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125Capítulo 6 Taxonomia dos citros Edson Freitas de Araújo e Nádia Roque CITROS126 Taxonomia dos citros 127 Foto da página anterior: Diversidade genética de frutos do Banco Ativo de Germoplasma de Citros - IAC (Centro APTA Citros Sylvio Moreira/ IAC) CITROS126 Taxonomia dos citros 127 1 Introdução O gênero Citrus é representado por plantas de porte médio (arbóreo/arbustivo), flores brancas e aromáticas e frutos tipo baga, contendo vesículas preenchidas por um suco de grande interesse co- mercial. Os representantes desse gênero possuem um conjunto básico cromossômico x = 9, sendo re- latados poucos indivíduos triplóides e tetraplóides na natureza. Estima-se que a sua origem ocorreu em torno de 20 a 30 milhões de anos atrás, nas regiões tropical e subtropical da Ásia e do arqui- pélago Malaio, de onde dispersaram para outras regiões do mundo. Observa-se grande complexidade na classifi- cação desse grupo de plantas. A taxonomia da subfamília Aurantioideae foi marcada pela pro- posição de novos gêneros, segregados de Citrus, como Poncirus, Fortunella e Microcitrus. Não há fortes evidências, morfológicas, no entanto, para a manutenção desses gêneros, uma vez que carac- teres diagnósticos de um deles podem ser encon- trados em outros representantes do referido grupo. Em se tratando de Citrus, diferentes sistemas ta- xonômicos têm sugerido um número variável de espécies, sendo descritas de 11 até mesmo 162 espécies distintas. Parte da complexidade filogenética e taxonô- mica observada em Citrus deve-se a particulari- dades de sua biologia reprodutiva e a sua ampla história de cultivo. Seus representantes apresentam grande intercompatibilidade sexual, o que possibi- lita a origem natural de híbridos intergenéricos e interespecíficos ao longo do processo de evolução do grupo. Alguns híbridos são férteis por embriões derivados do zigoto ou podem tornar-se férteis pela formação espontânea de embriões nucelares, que contribuem para manter a estabilidade genéti- ca e perpetuar os híbridos como clones apomíticos. Algumas linhagens de híbridos receberam o status de espécie. Um dos sistemas de classificação mais utiliza- do, proposto por Swingle (1943), reconheceu 16 espécies para Citrus e classificou-o entre os seis gêneros que compunham o grupo subtribal deno- minado “árvores de citros verdadeiros” (true citrus fruit trees), subtribo Citrinae, tribo Citreae, subfa- mília Aurantioideae da família Rutaceae (Swingle & Reece, 1967). Atualmente, uma reavaliação dos sistemas de classificação tem sido feita com base em estudos filogenéticos, apoiados por dados morfológicos, quimiotaxonômicos e macromoleculares. Alguns desses estudos indicam que Citrus é um grupo artificial, uma vez que nem todos os seus repre- sentantes naturais, que possuem ancestralidade comum, estão incluídos nesse táxon (Mabberley, 1998; Araújo et al., 2003). Este capítulo contém o processo de classificação desse grupo de plantas e o impacto de análises moleculares no sistema de classificação tradicional. 2 Sistemas de classificação Entre os principais tratamentos sistemáticos para o gênero Citrus, cabe destacar aqueles pro- postos por Engler (1931), Swingle (1943) e Tanaka (1961). Engler (1896), na primeira edição de Die Na- turlichen Pflanzenfamilien, publicou, dentro da fa- mília Rutaceae, o tratamento taxonômico da subfa- mília Aurantioideae, incluindo 14 gêneros para um número estimado de 71 espécies, das quais seis pertenceriam ao gênero Citrus. Na segunda edição dessa obra, Engler (1931) incluiu 29 gêne- ros na subfamília e estimou cerca de 180 espécies, das quais 11 estavam incluídas em Citrus. No ano de 1914, Swingle no estudo taxonô- mico realizado para o gênero Citrus, propôs 12 espécies e duas variedades. No período 1912- 1926, Swingle publicou 17 trabalhos sobre a subfamília: nove dos gêneros reconhecidos por ele foram adotados por Engler (1931). Posteriormente, Swingle (1943) dividiu Citrus em dois subgêneros: Citrus subg. Citrus Swingle e Citrus subg. Papeda (Hassk.) Swingle. Para o primeiro subgênero, o autor reconheceu dez espé- cies, duas variedades e cinco híbridos. Para o se- gundo, duas seções: Papeda, com quatro espécies, sete variedades e um híbrido; e a Papedocitrus, com duas espécies e dois híbridos. Swingle & Reece (1967) publicaram um exten- so capítulo sobre a biologia de Citrus e gêneros correlatos. Caracterizaram, morfologicamente, todos os níveis hierárquicos da subfamília Au- rantioideae, incluindo tribos, subtribos, grupos, gêneros, espécies, variedades e até os híbridos encontrados. Esse trabalho é considerado o mais completo para o gênero e ainda o mais utilizado. Nessa obra, Swingle & Reece (1967) reconhece- ram dez espécies de Citrus com frutos comestíveis e estames conatos na base (Citrus subg. Citrus) e CITROS128 Taxonomia dos citros 129 seis espécies com frutos acres, não comestíveis e estames livres (Citrus subg. Papeda). Entre 1924 e 1941, Tanaka publicou uma série de trabalhos sobre a taxonomia dessa subfamília e que, segundo Swingle (1943), representou uma valiosa contribuição para a sistemática do grupo. Naquele período, Tanaka reconheceu dez espé- cies para o gênero Citrus, todas já propostas por Swingle, e descreveu 17 novas espécies. Posterior- mente, Tanaka (1961) dividiu o gênero Citrus nos subgêneros Archicitrus e Metacitrus, várias seções, subseções, grupos e subgrupos, contabilizando 157 espécies. Destas, 30 são espécies novas de Citrus e 48 são novas combinações. Em 1977, Ta- naka totalizou 162 espécies como representantes de Citrus. Estudos quimiotaxonômicos indicam que Citrus subg. Citrus compreende apenas quatro espécies selvagens alopátricas conhecidas - duas espécies tropicais: C. halimii B.C. Stone (Península Malaia e Borneo) e C. grandis Osbeck [= C. maxima (Burm.) Merr.] (toranja, do sudeste da Ásia) e duas subtropicais: C. medica L. (cidra) e C. reticulata Blanco (tangerina, mandarin) (Mabberley, 1997). Pesquisas com enzimas comprovaram que todos os frutos comercialmente comestíveis referidos em Citrus devem ter sido derivados das três últimas es- pécies citadas, através da seleção e hibridização (geralmente não intencional), seguidas da seleção de “complexos agâmicos” (Mabberley, 1997). Segundo Mabberley (1997), a grande impor- tância dessas plantas na horticultura comercial deve ter sido responsável pela proliferação de binômios, resultando em crescentes complicações nomenclaturais à medida que novas linhagens de híbridos foram introduzidas. Esse autor propôs, então, a acomodação das plantas cultivadas desse gênero, no esquema lineano, tendo incluído desig- nação de tipos e obra princeps (protólogo). Seguindo Mabberley (1997, 1998) e Pirani (1999), as espécies de Citrus importantes comer- cialmente são derivadas como segue. 2.1 Citrus medica L. Nome vulgar: cidra. Sempre foi distinta pelas folhas simples, pecíolo sem alas e flores poligâmicas. Envolveria dois tá- xons de origem híbrida: i) Citrus x limon (L.) Osbeck [parentais: 1. C. medica x ?]. Nome vulgar: limão, limão-cravo, lima. ii) Citrus x jambhiri Lush. [parentais: 1. C. me- dica x C. reticulata]. Nome vulgar: “bulsh-lemons”, em floriculturas, envasadas. 2.2 Citrus grandis (L.) Osbeck [ = Citrus maxima (Burm.) Merr., segundo Swingle & Reece, 1967] Nome vulgar: toranja. Distinta pelas largas alas do pecíolo e bagas grandes. Envolveria dois táxons de origem híbrida: i) Citrus x aurantiifolia (Christm.) Swingle [pa- rentais: 2. C. maxima x ?]. Nome vulgar: limão-galego. ii) Citrus x aurantium L. [parentais: 2. C. maxi- ma x 3. C. reticulata]. Nome vulgar: laranjas e pomelos (grapefruit). Os híbridos originais com predominância de características do parental C. maximaseriam as laranjas-amargas (usualmente denominadas C. aurantium); aqueles com mais caracteres do pa- rental C. reticulata corresponderiam às laranjas doces (geralmente denominadas C. sinensis), com numerosos cultivares e variedades. 2.3 Citrus reticulata Blanco Nome vulgar: tangerina, mexerica, bergamota (mandarin nos países de língua inglesa). Distinta pelas flores pequenas e frutos com cas- ca facilmente destacável. 3 Caracterização morfológica 3.1 Família Rutaceae Juss. Segundo Judd et al. (1999) e Pirani (1999), geralmente, árvores ou arbustos, algumas vezes com espinhos, cavidades secretoras dispersas (pontos translúcidos) contendo óleos etéreos aro- máticos, variados tricomas. Folhas alternas ou opostas, raramente verticiladas, freqüentemente compostas, pinadas ou reduzidas trifolioladas ou unifolioladas, ocasionalmente palmadas, folíolos com pontuações translúcidas (especial- mente próximo às margens), margens inteiras ou crenadas, venação pinada; estípulas ausentes. Inflorescências freqüentemente determinadas, raro reduzidas a uma única flor, terminais ou axilares. CITROS128 Taxonomia dos citros 129 Flores bissexuais ou unissexuais (plantas monóicas ou dióicas), geralmente radiais; sépalas quatro a cinco, livres ou, algumas vezes, conatas na base, normalmente imbricadas; pétalas quatro a cinco, distintas ou unidas, geralmente imbricadas; esta- mes oito a dez, as vezes numerosos, filamentos dis- tintos ou conatos na base, glabros ou pubescentes, grãos de pólen três a seis - colporados; carpelos quatro a cinco - muitos, sincárpicos, um estilete, raros carpelos distintos e unidos somente por seus estiletes e estigmas; ovário súpero, placentação axilar, óvulos um - vários/lóculo; disco nectarífero presente, intra-estaminal. Fruto drupa, cápsula, sâmara, folículo ou baga variavelmente desenvol- vida (mesocarpo homogêneo ou não, casca dura a coriácea, com ou sem distinções entre si, gomos ou polpa derivados da parede do ovário ou de tricomas multicelulares, provenientes da epiderme do carpelo e preenchidos por suco). Embrião reto a curvado, endosperma presente ou ausente. Distribuição geográfica: Cosmopolita, mas, prin- cipalmente, nas regiões tropicais e subtropicais. A família Rutaceae é considerada monofilética por sinapomorfias com cavidades contendo óleos etéreos (aparecendo como pontos translúcidos no mesofilo e outros tecidos macios da planta) e pelos estudos moleculares de rbcl e atp B do DNA de cloroplasto (Judd et al., 1999). Segundo Judd et al. (1999), a família apresen- ta 155 gêneros e cerca de 930 espécies. Várias espécies de Citrus (laranjas, tangerinas, toranjas, cidra, limão, lima) são apreciadas por seus frutos comestíveis; frutos de Fortunella e Casimiroa são também comestíveis. Espécies de Ruta (arruda), Zantoxylum, Citrus e Casimiroa são usadas me- dicinalmente. A família contém muitas espécies ornamentais, principalmente, dos gêneros Murraya, Phelloden- dron, Poncirus, Severinia e Triphasia. Os compos- tos resiníferos característicos de Rutaceae são in- flamáveis e a madeira de uns poucos gêneros, tais como Amyris, é usada como combustível e tochas. As subfamílias são tradicionalmente reconhe- cidas, principalmente, pelo tipo de fruto, número e conação dos carpelos. A maioria dos gêneros na subfamília Aurantioideae, grupo caracterizado pelas bagas globosas e pelo número básico de nove cromossomos, forma, provavelmente, um clado monofilético. Rutaceae subfam. Aurantioideae Horan. (sensu Swingle & Reece, 1967) Tribe Citreae (3 subtribos, 28 gêneros, 124 espécies, 18 variedades) Subtri- bo Citrinae (3 grupos subtribais, 13 gêneros, 65 espécies, 15 variedades) Citrus (16 espécies, 8 variedades) 3.2 Rutaceae Juss. subfam. Auran- tioideae Horan., Char. Ess. Reg. Veg.: 203.1847 Aurantiaceae Juss., Gen. Pl.: 260. 1789. Tipo: Aurantium Tournef. ex Miller (= Citrus L.) Árvores ou arbustos, perenifólios (exceto em três gêneros monotípicos, Poncirus, Aegle e Fe- ronia, e em três espécies de Clausena e uma de Murraya). Flores geralmente alvas e aromáticas. Muitos dos gêneros portam frutos subglobosos com uma casca verde, amarela ou laranja, dotada de numerosas glândulas oleíferas, que, muitas vezes, dão um agradável aroma quando o fruto é manu- seado (Swingle & Reece, 1967). A subfamília Aurantioideae é originária do Ve- lho Mundo. Dos 33 gêneros que a constituem, não menos que 29 são nativos da região de Monções (sudeste da Ásia), sendo 27 endêmicos a esta. Muitas espécies de Citrus e de gêneros intimamen- te relacionados são atualmente encontrados em to- das as regiões tropicais e subtropicais do mundo, tanto para cultivo como ornamental. A subfamília Aurantioideae está dividida em duas tribos: Clauseneae e Citreae (Tabela 1). A Clauseneae Wight & Arn. (3 subtribos, 5 gêne- ros, 79 espécies, 20 variedades) compreende as espécies filogeneticamente distantes de Citrus. As espécies têm, geralmente, frutos pequenos, muito diferentes daqueles de Citrus, normalmente semi- secos e não palatáveis. A tribo Citreae Meissner será discutida abaixo mais detalhadamente 3.3 Tribo Citreae Meissner Pequenas árvores ou lianas lenhosas, quase sempre com espinhos axilares, únicos ou aos pa- res nos nós dos ramos; folhas persistentes (exceto em três gêneros monotípicos, Poncirus, Aegle, Fe- ronia), geralmente simples ou um-três - folioladas, ou algumas vezes, imparipinada, com folíolos opostos, pecíolo muitas vezes alado. Flores em fascículos axilares ou em panículas, geralmente aromáticas; cálice com três a cinco sépalas; corola imbricada na prefloração, três a cinco (raramente seis) pétalas; estames dois a quatro ou tanto quan- CITROS130 Taxonomia dos citros 131 to as pétalas; ovário dois a 18 locular, um a 18 (geralmente um a 12) óvulos/lóculo (22 ou mais em Burkillanthus). Frutos como laranja ou limão na aparência externa, muitas vezes pequenos e vermelhos ou bagas suculentas negras. Os lóculos desses frutos contêm tricomas multicelulares que podem ser preenchidas com suco, observados em representantes da subtribo Citrinae, ou preenchi- dos com uma goma mucilagenosa, observados em representantes das subtribos Triphasiinae e Balsa- mocitrinae. Sementes um-vários embriões, se com vários somente um (raramente dois) é verdadeiro; os demais são desenvolvidos do nucelo e crescem no saco embrionário; germinação hipógina ou epígina (Swingle & Reece, 1967). A Tribo Citreae contém 28 gêneros com 124 espécies que estão divididas em três subtribos (Swingle & Reece, 1967). 3.4 Subtribo Citrinae A subtribo Citrinae apresenta 13 gêneros e 65 espécies. Difere das demais pela presença de fruto contendo tricomas com polpa, estruturas muito peculiares que surgem das paredes dos lóculos (epiderme interna dos carpelos, especialmente da parede dorsal) e crescem na cavidade locular, desenvolvendo sacos preenchidos por numerosas células grandes, com paredes muito finas, conten- do um suco aqüoso. Os 13 gêneros se subdividem em três grupos que diferem entre si pelo tamanho, forma e posição das vesículas. Na subtribo Citrinae, os frutos apresentam vesículas altamente especializadas e atingem o máximo desenvolvimento no gênero Citrus. Essas vesículas constituem a base da mais importante in- dústria de sucos nos países tropicais, já que contêm suco potável e de grande significância comercial. Até o momento, elas não foram encontradas em frutos de nenhum outro grupo de angiospermas. 3.5 Citrus L. Sp. Pl. 2: 782.1753 Citrophorum Neck., Elem. 2: 401. 1790. Sarcodactylis Gaertn. f., Fruct. & Sem. 3: 39, tab. 185. 1805. Papeda Hassk., Flora 25, Beilb. 2: 42. 1842. Espécie-tipo: Citrus medica L. Arbustos ou arvoretas; ramos jovens com um único espinho na axila das folhas, ramos maisve- lhos muitas vezes sem espinhos; folhas unifoliola- das ou simples em C. medica; pecíolo geralmente (sub) alado. Inflorescências de flores solitárias ou em pequenos fascículos axilares. Flores perfeitas, raramente estaminadas, aromáticas, cálice qua- tro-cinco - meras, cupuliforme, lobos distintos ou dentes diminutos, pétalas quatro a oito (geralmen- te cinco), lineares a oblongas, livres, imbricadas, alvas, glandulosas; estames numerosos 20 a 40, poliadelfos; ovário composto de oito a 15 carpelos conatos, circundado na base por disco intra-esta- minal anular. Fruto baga do tipo especial hespe- rídio (lóculos do ovário preenchidos por tricomas multicelulares repletos de suco, aderidos à parede interna do carpelo), globosa a ovóide ou obovói- de, com muitas sementes; poliembrionia comum. 4 Relações filogenéticas na subfamília Aurantioideae 4.1 Subfamília Aurantioideae Essa subfamília, embora reconhecida como um grupo monofilético dentro da família Rutaceae (Judd et al., 1999; Samuel et al., 2001), apresenta variações quanto ao número de tribos e subtribos proposto nos diferentes sistemas de classificação, bem como suas relações de afinidade. Caracte- rísticas como forma de cultivo, alta intercompati- bilidade sexual e poliembrionia, associadas aos distúrbios no habitat, respondem pela complexi- dade taxonômica observada nesse grupo (Scora, 1975). Dentre os sistemas de classificação mais rele- vantes, destaca-se o de Engler (1931), que descre- veu uma tribo e duas subtribos para a subfamília Aurantioideae; o de Tanaka (1932), que aumentou esses números para oito tribos e oito subtribos e, finalmente, o sistema proposto por Swingle (1943) e Swingle & Reece (1967), dividindo a subfamília em duas tribos e seis subtribos (Tabela 1). Embora o sistema de classificação proposto por Swingle (1943) ainda seja o mais amplamente aceito, estudos filogenéticos, inferidos a partir de caracteres macromoleculares e quimiotaxonômi- cos, têm revelado que vários grupos propostos por esse autor são artificiais. Nova classificação foi proposta, com base, principalmente, em análises quimiotaxonômicas, por Da Silva et al. (1988). Nesse trabalho, foi su- gerida a existência de seis tribos para a subfamília Aurantioideae: quatro dessas seriam formadas CITROS130 Taxonomia dos citros 131 Tabela 1 Representantes da subfamília Aurantioideae segundo a classsificação de Swingle & Reece (1967) Tribo Subtribo Grupo subtribal Gêneros Clauseneae Micromelinae Micromelum Clauseninae Glycosmis Clausena Murraya Merriliinae Merrilia Citreae Triphasiinae Grupo Wenzelia Wenzelia Monanthocitrus Oxanthera Merope Grupo Triphasia Triphasia Pamburus Grupo Luvunga Luvunga Paramignya Citrinae “Árvore de citros primitivos” - (Grupo A) Severinia Pleiospermium Burkillanthus Limnocitrus Hesperethusa “Árvores de frutos similares a citros” - (Grupo B) Citropsis Atalantia “Árvores de citros verdadeiros” - (Grupo C) Fortunella Poncirus Microcitrus Eremocitrus Clymenia Citrus Balsamocitrinae Grupo Tabog Swinglea Grupo Bael-fruit Aegle Afraegle Aeglopsis Balsamocitrus Grupo Wood-Apple Feronia Feroniella por representantes da tribo Clauseneae e as outras duas pelos representantes da tribo Citreae (sensu Swingle, 1943). Tal classificação foi criticada por Waterman (1990), que considerou prematura a proposição de novas tribos para essa subfamília. Para o autor, as análises fitoquímicas realizadas por Da Silva et al. (1988) não apóiam a separa- ção dos representantes da tribo Clauseneae em tribos distintas. Samuel et al. (2001), com base em dados mo- leculares e fitoquímicos, e Guerra et al. (2000), estudando padrão de bandeamento cromossômi- co e acréscimo na quantidade de heterocromatina por conjunto haplóide, propõem que a subdivisão dos representantes de Aurantioideae nas duas tri- bos (sensu Swingle, 1943), só se justificaria caso Merrilia e Murraya sect. Murraya fossem transfe- ridos da tribo Clauseneae para a tribo Citreae. CITROS132 Taxonomia dos citros 133 Desse modo, os gêneros da tribo Clauseneae seriam representados apenas por táxons con- tendo carbazol e uma pequena quantidade de heterocromatina por conjunto haplóide (< 5%). Eles sugerem, ainda, que as três subtribos de Ci- treae propostas por Swingle (1943) não formam grupos naturais. Segundo Waterman (1990), há uma clara dicotomia na tribo Clauseneae com base na ocorrência de alcalóides, formando duas li- nhagens: i) Murraya sect. Murraya e Merrilia, também conforme Kong et al. (1988), e ii) Mur- raya sect. Bergera, Clausena e Glycosmis, tendo Micromelum como gênero basal para a filogenia do grupo. Por sua vez, a análise de terpenóides sugere que alguns representantes das subtribos Balsamocitrinae (Aeglopsis e Afraegle) e Citri- nae (Pleiospermium) sejam mais relacionados à tribo Clauseneae do que à Citreae, contrariando a proposta de classificação de Swingle (1943). Em se tratando da classificação subtribal proposta por Swingle (1943) para a subfamília Aurantioideae (seis subtribos: Micromelinae, Clauseninae, Merriliinae, Triphasiinae, Citrinae e Balsamocitrinae), várias considerações são postuladas sobre o grau de parentesco desses grupos (Tabela 1). Para Engler (1931) e Swin- gle (1943), Balsamocitrinae e Citrinae podem ter sido originadas de um mesmo pool gênico ancestral e se desenvolvido independentemente. Para Tanaka (1936), o gênero Merrilia (= sub- tribo Merriliinae) representa uma forma transi- cional por sua similaridade na anatomia da ma- deira e na morfologia foliar e floral a Murraya (tribo Clauseneae = subtribo Clauseninae), en- quanto características do fruto e da semente as- semelham-se a Swinglea e Aegle (tribo Citreae e subtribo Balsamocitrinae). Samuel et al. (2001), que utilizaram dados moleculares e fitoquími- cos, postularam que nenhuma das subtribos reconhecidas por Aurantioideae reflete qualquer relação filogenética. Da mesma forma, Araújo et al. (2003) não encontraram suporte para as subdivisões da tribo Citreae em Triphasiinae, Citrinae e Balsamocitrinae. Neste trabalho, as três subtribos apareceram como uma politomia no clado de Citreae (Figura 1). Os resultados propostos por Da Silva et al. (1988) no entanto, agruparam representantes das subtribos Triphasiinae e Citrinae em uma nova tribo denominada Citrus, enquanto re- presentantes da subtribo Balsamocitrinae foram classificados na tribo Aegle. Outro estudo fito- químico revelou que a presença de limonóides (triterpenóides), considerada como apomorfia por Guerra et al. (2000), foi observada em re- presentantes de Triphasiinae e Citrinae, estando ausentes na tribo Clauseneae e subtribo Balsa- mocitrinae (Dreyer et al., 1972). De modo geral, os dados sugerem uma maior afinidade entre os representantes das subtribos Triphasiinae e Citrinae em relação àqueles da subtribo Balsamocitrinae. A condição monofiléti- ca, porém, para cada uma dessas subtribos não tem sido sustentada. 4.2 Subtribo Citrinae: taxonomia e filogenia Swingle & Reece (1967) classificaram os gêneros representantes da subtribo Citrinae como pertencentes a três grupos: 1. “árvores de citros primitivos” (“Primitive Citrus Fruit Trees” - Grupo A); 2. “árvores de frutos similares a citros” (“Near-Citrus Fruit Trees”- Grupo B); e 3. “árvores de citros verdadeiros” (“True Citrus Fruit Trees” - Grupo C) (Tabela 1). Entre esses, a condição monofilética tem sido sustentada apenas para o grupo C (Samuel et al., 2001; Araújo, 2002). O grupo A caracteriza-se por seus frutos apre- sentarem polpa contendo vesículas sem forma defi- nida, que se desintegram liberando óleo ou resina quando maduros. O B salienta-se pela presença de frutos contendo vesículas cônicos,que se encontram incrustadas por toda a parede do lóculo. Esses dois grupos apresentam androceu diplostêmone. O grupo C, por sua vez, distingue-se pela pre- sença de frutos do tipo baga, cujas vesículas de suco são delgadas e pedunculadas; encontram-se fracamente unidas, estando incrustadas apenas na parede dorsal do lóculo. O androceu é do tipo polistêmone. Severinia (Grupo A) e Atalantia (Grupo B) agru- param-se, inicialmente, por Engler (1931) em um único gênero. No entanto, Swingle & Reece (1967) agruparam-nos, em Atalantia, espécies com carac- teres apomórficos (flores grandes e vesículas cônicas de suco) e em Severinia as espécies com caracteres plesiomórficos. Estudos filogenéticos com base na análise de dados macromoleculares sugerem que Severinia (Grupo A) e Atalantia (Grupo B) apre- sentam maior afinidade entre si do que em relação a Hesperethusa (Grupo A) (Araújo et al., 2003). CITROS132 Taxonomia dos citros 133 Figura 1 Uma das três árvores mais parcimoniosas [97 passos, ci = 0,9588 e ri = 0,9649] idêntica a árvore consenso, originada da análise das regiões trnL(UAA)-trnF(GAA) e trnT(UGU)-trntL(UAA), considerando como informativos gap e mutação de ponto. Teste bootstrap foi realizado com 100 reamostragens Fonte Araújo (2002) CITROS134 Taxonomia dos citros 135 Da mesma forma, Guerra et al. (2000) observa- ram um padrão de bandeamento e porcentagem de heterocromatina similar para representantes dos dois primeiros gêneros. Atalantia (grupo B) tem uma posição confli- tuosa dentro da filogenia da subtribo Citrinae, correspondendo a um gênero de grande diver- sidade genética (Herrero et al., 1996a, b). A estrutura do fruto de Atalantia subg. Atalantia é mais similar àquela apresentada por espécies do grupo C, pela presença de vesículas de suco na maturidade, mas diferem do C por serem sésseis, com a base larga, encontrando-se in- crustadas em toda a parede lateral dos lóculos. Em Atalantia subg. Rissoa, a estrutura do fruto é bastante diferente: quase seco, sugerindo que o grupo não seja monofilético, uma possibilida- de também inferida por dados isoenzimáticos (Herrero et al., 1996b). Estudos fitoquímicos e macromoleculares, contudo, apóiam a condi- ção monofilética para Atalantia (Samuel et al., 2001). Estudos moleculares de cpDNA sugerem que a presença do fruto tipo hesperídeo em Atalan- tia e no Grupo C (clado Citrus) deve-se a uma convergência do caráter. No entanto, a raridade dessa estrutura entre as Angiospermas torna pou- co provável a hipótese de que esse caráter tenha surgido, independentemente, em grupos de Ru- taceae. Desse modo, a hipótese da existência de um clado unindo Atalantia ao Grupo C não deve ser rejeitada (Araújo et al., 2003). Na segunda hipótese, as vesículas de suco (sésseis, com base larga, incrustadas em toda a parede locular), encontradas em Atalantia, deve provavelmente corresponder ao estado primitivo das vesículas de suco (pedunculadas, incrustadas na parede dorsal do lóculo), encontradas no clado-Citrus (Araújo et al., 2003). 4.3 Grupo Subtribal - “árvores de ci- tros verdadeiros” - Grupo C Swingle & Reece (1967) classificaram Ci- trus como representante do grupo “árvores de citros verdadeiros” (grupo C) juntamente com Poncirus, Microcitrus, Eremocitrus, Clymenia e Fortunella (Tabela 1). Estudos filogenéticos com base na análise de dados moleculares têm dado suporte à condição monofilética para esse grupo (Araújo & Machado, 1999; Samuel et al., 1999, 2001; Araújo et al., 2003), - pela presença das seguintes sinapomorfias: numerosos estames (pelo menos quatro vezes o número das pétalas) e bagas contendo vesículas de suco alongadas, pedunculadas e unidas na parede dorsal do lóculo. A grande afinidade genética que existe entre os gêneros representantes do grupo C tem sido reve- lada pela intercompatibilidade sexual (Iwamasa et al., 1988), organização do genoma (Iwamasa & Nito, 1988; Guerra et al., 2000), similaridade em caracteres morfológicos (Barret & Rhodes, 1976) e isoenzimáticos (Rahman et al., 1994; Herrero et al., 1996b), além de análises do DNA (Federici et al., 1998). Burkill (1931) tratou os gêneros intimamente relacionados a Citrus como subgêneros de um único gênero, Citrus. De acordo com estudos filogenéticos, com base em dados moleculares, não existe uma clara separação entre Fortunella e Citrus (Yamomoto et al., 1993; Herrero et al., 1996b; Nicolosi et al., 2000). Mabberley (1998), ao analisar caracteres morfológicos, propôs a inclusão dos representantes de Microcitrus e Ere- mocitrus em Citrus. Recentes estudos moleculares colocaram Citrus como grupo polifilético, em vista da posição isolada de C. medica dentro do clado que contempla Citrus e gêneros afins, e sugere uma delimitação mais ampla para Citrus, incluin- do todos os representantes do grupo C no gênero (Araújo et al., 2003; Figura 1). Uma clara associação é observada entre Ponci- rus, Fortunella, Citrus e Microcitrus (Herrero et al., 1996b). Estudos com base em caracteres morfo- lógicos (Swingle & Reece 1967; Barret & Rhodes, 1976), isoenzimáticos (Herrero et al., 1996b) e citogenéticos (Iwamasa & Nito, 1988) sugerem maior divergência de Poncirus em relação a Citrus, Microcitrus e Fortunella. Esta apresenta maior simi- laridade genética com o grupo das laranjas-tange- rinas, enquanto Microcitrus revela maior afinidade com o complexo cidra-lima-limão (Herrero et al., 1996b); Federici et al., 1998) 5 Relações filogenéticas entre repre- sentantes de Citrus sensu Swingle & Reece (1967) De acordo com a classificação proposta por Swingle & Reece (1967), os representantes de Citrus podem ser agrupados em dois subgêneros: CITROS134 Taxonomia dos citros 135 Citrus subgênero Citrus (dez espécies) e Citrus subgênero Papeda (seis espécies). Araújo et al. (2003) observaram a formação de um grupo monofilético entre representantes dos subgêneros Papeda e Citrus, sugerindo que C. hystrix (subgê- nero Papeda) apresenta maior afinidade com representantes do grupo das toranjas (subgênero Citrus) em relação a outros representantes de Papeda analisados (C. ichangensis e C. yunos). Além disso, C. medica se encontra fora do clado que agrupa as demais espécies de Citrus, cor- roborando a condição não monofilética para o subgênero Citrus (Figura 1). Tanaka (1969) propôs que os representantes do subgênero Papeda, considerados por ele como os mais “primitivos”, teriam dado origem à C. aurantiifolia, que, por sua vez originou as toranjas e o complexo cidra-limão. As laranjas teriam surgido, posteriormente, a partir das to- ranjas (C. grandis). Muitos trabalhos, no entanto, apóiam a hipóte- se de que a maioria dos táxons de Citrus foi origi- nada segundo um padrão de evolução reticulado. A condição híbrida para muitos dos representantes desse gênero tem sido corroborada pelas mais va- riadas fontes (Potvin et al., 1983; Luro et al., 1992; Herrero et al., 1996a, b; Federici et al., 1998). Barret & Rhodes (1976) propuseram que apenas C. medica, C. grandis, C. reticulata e C. halimii correspondem às verdadeiras espécies do subgê- nero Citrus, sendo as demais consideradas como híbridos naturais. 5.1 Filogenia inferida a partir de da- dos controlados pelo núcleo celular Estudos de similaridade têm sido utilizados para inferir as relações de afinidade em Citrus. A análise de dados controlados, predominantemen- te, pelo genoma nuclear tem apoiado a hipótese de que três espécies - C. medica, C. grandis e C. reticulata, - constituem a base da origem das “es- pécies” comerciais desse gênero. Barret & Rhodes (1976), analisando dados morfológicos, e Potvin et al. (1983), utilizando dados bioquímicos, sugeriram a existência de dois grupos dentro do subgênero Citrus. Um maior, correspondendoàs laranjas-tangerinas, é formado por C. reticulata, C. sinensis, C. aurantium, C. grandis e C. paradisi, enquanto o outro, representando o complexo cidra-lima- limão, é formado por C. medica, C. aurantiifolia e C. limon. Herrero et al. (1996b), analisando dez sis- temas isoenzimáticos, observaram a formação de dois agrupamentos que corresponderiam aos grupos laranjas-tangerinas e o das cidras-limas- limões-pomelos. Federici et al. (1998), analisando padrões de restriction fragment length polymor- phisms (RFLP) e random amplified polymorphic DNA (RAPD), verificaram a formação de um gru- po com representantes de cidras, limas e limões e outro envolvendo representantes das tangerinas e laranjas. Maior similaridade genética tem sido su- gerida para C. grandis e alguns representantes do subgênero Papeda (Herrero et al., 1996b; Federici et al., 1998). Nicolosi et al. (2000), estudando as relações de representantes de Citrus e gêneros afins com base na análise de marcadores moleculares do tipo sequence-characterized amplified regions (SCAR) e RAPD, detectaram a existência de oito grupos que se distribuiriam da seguinte forma: i) Grupo das cidras - C. medica, C. aurantiifolia, C. macrophylla, C. limon, C. bergamia, C. limettio- ides, C. jambhiri, C. limonia e C. volkameriana, ii) Grupo das tangerinas - C. tachibana e C. reti- culata, num primeiro subgrupo, e C. paradisi, C. aurantium, C. sinensis e C. yunos, num segundo, iii) Grupo das toranjas - C. grandis e C. celebi- ca, iv) Grupo ichang - C. ichangensis, v) Grupo fortunella - Fortunella margarita e C. indica, vi) Grupo Micrantha - C. hystrix, C. micrantha, C. macroptera e C. latipes (todos representantes do subgênero Papeda), vii) Grupo Poncirus - Ponci- rus trifoliata, e viii) Grupo Microcitrus - M. austra- lis e Eremocitrus glauca. 5.2 Filogenia inferida com base em dados de origem citoplasmática A análise de dados de origem mitocondrial e de cloroplasto sugere grupos de afinidade cito- plasmática para Citrus, separando C. grandis, C. reticulata e C. medica em grupos distintos, e corro- bora a hipótese de tais espécies comporem a base da formação de híbridos naturais representantes do subgênero Citrus (Green et al., 1986, Handa et al., 1986; Yamamoto et al., 1993; Nicolosi et al., 2000; Araújo, 2002). CITROS136 Taxonomia dos citros 137 Green et al. (1986), analisando o genoma de cloroplasto por RFLP, observaram grande similaridade entre C. grandis, C. aurantium, C. sinensis, C. limon e C. paradisi, que por sua vez, apresentaram maior divergência em relação ao padrão apresentado por C. medica e C. reticulata. Yamamoto et al. (1993), analisando dados de RFLP de genoma mitocondrial, verificaram a formação de dois grupos distintos que corresponderiam ao grupo das toranjas e do das tangerinas. O das tangerinas foi formado por representantes de C. reticulata, C. tachibana (Swingle, 1943) e tango- res (C. sinensis x C. reticulata). O das toranjas foi dividido no subgrupo toranja (C. grandis, C. para- disi, C. sinensis, C. aurantium, C. limon, Kunenbo, Natsudaidai, Hassaku, Sudachi, Hyuganatsu e Iyo) e no subgrupo Yuzu (representantes Citrus subg. Papeda, Fortunella e C. aurantiifolia). Tanto C. medica quanto P. trifoliata apresentaram ampla divergência citoplasmática em relação a esses dois grupos (Yamamoto et al., 1993). Araújo (2002), analisando o segmento de origem mitocondrial 18S-5S, observou um padrão de herança estritamente materno para Citrus. Por suas sinapomorfias, foram definidas duas linhagens maternas para o subgênero Ci- trus. A das toranjas é formada por C. grandis, C. sinensis, C. aurantium, C. limon, C. latifolia, C. limettioides e C. paradisi, enquanto a linha- gem materna das tangerinas é formada por C. reticulata (Sunki, Ponkan, Clementina, Dancy e Satsuma), C. jambhiri, C. limonia e C. volka- meriana. Ele também observou a formação das mesmas linhagens ao analisar os segmentos trnL(UAA)-trnF(GAA) e trnT(UGU)-trnL(UAA), oriundos do cloroplasto. Os segmentos de ori- gem mitocondrial e de cloroplasto permitiram separar C. medica, C. grandis e C. reticulata, de forma a sugerir que C. medica apresentaria maior divergência dentro do grupo por suas mo- léculas com caracteres plesiomórficos. As informações oriundas de análises de pro- teína e DNA de cloroplasto (Handa et al., 1986; Nicolosi et al., 2000; Araújo, 2002) e do DNA mitocondrial (Yamamoto et al., 1993) sugerem que C. medica apresente ampla divergência em relação aos outros representantes de Citrus, mesmo em relação a gêneros relacionados como Fortunella, Poncirus, Eremocitrus e Microcitrus. Esse táxon não contribuiu como parental materno na formação das espécies comerciais de Citrus (Araújo, 2002). 6 Diversidade genética de Citrus O gênero Citrus possui ampla diversidade ge- nética. A estrutura genética apresentada por seus táxons pode diferir de modo significativo, sendo observados diferentes níveis de variabilidade in- traespecífica e de heterosigozidade (Herrero et al., 1996a). Variações morfológicas em folhas, flores e, principalmente, em fruto, podem ser observadas entre espécies de Citrus. O fruto maduro pode ser oblato, ovóide e mesmo piriforme, com variações no tamanho, com diâmetros de 2 cm até mesmo 30 cm. A coloração da casca pode variar do amarelo ao verde, como nas limas, até ao vermelho-ala- ranjado, comum nas tangerinas (Swingle & Reece, 1967). Embora o fenômeno da poliploidia responda por parte da variabilidade observada em plantas superiores, apresentando particular importância na evolução destes organismos estudos citogené- ticos revelaram que, em Citrus, a ocorrência, na natureza, de indivíduos com variação no número de cromossomos é incomum. Indivíduos triplóides e tetraplóides têm sido observados, bem como variações cromossômicas estruturais dos tipos inversão e translocação (Iwamasa & Nito, 1988). A mutação gênica é considerada responsável por parte significativa da variação observada em espécies comerciais, cuja propagação é, predo- minantemente, vegetativa (Hodgson 1967; Fang & Roose 1997). A hibridação, no entanto, parece ser a maior causa da variabilidade nas espécies de Citrus (Herrero et al., 1996a). Dados morfológicos e moleculares sugerem que grande parte dos representantes desse gênero apresente origem híbrida (Barret & Rhodes, 1976; Handa et al., 1986; Federici et al., 1998). Guerra (1993), através de estudos com bandeamento cromos- sômico, observou que as seis espécies de Citrus analisadas C. sinensis, C. medica, C. limon, C. limonia, C. grandis e C. aurantium apresenta- vam, pelo menos, um par de cromossomos em heterozigose. Herrero et al. (1996a), estudando a diversidade genética com base em isoenzimas, constataram que a heterozigosidade em repre- CITROS136 Taxonomia dos citros 137 sentantes de Citrus é bastante variável: obser- varam um elevado grau para os representantes do grupo dos limões (C. limon, C. meyeri, C. karna, C. volkameriana), limas (C. limettioides, C. aurantiifolia e C. latifolia) e C. bergamia. As espécies C. sinensis, C. clementina, C. tangeri- na, C. temple e alguns representantes de Citrus subgênero Papeda (C. hystrix, C. ichangensis e C. macropthera) apresentaram heterozigosida- de média e uma pequena foi observada em C. aurantium, C. halimii, C. tachibana, C. paradisi e C. deliciosa, reduzindo gradualmente para os táxons C. medica, C. grandis, C. unshiu, C. sunki, até chegar a um nível mínimo, apresenta- do por C. reshni. Em Citrus, o grupo das tangerinas correspon- de àquele de maior diversidade genética. Swingle (1943) tratou todas as tangerinas, com exceção de C. tachibana e C. indica, como sinônimos de C. reticulata. Para Tanaka (1954), as tangerinas são representadas por 36 espéciesque podem ser organizadas em cinco diferentes grupos. Para Hodgson (1967), as tangerinas economicamen- te importantes representam quatro espécies: C. unshiu (Satsuma), C. reticulata (Ponkan, Dancy e Clementina), C. deliciosa Tenore (Willowleaf) e C. nobilis Lour. (King). A ampla diversidade genética apresentada pelas tangerinas tem sido confirmada pelo emprego de diversas técnicas de análise molecular, como isoenzimas (Herrero et al. 1996a), RAPD (Coletta Filho et al. 1998; Federici et al. 1998), RFLP (Federici et al., 1998) e microssatélite (Fang & Roose, 1997; Fang et al.,1998). Outros representantes do subgênero Citrus, correspondentes aos pomelos (C. paradisi), la- ranjas doces (C. sinensis), limões (C. limon) e limas (C. aurantiifolia), apresentam menor varia- bilidade genética, em vista, em grande parte, da sua história de cultivo, caracterizada pela ação da seleção artificial, associada à propagação vegetativa. C. sinensis tem sua diversidade atri- buída à ação de pequenas mutações, que resulta- ram em modificações em caracteres horticulturais como características do fruto (Hodgson, 1967). De modo similar, os cultivares de C. paradisi apresentam pequenas variações, tendo sua ori- gem atribuída a sucessivos eventos de mutação ocorridos a partir de uma mesma árvore ances- tral (Gmitter, 1995). Estudos com base em marcadores microssaté- lites (ISSR) revelaram ampla diversidade genética para as tangerinas em relação aos limões, que, por sua vez, apresentaram maior diversidade genética em relação às laranjas doces e pomelos (Fang & Roose 1997). 7 Origem genética de “espécies” co- merciais de citros Atualmente, a maioria das espécies de Citrus tem sido considerada como resultado de hibri- dação natural. A ocorrência de introgressão de outros gêneros na formação de alguns dos seus representantes também tem sido sugerida. Mi- crocitrus estaria envolvido na formação de C. aurantiifolia (Barret & Rhodes 1976), enquanto representantes de Fortunella estariam envolvidos na origem de C. madurensis Lour. e C. microcarpa Bunge (Swingle & Reece 1967). Algumas das propostas da origem genética se- rão discutidas com base nas linhagens maternas, sendo sugeridos os cruzamentos mais prováveis (sublinhados) para as seguintes “espécies comer- ciais” de Citrus (Tabela 2). 7.1 Citrus limon (L.) Burm. f. Cruzamentos propostos: C. medica x C. aurantiifolia (Swingle, 1943; Malik et al., 1974); C. aurantium x C. medica (Nicolosi et al., 2000, Gulsen & Roose, 2001). Para Malik et al. (1974), C. limon apresenta origem genética incerta. Esses autores consideram as cidras (C. medica) como um dos parentais dos limões, embora sugiram que outra fonte de genes, fora do complexo cidra-lima, possa ter contribuído na formação desse táxon. Hirai & Kozaki (1981) sugerem que C. sinensis, C. aurantium ou C. reticu- lata possam representar o outro parental de C. li- mon, juntamente com C. medica. Estudos recentes, com base em dados nucleares e citoplasmáticos, apontam para o cruzamento C. aurantium x C. medica como o responsável pela origem dos li- mões verdadeiros (C. limon) (Nicolosi et al., 2000; Gulsen & Roose, 2001). Dados citoplasmáticos corroboram a hipótese de C. aurantium correspon- der ao parental materno de C. limon (Green et al., 1986, Handa et al., 1986; Yamamoto et al., 1993; Nicolosi et al., 2000; Araújo, 2002). CITROS138 Taxonomia dos citros 139 Tabela 2 Algumas espécies de Citrus utilizadas comercialmente segundo a classificação de Swingle (1943) e seus sinônimos correspondentes na classificação de Tanaka (1977)a Swingle Tanaka Citrus aurantiifolia (Christm.) Swingle C. aurantiifolia (Christm.) Swingle C. bergamia Risso & Poit. C. davaoensis Tanaka C. excelsa Wester C. hyalopulpa Tanaka C. javanica Blume. C. latifolia Tanaka C. limettioides Tanaka C. longispina Wester C. macrophylla Wester C. montana Tanaka C. obversa Hassk. C. ovata Hassk. C. papaya Hassk. C. pennivesiculata (Lush.) Tanaka C. pseudolimonum Wester C. webberii Wester C. aurantium L. C. aurantium L. C. canalicuta hort ex Y. Tanaka C. rokugatsu hort ex Y. Tanaka C. yanbaruensis Tanaka C. aurantium híbrido C. iriomotensis Tanaka C. papillaris Blanco C. pseudopapillaris Tanaka C. taiwanica Tanaka & Shim C. limon (L.) Burm. f. C. assamensis Dutta & Bhatt C. aurata Risso C. balotina Poit. & Türpe C. duttae Tanaka C. jambhiri Lush. C. karna Raf. C. limetta Risso C. limon (L.) Burm. f. C. limonia Osbeck C. longilimon Tanaka C. lumia Risso & Poit. C. microlimon Tanaka C. megaloxycarpa Lush. C. mellarosa Risso C. meyeri Y. Tanaka C. peretta Risso C. pseudolimon Tanaka C. pyriformes Hassk. continua CITROS138 Taxonomia dos citros 139 C. rissoi Risso C. sarbati Tanaka C. volkameriana Tanaka C. paradisi Macfad. C. ampullacea hort. ex Tanaka C. anonyma hort. ex Y. Tanaka C. asahikan hort. ex Tanaka C. aurantiaca hort. ex Tanaka C. flavicarpa hort. ex Tanaka C. glaberinna hort. ex Tanaka C. hassaku hort. ex Y. Tanaka C. himekitsu hort. ex Y. Tanaka C. hiroshimana hort. ex Y. Tanaka C. intermedia hort. ex Tanak C. iwaikan hort. ex Y. Tanaka C. kotokan Hay C. medioglobosa hort. ex Tanaka C. miaray Wester C. mitsuharu hort. ex Y. Tanaka C. natsudaidai Hay C. obovoidea hort. ex Tanaka C. omikanto hort. ex Y. Tanaka C. otachibana hort. ex Y. Tanaka C. paradisi Macfad. C. pseudoparadisi hort. ex Y. Tanaka C. rugulosa hort. ex Tanaka. C. sulcata hort. ex Tanaka C. tengu hort. ex Tanaka C. tosa-asahi hort. ex Y. Tanaka C. yamabuki hort. ex Y. Tanaka C. yuge-hyokan hort. ex Y. Tanaka C. sinensis (L.) Osbeck C. aurea hort. ex Tanaka C. funadoko hort. ex Y. Tanaka C. iyo hort. ex Tanaka C. luteo-turgida Tanaka C. oblonga hort. ex Y. Tanaka C. shunkokan hort. ex Tanaka C. sinensis (L.) Osbeck C. sinograndes hort. ex Tanaka C. tamurana hort. ex Tanaka [C. maxima (Burm.) Merr. x Citrus sp.] C. tankan Hay C. temple hort. ex Y. Tanaka C. ujukitsu hort. ex Tanaka a Espécies em negrito estão citadas no texto Tabela 2 Conclusão Swingle Tanaka CITROS140 Taxonomia dos citros 141 7.2 Citrus aurantiifolia (Christm.) Swingle Cruzamentos propostos: C. medica x C. grandis x Microcitrus (Barret & Rhodes, 1976). C. medica x Papeda (Torres et al., 1978) Estudos citoplasmáticos sugerem ser pouco provável que C. medica, C. grandis ou Microcitrus possam ter contribuído como parental materno na formação de C. aurantiifolia, descartando, portanto, o cruzamento trihíbrido proposto. Maior similaridade citoplasmática é observada entre re- presentantes Papeda e C. aurantiifolia em relação a C. grandis. Além disso, análises isoenzimáticas revelam que Papeda e C. aurantiifolia compar- tilham de alelo raro, não encontrado em outros representantes do subgênero Citrus, corroborando a hipótese da contribuição de um representante Papeda na formação de C. aurantiifolia, como sugerido por Torres et al. (1978). Nicolosi et al. (2000) sugerem que o representante Papeda, envolvido na formação desse táxon, deva ser C. micrantha ou um táxon similar. 7.3 Citrus sinensis (L.) Osbeck Cruzamento proposto: C. grandis x C. reticulata (Swingle & Reece, 1967; Barret & Rhodes, 1976). Os dados citoplasmáticos sugerem a contribui- ção materna de C. grandis na formação de C . sinensis (Green et al., 1986, Handa et al., 1986; Yamamoto et al., 1993; Nicolosi et al., 2000; Araújo, 2002). 7.4 Citrus aurantium L. Cruzamento proposto: C. grandis x C. reticulata (Swingle & Reece, 1967; Barret & Rhodes, 1976). Os dados citoplasmáticos sugerem a contribui- ção materna de C. grandis na formação de C. au- rantium (Green et al., 1986;Handa et al., 1986; Yamamoto et al., 1993; Nicolosi et al., 2000; Araújo, 2002). 7.5 Citrus limettioides Tanaka Cruzamentos propostos: C. aurantiifolia x C. limon (Webber, 1943); C. aurantiifolia x C. medica (Webber, 1943); C. aurantiifolia x C. sinensis (Barret & Rhodes, 1967). Esse táxon pertence à linhagem materna das toranjas, o que descarta a possibilidade de o cru- zamento C. aurantiifolia x C. medica ser o respon- sável pela sua origem (Araújo, 2002). Os dados citoplasmáticos apóiam a hipótese de tanto C. limon, quanto C. sinensis corresponderem a potên- cias parentais maternos de C. limettioides (Green et al., 1986, Handa et al., 1986; Yamamoto et al., 1993; Nicolosi et al., 2000; Araújo, 2002). 7.6 Citrus jambhiri Lush. Cruzamentos propostos: C. limon ou C. medica x C. reticulata (Swingle & Reece, 1967; Barret & Rhodes, 1976). Os dados citoplasmáticos apontam C. reticula- ta como provável parental materno na formação desse táxon (Araújo, 2002). 7.7 Citrus limonia Osbeck Cruzamentos propostos: C. medica x lima x espécie não identificada (Malik et al., 1974); C. medica x lima (Hodgson, 1967); C. medica x limão Rugoso (Hodgson, 1967). Os dados citoplasmáticos colocam C. limonia na linhagem materna das tangerinas, junto a C. reticulata, C. jambhiri e C. volkameriana, podendo ter, em qualquer um destes táxons, o seu parental materno (Araújo, 2002). Esses dados corroboram a proposta de Hodgson (1967) (C. medica x limão Rugoso) e colocam o limão Rugoso como provável parental materno desse táxon. 7.8 Citrus volkameriana V. Ten. & Pasq. Cruzamentos propostos: C. medica x C. aurantium (Deng et al., 1996; Nicolosi et al., 2000); C. medica x C. reticulata (Araújo, 2002). Nicolosi et al. (2000) sugeriram a introgressão de genes do grupo das tangerinas na formação de C. volkameriana. Estudos com base na aná- lise mitocondrial e de cloroplasto descartam a possibilidade de o cruzamento C. medica x C. aurantium ser o responsável pela sua origem. Esse CITROS140 Taxonomia dos citros 141 táxon pertence à linhagem materna das tangeri- nas, composta por C. reticulata, C. limonia e C. jambhiri (Araújo, 2002), o que reforça a hipótese de introgressão de genes oriundos do grupo das tangerinas na sua formação. O cruzamento C. medica x C. reticulata, portanto, corresponde à uma provável combinação para a origem genética de C. volkameriana, tendo em C. reticulata o seu parental materno. 7.9 Citrus paradisi Macfad. Cruzamento proposto: C. grandis x C. sinensis (Scora, 1975, Swingle & Reece, 1967). Ambos os táxons pertencem à mesma linha- gem materna dos pomelos. Estudos bioquímicos sugerem que C. sinensis tenha contribuído como doador de pólen na formação desse táxon. 8 Conclusões Estudos filogenéticos têm dado apoio à mono- filia da família Rutaceae e da subfamília Auran- tioideae. O sistema de classificação proposto por Swingle (1943), no entanto, para essa subfamília, tem sido objeto de grande discussão. Alguns grupos propostos por tal sistema são bastante consistentes, a exemplo do subtribal “árvores de citros verdadeiros”, correspondente a um grupo monofilético apoiado por variadas fontes de da- dos, entre elas, a intercompatibilidade reprodutiva observada entre seus táxons. Outros grupos, a exemplo da subtribo Balsamocitrinae, representam uma classificação artificial, associada à politomia observada nas análises filogenéticas, inferidas a partir de estudos macromoleculares. O cruzamento de dados morfológicos, citoge- néticos e moleculares sugere paralelismo na evolu- ção de alguns caracteres presentes na subfamília Aurantioideae. O acréscimo na quantidade de he- terocromatina, por exemplo, tem sido considerado uma apomorfia apresentada por táxons “avan- çados”, que pode ser observada tanto no grupo subtribal que contempla Citrus (subtribo Citrinae), quanto em representantes da tribo Clauseneae, como Murraya e Merrilia, que correspondem a gê- neros geneticamente pouco relacionados a Citrus. Características do fruto foram bastante uti- lizadas na determinação de subtribos e grupos subtribais por Swingle (1943). Algumas delas são bastante consistentes, a exemplo da vesícula de suco altamente especializada, que corresponde a uma sinapomorfia para o grupo das “árvores dos citros verdadeiros” (grupo C), não sendo relatado algo similar nas angiospermas, o que reforça a condição monofilética desse grupo. Paralelismo também é sugerido para a evolução de caracteres diagnósticos relacionados ao fruto. Por exemplo, a casca dura e lenhosa dos representantes da sub- tribo Balsamocitrinae parece ter sido originada, independentemente, fato evidenciado por carac- terísticas anatômicas e de desenvolvimento. Tal hipótese de paralelismo é reforçada pela filogenia inferida a partir da análise de dados moleculares. Uma cuidadosa reavaliação do sistema de classificação proposto por Swingle (1943) portan- to, deve ser realizada. Análises filogenéticas suge- rem que a subdivisão da subfamília Aurantioideae em duas tribos só se justifica caso Merrilia s.l. e Murraya s.s. sejam transferidos para a tribo Clau- seneae. Além disso, as subtribos propostas por esse sistema de classificação apresentam-se como grupos artificiais, não havendo suporte para sua manutenção. Por outro lado, a condição monofilé- tica tem sido observada para alguns táxons, como o grupo subtribal “árvores de citros verdadeiros” (Grupo C) e gêneros como Clausena, Micromelum, Glycosmis e Atalantia. Citrus apresenta grande diversidade genética e acentuada complexidade taxonômica pelos frágeis limites reprodutivos observados entre as espécies que o compõem, associados à apomixia facultativa e ação antrópica, que, por sua vez, burlou os limites geográficos existentes no curso natural da dispersão do grupo, através da sua ampla exploração comer- cial nas regiões tropicais e subtropicais. A delimitação genérica de Citrus, como proposto por Swingle (1943) e Tanaka (1977), forma um grupo polifilético com base em estudos filogenéticos recentes (morfológicos e moleculares, Mabberley, 1998; Araújo et al., 2003). Segundo Araújo et al. (2003), uma classificação mais natu- ral para o gênero Citrus deveria incluir os demais representantes do grupo C (Poncirus, Fortunella, Microcitrus, Clymenia e Eremocitrus). Entre os representantes do subgênero Citrus sensu Swingle apenas quatro espécies alopátricas - C. medica, C. grandis, C. reticulata e C. halimii - são consideradas como espécies verdadeiras. Os demais representantes desse grupo são tidos como híbridos naturais. CITROS142 Taxonomia dos citros 143 Um padrão de evolução reticulado tem sido proposto para a maioria dos citros, sendo a ori- gem genética de “espécies” comerciais de grande interesse para programas de melhoramento ge- nético. A análise de caracteres, controladas pelo genoma nuclear e citoplasmático, tem sido utiliza- da no intuito de inferir a origem genética desses táxons. Tais dados apóiam a hipótese de que C. medica, C. grandis e C. reticulata correspondam a espécies que formam a base genética das espécies comerciais do subgênero Citrus. De modo geral, a análise de caracteres contro- lados geneticamente pelo núcleo celular permitiu a determinação de grupos consistentes, como o complexo cidra-lima-limão e o grupo tangerinas- laranjas. O posicionamento das toranjas dentro do grupo se apresenta menos definido. Algumas dessas análises sugerem maior afinidade entre as toranjas e os representantes do subgênero Papeda, enquanto outras sugerem que elas estejam no gru- po laranjas-tangerinas. Por sua vez, a análise de caracteres de origem citoplasmática sugere a formação de grupos mais consistentes para Citrus, em relação àqueles ob- servados através de dadosde origem nuclear. Isso se deve, provavelmente, ao fato de as organelas citoplasmáticas de Citrus apresentarem um padrão de herança do tipo uniparental. Esses dados permi- tiram a determinação de duas linhagens maternas para o subgênero Citrus: as linhagens das toranjas e das tangerinas. Tais linhagens foram utilizadas para discutir alguns dos cruzamentos propostos para a origem das “espécies” comerciais, apon- tando possíveis parentais maternos envolvidos na sua formação, o que sugere a não participação de C. medica como parental materno na formação das “espécies” comerciais de Citrus. Novos estudos fazem-se necessários para melhor entendimento da evolução de caracteres morfológicos, bioquímicos e moleculares que estão diretamente relacionados ao processo de forma- ção e diversificação dos grupos representantes da subfamíla Aurantioideae. 9 Agradecimentos Aos Profs. José Rubens Pirani (Universidade de São Paulo), Eduardo Leite Borba (Univer- sidade Estadual de Feira de Santana) e Vera Pacheco (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia) pela leitura do manuscrito e pelas valio- sas sugestões. CITROS142 Taxonomia dos citros 143 10 Referências bibliográficas ARAÚJO, E.F. Relações filogenéticas em Citrus e gêneros afins. 2002. 111p. 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