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1 7 4 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia OUTRAS PROPRIEDADES DE MASSA DAS ROCHAS SEDIMENTARES Além das quatro propriedades: cor, densidade e peso específico, poro- sidade e permeabilidade vistas em maior detalhe neste compêndio, podem ser admitidas várias outras características físicas. Krumbein e Sloss (1963, Tab. 4-6, p. 119) apresentam um sumário de propriedades de massa dos sedimentos, inclusive as quatro acima vistas. Então, excluindo-se as quatro já vistas, as outras propriedades enumeradas por estes autores são: Coesão É uma propriedade exercida por forças superficiais com tendência a conservar juntas as partículas constituintes de uma rocha. Esta ação é exer- cida principalmente por partículas mais finas, por exemplo, de diâmetros inferiores a 0,01 mm. Compactibilidade É a propriedade que se manifesta pelo decréscimo do volume das rochas quando submetidas a uma pressão (carga), comumente resultando em dimi- nuição de porosidade. É intensamente acusada por rochas inconsolidadas de granulação muito fina. Sedimentos argilosos (folhelhos) passam de 50 a 5 % de porosidade após soterramento sob cerca de 1 500 m de espessura de sedi- mentos. Elasticidade É a capacidade de corpos submetidos a esforços recuperarem seu ta- manho e forma primitivos após deformação. A elasticidade é um fator impor- tante no controle da velocidade de ondas sísmicas em prospecção geofísica. O módulo de Young, que define esta propriedade, varia de 2 x 1 0 u dinas/cm2 para folhelhos a 5 x 10 1 1 dinas/cm2 em arenito e 6 x 10 1 1 dinas/cm2 em calcários. Resistividade elétrica É uma medida da resistência à passagem da corrente elétrica. Depende sobretudo da natureza do sedimento e do fluido contido nos poros. Para arenitos, a resistividade é da ordem de 10 4 ohm • cm. A resistividade relativa de rochas sedimentares perfuradas em um poço é mostrada pela "curva lateral" (laterolog) dos perfis elétricos. Suscetibilidade magnética A suscetibilidade magnética mede as propriedades magnéticas das rochas. Em sedimentos, a suscetibilidade é amplamente uma função da quantidade de magnetita presente. Em unidades C.G.S., 90% dos sedimentos possuem suscetibilidade magnética inferior a 0,001 (em comparação, os derrames de lavas básicas possuem valores superiores a 0,001 em 90% das amostras). d e t e r m i n a ç ã o das propriedades das rochas sedimentares em laboratório 1 7 5 Disposição das partículas (Packing) A disposição espacial das partículas é um fator importante entre as pro- priedades de massa das rochas sedimentares, porque modifica os valores de diversas outras características. Esta propriedade expressa o grau em que os grãos estão em contato mútuo ou interpenetrados entre si. Radiatividade A radiatividade em sedimentos é expressa em unidades equivalentes a I O - 1 2 gramas de rádio por grama da rocha. Valores medidos para arenitos indicam 4,1 para arenitos puros, 4,0 para calcários, 11,3 para folhelhos cin- zentos e 22,4 para folhelho cinzento-escuro ou preto. Condutividade térmica A condutividade térmica é uma medida da facilidade de fluxo do calor através da rocha. A condutividade k, expressa em calorias/s • cm • grau, é da ordem de 0,005 nas rochas sedimentares. 4 . ALGUNS CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE AS ROCHAS SEDIMENTARES Até aqui vimos uma descrição das principais propriedades das rochas sedimentares, tanto sob o ponto de vista de elementos granulares constituintes como sob o aspecto de agregados desses grãos. Foram expostos também os diferentes métodos de quantificação dessas propriedades, para que assim te- nhamos elementos para estudos sedimentológicos dessas rochas. Aqui, ve- remos algumas propriedades, sem o conhecimento das quais não poderemos interpretar os dados quantitativos anteriormente obtidos. Conceito de maturidade dos sedimentos Maturidade é a medida da aproximação dos sedimentos elásticos de um tipo final estável, que é ocasionada por processos de formação agindo sobre os mesmos; portanto, a maturidade é um registro combinado do tempo através do qual os processos genéticos foram efetivos e da intensidade de ação desses processos. O tempo ou a duração da ação parece ser determinado principalmente pelo relevo. Relevos abruptos propiciam alta razão de erosão, enquanto que relevos baixos são associados com baixa razão de erosão, a mesma coisa podendo-se dizer da velocidade de sedimentação. Como foi verificado por Krynine (1949), a erosão de tais áreas fornece detritos pouco intemperizados, no primeiro caso, ou resíduo muito intemperizado, maturo, no segundo caso. Os efeitos do clima são mais complicados. Com respeito à precipitação pluviométrica existem dois tipos extremos, árido e úmido. Hilgard (1906) relata que a principal diferença entre resíduos formados em regiões de climas úmidos e áridos está nas porcentagens relativas de materiais insolúveis. A proporção de insolúveis é mais alta nas regiões de climas úmidos, onde os solos estão sujeitos a intensa lixiviação. Assim, nos sedimentos elásticos grosseiros (arenitos e conglomerados), a sílica poderia ser o índice de ma- turidade dos sedimentos, mas a porcentagem de sílica somente pode conduzir a erros, já que a sua porporção pode ser reduzida pela introdução de cimento carbonático. A temperatura parece também influir na razão de intemperismo alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 7 7 e portanto nos tipos de materiais produzidos. Altas temperaturas propiciam reações químicas mais intensivas. Sob condições tropicais, onde a temperatura é alta, o intemperismo parece ser mais rigoroso e os resíduos formados são nota- velmente enriquecidos em óxidos de ferro e alumínio, e consequentemente deficientes em sílica. Os lateritos e bauxitas são produtos finais de processos de formação de solos em tais regiões. De um modo geral, pode ser dito que climas mais quentes e úmidos favorecem decomposição mais intensiva da rocha matriz, enquanto que um clima mais frio e seco é marcado por pro- dutos finais de menor maturidade. A composição atual de um depósito sedimentar é o resultado da inte- ração de efeitos combinados de relevo, clima e rocha matriz. Uma composição que indique maturidade, tal como alta razão quartzo/feldspato, geralmente é o produto de clima quente em área de relevo pouco acidentado. Misturas de materiais estáveis e instáveis, tais como arenitos feldspáticos associados com folhelhos ricos em alumina, sugerem climas quentes e úmidos em regiões de relevo acentuado de topografia jovem. Se o sedimento contém somente produtos imaturos, então a área de proveniência é de relevo alto ou uma região de climas rigorosos. FATORES DE MATURIDADE A maturidade pode ser expressa tanto em termos texturais (granulo- metria) bem como em termos composicionais (químicos ou mineralógicos). O último termo em areias seria aquela constituída somente de quartzo. Este mineral é o único química e fisicamente mais estável entre os contribuintes principais das rochas plutônicas, de modo que pode ser acumulado em grandes volumes. Portanto, a medida da maturidade mineralógica da areia pode ser dada em termos de seu conteúdo em quartzo. Além disso, como frequen- temente o quartzo ocorre intimamente associado com feldspato em rochas plutônicas, a maturidade das areias e arenitos pode também ser expressa em termos do desaparecimento do feldspato, isto é, pela razão quartzo/feldspato. Mas, naturalmente, esta razão não é apropriada para rochas derivadas de matrizes originalmente pobres em feldspatos, tais como rochas metamórficas de baixo grau e rochas sedimentares. A razão de fragmentos de sílex/não-sílex poderia fornecer aproximadamente o índice de maturidade mineralógica de tais rochas. Mas o índice de maturidade, baseado essencialmente nas con- centrações de quartzo e sílex,não indicam como foi atingido este estádio. O índice é apenas uma medida da efetividade dos processos, tanto físicos como químicos. A maturidade mineralógica está ligada aos processos pelos quais passam os sedimentos até atingirem um estádio de completa estabilidade química. Portanto, este fenómeno está ligado à ordem de persistência dos minerais. Assim, por exemplo, a presença de anfibólios e piroxênios nos sedimentos indica derivação direta de rocha formadora, mas sua ausência não indica condições de longo transporte. Poderia estar ausente na rocha matriz ou 178 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia sugerir intemperismo rigoroso, ou ainda retrabalhamento dos sedimentos. Além do grupo de minerais pesados, outros que podem denotar maturidade mineralógica dos sedimentos são, como já vimos, os feldspatos. A maturidade composicional do arenito pode também ser expressa em termos químicos. Neste caso, a porcentagem de sílica seria aumentada ou diminuída (relativamente) pela introdução ou eliminação de cimentos quí- micos. Arenitos imaturos são comumente ricos em alumina, soda e potássio. A maturidade de composição raramente é atingida sem a correspondente maturidade textural. A maturidade textural pode ser definida em termos de uniformidade da granulometria das frações elásticas (seleção) e pelo seu grau de arredondamento. Embora sejam processos independentes, em geral, as areias mais bem selecionadas são também mais bem arredondadas. Mas a correlação entre estes fatores é relativamente pobre, porque a seleção pro- gride muito mais rapidamente sob condições normais de transporte e de- posição, enquanto que o arredondamento exige abrasão prolongada. Os processos de seleção são efetivos em dependência direta da densidade e viscosidade do meio de transporte. Se a diferença de densidade entre os sólidos transportados e o fluido de transporte for grande, a separação será rápida e completa, caso contrário a separação pode ser pequena ou ausente. Obviamente, se o fluido e os sólidos transportados tiverem a mesma den- sidade, não ocorrerá nenhuma seleção. Portanto, a presença ou ausência de matriz de granulação argilosa em uma areia é um índice da efetividade da capacidade de seleção do meio transportador e, desta maneira, expressa a razão sedimento/fluido do meio. MATURIDADE DOS PRINCIPAIS TIPOS DE DEPÓSITOS SEDIMENTARES Como existem algumas diferenças nas definições das maturidades dos principais tipos de sedimentos elásticos, isto é, conglomerados, arenitos e argilitos (folhelhos), vejamos separadamente cada um dos casos. MATURIDADE DE CASCALHOS E CONGLOMERADOS Os resíduos conglomeráticos derivados da superfície terrestre variam nas suas características como um resultado das variações das condições de relevo e clima da área-fonte. Sob condições de relevo pouco acentuado o cascalho fornecido será fino e maturo, isto é, os materiais serão de substâncias qui- micamente inertes. Permanecem somente quartzo de veio, quartzito e sílex fragmentado, e maior volume das rochas matrizes será reduzido a areias e argilas. Como acontece com as areias, o transporte rio abaixo dos cascalhos produz modificações. Os materiais menos resistentes são rapidamente redu- zidos de tamanho e a proporção de materiais mais resistentes sofre um incre- mento. Esses processos são notáveis mesmo a curtas distâncias. Como quartzo, quartzito e sílex são mecanicamente mais duráveis e quimicamente mais alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 7 9 inertes, eles tendem a ser concentrados durante o transporte. Um cascalho maturo é, portanto, aquele constituído desses materiais e as suas porcentagens são uma medida apropriada da maturidade. MATURIDADE DE AREIAS E ARENITOS As areias e arenitos, cujos grãos são essencialmente constituídos de quartzo (mais raramente de sílex e de quartzito), são maturos. Devido à gra- nulometria das frações areia, fragmentos líticos (de rochas) são mais raros que nos conglomerados. A presença ou ausência de minerais instáveis, de matriz argilosa e o grau de arredondamento dos fragmentos de quartzo definem a maturidade das areias e arenitos. MATURIDADE DE ARGILITOS (Folhelhos) Pelo fato de todos os folhelhos conterem minerais de argila ou, no mí- nimo, partículas de granulação de argila, eles seriam enquadrados todos entre rochas imaturas, se as definições previamente dadas sobre a maturidade fos- sem adotadas. Entretanto, quando um sedimento arenoso, inicialmente argi- loso, sofre um processo de eliminação de argila e passa para arenito submaturo, a argila deve ir para algum lugar; logo, os folhelhos de granulação mais fina poderiam representar complementos de arenitos e conglomerados que, após a eliminação, foram depositados em águas mais profundas e calmas. Quando a subsidência de uma bacia é rápida, a eliminação de argila é pequena e os depósitos consistem de argilitos ou folhelhos arenosos ou sílticos, pobremente selecionados, arenitos imaturos, muito argilosos. Quando a subsidência é lenta, permitindo amplas modificações texturais, os depósitos são bem diferenciados e consistem de folhelhos argilosos relativamente bem selecionados, ou fo- lhelhos sílticos, juntamente com arenitos maturos, bem selecionados. Portanto, desde que os arenitos maturos acompanhem folhelhos e argi- litos texturalmente mais finos, é proposto que os pelitos constituídos predo- minantemente de material de granulação fina, argilosa, com quantidades subordinadas de silte e sem areia, sejam chamados de "maturos". Pelitos formados de proporções quase iguais de silte e argila, juntamente com pe- quenas porcentagens de areia, são chamados de "imaturos"; e os pelitos com- postos de muita argila, mas com moderada quantidade de silte, são chamados de "submaturos". ESTÁDIOS DE MATURIDADE TEXTURAL De acordo com Folk (1951), são definidos quatro estádios de maturidade textural dos sedimentos, estabelecidos pela ocorrência de três eventos em sequência: a) remoção de argila, b) seleção da fiação arenosa e c) arredon- damento dos grãos arenosos de quartzo. A textura, quando encarada para a definição dos estádios acima, pode ser considerada sob dois pontos de vista: 1 8 0 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia a) variação da granulometria (média e os extremos) e b) maturidade textural expressa em termos de conteúdo de argila, seleção e arredondamento. A passagem de um sedimento inicialmente argiloso, pobremente sele- cionado e com grãos angulares para uma areia completamente matura, arre- dondada e selecionada é marcada por etapas sucessivas, que permitem re- conhecer quatro estádios de maturidade textural: Estádio imaturo - O sedimento contém considerável quantidade de argila e mica fina, a porção não-argilosa é pobremente selecionada e os grãos são angulares. Quando uma boa parte da argila é eliminada, o estádio (2) é atingido. Estádio submaturo - O sedimento contém pouca ou nenhuma argila, mas a porção não-argilosa (silte, areia e cascalho) é ainda pobremente sele- cionada e os grãos são angulares. Tão logo o sedimento se torne bem sele- cionado, o estádio (3) é atingido. Estádio maturo - O sedimento não contém argila e os grãos de areia são bem selecionados, mas ainda subangulares. Quando os grãos se tornam bem arredondados, o estádio (4) é atingido. Estádio super maturo - O sedimento não contém argila, a fiação arenosa é bem selecionada e os grãos são bem arredondados. Este é o último estádio textural, e nenhuma modificação é possível após este ciclo. Os quatro estádios são mostrados na Fig. 67 (Pettijohn, 1957). * % 5 ioo « — G R Ã O S MAL-SELECI0NAD0S->j»GRÃ0S B E M S E L E C I O N A D O S ' G R Ã O S 1 S E M A R R E D O N D A M E N T O — - T G R Ã O S A R R E D . >Js I M A T U R O S U B M A T U R O M A T U R O S U P E R M A T U R 0 MUITA A R G IL A - * - P O U C A O U N E N H U M A A R G I L A - 0 B A I X A M O D E R A D A A L T A E X T R E M A E N E R G I A M O D I F I C A D O R A T O T A L E N V O L V I D A Figura 67. E s t á d i o s de maturidade textural de sedimentos e lás t icos (Segundo Folk , 1951) O diagrama de Folk mostra que, embora todos os processos comecem a atuar simultaneamente, alguns requerem muito mais energia, portanto não chegam à completação final senão muito tarde. O diagrama acima, embora de caráter qualitativo e não quantitativo, serve para facilitar o entendimento dos significados das expressões como "bem selecionado", "pouca argila", etc, pois foram introduzidos certos valores nu- méricos para definição mais precisa dos limites dos estádios propostos por alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 181 Folk: o estádio (1) passa para o estádio (2), quando o sedimento passa a conter menos de 5 % de argila detrítica (sericita e mica fina são incluídas entre as argilas). O estádio (2) passa para o estádio (3), quando o sedimento atinge valor de So (coeficiente de seleção de Trask) de menos de 1,30. Isto corresponde aproximadamente a uma expansão de 1,2 unidade d> (fi) entre as porcentagens 10 e 90%; e nas seções delgadas, aproximadamente 2/3 dos grãos ocorrem dentro de uma variação de diâmetro de uma unidade <p. O estádio (3) passa para o estádio (4), quando os grãos de quartzo do tamanho de areia atingem um arredondamento médio de 0,50, ou melhor, usando-se a carta de com- paração visual de Krumbein (1941). Embora os quatro estádios acima sigam, em sequência bem ordenada, há rochas ocasionais que mostram uma inversão de estádio textural. Por exemplo, apresenta grãos bem arredondados, disseminados em uma abun- dante matriz argilosa, ou grãos arredondados mas pobremente selecionados. Nestes casos indicam condição especial, tal como presença de grãos sedi- mentares de segundo ciclo de deposição, que herdaram sua forma de um ciclo anterior, mas cuja seleção é uma resposta às condições do ciclo final. Em tais casos, o termo modificador (adjetivo), aplicado ao designar uma rocha, é aquele do estádio mais baixo de maturidade textural apresentado, e este fenómeno é designado inversão textural. Pela combinação de três variáveis: tamanho dos grãos, maturidade tex- tural e composição mineralógica, Folk propôs o seguinte esquema de nomen- clatura das rochas sedimentares elásticas. Primeiro, o termo granulométrico é aplicado, usando-se nomenclatura de Krynine (1948) ou qualquer outro termo de classificação textural. Este é separado por dois pontos dos termos que denotam a maturidade textural e composição mineralógica. Exemplos: "arenito conglomerático" : "quartzito maturo", "conglomerado arenoso": "arcózio submaturo", seguindo a fórmula geral: (granulometria): (composição litológica) (maturidade textural). Segundo Folk, desta maneira são abrangidos três importantes parâmetros das rochas sedimentares: 1) composição mine- ralógica, que é uma função da litologia e logo do estádio tectônico da área de origem (Krynine, 1943); 2) granulometria, que é uma função da proxi- midade e relevo topográfico da área fonte; 3) maturidade textural, que é uma função do grau de modificação física introduzida pelos agentes no local de deposição e, portanto, é um índice da razão de subsidência da bacia. MATURIDADE E AMBIENTE DE SEDIMENTAÇÃO A influência da tectônica sobre o estádio de maturidade dos sedimentos elásticos é constantemente enfatizada por Pettijohn (1957). Como já foi visto, o conteúdo feldspático é um dos índices de maturidade e, como foi demons- trado por Krynine (1935), o relevo é um fator mais importante que o clima, que determina o conteúdo feldspático das areias e arenitos. Relevo acentuado resulta em remoção ou erosão de materiais incompletamente intemperizados e portanto promove a formação de areias feldspáticas imaturas. Relevo 1 8 2 i n t r o d u ç ã o à sedimentologi suave leva à destruição completa do feldspato e assim pode dar origem a areias ortoquartzíticas. Além disso, como o relevo é um produto do tecto- nismo e requer energia de levantamento para a sua manutenção, a maturidade dos resíduos derivados de sua superfície é um índice da atividade tectônica. Além disso, rápido levantamento e rápida erosão são comumente associados com rápida sedimentação (e rápida subsidência). Os sedimentos fornecidos a bacias de subsidência rápida são depositados sem apreciável retrabalha- mento. Por outro lado, os sedimentos maturos, especialmente as areias de regiões estáveis, são sujeitos a sucessivos retrabalhamentos de tal modo que se tornam textural e mineralogicamente maturos. A principal influência do tectonismo, no entanto, é o efeito sobre o suprimento total dos sedimentos e a razão de subsidência, e o equilíbrio entre esses fatores determina a relação da superfície de deposição e o nível do mar (no caso de ambiente marinho). Somente na completa ausência de tectonismo os processos de amadu- recimento textural e mineralógico chegam ao estádio final. Desta maneira, o registro sedimentar é essencialmente um registro de preenchimento da bacia. Assim, considerando as diferenças de tectonismo, que por seu turno de- finem diferenças nas condições energéticas, Folk (1961) estabeleceu um gráfico qualitativo que liga os estádios de maturidade textural, por ele estabelecidos anteriormente, com vários ambientes de sedimentação e suas respectivas energias - veja a Fig. 68 (Shoji, 1966). Este gráfico mostra muito bem que, em ambientes de planícies de inundação, lagunas e pântanos, e em ambientes neríticos, que possuem todos uma baixa energia, predominam sedimentos imaturos. Em sedimentos de canais de rios e cones aluviais predominam se- 1 P L A N Í C I E D E I N U N D A Ç Ã O ( B A I X A E N E R G I A ) • - — L E Q U E A L U V T A T : L U G U N A \O D E E N E R G I A . C A N A L D E R I O J> E P Â N T A N O \ C U R T A D U R A Ç Ã O \ ^ > ^ ( B A I X A E N E R G I A K V ^ ^ ^ Í C U R T A D U R A - / \ • ^ - ^ ^ C Ã O E . M U I T A S / P R A I A E " B A N C O " _ \ yS*"^ ^ ~ - - ^ V E Z E S , E X C E S S O D E / ^ " ^ - s . E N E R G I A ) / . N E R I T I C O - ^ _ _ _ X \ S £ ! £ - ' ^ E Ó L I C O E 1 8 A I X A E N E R G I A ) D E D U N A 1 I M A T U R O 2 S U B M A T U R O 3 M A T U R O 4 S U P E R M A T U R O Figura 68. Re lação entre maturidade de sedimentos e d epós i to s de diferentes ambientes (Segundo Folk , 1961) alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 8 3 dimentos principalmente submaturos, enquanto que areias maturas e super- maturas são encontradas em ambientes de praia e bancos de areia e em dunas eólicas. Diagênese e litificação Litificação é o complexo de processos, que converte um sedimento recém- -depositado em uma "rocha dura". A litificação pode ser parcial ou incom- pleta; pode ocorrer logo após a deposição; concomitante à sedimentação; ou, ainda, muito tempo depois. As rochas de praia (beach rocks), tão comuns no nordeste brasileiro, onde constituem os recifes de arenitos, e também encon- tradas na região deltaica da foz do rio Doce (ES), são exemplos de sedimentos litificados logo após a deposição por precipitação de CaC0 3 nos interstícios dos grãos de areia. O termo diagênese refere-se primariamente às reações que se processam dentro de um sedimento, entre um mineral e outro, entre um mineral e vários outros ou entre vários minerais e os fluidos intersticiais. Durante a diagênese há muita dissolução e recristalização dos materiais. Assim, a lama calcária fina pode ser convertida em calcário cristalino grosseiro. Um carbonato pode ser substituído por fosfatos, um mineral de argila pode ser transformado em outro, a glauconita pode ser formada e várias substâncias sãoalteradas para alguns minerais de argila. O termo diagênese foi pela primeira vez aplicado por Von Giimbel (1868, in Segonzac, 1968) mas o significado original da palavra tem pouco a ver com o conceito atualmente estabelecido. Von Giimbel, que foi assim o inventor do termo, foi também o primeiro a imaginar um conjunto de trans- formações, independentes do metamorfismo, que converte um sedimento recém-depositado em uma rocha sedimentar compacta. Mas este Autor não conseguiu encontrar uma posição bem definida para os fenómenos diage- néticos entre os diferentes processos de transformação dos sedimentos. Isto foi conseguido por J. Walther (1893-1894, in Segonzac, 1968), que definiu a diagênese como "todas transformações físicas e químicas, que um sedimento sofre, desde a época de deposição até a completa litificação, excluindo-se as mudanças devidas à intervenção de compressão tectônica e calor fornecido por atividades vulcânicas". Tal como em muitos outros campos das ciências naturais, o conhecimento incompleto dos fatores envolvidos faz com que existam fortes diferenças de opinião concernentes aos limites exatos dos fenómenos. Três zonas bem estabelecidas, no entanto, podem ser mostradas entre os fenómenos de intem- perismo, diagênese e metamorfismo. A influência de Walther foi grande e pesquisas sobre diagênese são ainda ativas até hoje na Alemanha. Mas em outros países, tais como União So- viética, França e nos países de língua inglesa, pesquisas sobre o assunto não têm sido menos intensas. Uma revisão das variações de ideias do conceito de diagênese em vários países é apresentada por Segonzac (1968). 184 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia Evidências de reações diagenéticas consistem de sinais de recristalização pós-deposicional, substituições, crescimentos porfiroblásticos, segregações de substâncias minerais, dissolução intra-estratal, etc. Naturalmente as associa- ções mineralógicas produzidas por diagênese devem estar em equilíbrio com as condições fisico-químicas do meio, mas até hoje pouco esforço tem sido feito no sentido de se determinar que associações mineralógicas devem ser esperadas a partir de dadas composições. AMBIENTES DIAGENÉTICOS No momento da deposição, um sedimento pode ser constituído de par- tículas detríticas soltas, cristais, fragmentos orgânicos, lama coloidal ou mis- turas de tais substâncias. Quando uma lâmina de sedimento é formada, ela passará a constituir a interface entre o material previamente depositado e o meio de sedimentação. O ambiente diagenético é o ambiente de transformações fisico-químicas pós-deposicionais. Ele se estende desde a interface deposicional até uma distância indefinida para baixo. A natureza do ambiente diagenético e a rapidez de processamento das mudanças diagenéticas dependem sobretudo do meio de deposição e da espécie de sedimento que está sendo depositada. A interface deposicional representa uma condição limitante importante, que separa duas regiões fisico-químicas diferentes. Como um exemplo simples, podemos imaginar argilas e siltes sedimentando-se em ambiente marinho, como um conjunto de partículas. Quando as partículas atingem o fundo, elas formam uma matriz sólida com poros saturados de água. A água possui a mesma composição do meio superposto, mas começam a ocorrer nítidas di- ferenciações tão logo a água confinada entre os poros seja isolada da livre circulação. Com o prosseguimento da sedimentação, as lâminas de sedimentos pas- sam da condição de interface água-sedimento para posições sucessivamente mais baixas: entram no domínio de pressões e temperaturas mais altas, e de condições fisico-químicas e biológicas diferentes. Essas novas condições pro- movem a consolidação e litificação do sedimento até chegar às rochas sedi- mentares. Durante as últimas décadas, avanços especialmente importantes no re- conhecimento dos controles geoquímicos e biológicos sobre os processos diagenéticos têm permitido o estabelecimento de um exame mais crítico dos ambientes diagenéticos atuais, e têm assim propiciado uma verificação mais crítica das interpretações das mudanças diagenéticas em sedimentos antigos. AMBIENTE DIAGENÉTICO M A R I N H O Zobell (1946) deu considerável impulso ao estudo das condições em ambientes pós-deposicionais atuais pelas suas observações de fenómenos geo- químicos e biológicos em lamas de fundos submarinos. A Fig. 69 (Krumbein alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 8 5 - S U P E R F Í C I E OA A O U A , n CAPACIDADE R E D U t C R A 1 0 15 2 0 MILHÕES D É BACTEft lAS POR G ~ 25 . 5 0 . J 5 ( I N T E R F A C E D E P 0 S I C I 0 N A L 1 - 2 1 0 0 • 4 — E h Figura 69. Diagrama de m u d a n ç a s em caracterís- ticas da lama do fundo do mar abaixo da interface deposicional. A escala de Eh está em unidades de 0,1 (Dados de Zobell, 1946. I n : Krumbein e Sloss, 1963) SUPERFÍCIE E h = ««tpuittUim í H 2 S A B U N D A N T E ; l o X I G . A U S E N T E [ H Í N T E R F A C E ! ê i lOEPOSIÇ iJ Eflffff HHH - S U P E R F Í C I E DA A G U A SUPERFÍCIE E h = 0 C 0 I N - - C I O E COM A S U P E R F Í C I E DE 0 E P 0 S I Ç Ã 0 - S U P E R F Í C I E DA ÁGUA INTERFACE D E P O S I C I O N A L O X I G É N I O A B U N D A N T E H - S A U S E N T E , : - f S U P E B F E h . i . ttilifittlMIiili Figura 70. Diagramas das relações entre superfície de Eh nulo e a interface de- posicional. (A) C o n d i ç õ e s de fundo es- tagnante. (B) Coinc idênc ia das duas su- perfícies. (C) C o n d i ç õ e s oxidantes abaixo da interface deposicional (Segundo Krumbein e Garreis , 1952. I n : Krumbein e Sloss, 1963) e Sloss, 1963) ilustra algumas das descobertas de Zobell. O número de bac- térias, por grama de lama, de 63 milhões nos primeiros 5 centímetros abaixo da interface passa para menos de 1000 por grama à profundidade de cerca de 1,50 m. O Eh torna-se progressivamente negativo a partir da interface para baixo, apresentando valor -0,07, próximo a interface, e -0,28 à profundidade de 2,40 m. O pH muda irregularmente de 7,8 a 7,9. O conteúdo de oxigénio, embora não registrado no gráfico, indica valor zero logo abaixo da interface — veja a Fig. 70 (Krumbein e Garreis, 1952, in Krumbein e Sloss, 1963). O Eh (potencial de oxidorredução) é uma medida do estado de oxidação ou redução dos íons presentes. Em geral, valores positivos indicam que a maior parte dos íons está em seu mais alto estado de oxidação e valores ne- gativos indicam que eles se encontram em estados de valências mais baixas. O pH (concentração de íon hidrogénio) representa a natureza alcalina ou ácida do meio da lama de fundo. O meio neutro é indicado pelo valor 7,0; valores menores indicam acidez crescente e os valores maiores alcalinidade crescente. O exame da Fig. 69 permite chegar à conclusão de que, mesmo sob condições de circulação aberta em mares relativamente rasos, numerosas e importantes transformações podem ocorrer na transição do sedimento recém- -depositado para sedimentos soterrados a alguns centímetros ou a algumas 186 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia dezenas de centímetros abaixo da interface de deposição. Evidentemente, as intensidades e os tipos de transformações dependem amplamente da na- tureza do material sedimentado. Em zonas costeiras, de deposição predomi- nantemente arenosa, as mudanças podem ser simplesmente desprezíveis, já que o quartzo é relativamente estável, os agentes biológicos podem ser pouco importantes e as ondas e correntes podem perturbar periodicamente as interfaces. Areias de fundos em águas bem aeradas próximas à costa possuem Eh positivo e pH de 8,0 a 8,3. Em 1952, Emery e Rittenberg publicaram um interessante trabalho sobre a diagênese das primeiras fases de sedimentos em áreas ao longo da costa daCalifórnia, Estados Unidos. Inúmeros testemunhos de sondagem do se- dimento foram coletados e submetidos a exames detalhados para se verificarem as mudanças que ocorrem com as profundidades abaixo da interface depo- sicional. Alguns testemunhos foram de 1,5 a 2,0 m de comprimento. Entre as propriedades medidas estavam a granulação média, porcentagem de umi- dade, porcentagem de íon COJ ~, porcentagem de nitrogénio e os valores medidos de pH e Eh dos materiais dos testemunhos. Entre as mudanças mais importantes notadas, estava o decréscimo no conteúdo aquoso para baixo. Este decréscimo está relacionado com a com- pactação do sedimento pelo peso dos sedimentos superpostos. Os valores de pH geralmente aumentavam com a profundidade e o seu conteúdo orgânico decrescia com a profundidade. O estudo de Emery e Rittenberg mostrou a importância das observações conjuntas de dados integrados de ordem físico-química dos sedimentos da interface para baixo. As lamas carbonáticas, da mesma forma que os sedimentos detríticos de granulação fina (argilas), devem também revelar mudanças diagenéticas abaixo da interface deposicional. Ginsburg (1957) executou um estudo detalhado dos processos diagenéticos primários dos sedimentos carbonáticos de águas rasas da região da Flórida, Estados Unidos. Ele reconheceu três processos predo- minantes de diagênese primária, que classificou como orgânicos, fisico-quí- micos e físicos. Como no caso dos sedimentos elásticos, o autor observou que algumas mudanças são muito nítidas nas primeiras dezenas de centímetros abaixo da interface. Processos orgânicos incluem a agregação e formação de sedimento e a mistura dos sedimentos, que ocorre durante a formação de montículos, tubos e perfurações por organismos. Esses processos orgânicos exercem algum controle nos valores de pH e Eh observados abaixo da interface. Os processos fisico-químicos na diagênese dos carbonatos incluem dis- solução, precipitação e transformação dos carbonatos bem como a formação de glauconita, sulfetos e sílex associados. Processos principalmente físicos envolvem compactação, rachaduras de ressecação e deformação penecontem- porânea de sedimentos moles. alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 8 7 AMBIENTES DIAGENÉTICOS NÃO-MARINHOS As condições em ambientes diagenéticos não-marinhos são diferentes daquelas dos ambientes marinhos sob vários pontos de vista. No ambiente de água doce faltam os sais dissolvidos, que são encontrados na água do mar, portanto as mudanças químicas, que envolvem estes íons, são menos apa- rentes abaixo da interface deposicional. O decréscimo para baixo do oxigénio dissolvido produz condições redutoras, e aparentemente as lamas lacustrinas são redutoras e alcalinas, tais como as lamas marinhas. Da mesma maneira que nos ambientes marinhos fechados, os ambientes restritos de água doce também desenvolvem condições ácidas e redutoras nos sedimentos de fundo. Alguma circulação aberta ou ambientes diagené- ticos de água doce parcialmente fechados desenvolve condições oxidantes, como mostram as ocorrências de ferro férrico em algumas lamas de fundo. Alguns ambientes diagenéticos terrestres, tais como desertos e planícies aluviais, são contínua e periodicamente expostos a agentes subaéreos. A res- secação produz então rachaduras de lamas e origina gretas de contração e estruturas sedimentares pós-deposicionais associadas. O oxigénio atmosférico tende a eliminar a matéria orgânica dos sedimentos e mantém o ferro em estado férrico. PROCESSOS DIAGENÉTICOS As transformações diagenéticas são processadas pelos fenómenos comuns de reorganização química, tais como dissolução, reprecipitação, cristalização, recristalização, oxidação, redução, etc. Mas a diagênese é melhor entendida quando seus processos são analisados à luz das características geológicas dos processos e seus efeitos. Partindo dessa premissa, os principais processos dia- genéticos são: cimentação, reorganização diagenética (autigênese), diferen- ciação e segregação diagenéticas, metassomatismo diagenético, dissolução intra-estratal e compactação. CIMENTAÇÃO O material quimicamente precipitado, que forma o cimento de muitos sedimentos elásticos de granulação média a grosseira, é um dos constituintes importantes de tais rochas. A cimentação é um processo, que ocorre em um dos últimos estádios na formação das rochas sedimentares, e afeta tanto a porosidade como a permeabilidade. Portanto, é de grande interesse na tec- nologia de petróleo e água subterrânea. Muitas substâncias são encontradas como material cimentante. O mais comum é a sílica, geralmente na forma de quartzo. Em condições menos comuns, a sílica é depositada como opala ou calcedônia. Vários minerais carbonáticos, especialmente a calcita, são cimentos comuns. A dolomita é menos comum e a siderita é comparativamente rara. Entre os agentes cimen- tantes menos comuns têm-se sulfetos de ferro, barita e anidrita. A maior 1 8 8 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia parte das argilas contidas em areias seria de natureza detrítica, portanto, seria matriz, mas, no caso de argila grosseiramente cristalina, Pettijohn (1957) admite sua precipitação a partir de soluções, portanto poderia ser considerada cimento. A relação do cimento com o arcabouço detrítico de areia é de consi- derável interesse e importância. Se a composição do cimento for a mesma dos grãos detríticos, o cimento será muitas vezes depositado em continuidade cristalográfica, e resulta em um agregado cristalino interpenetrado. Desta maneira, podem ser originados, por exemplo, os quartzitos sedimentares. Estudos de Siever (1959), sobre a cimentaçào de arenitos pensilvanianos nos Estados Unidos, permitiram estabelecer a sequência de cimentação e de- cimentação em alguns arenitos quartzosos. A areia inicial pode conter uma solução muito diluída de sílica em seus poros. Durante as primeiras fases de soterramento mais raso, esta sílica desenvolve crescimento secundário sobre grãos detríticos de quartzo, produzindo pequenas faces euhedrais. Com so- terramento mais profundo, pode ser introduzido cimento carbonático nos poros remanescentes do arenito, mas, como o processo continua, o carbonato tende, em parte, a substituir a sílica original ou da precipitação secundária. Se, mais tarde, a rocha ficar exposta na superfície, o carbonato tende a ser dissolvido pelos agentes intempéricos, deixando atrás de si uma rocha par- cialmente decimentada. Alguns arenitos são cimentados por mais de um material. Neste caso é importante determinar a idade relativa dos minerais cimentantes. Em geral, a ordem de precipitação dos vários minerais cimentantes é estabelecida pelo fato de que aqueles formados em primeiro lugar serão mais bem desenvolvidos ou mais idiomorfos, e estarão ligados às paredes dos interstícios entre os grãos. Os minerais formados nas fases posteriores ocuparão os espaços restantes e serão moldados pelos cristais formados anteriormente. Estudos de Waldschmidt (1941) mostraram a predominância do quartzo sobre os carbonatos em ci- mentos de arenitos mais antigos e predominância da dolomita sobre a calcita em arenitos de cimento carbonático. Os arenitos mais novos, quando possuem cimento carbonático, são geralmente de calcita. Os problemas de mecanismo de cimentação das areias e da fonte dos materiais cimentantes ainda não estão resolvidos. É claro que na cimentação ocorre uma redução dos espaços porosos. Isto pode ser conseguido, tanto no caso da sílica como no caso de carbonatos, por soluções intra-estratais e reprecipitação ou por simples preenchimento dos vazios por meio de materiais introduzidos. Concomitantemente com a cimentação, que se processa em um local, em outro ocorre uma extensiva eliminação de carbonatos de arenitos calcíferos, causando assim a "decimentação"dos arenitos. AUTIGÊNESE Os minerais de um sedimento, que são em parte detríticos e em parte químicos, não estão necessariamente em perfeito equilíbrio uns com outros alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 8 9 ou com o fluido intersticial ao tempo da deposição. E os processos autigênicos consistem na tentativa do estabelecimento do equilíbrio químico do con- junto pela eliminação de espécies instáveis, crescimento de espécies estáveis e geração de novas espécies estáveis por reações químicas apropriadas. Os processos envolvidos incluem redução, especialmente de ferro. Muitas lamas vermelhas, contendo óxido de ferro, são depositadas em um ambiente redutor. Se a razão de sedimentação não for muito grande ou o suprimento de material redutor (principalmente matéria orgânica) for suficiente, a lama vermelha será convertida em lama cinza, verde ou azul. Desidratação é outro processo comum. A gipsita pode ser desidratada para formar a anidrita. Os materiais argilosos reagem com o ferro e magnésio presentes para formar clorita e outros silicatos. Carbonato de cálcio reage com magnésio para formar dolomita. Se um mineral é estável, isto é, está em equilíbrio com o meio, pode servir como núcleo de cristalização e aumentar de tamanho. M i - nerais como os feldspato e quartzo são comumente afetados por crescimento secundário. Qualquer mineral novo ou regenerado é chamado de mineral autígeno. Os grãos detríticos de quartzo apresentam comumente crescimento se- cundário. Este fenómeno é de ampla distribuição e deve ser onipresente em todos os arenitos em que o quartzo cristalino constitui o cimento. Nos cal- cários, a sílica autígena aparece mais frequentemente sob a forma de cal- cedônia. Os feldspatos autígenos e de crescimento secundário ocorrem em rochas de todas as idades, desde arenitos e folhelhos até calcários. Sua ocorrência em folhelhos foi reportada apenas uma vez. Nos arenitos eles ocorrem como bordas de crescimento secundário sobre grãos de feldspatos detríticos. Em calcários apresentam-se como pequenos cristais euhedrais. As condições de formação e a fonte dos íons de álcalis necessários para o crescimento do feldspato são desconhecidos, mas acredita-se que ele seja de ambiente ma- rinho. A calcita aparece como mineral autígeno, derivado da aragonita, que é o constituinte principal de algumas conchas de invertebrados. Mas como a aragonita é metaestável, transforma-se em calcita em um tempo relativamente curto. A glauconita é um mineral geralmente considerado autígeno. Este mi- neral aparece sob condições marinhas por processos de hidratação da sílica e subsequente absorção de bases e perda de alumina (Takahashi, 1939). Em sedimentos da baía de Monterey, Califórnia, Estados Unidos, a biotita foi observada em todos os graus de alteração para glauconita. Pirita e marcassita autígenas são comuns em muitos sedimentos. Sulfetos pretos amorfos parecem estar presentes em algumas lamas recentes. Apa- rentemente, após o soterramento, este material é segregado e cristalizado como cubos disseminados de pirita, em parte substituindo o material da matriz, como agregados cristalinos de marcassita ou pirita, como esferulitos e substituindo madeira fóssil. Por ação bacteriana origina-se, durante a de- 190 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia composição das matérias orgânicas, grande volume de N H 3 , C 0 2 , H, N , etc, que passam para a água intersticial dos sedimentos. Ao mesmo tempo, o oxigénio livre é consumido e as condições do interior do sedimento passam de oxidantes para redutoras. Desta maneira, tem inicio a redução dos com- postos inorgânicos capazes de liberar oxigénio sob condições de baixa pressão e temperatura, tais como os minerais ricos em Fe, Mn, Cr, etc. Além desses minerais citados, são encontrados minerais titaníferos (rutilo, brookita e anatásio), turmalina e zircão, que geralmente são resíduos detríticos pesados das rochas sedimentares, mas podem ser encontrados também como minerais autígenos. DIFERENCIAÇÃO DIAGENÉTICA As segregações de matérias minerais são incluídas entre os processos diagenéticos. Materiais espalhados difusamente através da rocha podem ser dissolvidos e carreados para centros de reprecipitação. De acordo com Ramberg (in Pettijohn, 1957), a energia livre de tais materiais é menor se eles estiverem segregados em poucos núcleos relativamente grandes do que esta- rem uniformemente difusos através da rocha. O processo de segregação é um tipo de diferenciação diagenética que leva a formação de concreções e outros corpos relacionados. Essas segregações podem assumir formas bastante diferentes. Algumas apresentam cristais grandes ou agregados de cristais simétricos. Outros corpos são irregulares e microcristalinos (nódulos de sílex). Alguns dos materiais se- gregados substituem a matriz da rocha hospedeira (como no caso de nódulos de sílex); em outros casos o material segregado é depositado em espaços abertos (poros, fraturas, etc). Maiores detalhes sobre as diversas formas e estruturas exibidas pelos corpos resultantes das segregações serão vistos no capítulo de estruturas sedimentares. METASSOMATISMO DIAGENÉTICO Poucas dúvidas pairam acerca do fato de em algumas rochas ocorrerem substituições em larga escala, embora em muitos casos os fenómenos sejam parciais e bem localizados. Se a rocha for o resultado de substituição completa, pode-se verificar que realmente tal fenómeno ocorreu, somente quando se tem cristais pseudomorfos. Os critérios de diferenciação entre rochas de origem metassomática e aquelas produzidas por precipitação direta nem sempre são claros e decisivos. Obviamente nenhum calcário bioquímico contém suficiente magnésio para converter a rocha em dolomito nem qualquer calcário contém bastante sílica para convertê-lo em silexito. Provavelmente, estes contri- buintes foram originados da água do mar, com a qual estava o sedimento em contato, das águas conatas contidas nas camadas, eliminadas de estratos adjacentes ou das águas de circulação. Se esses constituintes fossem de- rivados da água do mar, a substituição ocorreria penecontemporaneamente alguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 191 com a deposição dos sedimentos; mas, se águas conatas ou de circulação forem as responsáveis, a substituição pode ter se processado muito tempo após a consolidação e levantamento das rochas. Os critérios para definição do tempo da substituição e da fonte dos materiais introduzidos ainda estão longe de serem satisfatórios ou conclusivos. DISSOLUÇÃO INTRA-ESTRATAL Dissolução intra-estratal é um processo de solubilização que ocorre dentro de uma camada sedimentar, após a deposição. Tal fenómeno pode agir logo ou muito tempo depois da deposição do sedimento. Ele pode ou não ser acompanhado pela precipitação simultânea de materiais dissolvidos. Os efeitos da dissolução intra-estratal são muito variados. A perda de material por dissolução conduz a um aumento de porosidade, que no caso é chamada de porosidade secundária. Também muito variadas são as evidências de que ocorreram fenómenos de dissolução intra-estratal. Em rochas, prin- cipalmente naquelas de constituição química homogénea, a solubilização pode ser concentrada ao longo de planos normais à pressão, produzindo superfícies estilolíticas, onde ambos os lados se interpenetram. Embora as evidências de dissolução intra-estratal sejam abundantes, indicações sobre a importância e magnitude do fenómeno são poucas. Segundo Stockdale (1926), 5 a 40% do volume original da formação podem ser perdidos por solubilização esti- lolítica. Ocorrem, muito naturalmente, tanto dissolução como remoção de material, também em zonas superficiais, mas esses processos são mais ligados a intemperismo do que a processos de dissolução intra-estratal dos fenómenosdiagenéticos. COMPACTAÇÃO Observações mostram que os folhelhos sofrem uma compactação pro- nunciada. Os espaços abertos são eliminados ou enormemente reduzidos pela rotação e deformação dos grãos, assim como por maior ou menor recrista- lização. Portanto a porosidade pode ser tomada como uma medida grosseira do grau de compactação dos folhelhos. Athy (1930) encontrou nas argilas superficiais que a porosidade era de 45 a 50 %, enquanto que nos folhelhos a 2 000 m de profundidade a porosidade era de apenas 5 %. Compactação equi- valente a 20% do volume total original ocorreu ao tempo em que a argila foi soterrada a 300 m, 35 % a 600 m e 40% a 1000 m. Como foi mostrado por Jones (1944), a razão de compactação é muito rápida nas primeiras fases deposicionais mas ela decresce bastante com o passar do tempo. Outro fato interessante é que, ao aplicarmos uma sobrecarga de estrutura artificial a uma camada argilosa, ela se compacta muito pouco até atingir o peso cor- respondente ao peso máximo dos sedimentos superpostos, mas, depois disso, quando aquele valor é ultrapassado, a deformação se acentua mais. Este fato é de grande importância na geologia aplicada à engenharia civil. 1 9 2 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia Os sedimentos de granulação fina (aqueles que contêm partículas pe- quenas e achatadas de argilo-minerais) sofrem uma compactação muito maior do que os sedimentos grosseiros. Isto acontece porque os minerais achatados se dispõem perpendicularmente às pressões exercidas, passando a ocupar um volume bem menor do que quando eles se achavam caoticamente dispostos. A areia apresenta compactação bem menos pronunciada que os sedimentos argilosos devido a pelo menos duas razões. Primeiramente, a porosidade da da areia por ocasião da deposição é bem menor do que dos sedimentos argi- losos. Além disso, a ausência de abundante matriz em areias bem selecionadas faz com que os poros permaneçam relativamente abertos até que os grãos de quartzo consigam uma disposição bastante rígida de suas partículas. Outro fato de importância geológica, que está ligado ao fenómeno da compactação, está relacionado ao fluido que é expelido durante a compac- tação dos folhelhos. Estas soluções, atravessando camadas de arenitos adja- centes, podem carrear materiais, que podem ser precipitados como cimento em outras partes de menores pressões. A compactação dos sedimentos calcários é aparentemente mais com- plicada do que no caso de sedimentos detríticos. Sedimentos calcários finos possuem porosidade inicial mais alta do que areias, mas quaisquer evidências de acentuado grau de compactação durante a consolidação não são claras. Tal compactação deve ocorrer muito mais por introdução de material ci- mentante. SILICIFICAÇÃO E DOLOMITIZAÇÃO Os processos denominados dolomitização e silicificação são fenómenos que, conjuntamente, podem ser chamados de metassomatismo diagenético. São ambos processos importantes, que ocasionam, frequentemente, o apa- recimento de grandes corpos rochosos completamente dolomitizados, silici- ficados ou ambos. DOLOMITIZAÇÃO Os processos de dolomitização das rochas calcárias podem ocorrer em várias fases de evolução dos corpos litológicos. O processo mais comum é o de conversão total ou parcial de calcários em dolomitos. Em qualquer substituição metassomática desse tipo é necessário termos uma alta concen- tração de M g + + . Tem sido sugerido recentemente, por vários autores, que o refluxo de águas conatas de horizontes salinos pode formar condições ideais para a ocorrência do fenómeno (Illing, 1959; Adams e Rhodes, 1960; Deffeyes e outros, 1964). O movimento hidrodinâmico pode ser tanto lateral como vertical. Dolomitização progressiva resulta em perda de cerca de 12% do volume, de tal modo que é propiciada formação de fraturas nas rochas. Nos locais onde processos de tectonismo se somam àqueles de simples compac- tação, ocorre a formação de extensas zonas fraturadas, que permite uma ilguns conceitos fundamentais sobre as rochas sedimentares 1 9 3 melhor circulação de águas ascendentes. Assim, a dolomitização deste tipo é mais proeminente próximo aos cinturões orogenéticos. Contanto que haja íons M g + + disponíveis, a dolomitização metassomática pode ocorrer tanto nas primeiras fases diagenéticas como tardiamente. Dolomitos primários apresentam-se atualmente em formação em pe- quenas áreas, tais como lagos ou lagunas isoladas (Skinner, 1963). Neste processo de formação do dolomito primário, as algas verdes desempenham o papel principal, removendo C 0 2 e aumentando o pH do meio a ponto de possibilitar a precipitação simultânea de calcita e magnesita, provavelmente misturadas com brucita, Mg(OH) 2 (Chilingar, 1962; Teodorovich, 1955). Nas primeiras fases de soterramento, o alto valor de pH (acima de 9) é também ajudado pela ação de bactérias anaeróbicas. Próximo a praias, no Golfo Pérsico, existem lagunas rasas, onde ocorre precipitação contemporânea de gipso e dolomita no fundo das lagunas e também em forma de "rochas de praia" {beach rocks), segundo Wells (1962). Em alguns dolomitos paleozóicos são encontradas calcita e dolomita, dispostas em bandas. Este bandamento é atribuído por Sarin (1962) à morte periódica das algas nas fácies carbonáticas pela invasão de águas dolomíticas supersalinas. Existe também o fenómeno inverso, chamado "dedolomitização", em que ocorre uma substituição metassomática da dolomita pela calcita, mas pode também resultar da lixiviação, com uma dissolução molécula por molécula, seguida por remoção seletiva do M g C 0 3 . Como resultado, teremos um cal- cário com textura de areia sem coesão. Como exemplo brasileiro de calcário, que sofreu processos de dolomi- tização, temos as rochas da Formação Irati, Permiano da Bacia do Paraná. Segundo estudos feitos por Amaral (1968), quase todas as rochas calcárias da Formação Irati são dolomitizadas, ora mais, ora menos intensamente, ocorrendo também dolomitos quase puros junto a calcários, que parecem ser isentos de magnésio. Mas o autor não conseguiu observar feições texturais que pudessem esclarecer sobre a época em que se deu o processo, se antes ou depois da recristalização. Atualmente, o autor acredita que, pelo menos em parte, é certamente de origem singenética (informação verbal). SILICIFICAÇÃO Como a sílica é solúvel a temperaturas normais somente em águas tendo pH acima de 9 (Correns, 1949; Krauskopf, 1959), ela é, em geral, pouco mo- bilizada após a desidratação do gel primário. Mesmo a baixas concentrações de SiO z em solução seria precipitada a valores baixos de pH (3 a 6) existentes em alguns lagos, levando à silicificação de madeiras, por exemplo, devido à liberação de C 0 2 por ação bacteriana (Correns, 1949), mas tais condições são raramente encontradas nos mares. Quando a sílica é removida, molécula por molécula, por soluções de alto pH, ela tende a ser substituída por componentes menos solúveis em tais soluções com aquele valor de pH. Esses componentes são geralmente os
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