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256 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia de cálcio segundo a reação: Ca(HC0 3 ) 2 + 2 N H 3 —• ( N H 4 ) 2 C 0 3 + CaC0 3 . Os depósitos de calcário assim formados impermeabilizam, então, o fundo, evitando o escape de amónia. O depósito argiloso sucede então ao calcário, novo escape de amónia e nova precipitação de calcário. Na Formação Irati, Permiano da Bacia do Paraná, ocorrem depósitos de folhelhos pirobetuminosos e calcários. Aqui não se aplica, contudo, a explicação acima, porque a espessura das camadas é da ordem de centímetros e não milimétrica. A matéria orgânica, que produziu o betume, está comple- tamente desorganizada, presumivelmente por atividades orgânicas dos ani- mais, que habitavam o fundo, como, por exemplo, peixes e crustáceos, cujos fósseis se conhecem na Formação Irati, e as bactérias e fungos. Os Mesosau- rídeos eram nectônicos e deviam viver na superfície. A parte dominante da matéria orgânica provavelmente era derivada do plancto que vivia na su- perfície e se acumulava no fundo com a morte. A alternância de folhelhos e calcários seria provavelmente de origem climática. Os folhelhos depositados em clima frio e os calcários em clima quente. Em virtude da espessura dos sedimentos, essa alternância não devia ter sido anual mas muito mais longa. CICLOS DE SEDIMENTAÇÃO Ciclos de sedimentação são sequências recorrentes de estratos, cada uma consistindo de vários membros similares, litologicamente distintos entre si, arranjados em uma mesma ordem. Existe uma grande variedade de ciclos desde os mais simples até os muito complexos. Eles registram a ocorrência de uma série definida de condições físicas e ambientes sedimentares resul- tantes, ocorrência esta que é repetida na mesma ordem, apenas com ligeiras variações. As causas das variações, originadas no próprio ambiente de sedi- mentação, são chamadas autocíclicas por Beerbower (1964); as localizadas fora do ambiente são chamadas de alocíclicas. Os ciclos podem ser simétricos ou assimétricos. a) Ciclos simétricos — Consistem de sedimentos arranjados em uma ordem progressiva e depois regressiva. O tipo mais simples exige cinco mem- bros e inclui três tipos de sedimentos. Este ciclo é exemplificado pela Fig. 86, como uma sucessão de arenito, folhelho, calcário, folhelho e arenito. O mesmo tipo poderia ser constituído de outros sedimentos, como, por exemplo, con- glomerado, arenito, folhelho, arenito e conglomerado ou folhelho, gipso, sal-gema, gipso e folhelho, etc. Maior complexidade pode ser introduzida por aumento no número de membros de muitos tipos ou por maior discriminação nos caracteres litoló- gicos, como sucessão de arenito, folhelho calcífero, folhelho preto, folhelho síltico e arenito. Este padrão pode ser expresso, de maneira geral, pela fórmula: 1 - 2 - 3 - 2 - 1 ou, em maior detalhe, pela fórmula: 1 - 2 a - 2 b - 2 c - 3 - 2 c - - 2 b - 2 a - l . ( estruturas sedimentares 257 B 0= DISCORDÂNCIA Figura 86. Colunas estratigráficas mostrando ciclos sedimentares s imétricos . (A) Ciclo mais simples. (B) Cic lo mais complexo. (C) Sequênc ia cícl ica com discordância (Segundo Weller, 1960) Uma sucessão de ciclos simétricos representa série mais ou menos per- feita de oscilações. O ponto de mudança da oscilação ocorre no meio do membro 1 ou 3. Nenhum horizonte dentro desses membros, contudo, fornece um limite estratigráfico satisfatório. Por conveniência, portanto, as divisões entre os ciclos são feitas nos limites dos membros. Um ciclo simétrico, por conseguinte, pode ser representado pela sequência: 1—2 — 3— 2 — 1 — 2 — - 3 - 2 - 1 ou 3 - 2 - 1 - 2 - 3 - 2 - 1 - 2 - 3 . Ciclos sedimentares são desenvolvidos mais comumente em sedimentos marinhos. Os mares facultam maior estabilidade do que outros ambientes, estando mais a salvo de interferências estranhas. Para que houvesse perfeita simetria, os membros deveriam ter naturezas litológicas e espessuras mais ou menos constantes. Alguma variabilidade, contudo, é inevitável e diferenças de espessura e algumas variações litológicas podem ser ignoradas para efeito prático. Ciclos marinhos simétricos podem ser explicados por flutuações regulares da profundidade da água na bacia de deposição ou da quantidade e tipo de sedimentos que chegam ao local da deposição; interações mais complicadas de fatores, contudo, podem ocorrer. Transgressões e regressões marinhas re- gulares são sugeridas no ciclo arenito-folhelho-calcário-folhelho-arenito. Se, contudo, o sítio de deposição estiver situado dentro da zona, que é alterna- damente submersa e emersa, o ciclo poderá ser limitado por discordâncias ou poderá incluir estratos não-marinhos. No caso de discordâncias podemos ter a fórmula: D - 1 - 2 - 3 - 2 - D . b) Ciclos assimétricos - Consistem de sucessões de membros que não obedecem à ordem progressiva ou regressiva. A assimetria pode ser expressa pela ausência de um membro ou introdução de um ou mais membros sem 258 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia 2 t o o 3 l l oc 1 1 1 i- 2 c 1 - T - ' 1-> P T V J t T ~r-T— -T- *T A S S I M E 2b SM* A S S I M E 25 o _i 1 o i 8818 Figura 87. Colunas estratigráficas com ciclos assi- métr icos de s ed i mentação . (A) Ciclo simples. (B) Cic lo complexo (Segundo Weller, 1960) . ' D I S C O R D Â N C I A equivalente no ciclo. Como exemplos de ciclos assimétricos temos as fórmulas: D - l - 2 - 3 - D ( e m lugar de D - 1 —2 — 3 — 2 - D) e 1 - 2a - 2b - 2c - - 3 - 2b - 1 (veja a Fig. 87). CICLOTEMAS Os ciclos sedimentares mais estudados são os que caracterizam o Sistema Pensilvaniano das partes oriental e central dos Estados Unidos. São assimé- tricos e a maior parte contém camadas de carvão, e são comumente chamados de ciclotemas. Pode-se aplicar o termo, por extensão, para a repetição orde- nada de uma sequência de vários tipos de estratos, que refletem condições de deposição sobre áreas sedimentares extensas, alternadamente cobertas por mares rasos e terras emersas, baixas, próximas ao nível do mar. Na ausência de camadas de carvão ou outro material, seguramente terrestre, e sedimentos com fósseis marinhos, a comparação com os ciclotemas típicos é incerta (Weller, 1964). Certos autores incluem no conceito de ciclotema qualquer sequência de sedimentos indicativa de repetição ordenada de eventos geológicos. Duff e Walton (1962) sugeriram que ciclo, ritmo e ciclotema fossem considerados sinónimos, exceto quando for necessário restringir o ciclo a tempo e o ciclo- tema a sequência de rochas. Tal opinião não é aceita pela maioria dos geólogos e alguns são bem claros no conceito restrito de ciclotema. Os ciclotemas possuem desenvolvimento variado e são desde simples até muito complexos. Todos podem ser relacionados a um padrão que cor- responde ao mais complexo. Os outros podem ser considerados como expres- sões incompletas desse padrão. Um ciclotema do Pensilvaniano dos Estados Unidos, perfeitamente desenvolvido, é constituído pelos membros dados a seguir. estruturas sedimentares 259 Hemiciclotema inferior (não-marinho) Hemiciclotema superior (marinho) c — Carvão 2u — Underclay C — Calcário 2a — Folhelho arenoso 1 — Arenito D — Discordância local 2s - Folhelho síltico 3 — Calcário 2c - Folhelho calcífero 2p - Folhelho preto C — Calcário 2s - Folhelho síltico A coluna generalizada ideal e completa, indicada pelos membros supra- citados, está mostrada na Fig. 88. Poucos ciclotemas são completamente desenvolvidos como o da figura. Em geral um ou mais membros faltam. Poucos estratos, além dos mencionados acima, estão presentes nos ciclotemas. Figura 88. S e ç ã o estratigráfica mostrando um ciclotema pensil- vaniano completamente desenvol- vido do tipo encontrado em Illinois, E U A (SegundoWeller, 1957. I n : Weller, 1960) O desenvolvimento geral dos ciclotemas muda com as suas posições nas seções estratigráficas. Os mais antigos são os mais simples. Depois eles se tornam complexos e alguns dos últimos ciclotemas revertem à condição de simplicidade em algumas áreas. Muitas ideias foram aventadas para explicar os ciclotemas. Essas ideias envolvem considerações sobre flutuações de ordem diastrófica, climática e sedimentológica (Westoll, in Weller, 1964), tais como: I . Fonte de produção dos sedimentos: a) elevação e subsequente peneplanização; b) elevação e sub- sidência; c) épocas relativamente úmidas e áridas; e d) maior ou menor cres- 260 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia cimento da vegetação protetora. I I . Transporte dos sedimentos: a) mudanças climáticas alterando a quantidade de água nos rios; b) adernamentos que modificam os declives; c) construção e destruição de barreiras naturais aos sedimentos; e d) compactação diferencial dos sedimentos. I I I . Quantidade de sedimentos: a) subsidência intermitente das bacias; b) subsidência e elevação alternada da bacia; c) flutuação do nível do mar; e d) ação de filtro das zonas pantanosas. IV. Qualidade dos sedimentos: a) tipos de sedimentos transpor- tados; b) profundidade da água; c) distância da costa; d) salinidade da água; e e) crescimento de sargaços, etc. A grande extensão superficial dos ciclotemas mostra que os fatores, que influíram nas suas formações, deveriam agir em grande área. Provavelmente estão relacionados a controles existentes fora da bacia de sedimentação. Veja a Fig. 89 (Snider, 1932, in Weller, 1960). C1 C L O A C I C L O B C I C L O C C A H B R . 0R0OV. S I L . O E V . M I S S P E N S P E R . T R . JUR. C R E T T E R . 0. R E V O U JÇ Ã O ^^ ' | C A L C Á R I O o \ S\A - i > o > tu E L C Á R\0l R E V O L U Ç Ã O C A L C Á R I O * / / O K o- z> _ J o > LU CC Figura 89. Curva de var iação em intensidade de movimentos diastróf icos de caráter mundial, desde o princípio do pe r íodo Cambriano. O s picos separam grandes ciclos que se parecem nos padrões de depos i ção sedimentar (Segundo Snider, 1932. I n : Weller, 1960) Megaciclotemas são formados por conjuntos de ciclotemas. As vezes, pode-se observar que cada ciclotema difere do outro por variações litológicas ou de espessura dos seus membros. As variações, que ocorrem em um con- junto de dois, três ou mais ciclotemas, podem se repetir acima de forma regular permitindo o reconhecimento de megaciclotemas. Ciclos contendo carvão, ocorrendo em alguns sistemas pós-paleozóicos também têm sido chamados de ciclotemas. Eles são superficialmente similares aos ciclotemas pensilvanianos, porém comparações detalhadas mostram que a maioria deles difere em alguns aspectos importantes. Por exemplo, as re- lações entre estratos marinhos e não-marinhos não são os mesmos e underclays típicos também estão ausentes. Estruturas orgânicas Pistas, pegadas, perfurações e tubos de origem orgânica, coprólitos, estromatólitos, biohermes e recifes constituem as principais estruturas orgâ- nicas. Animais e plantas não só deixam seus vestígios diretamente nos sedi- mentos, através da conservação parcial ou total, como também através de pistas. Número imenso de impressões das mais variadas naturezas é deixado r estruturas sedimentares 261 pelos seres vivos em fundos arenosos ou lodosos, número este maior do que o de espécies viventes em um nicho ecológico, já que uma única espécie pode deixar impressões de vários tipos. Em areia, a possibilidade de conservação é menor do que na lama, pois, para haver conservação em areia, ela tem que estar úmida. Aqui veremos somente algumas estruturas orgânicas mais importantes. BIÓSTROMOS E BIOHERMES Bióstromo é um termo proposto por Cumings (1932) para designar leitos acamados, formados por concentração de restos de organismos. Alguns estro- matólitos (estruturas de algas, que serão vistas em pormenores mais adiante) constituem-se em exemplos de bióstromos. Outros bióstromos podem ser constituídos de bancos de ostras ou mexilhões. Muitos bióstromos de corais são citados, impropriamente, na literatura como recifes. No Paleozóico, são comuns bancos de braquiópodes e de crinóides e, no Carbonífero e Permiano, podem ocorrer mesmo bióstromos de foraminíferos (Fusulinidae). Bioherme é um termo empregado para estruturas semelhantes a recifes, em forma de elevações, lentes ou outras estruturas maciças, unicamente de origem orgânica, situadas em rochas de diferentes litologias. Os biohermes têm sido citados na literatura como recifes, mas este termo é puramente mor- fológico, significando cristas estreitas ou cadeias de rochedos, ou bancos de areia consolidada, situados próximos à superfície da água, onde interceptam as ondas, circundados por água de profundidade maior. Recife é, portanto, originalmente, um termo náutico, significando obstáculos perigosos à nave- gação. Neste sentido podem existir também recifes inorgânicos. Bioherme, ao contrário, é produto de construção ativa dos constituintes bióticos, ligando os sedimentos, os quais têm a capacidade de crescer até formarem estruturas rígidas, resistentes às ondas. Neste sentido, todo bioherme é um recife, mas nem todo recife é um bioherme (Fig. 90). Grande parte dos chamados recifes de corais não são formados por corais, pois eles contribuem em escala muito pequena na sua edificação. Outros organismos, como algas, conchas, briozoários, foraminíferos e outros seres, também contribuem. Mesmo nos recifes, onde os corais são os orga- nismos predominantes, existe contribuição de outros organismos. Os recifes do Cambriano são formados pelos Archaeocyathidae. Crinóides contribuem ponderavelmente na construção de recifes do Paleozóico. Os recifes de corais atuais são dos tipos de franja, barreira e atol. Os recifes de franja situam-se junto à costa, crescendo rumo ao mar. Os de barreiras formam uma bar- ragem entre a costa e o mar. O atol tem forma circular, dando origem a uma laguna interna. De acordo com Branner (1904), Mabesoone (1966) e outros autores, os recifes do Brasil seriam praias arenosas cimentadas por carbonato de cálcio, proveniente da dissolução de conchas calcárias. Essas praias cimentadas seriam muito resistentes à erosão, destacando-se, enquanto os sedimentos 262 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia C A L C Á R I O C A L C Á R I O C A L C Á R I O C A L C A R E N I T O C A L C I L U T I T O E S T R U T U R A M A C I Ç O A C A M A D O O O t - ÍT ICO . DE " C O L L E N I A " Figura 90. Esquema de cons t i tu i ção de Bioherme e rochas associadas circundantes seriam erodidos. Praias arenosas cimentadas por carbonato de cálcio são comuns nas regiões tropicais, formando as estruturas conhecidas pelos autores de língua inglesa sob a denominação de beach rock. Segundo Andrade (in Mabesoone, idem), os recifes da ilha da Itamaracá, Pernambuco, seriam cordões litorâneos {offshore bars) cimentados. A estratificação está ausente nos recifes, mas nas margens eles se inter- digitam com sedimentos estratificados constituídos por lamas e areias cal- cárias, conglomerados calcários e calcários cristalinos. Os sedimentos de laguna dos atóis são formados por lama calcária extremamente fina. Calcários oolíticos podem ser formados nas regiões batidas por ondas em torno dos recifes. Muitos recifes se transformam epigeneticamente em dolomitos, mas geralmente são constituídos inicialmente por calcários muito puros, que deixam muito pouco resíduo insolúvel. Discordâncias locais ocorrem dentro dos recifes e o alto ângulo de mergulho dos sedimentos, que os circundam, produz deslizamentos, tornando complicada a interpretação geológica desses ambientes. Hoffmeistere Multer (1965) citaram recifes atuais na costa da Flórida, Estados Unidos, que se desenvolveram em locais de antigos mangues. São porções da costa endurecidas por cimento carbonático, contendo raízes de plantas de mangues e que sobressaem posteriormente sob a forma de recifes por erosão dos sedimentos mais incoerentes. As raízes foram substituídas por cilindros de calcário, que estão embebidos em areia quartzo-calcária mais friável. Muitos calcários e dolomitos pré-cambrianos, produzidos por algas, são verdadeiros biohermes, não mostrando estratificação definida. São comumente de formas lenticulares, às vezes, tendendo para a forma dômica mais ou menos acentuada. Costumam apresentar marcada resistência aos agentes de intemperismo e erosão, sobressaindo-se em elevações. Na localidade de Ilhéus, ( estruturas sedimentares 263 município de Almirante Tamandaré, Paraná, essas estruturas afloram em quantidade impressionante (Bigarella e Salamuni, 1956), com gradações la- terais para dolomitos estratificados. ESTROMATÓLITOS Estromatólitos são massas compactas de natureza calcária, interpretadas como estruturas resultantes de atividade de algas. São constituídas por lâ- minas concêntricas, com convexidade voltada para cima. Sua estrutura mi- croscópica não revela senão cristais e sua origem é inferida da sua semelhança com massas de calcário formadas atualmente por algas. Os estromatólitos possuem tamanhos variáveis, de alguns centímetros até algumas dezenas de metros. Essas estruturas assumem grande importância na explicação da génese de alguns calcários e dolomitos. Certos afloramentos, consideráveis em espes- sura e extensão, são constituídos exclusivamente por estromatólitos, não apresentando praticamente solução de continuidade. Exemplos dessas estruturas são encontradas no Brasil, sendo, em geral, designadas sob a denominação genérica de Collenia. A primeira descrita em nosso país provém do Predevoniano de Itapeva, Estado de São Paulo, tendo sido designada, por isso de Collenia itapevensis. Mais tarde elas foram sendo reconhecidas no Predevoniano de Mato Grosso, Paraná e Minas Gerais. Logan e outros (1964) demonstraram que a forma do estromatólito de- pende das condições do ambiente onde viveram as algas responsáveis por esta estrutura. Formam-se, de preferência, na região litorânea entre as marés alta e baixa. OUTROS TIPOS DE ESTRUTURAS ORGÂNICAS As pistas são constituídas por cristas ou depressões contínuas, arredon- dadas ou angulares, simples ou compostas de vários lobos, retas ou curvas, regulares ou irregulares. Às vezes são preenchidas, fornecendo os contra- moldes. Os Arthrophycus existentes no Siluriano da Amazónia são contra- moldes de pistas, estriadas transversalmente. Nos varvitos de Itu, São Paulo, são também comuns as pistas. As pegadas formam-se por cavidades isoladas, mas distribuídas regular- mente. São formadas por animais que se locomovem por intermédio de dois ou mais membros. No Cretáceo do Estado da Paraíba, conhecem-se pegadas de répteis em Passagem de Pedra, 4 km a oeste de Sousa, em argilito. Pegadas de répteis também são conhecidas no Cretáceo de São Paulo (Formação Botucatu, segundo Von Huene, 1928). Perfurações e tubos interpretados como de origem orgânica são conhe- cidos desde rochas pré-cambrianas. Há inúmeros exemplos dessas estruturas em sedimentos brasileiros de diversas idades. Na Formação Furnas (Devo- niano dos Estados de São Pau'o e Paraná), essas estruturas de perfurações 264 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia seriam as únicas evidências de origem orgânica. Normalmente o organismo se decompõe, permanecendo somente o tubo que pode permanecer aberto, mas mais comumente é preenchido posteriormente por sedimentos. Em raros casos pode acontecer que parte do animal se conserve, conhecendo-se exem- plos de tubos tendo no interior conchas fósseis de lamelibrânquios. Coprólitos são massas fosfáticas nodulares constituídas por excrementos fossilizados. Possuem formas variadas conforme o tipo de animal que os pro- duziu. No Cretáceo de Pernambuco (Olinda), a forma elipsoidal é interpretada como originada por excrementos de peixes. POSIÇÃO DOS VESTÍGIOS ORGÂNICOS EM RELAÇÃO À MATRIZ A posição dos fósseis em relação à matriz fornece grande número de informações sobre as condições de vida no tempo do soterramento. Nos Estados Unidos conhecem-se florestas petrificadas, conservadas por invasão de lavas e cinzas vulcânicas de grande espessura. Em Santa Catarina, Putzer (1953) citou 44 testemunhos de sondagem, onde foram verificadas ocorrências de solos fósseis com as raízes dos vegetais in situ. Aparecem no Arenito Barro Branco Superior no topo da Formação Bonito, pertencente ao Grupo Tu- barão, Permocarbonífero da Bacia do Paraná. Braquiópodes, moluscos e outros animais também podem ser conser- vados na posição que tinham em vida. Por outro lado, quando os fósseis estão dispostos de maneira diferente da que tinham em vida, podem dar informações valiosas sobre o ambiente. No Devoniano do Paraná são comuns conchas alongadas e orientadas de um pequeno gastrópode chamado Ten- taculites; a orientação permite a dedução da existência de correntes aquosas, permitindo, ainda, estabelecer o sentido dessas correntes (veja a Fig. 91). I3D23-- Figura 91. P o s i ç ã o de restos orgâ- nicos orientados por correntes ORIENTAÇÃO DO G A S T R 0 P 0 D O 0ENOMINAD0 TENTAC U LLI T E S D E V O N I A N O 00 PARANÁ C O N C H A S DE L A M E L I S R A N - OUIOS O R I E N T A D A S P O R AÇÃO DAS C O R R E N T E S Em fundos de corpos de água sujeitos à ação de ondas e correntes, as partes duras de organismos são desmembradas, quebradas, selecionadas, transportadas e finalmente depositadas de acordo com a competência dos agentes transportadores, e da natureza das partes duras. Superfícies curvas, estruturas sedimentares 265 como de conchas, podem ser dispostas caoticamente. Contudo, em lugares sujeitos à ação de correntes fortes, podem ser soterradas depois de terem adquirido posição estável, isto é, com a superfície curva disposta para cima. Em lugares sujeitos à ação de correntes moderadas, mas suficientemente fortes para trazerem e girarem as conchas, mas muito fracas para levantarem os sedimentos que se acumulam entre as conchas, as valvas individuais ficam imbricadas. Quando as correntes são fortes demais as conchas são fragmen- tadas e teremos a formação de coquina (ou lumachella). Neste ponto recordemos os conceitos de biocenose e tanatocenose. A biocenose diz respeito a conjuntos de fósseis que constituíram associações naturais em vida, e a tanatocenose refere-se a conjuntos de fósseis, cuja asso- ciação ocorreu após a morte dos organismos constituintes. Pode-se, com frequência, reconhecer quando um fóssil sofreu transporte, porque os cantos tornam-se arredondados, chegando muitos a adquirir forma de seixo. Mesmo microfósseis podem adquirir forma arredondada, quando retrabalhados. Em fundos calmos, sobre os quais existe água com abundantes orga- nismos, os seres, quando morrem, caem no fundo e se acumulam caoticamente. À medida que suas partes duras se acumulam e crescem em espessura, sedi- mentos finos penetram nos espaços vazios. Disposição caótica de fósseis, por- tanto, é bom indício de águas calmas. Natureza dos contatos: concordante ou discordante Discordância é um plano ou contato estratigráfico que marca interrupção importante no registro geológico. Erosão de rochas preexistentes contribui para o desenvolvimento da maioria das discordâncias, mas não é essencial para a definição. A interrupção pode variar de extremamente grande, de amplitude correspondente aos tempos geológicos, tais como movimentos epirogenéticos ou orogenéticos. Mas essas discordâncias de grande amplitude deverão ser vistasem pormenores em geologia estrutural ou geotectônica. Aqui o assunto será tratado resumidamente, realçando algo mais as discor- dâncias de origem essencialmente sedimentar. CLASSIFICAÇÃO DAS SUPERFÍCIES DE DISCORDÂNCIA Podem ser reconhecidos os seguintes tipos de discordâncias: I . Descontinuidades estratigráficas relativamente importantes: a) não produzidas por erosão perceptível b) produzidas, em parte, por erosão: b,) estratos adjacentes paralelos b 2 ) estratos adjacentes não-paralelos b 3 ) embasamento formado de rochas plutônicas I I . Descontinuidades estratigráficas de pequena escala. 266 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia Descontinuidades não produzidas por erosão — Esta discordância é cha- mada de paraconformidade; os estratos parecem se suceder em conformidade, sem nenhuma discordância. Esta é apenas reconhecida por fósseis. Exemplo: fósseis do Carbonífero contidos em sedimentos em contato com rochas con- tendo fósseis do Cretáceo. Neste caso a discordância pode indicar períodos de não-deposição, sem ter havido erosão ou erosão não perceptível fisicamente (litologia). Descontinuidades produzidas parcialmente, por erosão, entre estratos adja- centes paralelos - Os estratos acima como abaixo da superfície de discor- dância são horizontais ou então inclinados com mesmo ângulo. Discordâncias deste tipo implicam em: a) formação da rocha mais antiga, b) levantamento epirogenético, c) erosão, d) abaixamento epirogenético e e) formação da rocha mais nova. Esta sequência de eventos deve ter-se verificado e este tipo de discordância é chamado de paralela ou desconformidade. Discordâncias produzidas parcialmente, por erosão, entre estratos adja- centes não-paralelos — Essas discordâncias são de mais fácil reconhecimento, por exemplo, quando os estratos inferiores estão inclinados e os superiores horizontais. Discordâncias deste tipo implicam em: a) formação da rocha mais antiga, b) adernamento ou dobramento, c) levantamento e erosão, d) abaixamento e e) formação da rocha mais nova. Este tipo de discordância é chamado discordância angular ou inconformidade. Pode ser formado por rochas sedimentares ou vulcânicas. Embasamento formado por rochas platónicas — Este tipo é chamado de não-conformidade. Como exemplo, podemos citar a discordância da região de Itu, São Paulo, entre o granito róseo (alasquito) e os sedimentos permocar- boníferos do Grupo Tubarão. Descontinuidades estratigráficas de pequena escala — As discordâncias até aqui vistas são geralmente de dimensões regionais, pois resultam de fenómenos geológicos de grande extensão. Mas as discordâncias estratigráficas de pe- quena escala, conhecidas pelo nome de diastema, são locais e o hiato envolve tempo geologicamente curto. Exemplos comuns se encontram nos depósitos fluviais, formados por rios meandriformes. Nas enchentes, os rios podem cavar canais nos seus próprios sedimentos e, quando entra em recesso, podem ser depositados novos sedimentos nesses canais, em discordância com os mais antigos. Durante a migração do leito do rio, este pode cavar seus próprios sedimentos, ocasio- nando o aparecimento de "braços mortos" de rios, que vão sendo aos poucos entulhados por detritos, geralmente argilosos, que estarão em discordância sobre os sedimentos mais antigos (geralmente areias e cascalhos). Nos sedi- mentos neocenozóicos da Bacia de São Paulo e da Bacia de Taubaté,são comuns os diastemas. Diastemas subaquáticos ocorrem quando correntes ou tempestades oca- sionais cavam canais preenchidos posteriormente por outros sedimentos. As estruturas de escavação e preenchimento (cut and fill structures) constituem-se estruturas sedimentares 267 em exemplos de diastemas. Deslizes subaquáticos também produzem dias- temas. Os diastemas podem ser tanto paralelos como angulares. A presença de diastemas angulares não implica em movimentos tectónicos, como é o caso para as inconformidades. Deformações atectônicas de estruturas A maioria das deformações aqui estudadas são penecontemporâneas, isto é, ocorreram no momento ou logo após a deposição dos sedimentos. A maneira como elas se manifestam depende, em grande parte, do grau de plasticidade do sedimento, ainda não inteiramente litificado. São excluídas as deformações de origem tectônica, que constituem assunto de geologia estrutural. Tanto deformações tectónicas quanto as atectônicas produzem falhas, dobras e brechas. As atectônicas, em geral, são caracterizadas pelo caráter local, comumente confinadas a um ou mais leitos, situados entre leitos não deformados. O dobramento é frequentemente caótico e não relacionado às grandes estruturas regionais. Os estratos deformados podem estar truncados por superfície de erosão penecontemporânea. Exceto em alguns casos de estruturas ocasionadas por correntes, a maioria das deformações não tem significado direcional. Mesmo em casos de deslizamentos, é bastante difícil reconstruir o paleodeclive. Muitas dobras penecontemporâneas são desor- denadas com os eixos das dobras aparentemente sem direção preferencial. A classificação das deformações em consideração, do mesmo modo que nas classificações de outras estruturas sedimentares, pode ser feita em base genética ou morfológica. A classificação genética é imperfeita, não só porque às vezes é difícil deslindar a origem da estrutura como também porque dois ou mais mecanismos podem concorrer na formação de uma estrutura. I . Estruturas total ou parcialmente causadas por movimentos verticais. a) Acomodação por sobrecarga: aj) estruturas simétricas de sobrecarga (load cast), a 2) pseudonódulos (bali and pillow), a 3) laminações convolutas de sobrecarga. b) Ação combinada de correntes e sobrecarga: bj) estruturas assimétricas de sobrecarga, b 2 ) laminações convolutas de corrente. c) Acomodações ligadas a intemperismo e erosão. I I . Estruturas ocasionadas principalmente por movimentos laterais, a) Deslizamentos (slumps): a t ) leitos contorcidos, a 2) brechas intraformacionais (em parte), a 3) boudinage, a 4) estruturas rompidas (pull apart). 268 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia b) Ocasionais perturbações de fundo: b,) brechas intraformacionais (em parte). I I I . Estruturas produzidas por injeção. a) Diques elásticos. b) Domos salinos. IV. Perturbações de estruturas por escape de gases. V. Perturbações de estruturas de origem orgânica. ESTRUTURAS SIMÉTRICAS DE SOBRECARGA (Load cast) Esta estrutura ocorre na base de corpos de arenitos ou de siltitos que cobrem folhelhos ou outros sedimentos argilosos, que estavam em estado plástico durante a deposição do corpo arenoso (veja a foto 4). A argila, possuindo maior porosidade do que a areia, é menos densa, cedendo assim ao peso do corpo arenoso ou síltico superposto. Ligeiras de- sigualdades na carga de sedimentos de cima causam afundamentos desiguais. Foto 4 — E S T R U T U R A S D E S O B R E C A R G A . Esta estrutura é formada pelas diferenças de comportamento m e c â n i c o frente a es forços de c o m p a c t a ç ã o por camadas superpostas, entre areia e silte argiloso, areia e argila, etc. A foto mostra o aspecto da vista superior, perpendi- cularmente ao acamamento Procedênc ia : Grupo T u b a r ã o (Permocarbon í f ero ) Itu — Estado de São Paulo estruturas sedimentares 269 A argila, sendo plástica, desloca-se lateralmente e para cima, formando injeções irregulares; ao mesmo tempo, com a compactação, a água é expelida e a argila é ainda mais deformada. Distingue-se dos turboglifos pela maior irregularidade e ausência de extremidades diferenciadas a montante e à jusante. O tamanho das estruturas pode variar de centímetros a decímetros. Seu início depende de uma espessura crítica de areia ou silte, que varia com as densidades dos dois leitos.Quando as estruturas de sobrecarga se desenvolvem em superfícies ligei- ramente inclinadas, podem adquirir formas assimétricas pelo lento desloca- mento ao longo do declive. As extremidades argilosas, que se projetam dentro do corpo arenoso, podem ser deslocadas no sentido do paleodeclive. As estruturas formadas por essas extremidades são chamadas de estruturas em "chama" (flame structure), por se assemelharem às labaredas de uma chama (veja a Fig 92). i r 0 CM 5 Figura 92. Estrutura de sobrecarga em forma de "chamas" (flames) na base de siltitos e topo de leitos argilosos (Tennessee, E U A ) (Segundo Potter e Pettijohn, 1963, modificado) PSEUDONÓDULOS (Ball and pillow) Preferimos adotar o termo pseudonódulo, derivado do termo francês pseudonodule, proposto por Maçar e Antun (in Dzulynski e Walton, 1965) do que traduzir a denominação mais complexa bali and pillow structure de Smith, adotada por Potter e Pettijohn (1963). A estrutura é confinada a um leito, podendo, contudo, haver diversos leitos com pseudonódulos em um único afloramento. Ocorrem em sedimentos das mais diversas idades, tendo mesmo sido descrita em depósitos recentes. O tamanho varia, podendo atingir 1 metro, contido em leitos até 3 metros de espessura, segundo Potter e Pettijohn (1963). São comumente localizados na parte inferior de leitos. A rocha argilosa subjacente encontra-se deformada, parecendo envolver as estruturas e ter sido espremida entre elas; estendendo-se como finas línguas no leito arenoso. Podem aparecer como corpos maciços ou podem estar laminados. A estrutura pode aparecer também em calcários, embora mais raramente. 270 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia A origem dos pseudonódulos é essencialmente a mesma das estruturas de sobrecarga; ocorre quando a massa de areia, que se aprofunda no silte ou argila, rompe a ligação com o corpo principal e é fragmentada em uma série de pelotas. Kuenen (in Potter e Pettijohn, 1963) reproduziu experimen- talmente a estrutura, dispondo uma camada de areia sobre argila e aplicando um choque ao depósito para causar a submersão e fragmentação de massas de areia. A ocorrência da estrutura na natureza é explicada por Kuenen, como devida a choques sísmicos. Veja a Fig. 93 (Potter e Pettijohn, 1963). C E R C A 0 E 12M Figura 93. Aspectos de p s e u d o n ó d u l o s . Ac ima: p s e u d o n ó d u l o s artificiais de Kuenen (1959). Abaixo: pseudonódulos naturais do Devoniano de Luxemburgo (Maçar e Antun, 1949). Note a grande similaridade, apesar das diferenças de escala. (Segundo Potter e Pettijohn, 1963) LAMI NAÇÃO CONVOLUTA (Convolute lamination) E uma estrutura caracterizada por forte amarrotamento causando dobras intricadas dentro de uma unidade de sedimentação bem definida, não-per- turbada. Sua amplitude pode variar dentro da unidade, desaparecendo gra- dativamente para cima e para baixo. Não apresentam falhas e são caracterizadas por anticlinais estreitos e agudos e sinclinais largos. As lâminas são contínuas, variando apenas ligei- ramente na espessura. As laminações convolutas podem ser originadas tanto por mecanismos de sobrecarga como por sobrecarga associada a correntes ou, ainda, sim- plesmente pela influência das correntes. Estrutura convoluta também pode ocorrer em sedimentação original- mente constituída por laminação horizontal. Sanders (1960) chamou a atenção para a diferença de comportamento à ação de correntes, entre sedimentos coesivos e não-coesivos, para se compreender a origem deste tipo de laminação convoluta. Quando o mesmo tipo de corrente age sobre sedimentos coesivos, estes serão puxados para cima com concomitante deslocamento (decollement) na base, causado pela força de cisalhamento. Logo que as ondulações se estruturas sedimentares 271 formam, as forças evocadas por Kuenen (o fluxo da corrente sobre a super- fície ondulada pode causar sucção sobre a crista e aumento de pressão na depressão, por efeito de redemoinhos, e essas diferenças de pressão tenderiam a exagerar as ondulações) poderão acelerar o processo. Sanders reproduziu estrutura figurada por Sorby (1908) de uma amostra constituída de areia vulcânica, depositada sobre lama também vulcânica. Ao longo do contato, a lama sofreu sucção e se desenvolveram "marcas onduladas" atenuadas e muito deformadas. Podem-se notar também na Fig. 94 fragmentos de lama "espirrados" no corpo arenítico. O mecanismo de formação dessa estrutura corresponde ao lembrado por Sanders. Realmente, estruturas semelhantes, com fragmentos "espirrados", foram obtidas experimentalmente por Kuenen e Menard (1952). C O R R E N T E Figura 94. Alguns exemplos de sedimentos com l a m i n a ç ã o convoluta. (A) Segundo Bigarella e Sanches (1966). (B) Segundo Kuenen e Menard (1952), (C) Segundo Sorby ( I n : Sanders, 1960) 5 C M A estrutura figurada por Bigarella e Sanches (1966) como "estratos con- torcidos", provenientes da praia suspensa do Saco da Tambarutaca, Paraná, poderia ter essa origem. É notável a semelhança com a figura supracitada de Sorby, fazendo-se a abstração da superfície irregular, que separa os "estratos contorcidos" de baixo da estratificação cruzada dos depósitos de preenchi- mento de uma escavação situada acima. Essa superfície irregular, claramente epigenética, constitui-se em um diastema. Nos ambientes de correntes de turbidez, a distribuição irregular de pressão e sucção produziriam deformações convolutas, segundo Holland (1959). O mecanismo seria o mesmo que origina as cristas e sulcos longitu- dinais (já estudados); a diferença seria causada pela falta de coesão dos se- dimentos, no caso desta última estrutura, e pela coesão no caso de laminação convoluta. 272 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia A força de empuxo do gelo sobre sedimentos inconsolidados pode também produzir estruturas semelhantes. A exposição acima mostra a derivação poligenética da laminação con- voluta, mas sua origem sempre singenética distingue-a das demais "estrati- ficações contorcidas". No Brasil são citadas laminações convolutas em sedimentos de diversas idades e localidades. Ludwig (1964) citou tais estruturas no Paleozóico da Amazónia; Salamuni e outros (1966) no Permocarbonífero do Paraná e Santa Catarina; Salamuni (1964) no Permiano do Paraná; Landim (1968) no Per- miano de São Paulo e Murphy e Schlanger (1963) no Cretáceo do Recôncavo Baiano. ACOMODAÇÕES LIGADAS A INTEMPERISMO E EROSÃO Estão nesse caso as acomodações de sedimentos sobre fendas, depressões, dolinas e outras feições de dissolução e erosão. Os vazios assim originados podem ser preenchidos por material derivado de cima. No caso de fendas podem ser formados corpos elásticos, com forma de diques, em geral, alar- gando-se para cima. Sobre os basaltos do Grupo São Bento, Cretáceo da Bacia do Paraná, podem se desenvolver fendas originadas pelo resfriamento da lava. Conhe- cem-se algumas dessas fendas preenchidas por arenitos do tipo Botucatu (Washburne, 1930). A ausência de fragmentos de basalto demonstra que as fendas abertas nos últimos estádios de resfriamento da lava logo depois foram preenchidas por areia, antes que houvesse decomposição do basalto. Nos sedimentos glaciais permocarboníferos do Grupo Tubarão, em São Paulo, ocorrem fendas de tensões desenvolvidas durante o movimento do gelo e preenchidas por sedimentos (crevasse filling) bem como acúmulo de depósitos grosseiros, pela ação seletiva de correntes subterrâneas (eskers) des- critos por Frakes e outros (1967). Na Bacia do Itaboraí, Estado do Rio de Janeiro, existem calcários com fendas, originadas por dissolução. Essas feridas foram preenchidas por detritos onde foram conservadas ossadas de vertebrados fósseis, que indicam idade neopaleocênica. Os calcários, por conseguinte, devem ser mais antigos. Os fósseis conservadosnas fendas são os únicos de idade paleocênica no Brasil. Na Formação Irati, do Permiano da Bacia do Paraná, ocorrem exemplos de acomodação de sedimentos, de origens diversas. Landim (1965) descreveu deformações atectônicas em sedimentos dessa formação, de duas origens di- ferentes: a) causadas por intemperismo e b) causadas por compactação dife- rencial. As acomodações motivadas por intemperismo são devidas à expansão do folhelho montmorillonítico por hidratação, auxiliada ainda pelo alívio de pressão por erosão. As causadas por compactação diferencial foram descritas na região de Assistência, São Paulo, onde ocorrem nos afloramentos formados por lentes de dolomitos em folhelhos. estruturas sedimentares 273 ESTRUTURAS DE DESLIZAMENTO Os deslizes em sedimento inconsolidados podem resultar do aumento do peso no topo de uma superfície de deposição em declive, por declive exces- sivo ou pela retirada do apoio na base da superfície de deposição em declive. Pode ser iniciado por impulsos como movimentos de água ou terremotos. Massas de sedimentos, que se movem de encontro a sedimentos recém-de- positados, como consequência de correntes torrenciais, ocasionam empuxo sobre os sedimentos já depositados deformando-os. Similar efeito resulta do empuxo por gelo (Hansen e outros, 1961). a) Fluxos de sedimentos — O fluxo (corrida) pode ser de areia ou lama (sandflow ou mudflow). Diferenças de coesão entre esses dois tipos ocasionam diferentes tipos de movimentos. O fluxo de lama possui considerável poder de transporte, carregando enormes blocos por distâncias de dezenas de quilómetros. Podem escavar extensos canais. Os fragmentos transportados são distribuídos ao acaso. Não há imbricações dos grãos nem marcas de sola. Ocasionalmente ocorrem massas de areia de disposição espiralada, arredondada ou em forma de fuso, com o eixo maior perpendicular ao acamamento, mergulhando a montante. Parecem ter-se originado em áreas de redemoinho e sua conservação atesta a quase instantânea velocidade de deposição. Os fluxos de areia produzem depósitos maciços com ocasionais blocos erráticos. b) Deslizes subaquáticos — Podem ser de dois tipos extremos: incoerentes e coerentes (Dzulynski e Walton, 1965). O primeiro tipo é caracterizado por mistura de fragmentos de rochas em massa de areia, silte ou argila. No se- gundo tipo, os leitos retêm sua identidade durante o deslize. Os fragmentos incluídos nos deslizes incoerentes mostram formas e per- turbações internas diversas (Kuenen, 1948): bolas de deslize (slump balis), de poucos centímetros a alguns metros, geralmente formadas de arenito e imersas em argilito. Esferóides corrugados (cnimpled balis), consistindo de massas de arenito muito irregulares, com achatamento paralelo ao acamamento, o que os distinguem das bolas de deslize com superfície lisa. Blocos deslizados dando aspecto de estratos cruzados, etc. Interessantes estruturas do tipo de bolas de deslize foram descritas por Rich (1953), proveniente do chamado varvito de Itu (São Paulo), Permocar- bonífero do Estado de São Paulo. Camadas argilosas muito finas (cerca de 1 mm de espessura) se intercalam com leitos mais espessos de siltito. Finas camadas de siltito. foram roladas entre duas camadas de argilito, estas fun- cionando como lubrificantes. Esta situação sugere ligeira inclinação da inter- face no tempo da deposição. Quando um leito é fragmentado, provavelmente devido a tensões, seus fragmentos deslizam declive abaixo. Durante o deslize, a parte frontal dos fragmentos pode ser encurvada para cima ou para baixo, o que pode auxiliar na determinação do sentido de deslize (Ksiazkiewicz, 1958). 274 i n t r o d u ç ã o à sedimentologia "BOUDINAGET Em consequência de tensões comumente produzidas por deslizes ou outras causas em sedimentos plásticos, tensões estas que não atingem a inten- sidade suficiente para produzir profundas deformações vistas anteriormente, algumas camadas finas, com maior coesão do que a argila plástica que a circunda, podem ser estiradas e afinadas em intervalos regulares. A essas estruturas dá-se o nome de estrutura de boudinage. Tal estrutura pode ser originada também por processos tectónicos. Veja a Fig. 95 (Weller, 1960). Figura 95. "Boudinage" artificial produzida por pressão vertical em camadas de argila entre ca- madas de plasticidade diferente. Todos os leitos eram da mesma espessura (Segundo Weller, 1960) Existem todos os tipos de gradações, desde ligeiros movimentos, produ- zindo formas tendendo à boudinage, até movimentos mais fortes, produzindo deslocamentos. As camadas rompidas poderiam ser chamadas de "estruturas rompidas" [pull apart). Boudinage e camadas rompidas foram reconhecidas por Farjallat (1967) em diamictitos permocarboníferos de Mato Grosso. BRECHAS INTRA FORMACIONAIS Outra estrutura comumente associada a deslizes é a brecha intrafor- macional. Representa um estádio mais avançado das estruturas de camadas rompidas. São brechas cujos fragmentos tendem a adquirir orientação de- sordenada e colocadas entre sedimentos não perturbados. A natureza lito- lógica dos fragmentos, em muitos exemplos, é a mesma da rocha que forma o embasamento da rocha, enquanto que a matriz é formada por rocha de diferente natureza litológica (veja a Fig. 96). Figura 96. Brecha intraformacional de calcário . O s fragmentos são cla- ramente derivados das camadas de baixo CM estruturas sedimentares 275 Há casos em que os fragmentos mostram claramente que foram derivados do leito subjacente, não só pela natureza litológica como também pela ori- entação, principalmente dos fragmentos inferiores, Fig. 96. Em outros casos, os fragmentos são espalhados sem nenhuma evidência de orientação. Essas estruturas podem ser formadas sob influência de ondas fortes, devido a tempestades ou tsunamis ou ainda devido a fortes correntes de maré. Caso comum, contudo, é o aparecimento de tais estruturas em deslizes suba- quáticos. Brechas intraformacionais podem ser formadas também pela erosão de gretas de contração. Neste caso são constituídas de pelotas de argila. Bigarella e Salamuni (1956) observaram essa estrutura em dolomitos pre- devonianos do Grupo Açungui, Estado do Paraná, possuindo desenvolvi- mento máximo de 2 m de espessura. Salamuni (1963) notou a ocorrência comum dessas estruturas nos sedimentos permianos do Grupo Passa Dois, nos Estados de Paraná e Santa Catarina. Belos exemplos de brechas intrafor- macionais existem nos afloramentos da Formação Irati, Permiano, das pro- ximidades de Assistência, Estado de São Paulo (Amaral, 1971). São lenticulares e dispostas em níveis diferentes entre camadas não perturbadas e suas espes- suras variam de 5 a 30 cm. DIQUES CLÁSTICOS Muitas formações sedimentares contêm corpos tabulares de material elástico, que cortam discordantemente as camadas. Geralmente são cons- tituídos de arenitos, sendo, portanto, chamados de diques de arenitos. No Brasil ocorrem em sedimentos do Grupo Passa Dois, Permiano da Bacia do Paraná; Formação Ilhas e Formação São Sebastião; Cretáceo do Recôncavo Baiano e, cortando basaltos do Grupo São Bento, Cretáceo da Bacia do Paraná. Os diques de arenito do Recôncavo Baiano possuem larguras que variam desde milímetros até 1,50 m. Eles possuem "apófises", que projetam do dique principal e também anastomosamentos. Cortando os basaltos do Grupo São Bento, em São Paulo, ocorrem diques de arenito do tipo Botucatu. A areia aqui veio de baixo para cima e foi empurrada através de diaclases do basalto, possuindo a forma sinuosa e frequentemente estão ligadas a sills de arenito. Alguns diques cortam a zona amigdaloidal, que marca o topo das lavas, e se afinam para cima, ramifi- cando-se e mostrando que são verdadeiros diques. Esses arenitos estão todos silicificados. Existem tambémcasos de diques elásticos formados pela areia que pe- netrou de cima para baixo. Neste caso, o mecanismo é bem mais simples, tendo resultado de mero preenchimento de fraturas abertas previamente. Em geral este tipo apresenta maior espessura na parte superior adelgaçando-se para baixo. Os diques originados de baixo para cima podem ser explicados pela plasticidade que os elásticos adquirem quando se embebem em fluidos como
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