação rescisória só será dos tribunais
superiores no caso de esses recursos terem sido julgados em seu
mérito, de forma que, não sendo admitidos (não
recebimento/conhecimento), a competência será do tribunal de
segundo grau, ainda que faticamente o processo tenha chegado até
os tribunais superiores446.
Merece destaque o entendimento consagrado na Súmula 249
do STF, que aponta para a competência do Supremo Tribunal
Federal na hipótese de não conhecimento do recurso extraordinário,
desde que tenha sido no caso concreto apreciada a questão
constitucional, hipótese frequente no caso de não conhecimento em
razão de ausência de ofensa à norma constitucional (art. 102, III, a,
da CF). A mesma regra é aplicada pelo Superior Tribunal de Justiça
na hipótese de recurso especial não conhecido com a matéria
federal apreciada447, o que ocorre em regra no caso de ausência
de ofensa à norma federal (art. 105, III, a, da CF). Trata-se da
indevida confusão entre juízo de admissibilidade e juízo de mérito
no julgamento dos recursos excepcionais, devidamente analisada no
Capítulo 77, item 77.2.
A competência da ação rescisória difere da competência da
querela nullitatis, sendo entendimento consolidado no Superior
Tribunal de Justiça que enquanto naquela a competência é
originária de tribunal, nessa a competência é do próprio juízo que
proferiu a decisão atacada448.
Seguindo a tradição do CPC/1973, o Novo Código de Processo
Civil não versa sobre a competência para o julgamento da ação
rescisória, mas traz importante novidade quanto ao tema da
incompetência. Atualmente, a incompetência absoluta do tribunal
leva à extinção terminativa da ação rescisória, não havendo
remessa da ação de um tribunal para outro449. Contra essa conduta,
o art. 968, § 6.º, do Novo CPC prevê expressamente a remessa dos
autos ao tribunal competente. Imaginando que a mudança de
tribunal possa exigir uma adequação da petição inicial, o § 5.º do
mesmo dispositivo prevê que, sendo reconhecida a incompetência
do tribunal para julgar a ação rescisória, o autor será intimado para
emendar a petição inicial, a fim de adequar o objeto da ação
rescisória, quando a decisão apontada como rescindenda não tiver
apreciado o mérito e não se enquadrar na situação prevista no § 2.º
do art. 966 do Novo CPC (I) e quando tiver sido substituída por
decisão posterior (II).
Nos termos do art. 968, § 6.º, do Novo CPC, depois de
emendada a petição inicial, ao réu será permitida a
complementação dos fundamentos de sua defesa, para só então
ocorrer a remessa dos autos para o tribunal competente. A regra
naturalmente não será aplicável quando a incompetência for
reconhecida de ofício liminarmente, o que leva à conclusão de que,
excepcionalmente, será admitida a emenda da petição após a
citação e apresentação de contestação do réu. Por outro lado, a
complementação da defesa estará limitada ao objeto das mudanças
realizadas na petição inicial em respeito ao princípio da causalidade.
Cabe uma observação quanto à competência adotando-se o
entendimento de que só deve existir uma ação rescisória por
processo. Imagine-se a hipótese de uma parcela do mérito ser
decidida e a decisão transitar em julgado no primeiro grau,
enquanto a outra parcela do mérito é julgada em último grau
recursal pelo Superior Tribunal de Justiça.
Nesse caso, se o vício de rescindibilidade estiver presente no
julgamento parcial a competência para a ação rescisória será do
tribunal de segundo grau, enquanto que estando o vício presente no
julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça a
competência será desse tribunal superior. Pergunto: e caso a parte
pretenda alegar vício das duas decisões? Nesse caso, mesmo para
os que defendem a existência de uma só ação rescisória por
processo parece inviável sustentar esse entendimento: mesmo que
com mesmo termo inicial, serão cabíveis duas ações rescisórias em
razão dos diferentes órgãos competentes para o julgamento de cada
vício de rescindibilidade alegado pelo autor.
62.8. PRAZO
62.8.1. PRAZO E TERMO INICIAL GERAIS
Segundo prevê o art. 975 do Novo CPC, o prazo para a
propositura de ação rescisória é de dois anos, contados do trânsito
em julgado da última decisão proferida no processo. Em razão da
expressa previsão legal é irrelevante a data em que a parte tomou
conhecimento dos fatos que possibilitariam a propositura da ação
rescisória, valendo sempre, para qualquer situação e para qualquer
legitimado, inclusive o terceiro juridicamente prejudicado, o termo
inicial do trânsito em julgado. Segundo entendimento do Superior
Tribunal de Justiça, o trânsito em julgado conta-se da última decisão
proferida no processo, ainda que tal decisão seja de inadmissão de
recurso450. O entendimento encontra-se atualmente sumulado451.
No caso de intempestividade do recurso, somente em situação de
extrema excepcionalidade, na qual a intempestividade é flagrante e
se presume a má-fé do autor em reabrir o prazo para o ingresso da
ação rescisória, o termo inicial não será a última decisão proferida
no processo452.
Registre-se que, para o Superior Tribunal de Justiça,
participando do processo a Fazenda Pública,
o trânsito em julgado,
e, portanto, o termo inicial da contagem de prazo para o ingresso de
ação rescisória, somente ocorre após o esgotamento do prazo em
dobro que esta tem para recorrer, ainda que o ente público tenha
sido vencedor na última decisão proferida na demanda453.
Existe tese doutrinária que defende o entendimento de coisa
julgada material parcial na hipótese de recurso parcial, entendendo
que a parcela da decisão não recorrida transita em julgado e, sendo
de mérito, produz imediatamente coisa julgada material. Nesse
entendimento, o termo inicial da ação rescisória não é a última
decisão proferida no processo, mas o momento em que a parcela
da decisão não foi objeto de recurso454. O posicionamento,
entretanto, não convenceu o Superior Tribunal de Justiça, que não
admite a tese de coisa julgada parcial, reafirmando o entendimento
de que somente após a última decisão proferida no processo passa a
ser contado o prazo da ação rescisória455. Há, por outro lado,
entendimento do Supremo Tribunal Federal que admite a tese e
aponta para diferentes termos iniciais para a propositura da ação
rescisória, a depender do momento do trânsito em julgado do
capítulo não impugnado da decisão456.
Para parcela da doutrina, o art. 975, caput, do Novo CPC, teria
consagrado o entendimento sumulado no Superior Tribunal de
Justiça no sentido de haver apenas um termo inicial para a ação
rescisória: a última decisão proferida no processo. Por esse
entendimento, mesmo havendo a coisa julgada material parcial,
fenômeno inegavelmente possível diante do julgamento antecipado
parcial do mérito previsto no art. 356 do Novo CPC, o termo inicial
da contagem do prazo de dois anos para a ação rescisória será a
última decisão proferida no processo457.
Diante de tal entendimento será cabível apenas uma ação
rescisória por processo, independentemente do trânsito em julgado
parcial, com o que se evitaria o tumulto processual decorrente de
inúmeras coisas julgadas em um mesmo feito458, com a
consequente pluralidade de ações rescisórias.
Não parece correto esse entendimento diante do que
efetivamente encontra-se previsto no dispositivo ora comentado. O
art. 975, caput, do Novo CPC não prevê o termo inicial da ação
rescisória, mas tão somente seu termo final: “o direito à rescisão se
extingue em dois anos contados do trânsito em julgado da última
decisão proferida no processo”. Significa dizer que, constando o
trânsito em julgado de capítulo de decisão de mérito a parte poderá
imediatamente ingressar com ação rescisória, tendo como termo
final do exercício desse direito o prazo de dois anos da última
decisão proferida no processo459.
Esse entendimento, entretanto, não elimina um sério
inconveniente: a possibilidade de propositura de ação rescisória
muito tempo depois que o mérito tenha sido julgado
definitivamente. Como é notório, os processos em trâmite perante a
Justiça Brasileira em geral não atendem ao princípio constitucional
da duração razoável do processo. Imagine uma hipótese, em nada
improvável, que uma decisão interlocutória de mérito tenha
resolvido parcela do pedido e que, em razão de sucessivos recursos
contra a parcela de mérito decidida, a última decisão a ser
proferida nesse processo ocorra somente 10 anos depois. Significa
que a parte terá um prazo de 12 anos para rescindir a decisão
parcial de mérito... Não é preciso muito esforço para se notar que,
nesse caso, estar-se-á diante de grave violação à segurança
jurídica.
Para contornar esse indesejável inconveniente – registre-se,
também presente no entendimento de que o prazo só tem início após
a última decisão proferida no processo – é possível se imaginar uma
interpretação mais criativa do dispositivo legal ora comentado. A
última decisão proferida no processo não seria exatamente a
“última decisão proferida no processo”, mas sim a última decisão
proferida a respeito do capítulo não impugnado ou da decisão
interlocutória de mérito proferida nos processos. Nessa
interpretação o termo inicial seria o trânsito em julgado de tal
capítulo ou decisão. Não tenho dúvida de que o resultado desse
entendimento seria o mais adequado, mas aparentemente contaria
tanto a previsão legal como seu espírito. A atividade hermenêutica,
afinal, precisa ter limites.
É tranquilo o entendimento de que no prazo de dois anos a parte
não perde o direito à ação rescisória, mas o próprio direito material
de desconstituir a decisão, de forma que o prazo de dois anos tem
natureza decadencial. Não poderia ser outra solução, considerando-
se que ação rescisória tem natureza constitutiva e versa sobre direito
potestativo460. Como se sabe, sendo de decadência, o prazo não se
interrompe nem se suspende, sendo entendimento pacífico do
Superior Tribunal de Justiça que vencido em data na qual não há
expediente forense caberá à parte interessada ingressar com a ação
rescisória no primeiro dia útil subsequente461, em entendimento
consagrado pelo art. 975, § 1º, do Novo CPC.
Segundo entendimento pacificado no Superior Tribunal de
Justiça, o prazo decadencial de dois anos só se considerará
interrompido quando a relação jurídica processual estiver completa,
de forma que a formação de litisconsórcio necessário ulterior só
será admitida antes do vencimento do prazo462. Caso o prazo de
dois anos transcorra sem tal formação, caberá a extinção da ação
por decadência, nos termos do art. 487, II, do Novo CPC.
Registre-se, por fim, que o prazo de dois anos não flui em
desfavor de incapazes, nos termos do art. 208 do Código Civil463.
Nesse caso, o termo inicial do prazo de dois anos é a perda da
condição de incapaz.
62.8.2. TERMOS INICIAIS DIFERENCIADOS
Conforme já analisado, o prazo para a ação rescisória é de dois
anos e o termo inicial desse prazo é a última decisão proferida no
processo. Há, entretanto, situações especiais em que o termo inicial
se afasta da regra geral consagrada no caput do art. 975 do Novo
CPC.
Quando fundada na hipótese prevista no inciso VII do art. 966,
o termo inicial do prazo será a data de descoberta da prova nova,
observado o prazo máximo de cinco anos, contado do trânsito em
julgado da última decisão proferida no processo (art. 975, § 2.º).
Nessa hipótese o prazo continua a ser tecnicamente de dois anos,
mas com a modificação do termo inicial de sua contagem na
prática a parte passa a ter até cinco anos da prolação da última
decisão no processo para a propositura da ação rescisória.
O dispositivo é interessante porque é injusto se contar um prazo
quando o fundamento da ação rescisória é desconhecido pela parte.
Por outro lado, o legislador entendeu que não poderia deixar aberto
eternamente o cabimento da ação rescisória nesse caso. Numa
ponderação entre a justiça e a segurança jurídica chegou-se à
técnica consagrada no § 2º do art. 975 do Novo CPC.
Sendo o fundamento da ação rescisória a simulação ou a
colusão das partes, o prazo começa a contar para o terceiro
prejudicado e para o Ministério Público, que não interveio no
processo, a partir do momento em que têm ciência da simulação ou
da colusão (art. 975, § 3.º, do Novo CPC). Novamente o prazo
continua a ser de dois anos, mas com a fluidez do termo inicial, na
prática, a ação rescisória poderá ser proposta muito além do prazo
de dois anos da última decisão proferida no processo.
Nesse caso específico o legislador não põe limite temporal,
considerando que a proteção da lei e/ou do terceiro prejudicado
poderá ocorrer a qualquer tempo, desde que dentro do prazo de dois
anos da ciência da simulação ou colusão entre as partes. Assim, é
admissível a ação rescisória mesmo depois de transcorridos vários
anos da última decisão proferida no processo.
Há também um termo inicial para o prazo da rescisória
consagrado nos arts. 525, § 15, e 535, § 8º, do Novo CPC. Sendo a
ação rescisória fundada em inconstitucionalidade da norma que
fundamentou
a decisão rescindenda, o termo inicial do prazo de dois
anos da rescisória será a decisão proferida pelo Supremo Tribunal
Federal declarando tal inconstitucionalidade. Novamente tem-se um
termo inicial fluido, que dependerá da data da decisão da Corte
Constitucional. É mais um caso de admissão de ação rescisória
mesmo depois de transcorridos vários anos da última decisão
proferida no processo.
62.9. AÇÃO RESCISÓRIA E CUMPRIMENTO EXECUTIVO
DO JULGADO
O art. 969 do Novo CPC prevê que a propositura da ação
rescisória em regra não impede o cumprimento da decisão que se
busca rescindir, mas que é admissível que no caso concreto o autor
da ação rescisória obtenha tutela provisória para impedir o início ou
suspender o andamento do cumprimento de sentença.
Quanto à tutela de urgência, esse atípico impedimento ou
suspensão do cumprimento de sentença sempre foi admitido pela
melhor doutrina, existindo alguma divergência a respeito de qual a
tutela de urgência adequada para tal desiderato. Para alguns, o ideal
seria o pedido de medida cautelar464, enquanto outros, com razão,
entendiam pelo cabimento de tutela antecipada na própria ação
rescisória465. A divergência não foi solucionada pelo art. 969 do
Novo CPC ao prever genericamente a tutela provisória, sem optar
pela mais adequada, que naturalmente é a tutela antecipada. De
qualquer forma, com a previsão de tutela provisória, parece que o
legislador optou pela maior abrangência possível no tocante à tutela
do autor da ação rescisória, sendo atualmente cabível o pedido por
meio de qualquer uma das duas tutelas de urgência e também da
tutela da evidência.
No caso de pedido incidental de tutela provisória o autor poderá
elaborá-lo na própria petição inicial da ação rescisória, sempre que
cabível, já que há tutela de evidência que não pode ser concedida
liminarmente (art. 311, parágrafo único, do Novo CPC), ou por
meio de mera petição após a propositura da ação. Também será
admissível o pedido antecedente, seja a pretensão provisória
fundada em tutela de urgência ou da evidência, conforme
devidamente analisado no Capítulo 12, item 12.2.2.
Registre-se o entendimento de que o pedido de suspensão do
cumprimento de sentença também pode ser feito no primeiro grau
de jurisdição, diante do juízo que conduz o cumprimento de
sentença. Apesar de reconhecer que o meio mais adequado é o
pedido de tutela provisória perante o tribunal competente para a
ação rescisória, essa corrente doutrinária entende que em aplicação
do poder geral de cautela do juiz, o pedido de concessão de tutela de
urgência no primeiro grau é cabível466. Por analogia deve ser o
mesmo entendimento aplicado na tutela da evidência. Deve se
lamentar a opção do legislador em manter a previsão no sentido de
que a tutela provisória impede o cumprimento de sentença.
Na realidade, nem toda decisão rescindenda gera
cumprimento de sentença, como ocorre com as decisões
meramente declaratórias – salvo aquelas que declaram a
exigibilidade de uma obrigação, com as decisões constitutivas e até
mesmo com as decisões de improcedência. Nesses casos, apesar de
não existir cumprimento de sentença no caso concreto, não se deve
destacar a aplicação do art. 969 do Novo CPC, que terá como
função impedir a geração de efeitos da decisão rescindenda. Nesse
sentido teria andado melhor o legislador se tivesse previsto a
possibilidade de a tutela provisória impedir a geração de efeitos da
decisão rescindenda, que como analisado não será sempre um
efeito executivo (cumprimento de sentença).
62.10. PROCEDIMENTO
62.10.1. PETIÇÃO INICIAL
Tendo natureza jurídica de ação, vigora na ação rescisória o
princípio da inércia da jurisdição, exigindo-se a provocação de um
dos legitimados pelo art. 967 do Novo CPC. Essa provocação inicial
dar-se-á por meio de uma petição inicial, nos termos dos arts. 319 e
320 do Novo CPC. Apesar de a petição inicial ser tema do Capítulo
15, existem algumas particularidades na petição inicial da ação
rescisória que merecem breves comentários.
O art. 319, I, do Novo CPC prevê o endereçamento da petição
inicial, sendo certo que no caso da ação rescisória o endereçamento
sempre apontará um tribunal, conforme já analisado no Capítulo 15,
item 15.2.1. Eventual equívoco quanto ao endereçamento, que
criará no caso concreto um vício de incompetência absoluta, não
enseja a extinção do processo, o que poderia no caso concreto ser
extremamente danoso à parte em razão do prazo decadencial de
dois anos para a propositura da ação rescisória. Dessa forma,
reconhecida a incompetência absoluta – o que deve ser feito de
ofício pelo órgão jurisdicional –, o processo deverá ser remetido ao
tribunal competente467, nos termos do art. 968, § 5º, do Novo CPC.
No tocante ao pedido é preciso recordar que a regra na ação
rescisória é a existência de dois juízos:
(a) juízo rescindendo (iudicium rescindens), que é o pedido de
rescisão do julgado impugnado; e
(b) juízo rescisório (iudicium rescissorium), que é o pedido de
novo julgamento.
Sempre que for necessária a cumulação de pedidos –
cumulação sucessiva, na qual o segundo pedido só será analisado se
o primeiro for acolhido –, é indispensável que ambos os pedidos
sejam feitos expressamente, não se admitindo pedido implícito de
novo julgamento. A exigência consta do art. 968, I, do Novo CPC. O
princípio da instrumentalidade das formas exige do juízo a
determinação de emenda da petição inicial no caso de ausência de
pedido de novo julgamento nesses casos468, mas é inegável que um
juízo mais formalista possa vir a indeferir liminarmente a petição
inicial.
As exceções à necessidade de cumulação de pedidos ficam
por conta da ação rescisória fundada no art. 966, II, do Novo CPC,
sempre que o órgão que desconstituir a decisão o fizer exatamente
porque reconheça sua incompetência absoluta para proferir o
julgamento impugnado (não teria nenhum sentido desconstituir o
julgamento e proferir novo julgamento com o mesmo vício), e da
ação rescisória fundada no art. 966, IV, do Novo CPC, já que,
afastada a decisão que contraria a coisa julgada, nenhuma outra
terá que ser proferida, mantendo-se a decisão originariamente
afrontada pela decisão desconstituída. Nesses casos não haverá
cumulação de pedidos, limitando-se a pretensão do autor ao pedido
de rescisão do julgado (juízo rescindendo)469.
No tocante ao valor da causa, entendo que se deva analisar no
caso concreto o valor econômico do bem da vida perseguido pelo
autor da ação rescisória, não existindo uma vinculação necessária
entre o valor da causa do processo originário e o da ação
rescisória470. Atualmente esse é o entendimento prestigiado no
Superior Tribunal de Justiça471, que corretamente se afastou do
entendimento de que o valor da causa da rescisória seria sempre o
valor da causa da ação originária devidamente atualizado472. A
dissociação ora defendida entre valor da causa da ação rescisória e
da ação originária fica ainda mais evidente quando a ação
rescisória não se voltar à impugnação da totalidade da decisão,
objetivando a desconstituição de apenas alguns capítulos do ato
decisório473.
Segundo o art. 968, II, do Novo CPC, caberá ao autor realizar
um depósito no valor de 5% do valor da causa, valor esse que se
converterá em multa e será revertido à parte contrária na hipótese
de decisão unânime de inadmissão da ação rescisória ou de
improcedência do pedido. O objetivo do dispositivo legal é evitar o
abuso na utilização da ação rescisória, servindo como um
desestímulo àqueles que não têm razões fundadas para a demanda,
ainda que para parcela minoritária da doutrina trate-se de requisito
inconstitucional por restringir injustificadamente o direito de acesso
ao processo474.
Como o dispositivo legal aponta para a exigência de decisão
unânime, entende-se que, sendo a decisão monocrática proferida
pelo relator, não caberá a aplicação
da multa ao autor com a perda
do valor depositado, o mesmo ocorrendo na hipótese de decisão
colegiada se ao menos um juiz decidir em favor do autor da ação
rescisória. Compreende-se que nesses casos – em especial no
segundo – não é adequado se presumir que houve um abuso no
manejo da ação rescisória, o que isentaria o autor do pagamento da
multa.
O art. 968, § 2º, do Novo CPC cria um valor máximo de mil
salários mínimos para a caução prévia, o que se justifica para que a
exigência legal não se torne proibitiva da propositura da ação
rescisória.
Há previsão expressa no § 1º do art. 968 do Novo CPC de
dispensa do recolhimento do depósito prévio à União, Estado,
Distrito Federal, Município, às suas respectivas autarquias e
fundações de direito público, ao Ministério Público, à Defensoria
Pública e àqueles que tenham obtido o benefício da gratuidade da
justiça475.
O art. 320 do Novo CPC exige que os documentos
indispensáveis à propositura da demanda sejam juntados com a
petição inicial. Na ação rescisória existem ao menos duas peças do
processo originário que necessariamente deverão instruir a petição
inicial por meio de cópias. São considerados documentos
indispensáveis à propositura da ação rescisória: (a) cópia da decisão
que se busca rescindir, até mesmo porque sem essa peça não seria
possível ao tribunal analisar a causa de rescindibilidade; e (b) a
cópia da certidão do trânsito em julgado476, para que o tribunal
possa verificar que o momento é adequado para a propositura da
ação rescisória, tanto no tocante ao termo inicial como ao termo
final.
62.10.2. REAÇÕES DO JUIZ DIANTE DA PETIÇÃO INICIAL
Como ocorre com qualquer petição inicial, também a que dá
início à ação rescisória pode ser indeferida, prevendo o art. 968, §
3º, do Novo CPC que o indeferimento ocorre nas hipóteses do art.
330 do Novo CPC e quando não for realizado o depósito prévio
previsto em lei. A previsão é excessivamente formalista, porque a
ausência do depósito prévio é vício sanável, devendo ser
determinada a emenda da petição inicial, e não o seu
indeferimento. É natural que, não realizada a emenda, será caso de
indeferimento, nos termos do art. 330, IV, do Novo CPC.
O indeferimento pode ocorrer por decisão monocrática do
relator, em aplicação subsidiária do art. 932, III, IV e V, do Novo
CPC, hipótese em que caberá ao autor a propositura de agravo
interno no prazo de 15 dias477. Sendo a decisão colegiada, caberá
no máximo – a depender do caso concreto – recurso especial e/ou
extraordinário. Por questão de agilidade procedimental a decisão
que indefere ou determina a emenda da petição inicial pode ser
proferida pelo relator, embora não exista ilegalidade na prolação de
tal decisão pelo órgão colegiado478.
O § 4.º do art. 968 do Novo CPC prevê expressamente a
aplicação do julgamento liminar de improcedência com
fundamento no art. 332 do Novo CPC, ou seja, pelas mesmas razões
que qualquer ação tem tal espécie de julgamento.
A citação não tem qualquer especialidade, seguindo as regras
comuns, sendo inclusive possível a realização pela via eletrônica,
valendo-se o tribunal do endereço constante no processo originário.
62.10.3. RESPOSTA DO RÉU
O prazo de resposta será determinado pelo juiz no caso
concreto entre 15 e 30 dias (art. 970 do Novo CPC). Há decisão do
Superior Tribunal de Justiça indicando a aplicabilidade do art. 188
do CPC/1973, de forma que o prazo seja contado em quádruplo
para a Fazenda Pública responder à petição inicial479, ainda que se
trate de prazo judicial e não legal, já que fixado no caso concreto
pelo juízo. Não há razão para acreditar que ocorra diferente com o
art. 180 do Novo CPC, que prevê o prazo em dobro para a Fazenda
Pública falar em geral nos autos. Tal posicionamento permite a
conclusão de que também o art. 229 do Novo CPC seja aplicável,
sendo contado em dobro o prazo de resposta fixado pelo juízo no
caso de litisconsórcio passivo com pluralidade de patronos de
diferentes sociedades de advogados480.
Das espécies de respostas previstas pelo art. 970 do Novo CPC,
não resta qualquer dúvida a respeito do cabimento da contestação,
típica resposta defensiva, não sendo cabível nesse caso a alegação
de incompetência relativa, considerando-se que qualquer vício de
competência será de incompetência absoluta. Nessa contestação
será admissível a reconvenção, desde que se respeite o prazo
decadencial de dois anos e que o réu realize o depósito prévio de 5%
do valor da causa previsto pelo art. 968, II, do Novo CPC481.
Também se admite a impugnação ao valor da causa e a
impugnação à concessão dos benefícios da assistência judiciária
caso essa tenha sido concedida liminarmente. Por fim, são cabíveis
as exceções de impedimento e suspeição, nos termos da lei
processual.
A ausência de defesa por meio da contestação torna o réu
revel, considerando-se a revelia uma situação de fato gerada pela
ausência jurídica de contestação. A doutrina e jurisprudência,
entretanto, em razão da especialidade procedimental da ação
rescisória, entendem que não há geração do principal efeito da
revelia, que é a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo
autor482.
62.10.4. ATIVIDADE SANEADORA
A segunda parte do art. 970 do Novo CPC determina que após o
prazo de resposta, com ou sem contestação, observar-se-á o
procedimento comum, ou seja, “providências preliminares” e
“julgamento conforme o estado do processo”. A utilização da
advertência de que a aplicação das normas previstas para o
procedimento comum deve ocorrer no que couber é importante em
razão das particularidades procedimentais da ação rescisória.
A audiência de conciliação e de mediação não tem lugar na
ação rescisória, considerando-se que a desconstituição de decisão
de mérito transitada em julgado não pode ser objeto de transação.
Diferente ocorre com a audiência de saneamento prevista no art.
357, § 3º, do Novo CPC, que poderá ocorrer normalmente.
Também não se admite a presunção de veracidade dos fatos
gerada pela revelia do réu, o que afasta a possibilidade de
julgamento antecipado do mérito com fundamento no art. 355, II,
do Novo CPC. Nem mesmo todas as extinções previstas nos arts.
485 e 487 do Novo CPC são admissíveis na ação rescisória, sendo
incabível a extinção em razão de convenção de arbitragem (as
partes não podem optar por desconstituir a coisa julgada material
por arbitragem) e por reconhecimento jurídico do pedido (a
disposição do direito nesse caso é ineficaz)483.
62.10.5. FASE PROBATÓRIA
Tanto o pedido rescisório quanto o pedido rescindendo podem
no caso concreto exigir a produção probatória, que ocorre de uma
só vez. Tratando-se de prova documental aplicam-se as regras
analisadas no Capítulo 22, item 22.2.5, não existindo nenhuma
dificuldade prática na produção dessa espécie de prova no próprio
tribunal competente para o julgamento da ação rescisória.
Diferente realidade se dá quando a prova a ser produzida é oral e/ou
pericial, meios de prova que exigem certa estrutura funcional que
os tribunais não possuem. Em razão dessa dificuldade para a prática
de tais atos processuais, é admitida a delegação da função
probatória para o juízo de primeiro grau484.
Dispõe o art. 972 do Novo CPC que, havendo a necessidade de
produção de prova, o relator delegará a função probatória do
tribunal para o órgão que proferiu a decisão rescindenda, que
deverá produzir a prova. Entendo que não seja prudente aplicar a
regra legal na hipótese da ação rescisória fundamentada no art. 966,
I, do Novo CPC, porque nesse caso o alegado crime praticado pelo
juízo que proferiu a decisão rescindenda o coloca em situação
desaconselhável a produzir a prova. Nesse caso, melhor que seja
respeitado o foro, mas não o juízo. Por outro lado, devendo a prova
ser produzida em foro distinto daquele em que tramitou o processo
cuja decisão de mérito transitada em julgado busca-se rescindir

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Outros materiais