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A textura aberta, H. Hart

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1 
A Vagueza no Direito 
 
 
1.1 
Considerações iniciais 
 
 
 Em qualquer sociedade de pessoas, as normas gerais, os padrões de 
conduta e os princípios formam o principal instrumento de controle social, 
transmitindo para a multidão de indivíduos que compõem esse grupo social regras 
de comportamento específicas para determinadas circunstâncias. 
 Tais orientações normativas devem ser reconhecíveis e compreensíveis por 
todo o universo de pessoas que compõem essa coletividade, no entanto, esses 
padrões de comportamento transmitidos por mais que funcionem e sejam eficazes 
na maioria dos casos comuns poderão se mostrar imprecisos em algum caso 
específico, já que os padrões são pensados para a generalidade dos casos, podendo 
ocorrer situações singulares em que a interpretação dessas normas gerais ou dos 
padrões de conduta seja inconsistente, contestada ou mesmo colocada em dúvida. 
 Dessa forma, muito se tem debatido atualmente sobre a atividade 
interpretativa em geral e mais precisamente sobre a interpretação jurídica, eis que 
a interpretação será o método de definição de uma norma geral aplicável a toda a 
sociedade, sendo certo que a proliferação de teorias e debates sobre o significado, 
conteúdo e extensão da interpretação jurídica tem sido extremamente relevante 
para a consolidação dos Estados democráticos na medida em que tais teorias 
sempre procuram explicar como órgãos e agentes públicos chegam as suas 
decisões, sobretudo nos casos singulares nos quais a aplicação da norma geral foi 
contestada. 
 Assim, a preocupação dos teóricos não se limita a encontrar os 
fundamentos ou as conclusões que motivaram a decisão da autoridade estatal, mas 
em explicar como ocorre todo o procedimento lógico-dedutivo desenvolvido pelo 
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 13 
intérprete para atribuir um significado a um determinado texto normativo2 eis que 
esse é o fruto do Legislativo e, como tal, traduz-se na expressão maior da 
soberania popular. 
 Nesse aspecto, a própria legitimidade dos atos estatais, administrativos ou 
judiciais, sempre decorre do devido zelo e da congruência entre a interpretação 
conferida ao texto pelo intérprete e o texto objeto de interpretação, isto porque 
desde que o povo foi reconhecido como entidade política3 que exerce o poder quer 
direta, quer indiretamente por meio de seus representantes, conduz a uma 
conclusão: O verdadeiro autor das leis da República é o povo, e, como poder 
legislativo, pode (deve) exigir a fiel execução das leis e a punição daqueles que as 
descumprem, isto é, o povo é o detentor do poder de fazer as leis, do poder de 
fazer com que elas sejam executadas e ainda de julgar a sua aplicação. 
 Ocorre que, diante da complexidade dos Estados contemporâneos, o povo 
acaba por não exercer diretamente4 esses poderes, sendo necessário nomear um 
corpo burocrático para exercer as funções legislativas, executivas e judiciárias em 
seu nome e em seu proveito, cabendo aos seus representantes criar e interpretar as 
leis atribuindo sentido e coerência ao texto. 
 O problema é que as leis são criadas nessas sociedades organizadas como 
instrumento de controle social, funcionando como normas gerais balizadoras de 
conduta (normas que dispõem sobre padrão geral de comportamento para 
multidão de indivíduos), sendo produzidas sempre de forma abstrata e genérica 
 
2
 Neste trabalho serão utilizadas preferencialmente as expressões “interpretação de texto”, “de 
texto legal” ou “de texto normativo” quando se estiver fazendo menção ao objeto da interpretação, 
ou seja, a atribuição de sentido ao vocábulo legal fruto de um enunciado do discurso prescritivo 
elaborado por uma autoridade normativa e identificável como fonte do direito de um determinado 
sistema jurídico. Aqui também não se desconhece a problemática na utilização dessa expressão 
(interpretação de texto) na medida em que ela não comporta em seu conteúdo os “fatos” que são 
extremamente relevantes e de indispensável consideração para a perfeita formação do produto 
resultado da interpretação, ocorre que, embora problemática tal conceituação, pretende-se com ela 
evitar a confusão quanto às expressões comumente utilizadas “interpretação de normas” ou 
“interpretação do direito”, eis que as normas não são os textos, mas o resultado da interação entre 
o interprete e o texto legislativo, e a expressão “interpretação do direito” embora designe o gênero 
relativo aos textos, normas, fatos, jurisprudência, costumes,entre outros, seria inapropriadamente 
utilizado para designar aquilo que ele mesmo compõe – a hermenêutica. Sgarbi (2007: 434). 
 
3
 A Constituição Federal proclama no seu artigo 1°, Parágrafo único: “[...] Todo o poder emana do 
povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta 
Constituição”. 
 
4
 Há exceções constitucionais de democracia direta em que o povo exercita o seu poder 
diretamente como disposto no artigo 14 da Constituição Federal: [...] I - plebiscito, II – referendo, 
III - iniciativa popular. 
 
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 14 
para que orientem a maior quantidade de casos possíveis e também para que 
sejam facilmente compreensíveis por toda a universalidade de indivíduos que 
compõem essa sociedade. 
 Em virtude de sua abstração e generalidade, muitas vezes, o texto legal 
objeto de interpretação apresenta-se vago ou incerto, facultando ao intérprete 
inúmeras possibilidades hermenêuticas, eis que, não apenas no campo das normas, 
mas em todos os campos da existência humana, existe um limite que a linguagem 
geral pode oferecer como orientação às pessoas. Assim, para H.L.A. Hart os 
próprios cânones interpretativos não servem para eliminar a indeterminação e a 
incerteza própria da linguagem comum. 
“É certo que existem casos claros, que reaparecem constantemente em contextos 
semelhantes, aos quais as fórmulas gerais são nitidamente aplicáveis (‘se algo é 
um veículo, um automóvel o é’) mas haverá também casos aos quais não está 
claro se elas se aplicam ou não (‘a palavra aqui usada ‘veículo’, incluirá 
bicicletas, aviões, patins?’). Estas últimas são situações de fato, continuamente 
criadas pela natureza ou pela inventividade humana, que possuem apenas alguns 
dos traços presentes nos casos simples, enquanto outros estão ausentes. Os 
cânones de ‘interpretação’ não podem eliminar essas incertezas, embora possam 
minorá-las, pois estes cânones constituem, eles próprios, normas gerais para o 
uso da linguagem e empregam termos gerais que exigem eles próprios 
interpretação”5. 
 
 Assim, embora os padrões de comportamento transmitidos por meio de 
legislação funcionem na maioria dos casos, em outros as fórmulas gerais de 
conduta6 não serão tão claras, de modo que, nesses casos específicos, podem 
ocorrer incertezas quanto ao comportamento exigido dos indivíduos. 
 Daí a relevância do estudo do texto normativo ao lado da atividade 
interpretativa, pois muitas regras em virtude da textura aberta7 da linguagem são 
 
5
 Hart (2009: 164). 
 
6
 Os ordenamentos jurídicos podem ser simples ou complexos dependendo da abrangência 
tipológica da regra. Serão simples, aqueles sistemas jurídicos formados somente por “normas de 
conduta” ou primárias; já os sistemas complexos são aqueles que conjugam normas primárias com 
secundárias ou “atributivas de poderes”. Assim, nem toda norma veicula uma fórmula geral de 
comportamento, pois tal característica é exclusiva das normas de conduta, enquanto às normas 
secundárias funcionam para assegurar eficiência às primeiras veiculando “conceitos 
especificamente jurídicos de interesse profissional para o jurista e o profissional do direito, como 
os de obrigações e direitos, validade e fontes de direito,legislação e jurisdição e sanção” Hart 
(2009: 127). Segundo Hart, as sociedades atuais conjugam normas primárias com secundárias de 
três ordens: regra de reconhecimento (destinada a identificar as normas primárias pertencentes à 
ordem jurídica), regras de modificação (regulam o processo de criação, eliminação e 
transformação das normas primárias) e regras de julgamento (instauram, identificam e regulam os 
órgãos de aplicação das normas primárias). Hart (2009: 103/128). 
 
7
 Será analisado mais adiante no decorrer da dissertação. 
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 15 
plurissignificativas, cabendo ao intérprete desvendar o seu significado. Tal 
atividade é de suma importância para o estudo do direito, já que essas fórmulas 
gerais de conduta constituem o próprio Direito como instrumento destinado ao 
controle social8. 
 É certo também que o mesmo problema da indeterminação na aplicação e 
na interpretação da legislação ocorre nas sociedades que adotam os precedentes9 
como estratégia de comunicação dos padrões gerais de conduta, uma vez que, 
tanto os precedentes quanto a legislação exibem padrões de comportamento 
limitados e pré-definidos, sendo impossível imaginar de antemão todos os 
possíveis acontecimentos, condutas ou circunstâncias que ocorreriam no futuro 
para que a legislação ou os precedentes abrangessem todas essas hipóteses. 
Assim, como exemplificado por Hart, quando uma lei faz referência a um veículo, 
claramente estará mencionando um automóvel (caso claro), no entanto, não fica 
claro se a lei inclui em seu dispositivo outros objetos destinados ao transporte de 
pessoas como bicicletas, motocicletas, quadriciclo, velocípedes, patins, entre 
outros, tratando-se então de um caso difícil (hard case)10. 
 Assim, seja por meio da legislação ou de precedentes, sempre se deve 
procurar criar regras gerais de orientação social baseada em classes de pessoas, 
classes de condutas, coisas e circunstâncias relacionadas à vida social, cabendo ao 
 
 
8
 Aqui o direito é descrito como um instrumento destinado ao controle social em virtude da sua 
capacidade de veicular condutas destinadas à ordenação e à sistematização da sociedade, Possui 
função harmonizadora da vida social ao lado da religião, da moral e dos costumes. Émile 
Durkheim ensina que “a sociedade sem o direito não resistiria, seria anárquica, teria o seu fim. O 
direito é a grande coluna que sustenta a sociedade. Criado pelo homem, para corrigir a sua 
imperfeição, o direito representa um grande esforço para adaptar o mundo exterior às suas 
necessidades de vida”. Durkheim (1960: 17). 
 
9
 O modelo do Common Law, comum aos países de colonização inglesa, “descreve as decisões 
judiciais como principal elemento irradiador de normas, conferindo-lhes efeitos vinculantes e 
gerais e atribuindo à lei papel secundário. Nesse sistema, a partir das soluções proferidas em cada 
caso, buscar-se-ia, por indução, formular as regras aplicáveis a situações análogas. O 
desenvolvimento do direito, por isso, ocorreria, na medida em que associações e distinções entre 
casos ensejassem a aplicação de resultados idênticos ou provocassem a criação de novos 
precedentes. Já nos ordenamentos de origem românica, caberia à lei a função de protagonizar a 
manifestação do direito, incumbindo-se às decisões papel meramente acessório e mediato, como 
fonte explicitadora e declaradora do significado do ordenamento positivo. Assim, a determinação 
da solução aplicável a uma demanda específica dar-se-ia pelo mecanismo da subsunção das 
situações de fato na regra geral legislada, cujo significado seria revelado através da atividade 
interpretativa”. Mello (2008: 12). 
 
10
 Será analisado mais adiante no decorrer da dissertação, inclusive com os desdobramentos do 
clássico exemplo apresentado por Hart. 
 
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 16 
intérprete fazer a devida associação da regra geral ao caso particular de forma 
silogística11. 
 Ocorre que, seja na legislação ou nos precedentes, a linguagem geral 
(formulações verbais) e os exemplos serão sempre insuficientes para englobar 
toda a imensidão de acontecimentos futuros e inesperados, isso porque o 
significado de formulações gerais nunca pode ser completamente esclarecido ou 
definido já que os termos empíricos das afirmações são dotados de uma textura 
aberta impedindo uma observação conclusiva com respeito ao seu significado. 
 Hart expõe duas formas distintas de comunicação de critérios gerais de 
conduta para que o controle social seja efetivo (formulações gerais e exemplos), o 
que no plano jurídico significa dizer que as regras legais podem ser efetivadas por 
intermédio da legislação positivada ou do uso dos precedentes, ocorre que, em 
uma ou outra, a textura aberta da linguagem impede uma observação conclusiva 
com respeito ao seu significado. Vale dizer, a regra é formada por palavras e estas 
possuem semanticamente uma textura aberta de significação cujo sentido em seu 
núcleo é fixo, mas permeado por uma zona de penumbra de modo que, 
inevitavelmente, circunstâncias da vida ocorrerão e se enquadrarão nessa zona 
periférica em que a aplicabilidade da própria regra jurídica poderá ser colocada 
em dúvida12. 
 Neste sentido, Hart utiliza-se de um exemplo simples e não jurídico para 
diferenciar a estratégia de controle social fulcrada nos precedentes daquela 
fundada na legislação, vejamos: 
 
11
 Neste caso, a premissa maior é a norma válida – verdade universal (P), a premissa menor é o 
acontecimento fático – particularidade factual (p) e a conclusão é a norma a ser aplicada ao caso 
particular– interação entre as duas premissas anteriores (c); na seguinte fórmula aristotélica: P + p 
→ c”. Guastini (2005 : 227/235). 
 
12
 Será retomada mais adiante a apreciação e análise conceitual da textura aberta das normas 
descritas por Hart, mas, preambularmente, podemos descrevê-la como sendo uma característica 
comum das regras que “têm uma trama aberta e, por isso, também uma ‘zona de penumbra’. Mas 
no centro da trama há uma ‘zona de luz’, no âmbito da qual a interpretação e a aplicação da norma 
não são controvertidas. Na medida em que as normas possuem uma ‘zona de luz’, uma ciência de 
normas é possível. Em Hart, portanto, a ideia de área de penumbra serve não tanto para afirmar 
que as normas são enunciados vagos, de incerta aplicação, mas antes para sublinhar, 
paradoxalmente, o oposto: apesar de um certo grau de imprecisão, as normas também têm uma 
área de aplicação pacífica. A ‘penumbra’, de fato, define-se em negativo como a zona em que não 
há luz e, nem, tampouco, total escuridão. Nem todos os casos são dúbios: a área dos casos dúbios é 
delimitada, ‘circundada’, pela área dos casos claros (de uma parte, o conjunto dos casos aos quais 
a norma é certamente aplicável; de outra parte, o conjunto dos casos aos quais, também, 
certamente, a norma não é aplicável).” Guastini (2005 :147). 
 
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 17 
“Podem-se ver os traços distintivos das duas estratégias nos seguintes casos 
simples e não jurídicos. Antes de ir à igreja, um pai diz ao filho: ‘Ao entrarem na 
igreja, todos os homens e meninos devem tirar o chapéu’. Outro pai, descobrindo 
a cabeça ao entrar na igreja, diz ‘esta é a maneira certa de se comportar em 
ocasiões como esta’” 13. 
 
 Segundo esse ilustrativo exemplo, a formulação geral apresentada pelo pai 
ao filho “ao entrarem na igreja, todos os homens e meninos devem tirar o 
chapéu’” apresenta-se tão incerta quanto a estratégia adotada pelo outro pai de 
valer-se do exemplo “esta é a maneira correta de entrar na igreja”, eis que, em 
ambasas situações, podem ocorrer dúvidas de qual o alcance da formulação geral 
ou de como o filho deve seguir o exemplo do pai, já que é impossível descrever 
com certeza absoluta quais são os fatos contingentes e quais são os fatores 
essenciais que constituem o exemplo, deixando assim um amplo leque de 
possibilidades e, portanto, de dúvidas sobre o que se pretende e sobre questões 
que a própria pessoa que transmite o ensinamento já tenha examinado com 
clareza. 
“até que ponto o comportamento deve ser imitado? Fará diferença se, para tirar o 
chapéu, eu usar a mão esquerda em vez da direita? Que a ação seja executada 
lentamente ou com rapidez? Que o chapéu seja colocado debaixo do assento? 
Que, dentro da igreja, não seja recolocado na cabeça? Todas essas são variações 
de perguntas genéricas que a criança poderia fazer a si mesma: ‘De que formas 
minha conduta deve assemelhar-se à dele para que seja correta?’; ‘o que, 
exatamente, na conduta dele, deve servir-me de orientação?’” 14 
 
 Assim, é certo que, qualquer que seja a estratégia utilizada para a 
transmissão dos padrões gerais de conduta, se por meio de precedentes ou de 
formulações gerais, sempre restará uma zona de incerteza quanto ao tipo de 
comportamento por elas exigido, criando, em maior ou em menor grau, um leque 
de alternativas e de dúvidas para o intérprete. 
 
1.2 
O que é indeterminação 
 
 Em Ottawa, no Canadá, nenhuma pessoa pode capturar ou possuir rãs a 
menos que a tíbia do animal tenha cinco centímetros ou mais de longitude. 
 
13
 Hart (2009 :162). 
 
14
 Hart (2009 :162). 
 
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 18 
 Com esse exemplo, Tymothy A. O. Endicott15 procura demonstrar o 
quanto a lei em Ottawa pode ser indeterminada, e por conseguinte também o 
quanto pode ser indeterminada a responsabilidade dos caçadores de rãs na capital 
canadense. É que, embora o legislador que criou a lei de proteção das rãs tivesse o 
cuidado de não utilizar termos imprecisos como “rã grande” ou “rã adulta”, 
valendo-se então de uma constante métrica (centímetros), ainda assim, mesmo 
com o seu zelo na escolha das palavras não será capaz de erradicar a 
indeterminação linguística. 
 Nesse caso, há uma série de hipóteses em que a aplicabilidade da lei será 
indeterminada no Canadá, como por exemplo, o que ocorreria se uma rã tivesse 
uma tíbia maior do que cinco centímetros e a outra menor, ou mesmo se a sua 
tíbia tivesse quatro centímetros quando curvada mas cinco centímetros quando 
alinhada em uma régua? 
 Assim, é certo que inumeráveis indeterminações podem surgir com as 
formulações linguísticas das regras jurídicas, sejam ambiguidades léxicas, como, 
por exemplo, se por pessoa proibida de caçar rãs também se entende as pessoas 
jurídicas ou somente as físicas; ou ambiguidades sintáticas tal como: a rã deve ser 
caçada em Ottawa ou basta possuir uma rã com uma tíbia inferior a cinco 
centímetros mesmo que ela tenha sido capturada em qualquer outro lugar do 
mundo para incidir nas sanções da lei? E a pessoa que a possui, também deve 
estar em Ottawa? 
 Da mesma forma que o exemplo canadense citado por Endicott, é possível 
imaginar um exemplo bem mais próximo da nossa realidade e que também 
apresenta um grave problema de indeterminação. 
 No Estado de Mato Grosso do Sul, o ingresso nos quadros da polícia 
militar depende sempre de prévia aprovação em concurso público no qual se exige 
que o candidato, além do preenchimento de outros requisitos16 não possua 
“qualquer tatuagem permanente no corpo, mesmo estilizada, que possa expressar 
ou sugerir qualquer ligação com gangues, organizações criminosas ou de estímulo 
à violência e ao uso de drogas; que seja contrária aos princípios e aos valores da 
liberdade e da democracia, à moral, à lei, à ordem e aos bons costumes ou, cujo 
 
15
 Endicott (2006: 31). 
 
16
 Conforme artigo 8° da lei estadual n.3.808/09. 
 
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 19 
conteúdo, constitua-se em apologia à conduta delituosa ou que ofenda os deveres 
e as obrigações militares, a ética, a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro 
da classe” (art. 8°, I, ‘p’ da lei estadual n° 3.808/09). 
 Assim, em atenção à lei estadual é possível imaginar diversas hipóteses em 
que a restrição de acesso a cargo público aos possuidores de tatuagens seja 
indeterminada no Estado de Mato Grosso do Sul, ou mesmo, casos em que a lei 
não delimite com exatidão o alcance da restrição imposta ao princípio 
constitucional da ampla acessibilidade aos cargos públicos17. 
 Em uma primeira analise é fácil perceber que a finalidade da lei é coibir o 
acesso à carreira policial daquelas pessoas que se utilizem do próprio corpo para 
fazer apologia a condutas criminosas ou mesmo que se declarem integrantes de 
grupos criminosos por meio da tatuagem corporal, ou seja, pretende a lei manter 
uma coerência entre os valores éticos institucionais da polícia militar e o seu 
corpo de profissionais, vedando o acesso à instituição policial daquelas pessoas 
que, por convicção ou demonstração de afetos, aparentemente não comunguem 
dos mesmos princípios. 
 Dessa forma, é simples imaginar que um candidato que tenha tatuado em 
seu corpo um emblema do “comando vermelho” ou do “primeiro comando da 
capital” deveria ser impossibilitado de ingressar na polícia nos termos da restrição 
prevista na lei estadual, eis que o estímulo e a vinculação à violência desses 
grupos criminosos é evidente18. 
 No entanto, em outra situação hipotética projetada, em que um 
determinado candidato tenha tatuado em seu corpo uma sereia, ou uma cruz, ou 
uma teia de aranha, ou uma imagem de Nossa Senhora Aparecida ou mesmo de 
Jesus, nessa hipótese seria, ou deveria ser, aplicável a lei estadual que impede o 
acesso ao cargo público em virtude de alguma apologia ao crime? 
 Em princípio não, uma vez que essas tatuagens representam figuras 
mitológicas ou mesmo bíblicas que procuram identificar serenidade, doçura, 
 
17
 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos 
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, 
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 
I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os 
requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; 
 
18
 É de domínio público que tanto o comando vermelho quanto o PCC são organizações com 
finalidades criminosas. 
 
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 20 
harmonia e tranquilidade de seu possuidor, no entanto, ao mesmo tempo em que 
possuem essa simbologia também podem representar e identificar uma 
personalidade criminosa ou os delitos cometidos por seu possuidor19. 
 Só pelos exemplos citados podemos constatar que o símbolo tatuado no 
corpo por si só não é capaz de identificar se a pessoa está fazendo alguma 
apologia ao crime ou incitando a violência, eis que a cruz poderia tanto 
representar uma pessoa perigosa e, portanto, incitando a violência, quanto poderia 
ser utilizada como expressão de religiosidade. 
 Assim, quando a tatuagem estará sugerindo que o candidato ao cargo 
policial possui ligação com uma gangue? Ou mesmo que estimule a violência ou 
faça apologia ao uso de substâncias entorpecentes? Quando ofende a democracia, 
a moral, aos costumes ou o pundonor policial? 
 Como deveria ser encarada a situação de alguém fanático pelas artes 
militares que tatuou uma metralhadora no peito? Ele faz apologia à violência ou 
exalta o poder e a potência da instituição? 
 De certo que inumeráveis indeterminações que enriquecem e muitasvezes 
dificultam o processo interpretativo surgem das formulações jurídicas criadas por 
indeterminações linguísticas existentes nas próprias regras jurídicas, tais como as 
decorrentes de ambiguidades léxicas ou ambiguidades sintáticas, da textura aberta 
das normas, da vagueza do texto, da imprecisão da norma, dos unfinished 
standards20 ou mesmo do contexto em que se situa a norma e seus intérpretes. 
 A tais indeterminações linguísticas e semânticas devem ser somadas as 
indeterminações jurídicas do próprio e complexo sistema normativo 
(discrepâncias normativas e contradições normativas), como o conflito de normas 
ou o conflito aparente de normas. Por exemplo, teria o Estado de Mato Grosso do 
Sul competência legislativa para criar uma regra restritiva de acesso a cargo 
público de natureza militar? Em se tratando de competência legislativa 
 
19
 Na linguagem dos presidiários, a sereia representa uma pessoa condenada pelo crime de estupro, 
a cruz representa uma pessoa perigosa, Jesus um latrocida, teia de aranha significa que se trata de 
um matador de cúmplices e a Nossa Senhora representa um latrocida ou estuprador dependendo da 
sua localização no corpo da pessoa. disponível em: 
<http://www.depen.pr.gov.br/arquivos/File/monografia cezinando.pdf> 
 
20
 Na tradução em espanhol unfinished standards aparecem como estándares inconclusos. Endicott 
(2006: 88). No Brasil, unfinished Standards indicam os “conceitos jurídicos indeterminados” que 
serão melhor abordados no decorrer deste trabalho. 
 
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 21 
concorrente (art. 22, XXI, CRFB) a lei estadual n° 3.808/09 poderia aumentar, 
diminuir ou criar exigências diversas daquelas previstas na lei nacional21 (lei 
6.880/80 – Estatuto dos Militares)? 
 Inclusive, os candidatos ao cargo militar ainda enfrentariam incertezas 
relativas às imposições sobre tatuagens que não são nem linguísticas e nem 
jurídicas, tal como a discricionariedade do administrador ao aplicar a norma 
quando da realização do próprio certame ou mesmo o seu desconhecimento 
quanto às características desabonadoras no símbolo tatuado. 
 Tais indeterminações sem natureza linguística existem porque a vida e os 
sistemas jurídicos são complexos, sendo mais complicado de eliminá-las do que 
as indeterminações linguísticas, uma vez que, em virtude da capacidade das 
pessoas de selecionar suas palavras é possível conceber ao menos que as 
indeterminações linguísticas poderiam ser erradicadas ou minoradas com o uso 
mais cuidadoso da própria linguagem, como na hipótese das rãs, na qual o 
legislador canadense procurou se valer de um qualitativo métrico para definir a 
regra. 
 No caso sul-mato-grossense das tatuagens, poderia o legislador ter 
utilizado expressões mais objetivas para vedar o ingresso na carreira militar 
daqueles candidatos que possuíssem “tatuagens com mais de 10 centímetros” ou 
“tatuagens de caveira”, ou “de sereia”, ou outras formas mais objetivas, em vez de 
termos genéricos como “bons costumes”, “moral”, “princípios e aos valores da 
liberdade e da democracia”, “ética”, “honra”, “pundonor” ou “decoro”, para que a 
lei gerasse menos dúvidas. 
 No entanto, ainda que o legislador do ente federado fosse mais cuidadoso, 
mesmo assim, fracassaria no intuito de eliminar a indeterminação do texto, eis 
que, novos questionamentos poderiam surgir como, por exemplo, e se a tatuagem 
 
21
 Aqui se utilizou a expressão lei nacional em atenção à diferenciação criada pela doutrina pátria a 
respeito de lei nacional e lei federal: [...] “O Congresso Nacional é órgão legislativo do Estado 
Federal e da União. Na primeira qualidade edita leis nacionais, na segunda, leis federais. As leis 
nacionais superam e transcendem às circunscrições políticas internas. As leis federais, ao lado das 
estaduais e municipais, circunscrevem-se à área de jurisdição da pessoa a que se vinculam e 
somente obrigam os jurisdicionados stricto sensu de cada qual. que a lei federal. Em outras 
palavras, a Constituição confere à lei nacional amplíssimo poder para regular matérias específicas 
em todo o território nacional, abstração feita da sujeição dos destinatários da norma, quer à União, 
quer a Estados e Municípios. Já a lei federal, embora editada pelo mesmo órgão, onera, 
circunscritamente, somente os jurisdicionados da União.” [...]. Geraldo Ataliba (1968: 94). 
 
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 22 
tiver 10 cm de um lado e 5 cm de outro, ou mesmo se a tatuagem possui uma 
caveira mas de forma encoberta? 
 Com esse exemplo pretende-se demonstrar tão somente que mesmo que o 
legislador procure ser mais cuidadoso na escolha de suas palavras, ainda assim, o 
texto fruto do procedimento legislativo remanescerá sempre de frestas 
interpretativas passíveis de infindáveis digressões teóricas a respeito de sua 
interpretação, isto porque a vagueza é uma característica essencial das expressões 
linguísticas que compõem a linguagem e como corolário do próprio direito. Nesse 
sentido, é certo que a vagueza pode ser reduzida, não suprimida. 
 Assim, por ser a indeterminação uma característica própria da linguagem e 
do direito que não pode ser eliminada, é de fundamental importância compreender 
como funciona o processo interpretativo, pois a norma jurídica a ser aplicada aos 
casos concretos será fruto desse procedimento. 
 Ocorre que, antes de ingressar no conceito de textura aberta e no bojo da 
dissertação é importante delimitar qual a extensão da zona de indeterminação de 
um texto, ou seja, para uns como Jacques Derrida, todas as nossas pré-concepções 
sobre a linguagem podem ser acertadamente “descontruidas”, razão pela qual, ao 
fazer o uso das palavras não haveria que se pensar na ocorrência de um núcleo de 
certeza de significação dessa linguagem uma vez que ela, por ser o “fruto de 
construções culturais que sistematicamente foram concebidas como se verdades 
absolutas fossem”22, bastaria a alteração desses paradigmas culturais para que o 
significado da linguagem seja discrepante. O filósofo Friedrich Waissman ensina 
que o uso da linguagem em determinadas ocasiões pode descrever com exatidão 
ou alcançar de forma exata aquilo que se está fazendo menção, no entanto, em 
outras ocasiões pode ocorrer uma imprecisão ou dúvida sobre aquilo que as nossas 
palavras pretendem descrever, nestes casos, está-se diante da textura aberta da 
linguagem. H.L.A. Hart adota esse conceito empregado para a linguagem natural 
como um todo, demonstrando que no direito, assim como na linguagem, regras 
podem ser aplicadas sem maiores problemas em determinados casos particulares, 
enquanto em outros, sua aplicação será problemática exigindo a utilização de uma 
argumentação que escapa a mera referência às regras legais23. 
 
22
 Leal (2009 : 5). 
 
23
 Struchiner( 2002 : 7). 
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 23 
 
1.3 
A zona de penumbra na linguagem 
 
 A teoria jurídica do século passado popularizou a metáfora, segundo a qual 
a indeterminação linguística deve ser concebida como uma zona de penumbra, 
uma zona marginal entre a clara aplicabilidade de uma determinada expressão e a 
sua clara inaplicabilidade. 
 Segundo Endicott24, muito embora tradicionalmente se tenha atribuído a 
construção dessa metáfora a H.L.A. Hart, é certo que antes dele Benjamin 
Cardozo já havia escrito, em 1921, a respeito da “zona marginal – a penumbra 
onde se inicia a controvérsia” e, Glanville Williams já havia publicado um 
trabalho em que expunha os casos marginais e as incertezas do direito25. 
 Diante dessa zona de penumbra em que não se reconheceria a 
aplicabilidade ou a inaplicabilidade patente da lei, em que a disposiçãolegal não 
ofereceria um único significado possível, caberia ao magistrado, nos limites de 
seu arbítrio, atuar tal qual um legislador, definindo se a situação encontrar-se-ia 
abrangida no campo de incidência da lei ou não. 
 Para H.L.A. Hart26, a textura aberta da linguagem produz núcleos de 
significado certo contornados por áreas de penumbra, ocorre que, muitos teóricos 
do direito têm insistido que a ideia de Hart acaba por atribuir falsamente às 
palavras uma espécie de certeza, de completude, de imunidade à variação, o que 
seria equivocado. 
“[...] Desde que Hart popularizo la metáfora del núcleo y de la penumbra, 
muchos teóricos Del Derecho han insistido em que la idea atribuye falsamente a 
las palabras una especie de certeza, completitud, independencia del contexto, o 
inmunidad al cambio, y que la indeterminación, sin embargo, es más que um 
magen de poca importancia. Ellos no han cuestionado la noción de penumbra, 
pero sí la de certeza.”27 
 
 
24
 Endicott (2006: 32). 
 
25
 Segundo Williams: “[…] Dado que el derecho tiene que ser expresado en palabras, y las 
palabras tienen una penumbra de incertidumbre, los casos marginales están destinados a 
acontecer”. Williams (1945) apud Endicott, (2006: 33). 
 
26
 Endicott (2006 : 33). 
 
27
 Endicott (2006 : 33) 
 
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 24 
 
 Endicott refuta tais teorias de indeterminação radical e da desconstrução, 
ao asseverar que elas acabam por refutar a si mesmas, quando prescrevem que 
“ningún enunciado significa nada, incluyendo éste”28, de modo que tais teorias 
acabam por não explicar nada a respeito do significado - “la desconstrucción no 
dice nada sobre el significado” 29. 
 Dennis Patterson e Stanley Fish descrevem que toda a aplicação do direito 
requer uma compreensão e de que somente se compreende quando se interpreta30, 
assim, para Fish, tudo que uma pessoa faz em relação a expressões de outras 
pessoas decorre de uma interpretação: 
“[...] las comunicaciones de toda clase están caracterizadas exactamente por las 
mismas condiciones – la necessidad del trabajo interpretativo, lo inevitable de la 
perspectiva, y la construcción por actos de interpretación, las intenciones, las 
características y las porciones del mundo”.31 
 
 Ocorre que, não é porque toda realização do homem em relação à outra 
pessoa ou mesmo porque todas as questões jurídicas reclamem alguma 
interpretação que se perpetra a ideia de que qualquer compreensão ou de que 
qualquer interpretação deve ser validamente aceitável. 
 Para exemplificar tal afirmação pode-se partir da interação entre um 
determinado motorista e um semáforo de trânsito, na qual incumbirá a ele 
interpretar o significado da cor que estiver aparecendo na lanterna conforme seus 
conhecimentos prévios, não podendo ele responder ao sinal acertadamente se não 
fizer um exercício mental lógico-dedutivo de interpretação do signo no semáforo. 
Assim, aparecendo o signo vermelho deve o motorista concluir que ele deve 
parar; signo amarelo – atenção e signo verde - siga32. 
 Há evidentemente um processo interpretativo realizado pelo 
motorista/intérprete, no entanto, não é porque esse motorista interpreta o signo 
 
28
 Endicott (2006 : 36) 
 
29
 Endicott (2006 : 36) 
 
30
 A teoria de Patterson é denominada “Interpretive Universalism and Contemporary Legal 
Theory”. Patterson (1993) apud Endicott, (2006: 36). 
 
31
 Endicott (2006 : 37) 
 
32
 Endicott (2006 : 40/41) 
 
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 25 
constante no semáforo que ele pode chegar a qualquer conclusão, pois do 
contrário ele não estaria compreendendo o próprio signo33. 
 Nesse caso, embora seja evidente que existe uma interpretação realizada 
pelo motorista (associar o sinal vermelho à determinação de parar), não se pode 
dizer o mesmo em relação à reação (compreensão esperada) que o motorista deve 
ter ao fazer tal associação (sinal vermelho = pare; sinal vermelho ≠ siga) eis que 
não há qualquer possibilidade de escolhas diante do signo “vermelho”. 
 Segundo esse exemplo, é possível ainda afirmar que só havia uma hipótese 
interpretativa admissível ao motorista (vermelho – pare) e que o aspecto 
determinado seria a inadmissibilidade de todas as demais interpretações (ex. 
vermelho – siga ou vermelho - atenção), de modo que, nenhuma hermenêutica dos 
signos do semáforo seria necessária e que compreensão desse sinal luminoso não 
deixava nenhum espaço para interpretação, pois não havia quaisquer opções 
quanto ao significado do signo no semáforo: 
“La ‘interpretación’ parece ser um término útil (y a menudo se utiliza) para 
referirse a opciones que tenemos em cuanto al significado de una expressión o de 
un texto. Pero aun cuando podamos tener opciones en el momento de conducir 
havia una señal de ‘stop’(e.g., la elecciónde si hay de pararse), es claro que no 
hay ninguna opción que evaluar acerca de su significado. De acuerdo a este 
empleo del término ínterpretacción, interpretamos cuando podemos reformular 
una regla en el modo en que clarifica su significado. Pero no interpretamos 
señales de ‘stop’ ”.34 
 
 Assim, compreender não é sinônimo de interpretar e nem toda aplicação 
do direito sempre corresponde a uma interpretação, razão pela qual se apresenta 
como frágil a associação realizada por Levinson35 em sua teoria da 
indeterminação baseada no pragmatismo de Richard Rorty. 
 Endicott36 resume assim o pragmatismo de Rorty: 
“Rorty piensa que un interprete ‘simplemente moldea um texto de una forma que 
servirá a sus proprios propositos’. Y él insiste em que no hay ninguma distinción 
entre esa actividad y la compreensión de um texto” 
 
 
33
 Tal conclusão deve ser tirada de forma aparente, pois sem analisar o contexto e a intenção do 
motorista não poderíamos concluir se ele tinha a vontade de contrariar a indicação do semáforo, 
analisando as circunstâncias, o intérprete pode chegar à conclusão de que o motorista fez a 
interpretação correta (vermelho = pare), no entanto, por outras razões decidiu ignorar o comando. 
 
34
 Endicott (2006 : 39) 
 
35
 Levinson (1982), apud (Endicott, 2006 : 39) 
 
36
 Endicott, (2006 : 39, 41). 
 
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 26 
 Para Levinson, toda interpretação é tão boa quanto qualquer outra37, ocorre 
que, tal tese tende a sustentar que todas as aplicações de expressões linguísticas 
corresponderiam a interpretações e que todas as interpretações (conclusões) 
seriam possíveis, contrapondo-se assim à teoria de H.L.A. Hart em que a textura 
aberta da linguagem possui tanto zonas de penumbra (incerteza de significado a 
priori passíveis de serem interpretadas) quanto zonas convencionalmente 
ajustadas como de certeza de significação38. 
 
1.4 
As fontes da indeterminação 
 
 A linguagem por si só não pode ser considerada como indeterminada 
conforme apresentado pelas teorias interpretativistas radicais em que o sentido do 
texto aparentemente pode significar qualquer coisa tal como descrito por 
Rosenfeld e Derrida. 
 De fato, há uma textura aberta na linguagem, uma verdadeira zona 
nebulosa que não franqueia um significado exaustivo ou completo de seu 
conteúdo, existindo assim sempre espaços inconsistentes ou duvidosos quanto à 
significação das palavras, o que não importa dizer que uma determinada palavra 
quando empregada em certa ocasião possa significar qualquer coisa como querem 
os autores mais radicais. 
 Da mesma forma que a linguagem geral, também as regras jurídicas, por 
serem o fruto do legislador humano, e transmitidaspela linguagem cuja 
capacidade de orientação e significação são intrinsecamente limitadas, também 
acabam sendo imprecisas. Se as regras são formadas por palavras e as palavras 
são peculiarmente imprecisas daí que as regras também apresentam uma 
indeterminação latente. 
 Assim, as indeterminações linguísticas ou não surgem e são relevantes 
para o Direito porque a vida e os sistemas jurídicos são complexos, de modo que, 
em qualquer campo da existência e mais precisamente no terreno das normas, 
 
37
 “toda interpretación es tan buena como cualquier otra”. Levinson apud Endicott (2006, 41) 
 
38
 A textura aberta na visão de Hart será tratada em tópico subsequente. 
 
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 27 
sempre haverá um limite que a linguagem geral pode oferecer de orientação para 
as pessoas. 
 É certo também que os legisladores humanos não podem prever todas as 
combinações possíveis de circunstâncias que o futuro pode trazer, no entanto, 
devem formular regras de controle social para serem utilizadas nesse futuro 
potencialmente imprevisível e ainda expressar tais regras por meio de palavras. 
 Dessa forma, como as regras são elaboradas com o uso de palavras que 
possuem um núcleo de significação fixo e uma ‘textura aberta’ de significação 
periférica (zona de penumbra), inevitavelmente, alguns cenários da vida ocorrerão 
e serão enquadrados dentro da zona de penumbra em que não é possível 
determinar com segurança se a palavra se aplica ou não. 
 Comumente as pessoas se utilizam da expressão “vago” para descrever o 
uso da linguagem de modo incompleto ou carente de informações, tais como 
insinuações, ameaças, promessas ou enunciações. Vago, nesse contexto de uso, 
significa que faltou alguma especificação útil para a correta ou integral 
compreensão do intérprete. 
 A vagueza no universo das regras jurídicas está associada à existência de 
casos marginais de aplicação da regra, ou seja, na linguagem geral “vago” 
consiste em uma enunciação carente de informação, no Direito, “vago” é uma 
regra que comporta “casos marginais de aplicação”. 
 Mark Sainsbury conceitua a “vagueza” da seguinte forma: 
“una palavra vaga admite casos marginales, casos em los cuales no sabemos si 
se aplica la palabra o no, aun cuando tengamos todos los tipos de información 
que normalmente consideraríamos suficiente para decidir el asunto39 
 
 Já H.P. Grice apresenta a seguinte definição de “vagueza”: 
“decir que una expressión es vaga (en un sentido amplio de vago) es 
probablemente, más o menos, decir que hay casos (actuales o posibles) em los 
que uno simplesmente no sabe si hay que aplicar o no una expressión y el hecho 
de que uno no sepa no se debe a la ignorancia de los hechos””40 
 
 Assim, é certo que a incerteza quanto ao significado presente nos casos 
marginais deve corresponder à indeterminação na aplicação de uma expressão (no 
caso das regras jurídicas de uma lei) não podendo ser confundida com uma 
 
39
 Sainsbury (1995) apud Endicott (2006 : 66). 
 
40
 Grice (1989) apud Endicott (2006 : 65/66). 
 
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 28 
ignorância do intérprete quanto ao significado da expressão. Por exemplo, a 
palavra “bald” (calvo) não é uma expressão vaga simplesmente porque uma 
pessoa que está aprendendo o idioma inglês não sabe se deve aplicá-la a um 
homem que não tenha cabelo, no entanto, se a pessoa conhece a aplicação correta 
da palavra “bald”, adjetivando um homem desse modo, será necessário avaliar os 
aspectos relevantes aos paradigmas de sua aplicação (analisar o contexto, a forma 
de utilização, os parâmetros comparativos utilizados, dentre outros). 
 Para Timoty Endicott “la vaguedad em el Derecho genera 
indeterminación jurídica”41 e uma determinada expressão será considerada vaga 
quando comportar casos marginais de aplicação e interpretação. Portanto, a 
ocorrência de indeterminação na aplicação das regras deve ser encarada como 
uma consequência natural de expressões carentes de informação. 
 Dessa forma, afastada a hipótese da ignorância, analisar a indeterminação 
consiste em examinar a vagueza consoante as diversas classes de linguagem que 
se encontram bem adaptadas aos seus usos42, e, no plano jurídico, consiste em 
analisar os casos marginais (casos de penumbra ou fronteiriços) criados pela 
indeterminação semântica da linguagem utilizada nas regras jurídicas43. 
 
 
 
 
 
41
 Endicott (2006 : 67). 
 
42
 Timoty Endicott aponta várias fontes da indeterminação jurídica ao assinalar que a vagueza no 
direito é originária de fenômenos linguísticos que compreendem a sua própria formação. Assim, a 
indeterminação no direito ocorrerá sempre que uma regra apresentar algum componente “vago” 
que poderá se manifestar em alguma das seguintes “espécies de vagueza”: a textura aberta, a 
imprecisão, a incompletude, a incomensurabilidade, a imensurabilidade, a contestabilidade, a 
ambiguidade, os unfinished standards e a vagueza pragmática. Neste trabalho, será dado enfoque 
principalmente na problemática que recai sobre a vagueza decorrente da textura aberta das normas 
(item 5.1), quanto às outras fontes da indeterminação arroladas não serão abordadas diretamente 
no curso deste trabalho, no entanto, podem vir a ser analisadas de forma subsidiária e 
complementar como reforço de argumentação ou como nota explicativa. Endicott (2006 : 65/97). 
 
43
 Quanto à indeterminação semântica, não se trata de um desconhecimento sobre as circunstâncias 
que compõem o caso jurídico, mas sim de uma incapacidade de classificar esses mesmos fatos 
dentro da linguagem previamente fornecida pelo Direito. Nessas circunstâncias, a solução a ser 
encontrada pelo juiz não poderá estar embasada somente em nossas convenções linguísticas já que 
estas se revelarão insuficientes para classificar os fatos do caso em questão, incumbindo ao juiz, 
nesses casos marginais, fazer uso de outros critérios como será exposto no decorrer desta 
dissertação. 
 
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 29 
1.4.1 
A textura aberta 
 
 Hart introduziu na filosofia do Direito o termo “textura aberta” referindo-
se à presença de um núcleo de certeza circundado por uma zona de incerteza de 
significação da linguagem ordinária. 
 Para isso, Hart empregou algumas das lições de Friedrich Waismann44 
sobre a linguagem geral, aplicando-a ao direito, de modo que a textura aberta seria 
uma propriedade tanto de termos45 quanto de sentenças e regras. 
 Sua inquietação decorre das dificuldades de aplicação de uma regra geral a 
um determinado caso concreto, tendo em vista a possibilidade da coexistência de 
regras contraditórias no mesmo ordenamento jurídico, da existência de uma 
linguagem vaga e/ou ambígua na confecção das regras pelo legislativo ou até da 
absoluta inexistência de qualquer regramento previsto para algum caso específico. 
 Assim, a ocorrência de casos que não estivessem antecipadamente 
previstos pelo ordenamento jurídico criaria um impasse, entre a obrigação46 do 
 
44
 Segundo Endicott: “Hart tomó prestado el término de Friedrich Waissmann, quien lo usó para 
describir una característica del significado de palabras como ‘silla’, palabras que Wittgenstein 
había destacado, señalando: que ‘la aplicación de una palabra no está sujeita en todas partes por 
reglas’. No hay respuesta a una pregunta del tipo de si la palabra ‘silla’ se aplica a algo que se 
parece a otras sillas, solo se puede decir que desaparece y reaparece de vez en cuando”. Endicott, 
(2006: 74). 
 
45
 Segundo Struchiner: “[...] por mais que o fornecimento do método de verificação possa auxiliarno processo de aprendizagem do significado da afirmação sobre um objeto material, o significado 
nunca vai ser esclarecido completamente e de forma definitiva porque os termos empíricos que 
compõem as afirmações são dotados de uma textura aberta que impossibilita que as afirmações 
sejam verificadas de forma conclusiva. Hart percorre o caminho parecido e provavelmente 
inspirado nas investigações de Waissmann em sua análise das regras. Apesar de Hart não colocar o 
problema nesses termos, o que ele pretende saber é se as regras podem ser verificadas de forma 
conclusiva. Assim, como Waissmann investiga a questão do método de verificação para saber em 
que situações uma afirmação é verdadeira ou pode ser usada com segurança, Hart pretende 
perquirir em que situações as regras são verdadeiras, ou, de maneira mais precisa, em que 
situações a regra pode ser aplicada com certeza” in Struchiner (2002: 34). 
 
46
 No direito romano era admitido que o pretor (juiz) pudesse deixar de julgar nos casos em que as 
provas das alegações não estivessem claras. Não convencido da realidade dos fatos podia 
simplesmente jurar sibi non liquet exonerando-se de julgar a causa. No direito processual 
brasileiro, em decorrência da distribuição do ônus probatório, não há possibilidade de o magistrado 
se desincumbir de julgar, alegando que os fatos não restaram comprovados, de modo que, se não 
restar convencido pela alegação de qualquer das partes deverá assim mesmo proferir uma decisão, 
levando em consideração os fatos que não restaram eficientemente comprovados. Arenhart (2006: 
30) 
 
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 30 
magistrado de encontrar uma solução ao caso concreto e a denominada lacuna do 
direito. 
 Tais dificuldades de aplicação resultam nos chamados “hard cases” (casos 
difíceis) em que as regras aplicáveis não demandam de uma forma lógica, apenas 
uma única resposta correta. Segundo Hart, quando as regras, por elas mesmas, não 
são capazes de fornecer uma única resposta correta está-se diante dos casos 
difíceis, cabendo ao juiz apelar para o uso de seu poder discricionário47 para 
resolver o caso concreto. 
 Hart expõe dois fenômenos que produzem as denominadas lacunas do 
direito: a regra de reconhecimento48 e a textura aberta da linguagem. 
 O primeiro fenômeno não será abordado no presente trabalho, já o segundo 
consiste em seu cerne. 
 Segundo Hart, a textura aberta da linguagem faz com que as regras 
apresentem sempre a possibilidade de uma nebulosidade, de uma zona cinzenta de 
aplicabilidade ou uma penumbra de dúvida49 em que não é possível precisar com 
clareza se a regra é aplicável ou não. 
 
47
 Será analisado mais adiante no decorrer da dissertação. 
 
48
 Segundo Struchiner: “[...] De acordo com Hart, a regra de reconhecimento é a regra fundamental 
para distinguir um direito primitivo, ou uma situação pré-jurídica, de um sistema jurídico 
desenvolvido. A função da regra de reconhecimento é determinar quais são as regras legais válidas 
de uma comunidade. ‘A regra de reconhecimento estabelece as condições necessárias e suficientes 
para que uma norma possa contar como parte do direito de uma comunidade’ (Coleman 1999: 
249). Para que uma regra seja considerada uma regra válida e, consequentemente, uma regra do 
sistema jurídico, é necessário que ela passe em todos os testes exigidos pela regra de 
reconhecimento. Sendo assim, é concebível, que possa surgir um caso particular que não esteja 
regulado por nenhuma das regras que satisfizeram os testes exigidos pela regra de reconhecimento. 
A regra de reconhecimento comporta um conjunto de regras finito e quando o caso concreto que 
pode surgir não estiver regulado em nenhuma destas regras, então haverá uma lacuna do direito. 
Nesse caso, o juiz não poderá recorrer a uma regra legal para a solução da disputa, mas terá que 
aplicar critérios que estão além das regras legais válidas. Dito tudo, pode-se derivar que Hart 
considera o direito um sistema de regras. As regras que satisfizerem a regra de reconhecimento são 
exaustivas do direito e sempre que elas não são capazes de resolver um caso legal, deve-se recorrer 
a elementos extralegais”. Struchiner (2002: 32). 
 
49
 Hart utiliza em sua clássica obra ‘O conceito de direito’ as expressões ‘núcleo de certeza’ e 
‘penumbra de dúvida’ para caracterizar as situações em que a aplicabilidade da regra será clara e 
as outras ocorrências em que será problemática: “[...] Todas as normas envolvem o 
reconhecimento ou classificação de casos particulares como exemplo de termos gerais e, no que 
diz respeito a tudo que nos dispomos a chamar de norma, é possível distinguir casos claros, 
nucleares, aos quais ela certamente se aplica, de outros, em que há razões tanto para se afirmar 
quanto para se negar que a mesma seja aplicável. Nada pode eliminar essa dualidade entre um 
núcleo de certeza e uma penumbra de dúvida quando procuramos acomodar situações particulares 
ao âmbito das normas gerais. Isso confere a todas as normas uma margem de vagueza ou ‘textura 
aberta’, o que pode afetar tanto a norma de reconhecimento que especifica critérios últimos usados 
para a identificação do direito quanto uma lei especifica.” (2009 : 158). 
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 31 
 Nesse sentido Carrió: 
“Respecto de todas ellas vale la siguiente metáfora esclarecedora. Hay un foco 
de intensidad luminosa donde se agrupam los ejemplos típicos, aquellos frente a 
los cuales no se duda que la palabra es apicable. Hay una mediata zona de 
oscuridad circundante donde caen todos los casos en los que no se duda que no 
lo es. El tránsito de una zona a otra es gradual; entre la total luminosidad y la 
oscuridad total hay una zona de penumbra sin límites precisos. Paradójicamente 
ella no empieza ni termina en ninguna parte, y sin embargo existe. Las palabras 
que diariamente usamos para aludir al mundo en que vivimos y a nosotros 
mismos llevan consigo esa imprecisa aura de imprecisión. […] 
Esta característica de vaguedad potencial que los lenguajes naturales 
necesariamente exhíben ha sido llamada por Waismann ‘la textura abierta del 
lenguaje’.”50 
 
 E completa: 
“Las palabras que aperecem en las normas jurídicas para aludir a hechos, 
sucesos o actividades humanas, y proporcionar pautas o criterios para guiar o 
juzgar estas últimas, tienen, pues, una zona de penumbra, es decir, son actual o 
potencialmente vagas.”51 
 
 Dessa forma, existem casos simples nos quais os termos gerais não exigem 
qualquer atividade interpretativa, inclusive quanto aos casos familiares, “que 
reaparecem continuamente em contextos semelhantes, a respeito dos quais existe 
um juízo consensual quanto à aplicabilidade dos termos classificatórios”52. 
 No entanto, quanto mais situações fáticas diferentes ocorrerem mais 
possivelmente a nova situação individual se afastará do “núcleo de certeza”, de 
modo que a variação dos casos familiares, cuja aplicabilidade geralmente é 
incontroversa se reverterá gradualmente para a “penumbra de dúvida” de 
aplicabilidade da regra, tal como um ruído sonoro se afastando da fonte - quanto 
mais próximo, mais convicção se tem daquilo que se escuta e quase não há 
controvérsia quanto ao conteúdo, na medida em que se afasta da fonte, a 
convicção do ouvinte diminui na mesma intensidade em que aumenta a 
controvérsia quanto ao significado de seu conteúdo. 
 Assim, existem casos familiares em que a aplicabilidade da regra geral 
ocorre sem dúvidas, mesmo que a hipótese regulada na norma não seja idêntica ao 
 
 
50
 Carrió (1979: 33-35). 
 
51
 Carrió (1979: 55). 
 
52
 Hart (2009 : 164). 
 
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 32 
caso em questão, uma vez que a variação estará incluída no “juízo consensual”53 e 
as variações da linguagem admitem sem maiores problemas tais adaptações. 
 Ocorre que, na medida em que os novos casos fáticos surgidos se 
afastarem do “núcleo de certeza” – termo geral classificatório da regra, menor será 
o consenso em torno de sua aplicabilidade, até o momento em que haverá um 
consentimento em torno de sua inaplicabilidade. 
 É que a decisão sobre a aplicação da regra em um determinado caso 
específico incide no ponto sobre o significado do termo geral classificatório 
previsto na regra. Assim, se a norma proíbe o ingresso de veículos no parque, a 
sua aplicação dependerá da classificação fornecida pelo intérprete ao significado 
de “veículo” (carros, caminhões e motocicletas), vedação que será 
consensualmente estendida aos casos familiares54 (tratores, guindastes, 
retroescavadeiras), no entanto, sua aplicação será controvertida em relação às 
situações em que os termos gerais das regras extrapolarem suas ocorrências 
ordinárias, cabendo ao magistrado valer-se de seu poder discricionário e legislar 
para o caso concreto, tal como enunciado por Hart acerca das bicicletas, dos patins 
ou dos carros elétricos de brinquedo. 
 Vejamos nas palavras de Hart: 
“Qualquer que seja a estratégia escolhida para a transmissão de padrões de 
comportamento, seja o precedente ou a legislação, esses padrões, por muito 
facilmente que funcionem na grande massa dos casos comuns, se mostrarão 
imprecisos em algum ponto, quando sua aplicação for posta em dúvida; terão o 
que se tem chamado de ‘textura aberta’. Até aqui temos apresentado isso, no caso 
da legislação, como uma característica geral da linguagem humana; a incerteza 
nas zonas limítrofes é o preço a pagar pelo uso de termos classificatórios gerais 
em qualquer forma de comunicação referente a questões factuais.”55 
 
 Portanto, os padrões de comportamento transmitidos, quer por meio de 
precedentes, ou mesmo da legislação positivada, poderão ser imprecisos em 
 
53
 Núcleo de certeza do texto normativo objeto de interpretação em que não se instala qualquer 
dúvida sobre o seu conteúdo ou a sua aplicação. A certeza de significação ocorre porque as regras 
são formadas a partir de termos gerais classificatórios (das regras jurídicas e da linguagem) que 
comportam experiências exaustivas e são utilizadas para os casos recorrentes, assim, o “juízo 
consensual” consiste na aplicação de uma regra a um determinado caso recorrente onde inexiste 
dissenso sobre o significado da expressão. Tal ocorre no exemplo de Hart sobre a vedação de 
veículos no parque, situação em que não há dúvidas quanto a vedação de acesso de carros ou 
motocicletas em suas dependências. 
 
54
 As semelhanças de família e a sua relevância para a dissertação será melhor tratada no último 
capítulo. 
 
55
 Hart (2009 : 166). 
 
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 33 
algumas circunstâncias limítrofes de sua aplicação, sempre que os termos gerais 
classificatórios contidos nas regras extrapolarem suas ocorrências ordinárias, 
situação em que caberá ao magistrado valer-se de seu poder discricionário e 
legislar para o caso concreto. 
 
1.4.2 
Do poder discricionário dos juízes diante dos hard cases 
 
 Todo o arcabouço jurídico de uma determinada sociedade é construído e 
pensado por seres humanos, assim, no sistema romano-germânico (civil law) os 
responsáveis por sua criação são as pessoas que compõem o órgão legislativo. 
Evidentemente, que tais pessoas não podem deter o conhecimento de todas as 
combinações possíveis de circunstâncias fáticas que podem ocorrer no futuro. É 
simplesmente impossível para eles tentar imaginar o amanhã para de antemão 
construir uma regra a ser aplicada em situações imprevisíveis. 
 Então, para proteger determinados bens e valores jurídicos socialmente 
relevantes das variações no tempo, o poder legislativo acaba por estabelecer 
padrões gerais de regulamentação que deverão ser integrados posteriormente na 
medida em que os casos concretos ocorrerem e exigirem uma nova resposta para a 
efetiva tutela desses valores jurídicos. 
 O poder legislativo estabelece padrões gerais de regulamentação para que 
as regras sejam duradouras, isso porque não se pode antever todos os casos 
futuros e suas variações, devendo legislar genericamente os casos recorrentes 
quando então a regra será aplicada sem maiores problemas. 
 Trata-se do uso de termos gerais classificatórios da regra jurídica (e, da 
linguagem) que comportam experiências exaustivas e são utilizadas para os casos 
recorrentes, contudo, na medida em que as circunstâncias fáticas do mundo vão 
alterando e incluindo novas experiências, não se saberá se a norma as terá 
alcançado, como no exemplo da proibição de ingresso de veículo no parque, não 
se saberá de antemão se a vedação também inclui o carro elétrico de brinquedo ou 
os patins. 
“Às vezes se reconhece desde o início que, na esfera a ser controlada 
judicialmente, as características dos casos individuais variarão tanto, em aspectos 
imprevisíveis mas socialmente relevantes, que o poder legislativo não pode criar 
antecipadamente e de modo útil normas uniformes a serem aplicadas caso a caso, 
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sem orientação oficial posterior. Consequentemente, aquele poder estabelece, 
para regulamentar essa esfera, padrões muito gerais, e delega então a um órgão 
normativo, conhecedor dos vários tipos de casos, a tarefa de formular normas 
adaptadas as suas necessidades específicas.”56 
 
 Ao estabelecer padrões gerais para as hipóteses recorrentes (casos 
normais), o legislador deixa em dúvida a sua aplicação aos casos que extrapolem 
as ocorrências ordinárias, isso porque, tal como exposto anteriormente, as regras 
são formadas por palavras, e o seu significado é formado por experiências prévias 
limitadas (não exaustivas), de modo que o seu uso anterior (no momento da 
confecção da norma) não delimitará todos os seus usos futuros, eis que as palavras 
sempre poderão apresentar uma textura aberta. 
 Nessas hipóteses em que a imprecisão das regras acarretarem a 
insuficiência da descrição dos fatos (termos gerais classificatórios), está-se diante 
dos casos excepcionais ou hard cases, em que os legisladores não anteciparam a 
sua regulamentação. Nestes casos, caberá ao juiz utilizar seu poder 
discricionário57 para decidir o caso concreto, atuando como verdadeira autoridade 
normativa em tais circunstâncias58. 
 Da mesma forma, nos sistemas jurídicos que transmitem os seus padrões 
normativos gerais por meio dos precedentes, as indeterminações e vaguidades na 
aplicação das regras aos casos concretos ocorrerão ainda com mais intensidade do 
que naqueles sistemas que somente se utilizem de regras editadas por um órgão 
normativo competente. 
 
56
 Hart (2009 : 169/170). 
 
57
 Como será exposto no próximo item deste trabalho, neste caso, fala-se em discricionariedade 
judicial como a liberdade de escolhas atribuída aos magistrados para, no caso particular, definir 
entre soluções juridicamente possíveis e igualmente justas aquela que resolve mais eficientemente 
a vagueza da regra. Por outro lado, na discricionariedade administrativa incumbe à autoridade 
exercer um ato de vontade realizando uma escolha dentro de um espaço de livre apreciação 
previsto na própria norma. 
 
58
 Dworkin talvez seja o mais célebre crítico do positivismo hartiano, sobretudo quanto à 
possibilidade conferida pelo jusfilósofo inglês a respeito do poder discricionário dos juízes para 
decidir os hard cases, isto é, aqueles casos em que em virtude da textura aberta das normas haverá 
incertezas entre a suaclara aplicabilidade e a sua clara inaplicabilidade, ou seja, uma zona de 
penumbra. Hart sustenta que o juiz deverá decidir discricionariamente tais hipóteses eis que o 
direito não é capaz de oferecer respostas para todos esses casos. Dworkin, ao contrário, sustenta 
posição diferente, em que os casos difíceis possuem uma resposta correta, apoiada no modelo do 
juiz Hércules. Hart ainda apresenta objeções às críticas de Dworkin em seu pós-escrito. Dworkin 
(ref. 2: 2007: 55/108) e (ref. 3 : 2005 : 175/266); Hart (2009 : 305/356). 
 
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 Hart justifica que a transmissão de normas gerais por meio de exemplos 
(precedentes), além de possuir a abertura semântica presente na “textura aberta” 
das regras jurídicas escritas que culmina na discricionariedade judicial para os 
casos difíceis, também acaba por conferir outra capacidade criadora ou legislativa 
aos juízes, que poderão, em um novo julgamento posterior, alterar a regra 
derivada do precedente, bastando criar exceções não consideradas anteriormente 
para restringir a regra extraída do precedente, criando assim, uma nova regra. 
“Por outro lado, os tribunais que julguem uma causa posterior podem chegar a 
uma conclusão oposta à contida no precedente; para tanto, restringem a norma 
extraída do precedente, admitindo exceções não consideradas anteriormente, ou 
no caso de terem sido consideradas, deixadas em aberto. Esse processo de 
‘distinguir’ o caso anterior envolve a descoberta de alguma diferença 
juridicamente pertinente entre o caso passado e o atual, sem que a natureza dessas 
diferenças jamais possa ser determinada exaustivamente.”59 
 
 Para ilustrar tal situação pode-se imaginar uma regra formada a partir de 
por um precedente judicial que proíbe a entrada de animais em parques, porque, 
nesse caso, um senhor que levava suas ovelhas para pastar em um parque causava 
grandes tumultos e constrangimentos aos outros frequentadores. 
 Posteriormente, em um novo caso, outro senhor caminhava com o seu 
cachorro no mesmo parque, interpelado judicialmente já que estaria violando a 
regra que proíbe o ingresso de “animais no parque” (termo geral classificatório - 
animais), sobrevém uma nova e discrepante decisão judicial, em que o precedente 
anterior acaba sendo relativizado e excepcionado sob o fundamento de que 
“cachorro é um animal de pequeno porte e que não causa tumultos, diferente das 
ovelhas”. 
 Assim, a regra que veda o acesso de animais no parque passou a conter 
uma exceção – “não é permitida a entrada de animais no parque, salvo de pequeno 
porte”, regra que ainda poderia ser excepcionada por várias vezes na medida em 
que novas circunstâncias do mundo dos fatos aconteçam, como por exemplo, se 
alguém entrasse com um cachorro bravo no parque e fosse feita uma nova exceção 
à regra por algum tribunal, tal como, “não é permitida a entrada de animais no 
parque, salvo de pequeno porte e dócil”, e assim, sucessivamente, conforme 
ocorra a variação das circunstâncias fáticas. 
 
59
 Hart (2009 : 174/175). 
 
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 No entanto, tal como enunciado por Hart no pós-escrito, o poder 
discricionário60 que ele atribui aos juízes para a solução desses hard cases não é 
irrestrito ou ilimitado, de forma que os magistrados estarão sempre sujeitos a 
constrangimentos substantivos e deverão atuar como um legislador consciencioso 
agiria justificando de forma satisfatória as regras por eles criadas61. 
“É importante que os poderes de criação que eu atribuo aos juízes, para 
resolverem os casos parcialmente deixados por regular pelo direito, sejam 
diferentes dos de um órgão legislativo: não só os poderes do juiz são objeto de 
muitos constrangimentos que estreitam a sua escolha, de que um órgão legislativo 
pode estar consideravelmente liberto, mas, uma vez que os poderes do juiz são 
exercidos apenas para ele se libertar de casos concretos que urge resolver, ele não 
pode usá-los para introduzir reformas de larga escala ou novos códigos. Por isso, 
os seus poderes são intersticiais, e também estão sujeitos a muitos 
constrangimentos substantivos. Apesar disso, haverá pontos em que o direito 
existente não consegue ditar qualquer decisão que seja correta e, para decidir os 
casos em que tal ocorra, o juiz deve exercer os seus poderes de criação do direito. 
Mas não deve fazer isso de forma arbitrária: isto é, ele deve sempre ter certas 
razões gerais para justificar a sua decisão e deve agir como um legislador 
consciencioso agiria, decidindo de acordo com as suas próprias crenças e valores. 
Mas se ele satisfizer estas condições, tem o direito de observar padrões e razões 
para a decisão, que não são ditadas pelo direito e podem diferir dos seguidos por 
outros juízes confrontados com casos difíceis semelhantes.”62 
 
 Assim, feita a ressalva do “juiz consciencioso”, Hart conclui de forma 
enunciativa que a textura aberta é um fato incontestável, mesmo quando os 
tribunais tentam disfarçá-la. 
“[...] Está claro que casos comuns, como esses, vão surgir em qualquer sistema; 
por isso, o fato de os tribunais terem jurisdição para resolvê-los, escolhendo entre 
as alternativas que a lei deixa em aberto, parece ser um elemento – conquanto 
apenas implícito – das normas que regem a atividade judicial, mesmo que os 
tribunais pretendam maquiar essa escolha entre alternativas, apresentando-a como 
uma ‘descoberta’.”63 
 
 Nesse sentido, embora impondo algumas limitações, Hart outorga aos 
magistrados a tarefa de solucionar os “hard cases” decorrentes da textura aberta 
 
60
 Tal argumentação será retomada no terceiro capítulo da dissertação, quando será abordado o uso 
da analogia e dos casos de família. 
 
61
 No mesmo sentido Neil MacCormick: “Dentro da estrutura das regras cujo significado está 
suficientemente claro para alguns propósitos, há e deve haver um espectro considerável de 
discricionariedade para os juízes e outras autoridades. E, ao exercer essa discricionariedade, eles 
devem considerar, necessária e devidamente, fatores não jurídicos, tais como opiniões morais e 
políticas, conveniência e raison d’état, assim como o contexto geral das regras e princípios 
jurídicos, em busca da orientação que estes podem fornecer”. In MacCormick (2010: 43). 
 
62
 Hart (2009 : 352). 
 
63
 Hart (2009 : 198). 
 
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do direito, sempre que os padrões gerais veiculados na norma ou nos precedentes 
extrapolem as ocorrências ordinárias. 
 
1.5 
Uma breve digressão: a textura aberta, a discricionariedade e os 
conceitos jurídicos indeterminados 
 
 Conforme apresentado, a textura aberta da linguagem faz com que as 
regras apresentem uma penumbra de dúvida, em que não é possível precisar com 
clareza se a regra é aplicável ou não àquela determinada circunstância fática. 
 Nessas situações (hard cases), em que há uma insuficiente descrição dos 
termos gerais classificatórios pela regra jurídica, incumbe ao magistrado 
solucionar o caso concreto, valendo-se de seu poder discricionário, atuando como 
verdadeira autoridade normativa, mas cuja decisão estará sempre condicionada a 
sua justificabilidade nos termos da argumentação e fundamentação apresentadas 
quando do seu julgamento64. 
 Assim, embora a solução encontrada por Hart para a problemática que 
envolve a indeterminação normativa dos casos insólitos decorrente da presença da 
textura aberta, seja atribuir aos juízes o exercício de uma discricionariedade para a 
resolução desses casos, é certo que, tal mister não se confunde com a 
discricionariedade administrativa presente em grande medida no direito 
administrativo brasileiro que designa outra circunstância,qual seja, a 
possibilidade de o administrador público ter “um espaço de livre apreciação” ou 
uma margem de atuação legal diante de uma determinada situação concreta65. 
 Assim, tal como descrito por Hart, a “discricionariedade” para a solução 
de um determinado caso judicial, no qual o preceito normativo de regência é 
incompleto ou vago, não se confunde com a discricionariedade administrativa em 
 
64
 Hart (2009 : 352). 
 
65
 Para Celso Antônio Bandeira de Mello, atos discricionários “seriam os que a administração 
pratica com certa margem de liberdade de avaliação ou de decisão segundo critérios de 
conveniência e oportunidade formulados por ela mesma, ainda que adstrita à lei reguladora da 
expedição deles” Mello (2003 : 394). 
 
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que o próprio legislador faculta ao gestor público a possibilidade de realizar uma 
escolha dentro de certos parâmetros legais66. 
 Discorrendo sobre os estándares inconclusos, Endicott apresenta um 
exemplo em que é fácil perceber a diferença entre um conceito “vago” e um 
conceito “discricionário”: 
 “[...] estoy yendo a la tienda y me piden que compre plátanos. Pregunto cuántos 
debería comprar, y me dicen, ‘los suficientes’. Quizás ‘suficientes’ significa ‘la 
cantidad correcta’: la persona que me pidió los plátanos se resiste a solicitar 
una cantidad concreta, pero si me pide que tome em consideración las 
circunstancias relevantes para decir cuántos plátanos debo llevar a casa?Es 
vaga su petición? Podemos decir dos cosas: (1) no parece ser una petición 
precisa – el tomar em consideración las circunstancias relevantes para lo 
correcto de la cantidad, generalmente no exige que lleve a casa una cantidad 
determinada de plátanos (no obstante que podamos imaginar circunstancias que 
si exigen uma cantidad precisa); y (2) este ejemplo es diferente de una petición 
vaga ordinária tal como ‘aproximadamente media docena’ – en este segundo 
caso podemos decir que no se solicita um cantidad (vaga o de outro tipo), pero sí 
se solicita que elijamos una cantidad. El decir ‘suficientes’ es como decir ‘tú 
decides cuántos’. Pero es diferente de decir ‘los que quieras’ – la petición misma 
exige que consideremos lo que es apropriado.”67 
 
 O exemplo é preciso ao diferenciar uma enunciação vaga (“compre uma 
quantidade suficiente de bananas”) de uma proposição discricionária (“compre 
aproximadamente meia dúzia de bananas”), na medida em que, no primeiro caso, 
caberá à pessoa realizar uma interpretação do conceito indeterminado 
“suficiente”, inferindo-o em relação ao contexto e as circunstâncias fáticas do 
caso, para poder precisar quantas bananas deve comprar para que a sua compra 
fique “adequada” às expectativas do seu interlocutor; assim, como exemplo, se 
comprasse duas bananas seria adequado a um desjejum, mas em nenhuma 
circunstância seria suficiente para fazer uma bananada. Logo, o conceito 
“suficiente” é vago na medida em que exige uma complementação contextual para 
perder ou diminuir a sua indeterminação, mas, sua execução será vinculada aos 
parâmetros contextuais quando fornecidos. 
 Situação diversa, quando se solicita que alguém compre 
“aproximadamente meia dúzia de bananas” não se está fornecendo qualquer 
 
66
 Diogo de Figueiredo afirma que a discricionariedade “é a qualidade da competência cometida 
por lei à administração pública para definir, abstrata ou concretamente, o resíduo de legitimidade 
necessária para integrar a definição de elementos essenciais à prática de atos de execução, 
necessária para atender um interesse público específico”. Moreira Neto (1991 : 22). 
 
67
 Endicott (2006 : 87/88) 
 
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parâmetro interpretativo, vago ou não, apto a indexar o comportamento da pessoa 
no mercado. Nesse caso, basta a pessoa comprar uma quantidade aproximada de 
meia dúzia que ela estará cumprindo satisfatoriamente a exigência, por isso, o 
parâmetro de eleição do quantitativo de bananas a ser comprado será 
discricionário conforme a vontade da pessoa que foi à loja. 
 A grande diferença entre as duas situações é que no primeiro caso o 
comprador de bananas estará vinculado ao conceito indeterminado “suficiente”, 
não havendo juízo de escolhas de quantas bananas deve comprar, uma vez que 
“suficiente” significa a “quantidade correta” consoante expectativa do interlocutor 
(duas bananas para o desjejum e duas dúzias para a bananada). Já no segundo 
caso, a compra será totalmente discricionária, eis que foi solicitado ao comprador 
que escolhesse quantas bananas comprar, dentro do parâmetro “meia dúzia”, que 
servirá como meio de orientação a ser seguido, mas não vinculativo. 
 Hart, ao descrever a sua teoria da textura aberta e apresentar a 
discricionariedade judicial como meio de solução para os hard cases, parece não 
atribuir aos juízes um espaço de livre apreciação para escolher, conforme seu 
arbítrio, a solução para esses casos em que as regras aplicáveis não demandam de 
uma forma lógica apenas uma única resposta correta. 
 Na verdade, a vagueza decorrente da textura aberta do direito e a 
ocorrência de indeterminação nos casos marginais de aplicação de regras gerais, 
parece estar muito mais próxima do modelo de interpretação dos “conceitos 
jurídicos indeterminados”, do que da aplicação de um juízo de oportunidade e 
conveniência, em que seria livre a apreciação dessa vagueza pelos juízes68. 
 
68
 Como no caso da fixação do “justo preço” nas expropriações que, por se tratar de um conceito 
jurídico indeterminado, não permite que o juiz fixe o valor da indenização conforme seu arbítrio, 
ele deve fazer, na verdade, um juízo de estimação e valoração para definir o “justo”, conforme 
excelente exemplo de Santiago Tawil citando um julgamento do Tribunal Supremo Espanhol: 
“[...] mientras que el concepto jurídico indeterminado es configurado por la ley como un supuesto 
concreto de tal forma que solo se da una única solución justa em la aplicación del concepto a la 
circunstancia de hecho, como ocurre en el caso de actuación del jurado de expropriación que, 
como organismo encaregado de aplicar el concepto indeterminado de ‘justo precio’ a unos bienes 
expropiados, no es libre de decidir, a traves de un proceso volitivo de discrecionalidad, entre 
varios posibles justos precios, sino que realizando un proceso de juicio o estimación, há de 
atenerse necesariamente, sin libertad de decisión, a las circunstancias reales que ha de calificar y 
al sentido jurídico preciso que la ley ha asignado al concepto de ‘justo precio’, para determinar, a 
traves de su valoración, no cualquier posible, sino el precio que real y efectivamente sea el 
verdadero y justo, y por ello, dicha función, al no admitir más que una solución adecuada y 
conforme a la norma, constituye un proceso de subsunción de la categoria de justo precio em el 
supuesto concreto que se contemple, es decir, se trata de un supuesto normal de aplicación del 
derecho, sometido sin traba alguna, por eso, precisamente, a la funcción jurisdicional, encargada 
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 Assim, muito embora Hart designe a atividade empreendida pelos juízes 
para a resolução dos hard cases como sendo “discricionária”, na verdade, os 
juízes não exercem um juízo de escolhas como no caso da compra de meia dúzia 
de bananas, neste caso, eles exercem uma atividade interpretativa, recaindo a 
eleição somente em relação à valoração e ponderação dos fatores contextuais, 
depois que esses são desvendados, a atividade seria vinculada. 
 Ademais, como relacionado no item anterior, a discricionariedade judicial 
que Hart atribui aos juízes para a solução

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