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estupro de vulneravel

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COMPILAÇÃO JURISPRUDENCIAL – DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE1
Professora Cristiane Dupret
COMPILAÇÃO JURISPRUDENCIAL
Informativos:
Informativo nº 0568
Período: 3 a 16 de setembro de 2015.
Recursos Repetitivos
DIREITO PENAL. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 918.
Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos; o consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime. Inicialmente, registre-se que a interpretação jurisprudencial acerca do art. 224, "a", do CP (antes da entrada em vigor da Lei 12.015/2009) já vinha se consolidando no sentido de que respondia por estupro ou por atentado violento ao pudor o agente que mantinha relações sexuais (ou qualquer ato libidinoso) com menor de 14 anos, mesmo sem violência real, e ainda que mediante anuência da vítima (EREsp 1.152.864-SC, Terceira Seção, DJe 1º/4/2014). Com efeito, o fato de alterações legislativas terem sido incorporadas pela Lei 12.015/2009 ao "Título IV - Dos Crimes contra a Dignidade Sexual", especialmente ao "Capítulo II - Dos Crimes Sexuais contra Vulnerável", do CP, estanca, de uma vez por todas, qualquer dúvida quanto à irrelevância, para fins de aperfeiçoamento do tipo penal inscrito no caput do art. 217-A, de eventual consentimento da vítima ao ato libidinoso, de anterior experiência sexual ou da existência de relacionamento amoroso entre ela e o agente. Isso porque, a despeito de parte da doutrina sustentar o entendimento de que ainda se mantém a discussão sobre vulnerabilidade absoluta e vulnerabilidade relativa, o tipo penal do art. 217-A do CP não traz como elementar a expressão "vulnerável". É certo que o nomem iuris que a Lei 12.015/2009 atribui ao citado preceito legal estipula o termo "estupro de vulnerável". Entretanto, como salientado, a "vulnerabilidade" não integra o preceito primário do tipo. Na verdade, o legislador estabelece três situações distintas em que a vítima poderá se enquadrar em posição de vulnerabilidade, dentre elas: "Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos". Não cabe, destarte, ao aplicador do direito relativizar esse dado objetivo, com o fim de excluir a tipicidade da conduta. A propósito, há entendimento doutrinário no viés de que: "Hoje, com louvor, visando acabar, de uma vez por todas, com essa discussão, surge em nosso ordenamento jurídico penal, fruto da Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, o delito que se convencionou denominar de estupro de vulnerável, justamente para identificar a situação de vulnerabilidade que se encontra a vítima. Agora, não poderão os Tribunais entender de outra forma quando a vítima do ato sexual for alguém menor de 14 (quatorze) anos. [...]. O tipo não está presumindo nada, ou seja, está tão somente proibindo que alguém tenha conjunção carnal ou pratique outro ato libidinoso com menor de 14 anos, bem como com aqueles mencionados no § 1º do art. 217-A do Código Penal. Como dissemos anteriormente, existe um critério objetivo para análise da figura típica, vale dizer, a idade da vítima". Dessa forma, não se pode qualificar ou etiquetar comportamento de crianças, de modo a desviar a análise da conduta criminosa ou justificá-la. Expressões como "amadurecimento sexual da adolescente", "experiência sexual pretérita da vítima" ou mesmo a utilização das expressões "criança prostituta" ou "criança sedutora" ainda frequentam o discurso jurisprudencial, como se o reconhecimento de tais circunstâncias, em alguma medida, justificasse os crimes sexuais perpetrados. Esse posicionamento, todavia, implica a impropriedade de se julgar a vítima da ação delitiva para, a partir daí, julgar-se o agente. Refuta-se, ademais, o frágil argumento de que o desenvolvimento da sociedade e dos costumes possa configurar fator que não permita a subsistência de uma presunção que toma como base a innocentia consilli da vítima. Basta um rápido exame da história das ideias penais - e, em particular, das opções de política criminal que deram ensejo às sucessivas normatizações do Direito Penal brasileiro - para se constatar que o caminho da "modernidade" é antípoda a essa espécie de proposição. Deveras, de um Estado ausente e de um Direito Penal indiferente à proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes, evoluiu-se, paulatinamente, para uma Política Social e Criminal de redobrada preocupação com o saudável crescimento físico, mental e afetivo do componente infanto-juvenil de nossa população, preocupação que passou a ser compartilhada entre o Estado, a sociedade e a família, com reflexos na dogmática penal. Assim é que novas tipificações vieram reforçar a opção do Estado brasileiro - na linha de similar esforço mundial - de combater todo tipo de violência, sobretudo a sexual, contra crianças e adolescentes. É anacrônico, portanto, qualquer discurso que procure considerar a modernidade, a evolução moral dos costumes sociais e o acesso à informação como fatores que se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certos grupos de pessoas física, biológica, social ou psiquicamente fragilizadas. Além disso, não há que se falar em aplicação do princípio da adequação social, porquanto no julgamento de caso de estupro de vulnerável deve-se evitar carga de subjetivismo, sob pena de ocorrência de possíveis danos relevantes ao bem jurídico tutelado - o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes - que, recorde-se, conta com proteção constitucional e infraconstitucional, não sujeito a relativizações. Ora, a tentativa de não conferir o necessário relevo à prática de relações sexuais entre casais em que uma das partes (em regra, a mulher) é menor de 14 anos, com respaldo nos costumes sociais ou na tradição local, tem raízes em uma cultura sexista - ainda muito impregnada no âmago da sociedade ocidental, sobretudo em comunidades provincianas, segundo a qual meninas de tenra idade, já informadas dos assuntos da sexualidade, estão aptas a manter relacionamentos duradouros e estáveis (envolvendo, obviamente, a prática sexual), com pessoas adultas. Ressalta-se, por fim, que praticamente todos os países do mundo repudiam o sexo entre um adulto e um adolescente - e, mais ainda, com uma criança - e tipificam como crime a conduta de praticar atos libidinosos com pessoa ainda incapaz de ter o seu consentimento reconhecido como válido. Precedentes citados: AgRg nos EDcl no AREsp 191.197-MS, Quinta Turma, DJe 19/12/2014; e AgRg no REsp 1.435.416-SC, Sexta Turma, DJe 3/11/2014. REsp 1.480.881-PI, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
Informativo nº 0567
Período: 21 de agosto a 2 de setembro de 2015.
Primeira Turma
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. HIPÓTESE DE MITIGAÇÃO DO REQUISITO ETÁRIO PARA A CONCESSÃO DE SALÁRIO-MATERNIDADE.
O não preenchimento do requisito etário exigido para a filiação ao RGPS como segurado especial não constitui óbice à concessão de salário-maternidade a jovem menor de dezesseis anos impelida a exercer trabalho rural em regime de economia familiar (art. 11, VII, "c" e § 6º da Lei 8.213/1991). Realmente, a Lei 8.213/1991 fixou a idade mínima de dezesseis anos para que se ostente a condição de segurado especial a que se refere o art. 11, VII, "c" e § 6º, desse mesmo diploma legal. Além disso, a idade mínima de dezesseis anos constitui o limite constitucional para o trabalho (art. 7º, XXXIII, da CF) e o marco etário para filiação ao RGPS. Apesar disso, não se pode admitir, na hipótese, que o não preenchimento do requisito etário para filiação ao RGPS prejudique o acesso ao benefício previdenciário do salário-maternidade. Inicialmente, o sistema de Seguridade Social, em seu conjunto, tem por objetivo constitucionalproteger o indivíduo, assegurando direitos à saúde, à assistência social e à previdência social, revelando-se, dessa forma, elemento indispensável para garantia da dignidade humana. Nesse contexto, prejudicar o acesso ao benefício previdenciário em razão do não preenchimento do requisito etário implicaria desamparar não só a jovem trabalhadora, mas também o nascituro, que seria privado não apenas da proteção social, como também do convívio familiar, já que sua mãe teria de voltar às lavouras após o nascimento. Além do mais, a intenção do legislador infraconstitucional ao impor o limite mínimo de dezesseis anos de idade para a inscrição no RGPS era a de evitar a exploração do trabalho da criança e do adolescente, ancorado no art. 7º, XXXIII, da CF. Negar o salário-maternidade à jovem grávida a que se refere a hipótese contraria essa proteção, na medida em que coloca a adolescente em situação ainda mais vulnerável, afastando a proteção social de quem mais necessita. Corroborando esse entendimento, o STJ já assentou a orientação de que a legislação, ao vedar o trabalho infantil, teve por escopo a proteção da criança ou adolescente, tendo sido estabelecida a proibição em seu benefício, e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (REsp 541.103-RS, Quinta Turma, DJ 1º/7/2004; e AgRg no Ag 922.625-SP, Sexta Turma, DJ 29/10/2007). REsp 1.440.024-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 18/8/2015, DJe 28/8/2015.
Informativo nº 0567
Período: 21 de agosto a 2 de setembro de 2015.
Terceira Turma
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ADOÇÃO DE CRIANÇA POR PESSOA HOMOAFETIVA.
É possível a inscrição de pessoa homoafetiva no registro de pessoas interessadas na adoção (art. 50 do ECA), independentemente da idade da criança a ser adotada. A legislação não veda a adoção de crianças por solteiros ou casais homoafetivos, tampouco impõe, nessas hipóteses, qualquer restrição etária. Ademais, sendo a união entre pessoas do mesmo sexo reconhecida como uma unidade familiar, digna de proteção do Estado, não se vislumbra, no contexto do "pluralismo familiar" (REsp 1.183.378-RS, DJe 1º/2/2012), pautado nos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, a possibilidade de haver qualquer distinção de direitos ou exigências legais entre as parcelas homoafetiva (ou demais minorias) e heteroafetiva da população brasileira. Além disso, mesmo se se analisar sob o enfoque do menor, não há, em princípio, restrição de qualquer tipo à adoção de crianças por pessoas homoafetivas. Isso porque, segundo a legislação vigente, caberá ao prudente arbítrio do magistrado, sempre sob a ótica do melhor interesse do menor, observar todas as circunstâncias presentes no caso concreto e as perícias e laudos produzidos no decorrer do processo de adoção. Nesse contexto, o bom desempenho e bem-estar da criança estão ligados ao aspecto afetivo e ao vínculo existente na unidade familiar, e não à opção sexual do adotante. Há, inclusive, julgado da Terceira Turma do STJ no qual se acolheu entendimento doutrinário no sentido de que "Estudos feitos no âmbito da Psicologia afirmam que pesquisas '[...] têm demonstrado que os filhos de pais ou mães homossexuais não apresentam comprometimento e problemas em seu desenvolvimento psicossocial quando comparados com filhos de pais e mães heterossexuais. O ambiente familiar sustentado pelas famílias homo e heterossexuais para o bom desenvolvimento psicossocial das crianças parece ser o mesmo'" (REsp 1.281.093-SP, DJe 4/2/2013). No mesmo sentido, em precedente da Quarta Turma do STJ (REsp 889.852, DJe 10/8/2010), afirmou-se que "os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria), 'não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores'". REsp 1.540.814-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/8/2015, DJe 25/8/2015.
Informativo nº 0565
Período: 1º de julho a 7 de agosto de 2015.
Primeira Turma
DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. CONVENÇÃO DA HAIA SOBRE ASPECTOS CIVIS DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS.
O pedido de retorno imediato de criança retida ilicitamente por sua genitora no Brasil pode ser indeferido, mesmo que transcorrido menos de um ano entre a retenção indevida e o início do processo perante a autoridade judicial ou administrativa (art. 12 da Convenção de Haia), na hipótese em que o menor - com idade e maturidade suficientes para compreender a controvérsia - estiver adaptado ao novo meio e manifestar seu desejo de não regressar ao domicílio paterno no estrangeiro. De fato, a autoridade central deve ordenar o retorno imediato da criança quando é acionada no período de menos de um ano entre a data da transferência ou da retenção indevidas e a data do início do processo perante a autoridade judicial ou administrativa do Estado contratante onde a criança se encontrar, nos termos do art. 12 da Convenção da Haia. Contudo, em situações excepcionalíssimas, nos termos da Convenção da Haia e no propósito de se preservar o superior interesse do menor, a autoridade central poderá negar o pedido de retorno imediato ao país de origem, como na hipótese de a criança já se encontrar integrada ao novo meio em que vive e manifestar o desejo de não regressar para o domicílio estrangeiro do genitor. Em tal cenário, deve-se priorizar o conteúdo da valiosa regra posta no art. 13 da referida Convenção, segundo a qual "A autoridade judicial ou administrativa pode também recusar-se a ordenar o retorno da criança se verificar que esta se opõe a ele e que a criança atingiu já idade e grau de maturidade tais que seja apropriado levar em consideração as suas opiniões sobre o assunto". Cuida-se, certamente, de diretriz de extrema importância e utilidade para a tomada de decisões na área de interesses de pessoas menores de 18 anos, que, aliás, encontrou plena receptividade no âmbito da posterior Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (ONU/1989), cujo art. 12 assim fez preceituar: "1. Os Estados-parte assegurarão à criança, que for capaz de formar seus próprios pontos de vista, o direito de exprimir suas opiniões livremente sobre todas as matérias atinentes à criança, levando-se devidamente em conta essas opiniões em função da idade e maturidade da criança. 2. Para esse fim, à criança será dada a oportunidade de ser ouvida em qualquer procedimento judicial ou administrativo que lhe diga respeito, diretamente ou através de um representante ou órgão apropriado, em conformidade com as regras processuais do direito nacional". REsp 1.214.408-RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 23/6/2015, DJe 5/8/2015.
Informativo nº 0562
Período: 18 a 28 de maio de 2015.
Quinta Turma
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. HIPÓTESE DE NÃO UNIFICAÇÃO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS.
O adolescente que cumpria medida de internação e foi transferido para medida menos rigorosa não pode ser novamente internado por ato infracional praticado antes do início da execução, ainda que cometido em momento posterior aos atos pelos quais ele já cumpre medida socioeducativa. Dispõe o caput do art. 45 da Lei 12.594/2012 que: "Se, no transcurso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida, a autoridade judiciária procederá à unificação, ouvidos, previamente, o Ministério Público e o defensor, no prazo de 3 (três) dias sucessivos, decidindo-se em igual prazo". Já em seu § 1º, tem-se que "É vedado à autoridade judiciária determinar reinício de cumprimento de medida socioeducativa, ou deixar de considerar os prazos máximos, e de liberação compulsória previstos na Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), excetuada a hipótese de medida aplicada por ato infracional praticado durante a execução".Por sua vez, dispõe o § 2º que "É vedado à autoridade judiciária aplicar nova medida de internação, por atos infracionais praticados anteriormente, a adolescente que já tenha concluído cumprimento de medida socioeducativa dessa natureza, ou que tenha sido transferido para cumprimento de medida menos rigorosa, sendo tais atos absorvidos por aqueles aos quais se impôs a medida socioeducativa extrema". Neste preceito normativo, foram traçadas as regras a serem seguidas no caso de superveniência de nova medida socioeducativa em duas situações distintas, quais sejam, por ato infracional praticado durante a execução da medida e por fato cometido antes do início do cumprimento desta. Veja-se que o § 1º do preceito aludido expressamente excepciona a aplicação de seu regramento nas hipóteses de superveniência de medida em razão de ato infracional que tenha sido "praticado durante a execução". Em seguida, em seu § 2º, o legislador fixa uma limitação à aplicação de nova medida extrema, sendo esta vedada em razão de atos infracionais "praticados anteriormente". Em uma interpretação sistemática na norma contida no § 2º, deve-se entender que esta vedação se refere à prática de ato infracional cometido antes do início da execução a que se encontra submetido o menor. Com efeito, o retorno do adolescente à internação após demonstrar que está em recuperação - que já tenha cumprido medida socioeducativa dessa natureza ou que tenha apresentado méritos para progredir para medida em meio aberto - significaria um retrocesso em seu processo de ressocialização. Deve-se ter em mente que, nos termos do ECA, em relação ao menor em conflito com a lei, não existe pretensão punitiva, mas educativa, considerando-se a "condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento" (art. 6º), sujeitos à proteção integral (art. 1º). Mister considerar, ainda, os princípios que regem a aplicação da medida socioeducativa extrema, quais sejam, da excepcionalidade e do respeito à condição peculiar do jovem em desenvolvimento (art. 121 do ECA), segundo os quais aquela somente deverá ser aplicada como ultima ratio, ou seja, quando outras não forem suficientes à sua recuperação. Conclui-se, pois, que o termo "anteriormente" contido no § 2º do art. 45 da Lei 12.594/2012 refere-se ao início da execução, não à data da prática do ato infracional que originou a primeira medida extrema imposta. HC 274.565-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 12/5/2015, DJe 21/5/2015.
Informativo nº 0561
Período: 4 a 17 de maio de 2015.
Primeira Turma
DIREITO ADMINISTRATIVO. PENSÃO ESPECIAL DE EX-COMBATENTE A CRIANÇA OU ADOLESCENTE SOB SUA GUARDA.
Na hipótese de morte do titular de pensão especial de ex-combatente, o menor de dezoito anos que estava sob sua guarda deve ser enquadrado como dependente (art. 5º da Lei 8.059/1990) para efeito de recebimento, na proporção que lhe couber, da pensão especial (art. 53, II, do ADCT) que recebia o seu guardião. Da leitura do art. 5º da Lei 8.059/1990, verifica-se que o legislador não incluiu o menor de dezoito anos sob guarda no rol dos beneficiários da pensão especial. Essa omissão, contudo, não tem o condão de afastar a pretensão do menor de dezoito anos de receber a aludida vantagem, uma vez que o art. 33, § 3º, da Lei 8.069/1990 (ECA) dispõe: "a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários". Nessa perspectiva, a ênfase dada para que essa condição especial do menor de dezoito anos envolva, inclusive, os benefícios previdenciários não pode conduzir a uma interpretação restritiva e contrária ao próprio espírito da norma, que cuidou de proporcionar uma proteção mais ampla aos direitos e interesses dos infantes. Além disso, o art. 227 da CF exige da família, da sociedade e do Estado a conjugação de esforços no sentido de prestar atendimento prioritário a todos os interesses de crianças e adolescentes. Assim, o ECA se encontra em absoluta sintonia com a diretriz hermenêutica demarcada no plano constitucional, não sendo admissível a exegese de que a pensão especial de ex-combatente, por não possuir natureza previdenciária, afastaria a aplicação da regra prevista no ECA. Nessa ordem de ideias, do cotejo entre a Lei 8.059/1990 (art. 5°) e o ECA, este diploma legal, mais benéfico, deve prevalecer, em razão do critério da especialidade. REsp 1.339.645-MT, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 3/3/2015, DJe 4/5/2015.
Informativo nº 0559
Período: 6 a 16 de abril de 2015.
Segunda Seção
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E PROCESSUAL CIVIL. RELAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA ENTRE AÇÃO FUNDADA NA CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS E AÇÃO DE GUARDA E DE REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS.
No caso em que criança tenha sido supostamente retida ilicitamente no Brasil por sua genitora, não haverá conflito de competência entre (a) o juízo federal no qual tramite ação tão somente de busca e apreensão da criança ajuizada pelo genitor com fundamento na Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças e (b) o juízo estadual de vara de família que aprecie ação, ajuizada pela genitora, na qual se discuta o fundo do direito de guarda e a regulamentação de visitas à criança; verificando-se apenas prejudicialidade externa à ação ajuizada na Justiça Estadual, a recomendar a suspensão deste processo até a solução final da demanda ajuizada na Justiça Federal. Com efeito, o objetivo da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças é repor à criança seu status quo, preservando o foro do país de sua residência habitual como o competente para julgar pedido de guarda, por configurar o juízo natural onde se pressupõe sejam melhor discutidas as questões a ela referentes e mais fácil a colheita de provas (art. 1°). Essa presunção, aliás, reforça a ideia de que a decisão sobre a guarda e regulamentação do direito de visitas não é objeto da ação de busca e apreensão de criança retida ilicitamente no território nacional. Aliás, os arts. 16, 17 e 19 da referida convenção corroboram esse entendimento e evidenciam que a competência para a decisão sobre a guarda da criança não é do juízo que vai decidir a medida de busca e apreensão da criança. Nesse passo, se for determinada a restituição da criança ao país de origem, lá é que se decidirá a respeito do fundo do direito de guarda e regulamentação de visitas. Por sua vez, caso seja indeferido o pleito de restituição, a decisão sobre essas questões caberá ao Juízo de Família competente. Desse modo, na ação de busca e apreensão que tramita na Justiça Federal não será definido o fundo de direito de guarda e regulamentação de visitas, por se tratar de questão para a qual existe foro próprio e adequado, seja no país de origem da criança, seja no Brasil. Portanto, a aludida ação de busca e apreensão de criança apresenta-se como uma prejudicialidade externa à ação de guarda e regulamentação de visitas proposta na Justiça Estadual, a recomendar sua suspensão desta, nos termos do art. 265, IV, "a", do CPC, e não a modificação da competência. Por fim, convém esclarecer que há três recentes precedentes do STJ que analisaram hipóteses semelhantes à que aqui se discute. Neles, reconheceu-se haver conflito e concluiu pela competência da Justiça Federal para o julgamento das causas que tramitavam na Justiça Estadual (CC 100.345-RJ, Segunda Seção, DJe 18/3/2009; CC 118.351-PR, Segunda Seção, DJe 5/10/2011; e CC 123.094-MG, Segunda Seção, DJe 14/2/2014). Entretanto, ante a inexistência de conexão entre a ação de busca e apreensão e a ação de guarda e regulamentação de visitas, não há se falar em conflito de competência entre as demandas em análise. CC 132.100-BA, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 25/2/2015, DJe 14/4/2015.
Informativo nº 0558
Período: 19 de março a 6 de abril de 2015.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. ADOÇÃO DE PESSOA MAIOR DE IDADE SEM O CONSENTIMENTO DE SEU PAI BIOLÓGICO.
Ante o abandono do adotandopelo pai biológico e o estabelecimento de relação paterno-filial (vínculo afetivo) entre adotante e adotando, a adoção de pessoa maior de idade não pode ser refutada sem apresentação de justa causa por parte do pai biológico. Após a revogação do art. 1.621 do CC pela Lei 12.010/2009, o ECA passou a reger, no que couber, a adoção de maiores de dezoito anos (art. 1.619 do CC). Nesse passo, convém esclarecer que o caput do art. 45 do referido Estatuto dispõe que "a adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando". Por sua vez, o § 1° do mencionado dispositivo do ECA preceitua que "o consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar". Ciente disso, importa destacar que o poder familiar extingue-se pela maioridade (art. 1.635 do CC), pois "os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores" (art. 1.630 do CC). Portanto, considerando-se que o direito em discussão está envolto à defesa de interesse individual e disponível de pessoa plenamente capaz e que o exercício da autonomia da vontade do maior de dezoito anos não depende mais do consentimento de seus pais ou de seu representante legal, não se aplica o art. 45 do ECA à adoção de maior de idade. Além disso, o art. 48 do ECA dispõe que "o adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos". Desse modo, sendo possível ao filho maior buscar suas origens biológicas, partindo-se de uma interpretação teleológica desse dispositivo, é possível reconhecer também o direito de afastá-las por definitivo, por meio de adoção quando ele atingir a maioridade. REsp 1.444.747-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 17/3/2015, DJe 23/3/2015.
Informativo nº 0557
Período: 5 a 18 de março de 2015.
Terceira Turma
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE PROPOSTA PELO MP E REALIZAÇÃO DE CITAÇÃO EDITÁLICIA DO RÉU EM JORNAL LOCAL.
Na hipótese em que o Ministério Público Estadual tenha proposto ação de investigação de paternidade como substituto processual de criança, a citação editalícia do réu não poderá ser realizada apenas em órgão oficial. Isso porque não se aplica o art. 232, § 2º, do CPC, o qual prevê que a publicação do edital de citação, no caso de a parte ser beneficiária da justiça gratuita, deve se restringir ao órgão oficial. Assim, por versar disposição restritiva e, portanto, aplicável exclusivamente apenas à previsão específica, é vedada a sua aplicação analógica do referido dispositivo ao Ministério Público, cuja atuação não se confunde com as funções próprias da Defensoria Pública, e com essa instituição não pode ser equiparado. Ademais, restringir a publicação de editais de citação ao órgão oficial resultaria, evidentemente, na limitação das chances da citação por edital lograr êxito. REsp 1.377.675-SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/3/2015, DJe 16/3/2015.
Informativo nº 0557
Período: 5 a 18 de março de 2015.
Terceira Turma
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE PROPOSTA PELO MP E DISPENSA DE ADIANTAMENTO DE DESPESA.
O Ministério Público Estadual, ao propor ação de investigação de paternidade como substituto processual de criança, não é obrigado a adiantar as despesas decorrentes da citação editalícia do réu em jornal local, devendo o adiantamento dos gastos da referida diligência ser realizado pela Fazenda Pública Estadual. No sistema do CPC, incumbe à parte interessada, como regra, antecipar as despesas relativas aos atos que praticar ou requerer no processo, desde o início até a sentença final (art. 19 do CPC). Após a definição do litígio, a sentença impõe ao vencido o pagamento à parte vencedora das despesas antecipadas (art. 20 do CPC). Por sua vez, conforme exegese do art. 27 do CPC, o MP, quando requerer diligências que acarretem custos não adiantará a despesa, mas suportará o ônus ao final do processo, caso seja vencido. E, mesmo nessa hipótese, em virtude da falta de personalidade jurídica do órgão ministerial, tal encargo deve recair sobre a Fazenda Pública. Portanto, a norma não isenta o MP do pagamento das despesas, apenas não o obriga a antecipar seu pagamento. De outro lado, o art. 18 da Lei 7.347/1985 (LACP) é expresso ao estatuir, como regra, a dispensa de adiantamento de despesas processuais em favor do titular da ação civil pública, como antecipação de honorários periciais, emolumentos, custas processuais e outros tipos de despesas, salvo comprovada má-fé. Além disso, o STJ já assentou, em sede de recurso especial, julgado sob o rito repetitivo, que "descabe o adiantamento dos honorários periciais pelo autor da ação civil pública, conforme disciplina o art. 18 da Lei 7.347/1985, sendo que o encargo financeiro para a realização da prova pericial deve recair sobre a Fazenda Pública a que o Ministério Público estiver vinculado, por meio da aplicação analógica da Súmula 232/STJ" (REsp 1.253.844-SC, Primeira Seção, DJe 17/10/2013). Desse modo, o MP não se sujeita ao ônus de adiantar as despesas processuais quando atua em prol da sociedade, inclusive como substituto processual, pois milita, em última análise, com base no interesse público primário, não devendo ter a sua atuação cerceada. Na hipótese em foco, o custo econômico da citação editalícia na imprensa local deve ser suportado pela Fazenda Pública estadual, por aplicação analógica da Súmula 232/STJ: "A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito". REsp 1.377.675-SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/3/2015, DJe 16/3/2015.
Informativo nº 0556
Período: 23 de fevereiro a 4 de março de 2015.
Quinta Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL. VALIDADE DO DEPOIMENTO SEM DANO NOS CRIMES SEXUAIS CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE.
Não configura nulidade por cerceamento de defesa o fato de o defensor e o acusado de crime sexual praticado contra criança ou adolescente não estarem presentes na oitiva da vítima devido à utilização do método de inquirição denominado "depoimento sem dano", precluindo eventual possibilidade de arguição de vício diante da falta de alegação de prejuízo em momento oportuno e diante da aquiescência da defesa à realização do ato processual apenas com a presença do juiz, do assistente social e da servidora do Juízo. Em se tratando de crime sexual contra criança e adolescente, justifica-se a inquirição da vítima na modalidade do "depoimento sem dano", em respeito à sua condição especial de pessoa em desenvolvimento, procedimento aceito no STJ, inclusive antes da deflagração da persecução penal, mediante prova antecipada (HC 226.179-RS, Quinta Turma, DJe 16/10/2013). Ademais, o STJ tem entendido que a inércia da defesa, em situações semelhantes à presente, acarreta preclusão de eventual vício processual, mormente quando não demonstrado o prejuízo concreto ao réu, incidindo, na espécie, o art. 563 do CPP, que acolheu o princípio pas de nullité sans grief (HC 251.735-RS, Sexta Turma, DJe 14/4/2014). RHC 45.589-MT, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 24/2/2015, DJe 3/3/2015.
Informativo nº 0555
Período: 11 de março de 2015.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. DESCONSTITUIÇÃO DE PATERNIDADE REGISTRAL.
Admitiu-se a desconstituição de paternidade registral no seguinte caso: (a) o pai registral, na fluência de união estável estabelecida com a genitora da criança, fez constar o seu nome como pai no registro de nascimento, por acreditar ser o pai biológico do infante; (b) estabeleceu-se vínculo de afetividade entre o pai registral e a criança durante os primeiros cinco anos de vida deste; (c) o pai registral solicitou, ao descobrir que fora traído, a realização de exame de DNA e, a partir do resultado negativo do exame, não mais teve qualquer contato com a criança, por mais de oito anos até a atualidade; e (d) o pedido de desconstituição foi formuladopelo próprio pai registral. De fato, a simples ausência de convergência entre a paternidade declarada no assento de nascimento e a paternidade biológica, por si só, não autoriza a invalidação do registro. Realmente, não se impõe ao declarante, por ocasião do registro, prova de que é o genitor da criança a ser registrada. O assento de nascimento traz, em si, essa presunção. Entretanto, caso o declarante demonstre ter incorrido, seriamente, em vício de consentimento, essa presunção poderá vir a ser ilidida por ele. Não se pode negar que a filiação socioativa detém integral respaldo do ordenamento jurídico nacional, a considerar a incumbência constitucional atribuída ao Estado de proteger toda e qualquer forma de entidade familiar, independentemente de sua origem (art. 227 da CF). Ocorre que o estabelecimento da filiação socioafetiva perpassa, necessariamente, pela vontade e, mesmo, pela voluntariedade do apontado pai, ao despender afeto, de ser reconhecido como tal. Em outras palavras, as manifestações de afeto e carinho por parte de pessoa próxima à criança somente terão o condão de convolarem-se numa relação de filiação se, além da caracterização do estado de posse de filho, houver, por parte do indivíduo que despende o afeto, a clara e inequívoca intenção de ser concebido juridicamente como pai ou mãe da criança. Portanto, a higidez da vontade e da voluntariedade de ser reconhecido juridicamente como pai consubstancia pressuposto à configuração de filiação socioafetiva no caso aqui analisado. Dessa forma, não se concebe a conformação dessa espécie de filiação quando o apontado pai incorre em qualquer dos vícios de consentimento. Ademais, sem proceder a qualquer consideração de ordem moral, não se pode obrigar o pai registral, induzido a erro substancial, a manter uma relação de afeto igualmente calcada no vício de consentimento originário, impondo-lhe os deveres daí advindos sem que voluntária e conscientemente o queira. Além disso, como a filiação sociafetiva pressupõe a vontade e a voluntariedade do apontado pai de ser assim reconhecido juridicamente, caberá somente a ele contestar a paternidade em apreço. Por fim, ressalte-se que é diversa a hipótese em que o indivíduo, ciente de que não é o genitor da criança, voluntária e expressamente declara o ser perante o Oficial de Registro das Pessoas Naturais ("adoção à brasileira"), estabelecendo com esta, a partir daí, vínculo da afetividade paterno-filial. Nesta hipótese - diversa do caso em análise -, o vínculo de afetividade se sobrepõe ao vício, encontrando-se inegavelmente consolidada a filiação socioafetiva (hipótese, aliás, que não comportaria posterior alteração). A consolidação dessa situação - em que pese antijurídica e, inclusive, tipificada no art. 242 do CP -, em atenção ao melhor e prioritário interesse da criança, não pode ser modificada pelo pai registral e socioafetivo, afigurando-se irrelevante, nesse caso, a verdade biológica. Trata-se de compreensão que converge com o posicionamento perfilhado pelo STJ (REsp 709.608-MS, Quarta Turma, DJe 23/11/2009; e REsp 1.383.408-RS, Terceira Turma, DJe 30/5/2014). REsp 1.330.404-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 5/2/2015, DJe 19/2/2015.
Informativo nº 0553
Período: 11 de fevereiro de 2015.
Sexta Turma
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. POSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO IMEDIATO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA IMPOSTA EM SENTENÇA.
Nos processos decorrentes da prática de atos infracionais, é possível que a apelação interposta pela defesa seja recebida apenas no efeito devolutivo, impondo-se ao adolescente infrator o cumprimento imediato das medidas socioeducativas prevista na sentença. Primeiramente, em que pese haver a Lei 12.010/2009 revogado o inciso VI do art. 198 do ECA, que conferia apenas o efeito devolutivo ao recebimento dos recursos, continua a viger o disposto no art. 215 do ECA, o qual dispõe que "o juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparável à parte". Assim, se é verdade que o art. 198, VI, do ECA não mais existe no mundo jurídico, a repercussão jurisprudencial dessa mutatio legis parece ser inexistente, tamanha a evidência de que a nova lei não veio para interferir em processos por ato infracional, mas apenas em processos cíveis, sobretudo nos de adoção. Isso porque, pela simples leitura da Lei 12.010/2009 percebe-se que todos os seus dispositivos dizem respeito ao processo de adoção, o que permite inferir, induvidosamente, que, ao revogar o inciso VI do art. 198 do ECA - que também tratava de recursos contra sentenças cíveis -, não foi, sequer em hipótese, imaginado pelo legislador que tal modificação se aplicaria a processos por ato infracional, que nada tem a ver com processos de adoção de crianças e adolescentes. Lógico inferir, portanto, que os recursos serão, em regra, recebidos apenas no efeito devolutivo, inclusive e principalmente os recursos contra sentença que acolheu a representação do Ministério Público e impôs medida socioeducativa ao adolescente infrator. Ademais, cuidando-se de medida socioeducativa, a intervenção do Poder Judiciário tem como missão precípua não a punição pura e simples do adolescente em conflito com a lei, mas sim a recuperação e a proteção do jovem infrator. Sendo assim, as medidas previstas nos arts. 112 a 125 do ECA não são penas e possuem o objetivo primordial de proteção dos direitos do adolescente, de modo a afastá-lo da conduta infracional e de uma situação de risco. Além disso, diferentemente do que ocorre na justiça criminal comum, que se alicerça sobre regras que visam proteger o acusado contra ingerências abusivas do Estado em sua liberdade, a justiça menorista apoia-se em bases peculiares, devendo se orientar pelos princípios da proteção integral e da prioridade absoluta, definidos no art. 227 da CF e nos arts. 3º e 4º do ECA. Por esse motivo, e considerando que a medida socioeducativa não representa punição, mas mecanismo de proteção ao adolescente e à sociedade, de natureza pedagógica e ressocializadora, não há de se falar em ofensa ao princípio da não culpabilidade, previsto no art. 5º, LVII, da CF, pela sua imediata execução. Assim, condicionar, de forma automática, o cumprimento da medida socioeducativa ao trânsito em julgado da sentença que acolhe a representação constitui verdadeiro obstáculo ao escopo ressocializador da intervenção estatal, além de permitir que o adolescente permaneça em situação de risco, exposto aos mesmos fatores que o levaram à prática infracional. HC 301.135-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 21/10/2014, DJe 1º/12/2014.
Informativo nº 0552
Período: 17 de dezembro de 2014.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO INDEVIDO DA ATIVIDADE PROBATÓRIA DAS PARTES EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE MATERNIDADE.
Definiu-se não ser possível julgar improcedente pedido de reconhecimento post mortem de maternidade socioafetiva sem que se tenha viabilizado a realização de instrução probatória, ante o julgamento antecipado da lide (art. 330, I, do CPC), na seguinte situação: i) a autora ingressou com pedido de reconhecimento da existência de filiação socioafetiva, com a manutenção de sua mãe registral em seu assentamento de nascimento; ii) o pedido foi fundado na alegação de que a pretensa mãe adotiva e sua mãe registral procederam, em conjunto, à denominada “adoção à brasileira” da demandante, constando do registro apenas uma delas porque, à época, não era admitida união homoafetiva pelo ordenamento jurídico nacional; iii) argumentou-se que a autora foi criada, como se filha fosse, por ambas as "mães", indistintamente, e mesmo após o rompimento do relacionamento delas, encontrando-se, por isso, estabelecido o vínculo socioafetivo, a propiciar o reconhecimento judicial da filiação pretendida; e iv) o julgamento de improcedência foi fundado na constatação de não ter sido demonstrado nos autos que a mãe socioafetiva teve, efetivamente, a pretensão de "adotar" a autora em conjunto com a mãe registral e, também, no entendimento de que elasnão formavam um casal homossexual, como sugere a demandante, pois, posteriormente, a mãe registral casou-se com um homem, com quem formou núcleo familiar próprio. No caso descrito, o proceder do julgador, ao não permitir que a autora demonstrasse os fatos alegados, configura cerceamento de defesa. De fato, o estabelecimento da filiação socioafetiva demanda a coexistência de duas circunstâncias bem definidas e dispostas, necessariamente, na seguinte ordem: i) vontade clara e inequívoca do apontado pai ou mãe socioafetivo, ao despender expressões de afeto à criança, de ser reconhecido, voluntária e juridicamente como tal; e ii) configuração da denominada “posse de estado de filho”, compreendido pela doutrina como a presença (não concomitante) de tractatus (tratamento, de parte à parte, como pai/mãe e filho); nomen (a pessoa traz consigo o nome do apontado pai/mãe); e fama (reconhecimento pela família e pela comunidade de relação de filiação), que naturalmente deve apresentar-se de forma sólida e duradoura. Nesse contexto, para o reconhecimento da filiação socioafetiva, a manifestação quanto à vontade e à voluntariedade do apontado pai ou mãe de ser reconhecido juridicamente como tal deve estar absolutamente comprovada nos autos, o que pode ser feito por qualquer meio idôneo e legítimo de prova. Todavia, em remanescendo dúvidas quanto à verificação do apontado requisito, após concedida oportunidade à parte de demonstrar os fatos alegados, há que se afastar, peremptoriamente, a configuração da filiação socioafetiva. Por oportuno, é de se ressaltar, inclusive, que a robustez da prova, na hipótese dos autos, há de ser ainda mais contundente, a considerar que o pretendido reconhecimento de filiação socioafetiva refere-se a pessoa já falecida. Nada obstante, não se pode subtrair da parte a oportunidade de comprovar suas alegações. Ademais, cabe ressaltar que o casamento da pretensa mãe com um homem, em momento posterior, não significaria que aquele alegado relacionamento com a mãe registral nunca existiu e, principalmente, que não teria havido, por parte delas, a intenção conjunta de "adotar" a demandante, que, segundo alega e pretende demonstrar, fora criada como se filha fosse pelas referidas senhoras, mesmo depois do rompimento deste relacionamento. Por fim, deve-se consignar ao menos a possibilidade jurídica do pedido posto na inicial, acerca da dupla maternidade, conforme já reconhecido por esta Corte de Justiça por ocasião do julgamento do REsp 889.852-RS, Quarta Turma, DJe 10/8/2010 (ressalvadas as particularidades do caso ora sob exame). Efetivamente, em atenção às novas estruturas familiares, baseadas no princípio da afetividade jurídica (a permitir, em última análise, a realização do indivíduo como consectário da dignidade da pessoa humana), a coexistência de relações filiais ou a denominada multiplicidade parental, compreendida como expressão da realidade social, não pode passar despercebida pelo direito. Desse modo, há que se conferir à parte o direito de produzir as provas destinadas a comprovar o estabelecimento das alegadas relações socioafetivas, que pressupõem, como assinalado, a observância dos requisitos acima referidos. REsp 1.328.380-MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/10/2014.
Informativo nº 0551
Período: 3 de dezembro de 2014.
Terceira Turma
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. HIPÓTESE DE ADOÇÃO DE DESCENDENTE POR ASCENDENTES.
Admitiu-se, excepcionalmente, a adoção de neto por avós, tendo em vista as seguintes particularidades do caso analisado: os avós haviam adotado a mãe biológica de seu neto aos oito anos de idade, a qual já estava grávida do adotado em razão de abuso sexual; os avós já exerciam, com exclusividade, as funções de pai e mãe do neto desde o seu nascimento; havia filiação socioafetiva entre neto e avós; o adotado, mesmo sabendo de sua origem biológica, reconhece os adotantes como pais e trata a sua mãe biológica como irmã mais velha; tanto adotado quanto sua mãe biológica concordaram expressamente com a adoção; não há perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando; e não havia predominância de interesse econômico na pretensão de adoção. De fato, a adoção de descendentes por ascendentes passou a ser censurada sob o fundamento de que, nessa modalidade, havia a predominância do interesse econômico, pois as referidas adoções visavam, principalmente, à possibilidade de se deixar uma pensão em caso de falecimento, até como ato de gratidão, quando se adotava quem havia prestado ajuda durante períodos difíceis. Ademais, fundamentou-se a inconveniência dessa modalidade de adoção no argumento de que haveria quebra da harmonia familiar e confusão entre os graus de parentesco, inobservando-se a ordem natural existente entre parentes. Atento a essas críticas, o legislador editou o § 1º do art. 42 do ECA, segundo o qual “Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando”, visando evitar que o instituto fosse indevidamente utilizado com intuitos meramente patrimoniais ou assistenciais, bem como buscando proteger o adotando em relação a eventual confusão mental e patrimonial decorrente da transformação dos avós em pais e, ainda, com a justificativa de proteger, essencialmente, o interesse da criança e do adolescente, de modo que não fossem verificados apenas os fatores econômicos, mas principalmente o lado psicológico que tal modalidade geraria no adotado. No caso em análise, todavia, é inquestionável a possibilidade da mitigação do § 1º do art. 42 do ECA, haja vista que esse dispositivo visa atingir situação distinta da aqui analisada. Diante da leitura do art. 1º do ECA (“Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”) e do art. 6º desse mesmo diploma legal (“Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”), deve-se conferir prevalência aos princípios da proteção integral e da garantia do melhor interesse do menor. Ademais, o § 7º do art. 226 da CF deu ênfase à família, como forma de garantir a dignidade da pessoa humana, de modo que o direito das famílias está ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana de forma molecular. É também com base em tal princípio que se deve solucionar o caso analisado, tendo em vista se tratar de supraprincípio constitucional. Nesse contexto, não se pode descuidar, no direito familiar, de que as estruturas familiares estão em mutação e, para se lidar com elas, não bastam somente as leis. É necessário buscar subsídios em diversas áreas, levando-se em conta aspectos individuais de cada situação e os direitos de 3ª Geração. Dessa maneira, não cabe mais ao Judiciário fechar os olhos à realidade e fazer da letra do § 1º do art. 42 do ECA tábula rasa à realidade, de modo a perpetuar interpretação restrita do referido dispositivo, aplicando-o, por consequência, de forma estrábica e, dessa forma, pactuando com a injustiça. No caso analisado, não se trata de mero caso de adoção de neto por avós, mas sim de regularização de filiação socioafetiva. Deixar de permitir a adoção em apreço implicaria inobservância aos interesses básicos do menor e ao princípio da dignidade da pessoa humana. REsp 1.448.969-SC, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 21/10/2014.
Informativo nº 0551
Período: 3 de dezembro de 2014.
Sexta Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AMPLIAÇÃO DA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE POR LEI ESTADUAL.
Lei estadual pode conferir poderes ao Conselho da Magistratura para, excepcionalmente, atribuir aos Juizados da Infância e da Juventude competência para processar e julgar crimes contra a dignidade sexual em que figurem como vítimas crianças ou adolescentes. Embora haja precedentes do STJ em sentido contrário, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, é de se seguir o entendimento assentado nas duas Turmas do STF no sentido de ser possível atribuir à Justiça da Infânciae da Juventude, entre outras competências, a de processar e julgar crimes de natureza sexuais praticados contra crianças e adolescentes. Precedentes citados do STF: HC 113.102-RS, Primeira Turma, DJe 18/2/2013; e HC 113.018-RS, Segunda Turma, DJe 14/11/2013. HC 238.110-RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 26/8/2014 (Vide Informativo nº 529).
Informativo nº 0549
Período: 5 de novembro de 2014.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. APLICABILIDADE DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE NO CASO DE DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE COLETA DE CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS.
Tem direito a ser indenizada, com base na teoria da perda de uma chance, a criança que, em razão da ausência do preposto da empresa contratada por seus pais para coletar o material no momento do parto, não teve recolhidas as células-tronco embrionárias. No caso, a criança teve frustrada a chance de ter suas células embrionárias colhidas e armazenadas para, se eventualmente fosse preciso, fazer uso delas em tratamento de saúde. Não se está diante de situação de dano hipotético – o que não renderia ensejo a indenização – mas de caso claro de aplicação da teoria da perda de uma chance, desenvolvida na França (la perte d'une chance) e denominada na Inglaterra de loss-of-a-chance. No caso, a responsabilidade é por perda de uma chance por serem as células-tronco, cuja retirada do cordão umbilical deve ocorrer no momento do parto, o grande trunfo da medicina moderna para o tratamento de inúmeras patologias consideradas incuráveis. É possível que o dano final nunca venha a se implementar, bastando que a pessoa recém-nascida seja plenamente saudável, nunca desenvolvendo qualquer doença tratável com a utilização das células-tronco retiradas do seu cordão umbilical. O certo, porém, é que perdeu, definitivamente, a chance de prevenir o tratamento dessas patologias. Essa chance perdida é, portanto, o objeto da indenização. REsp 1.291.247-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 19/8/2014.
Informativo nº 0546
Período: 24 de setembro de 2014.
Primeira Seção
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A CRIANÇA OU ADOLESCENTE SOB GUARDA JUDICIAL.
No caso em que segurado de regime previdenciário seja detentor da guarda judicial de criança ou adolescente que dependa economicamente dele, ocorrendo o óbito do guardião, será assegurado o benefício da pensão por morte ao menor sob guarda, ainda que este não tenha sido incluído no rol de dependentes previsto na lei previdenciária aplicável. O fim social da lei previdenciária é abarcar as pessoas que foram acometidas por alguma contingência da vida. Nesse aspecto, o Estado deve cumprir seu papel de assegurar a dignidade da pessoa humana a todos, em especial às crianças e aos adolescentes, cuja proteção tem absoluta prioridade. O ECA não é uma simples lei, uma vez que representa política pública de proteção à criança e ao adolescente, verdadeiro cumprimento do mandamento previsto no art. 227 da CF. Ademais, não é dado ao intérprete atribuir à norma jurídica conteúdo que atente contra a dignidade da pessoa humana e, consequentemente, contra o princípio de proteção integral e preferencial a crianças e adolescentes, já que esses postulados são a base do Estado Democrático de Direito e devem orientar a interpretação de todo o ordenamento jurídico. Desse modo, embora a lei previdenciária aplicável ao segurado seja lei específica da previdência social, não menos certo é que a criança e adolescente tem norma específica que confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários (art. 33, § 3º, do ECA). RMS 36.034-MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 26/2/2014.
Informativo nº 0546
Período: 24 de setembro de 2014.
Sexta Turma
DIREITO PENAL. AGRAVANTES NO CRIME DE INTRODUÇÃO DE MOEDA FALSA EM CIRCULAÇÃO.
Nos casos de prática do crime de introdução de moeda falsa em circulação (art. 289, § 1º, do CP), é possível a aplicação das agravantes dispostas nas alíneas "e" e "h" do inciso II do art. 61 do CP, incidentes quando o delito é cometido “contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge” ou “contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida”. De fato, a fé pública do Estado é o bem jurídico tutelado no delito do art. 289, § 1º, do CP. Isso, todavia, não induz à conclusão de que o Estado seja vítima exclusiva do delito. Com efeito, em virtude da diversidade de meios com que a introdução de moeda falsa em circulação pode ser perpetrada, não há como negar que vítima pode ser, além do Estado, uma pessoa física ou um estabelecimento comercial, dado o notório prejuízo experimentado por esses últimos. Efetivamente, a pessoa a quem, eventualmente, são passadas cédulas ou moedas falsas pode ser elemento crucial e definidor do grau de facilidade com que o crime será praticado, e a fé pública, portanto, atingida. A propósito, a maior parte da doutrina não vê empecilho para que figure como vítima nessa espécie de delito a pessoa diretamente ofendida. HC 211.052-RO, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 5/6/2014.
Informativo nº 0544
Período: 27 de agosto de 2014.
Sexta Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL. POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR (ART. 318 DO CPP).
É possível a substituição de prisão preventiva por prisão domiciliar, quando demostrada a imprescindibilidade de cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos de idade (art. 318, III, do CPP) e o decreto prisional não indicar peculiaridades concretas a justificar a manutenção da segregação cautelar em estabelecimento prisional. Na situação em análise, não se mostra adequada a manutenção do encarceramento do paciente quando presente um dos requisitos do art. 318 do CPP. Ademais, a prisão domiciliar, na hipótese, revela-se adequada para garantir a ordem pública, sobretudo por não haver, no decreto prisional, demonstração de periculosidade concreta, a evidenciar que a cautela extrema seria a única medida a tutelar a ordem pública. Além disso, a substituição da prisão preventiva se justifica, por razões humanitárias, além de ser útil e razoável como alternativa à prisão ad custodiam. Ressalte-se a posição central, em nosso ordenamento jurídico, da doutrina da proteção integral e do princípio da prioridade absoluta, previstos no art. 227 da CF, no ECA e, ainda, na Convenção Internacional dos Direitos da Criança, ratificada pelo Decreto 99.710/1990. Portanto, atendidos os requisitos legais e em nome da dignidade da pessoa humana, bem como da proteção integral da criança, é possível substituir a prisão preventiva do paciente por prisão domiciliar. HC 291.439-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/5/2014.
Informativo nº 0543
Período: 13 de agosto de 2014.
Sexta Turma
DIREITO PENAL. CONFIGURAÇÃO DO TIPO DE FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO DE ADOLESCENTE.
O cliente que conscientemente se serve da prostituição de adolescente, com ele praticando conjunção carnal ou outro ato libidinoso, incorre no tipo previsto no inciso I do § 2º do art. 218-B do CP (favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável), ainda que a vítima seja atuante na prostituição e que a relação sexual tenha sido eventual, sem habitualidade. Assim dispõe o art. 218-B do CP, incluído pela Lei 12.015/2009: “Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos”. O inciso I do § 2º do referido artigo, por sua vez, prescreve o seguinte: “Incorre nas mesmas penas: I - quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo”. Da análise da previsão típica do art. 218-B do CP, especialmentedo inciso I do § 2º, extrai-se que o fato de já ser a vítima corrompida, atuante na prostituição, é irrelevante para o tipo penal. Não se pune a provocação de deterioração moral, mas o incentivo à atividade de prostituição, inclusive por aproveitamento eventual dessa atividade como cliente. Pune-se não somente quem atua para a prostituição do adolescente – induzindo, facilitando ou submetendo à prática ou, ainda, dificultando ou impedindo seu abandono –, mas também quem se serve desta atividade. Trata-se de ação político-social de defesa do adolescente, mesmo contra a vontade deste, pretendendo afastá-lo do trabalho de prostituição pela falta de quem se sirva de seu atendimento. A condição de vulnerável é no tipo penal admitida por critério biológico ou etário, neste último caso pela constatação objetiva da faixa etária, de 14 a 18 anos, independentemente de demonstração concreta dessa condição de incapacidade plena de auto-gestão. O tipo penal, tampouco, faz qualquer exigência de habitualidade da mantença de relações sexuais com adolescente submetido à prostituição. Habitualidade há na atividade de prostituição do adolescente, não nos contatos com aquele que de sua atividade serve-se. Basta único contato consciente com adolescente submetido à prostituição para que se configure o crime. A propósito, não tem relação com a hipótese em análise os precedentes pertinentes ao art. 244-A do ECA, pois nesse caso é exigida a submissão (condição de poder sobre alguém) à prostituição (esta atividade sim, com habitualidade). No art. 218-B, § 2º, I, pune-se outra ação, a mera prática de relação sexual com adolescente submetido à prostituição – e nessa conduta não se exige reiteração, poder de mando, ou introdução da vítima na habitualidade da prostituição. HC 288.374-AM, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 5/6/2014.
Informativo nº 0543
Período: 13 de agosto de 2014.
Sexta Turma
DIREITO PROCESSUAL PENAL. UTILIZAÇÃO DE GRAVAÇÃO TELEFÔNICA COMO PROVA DE CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL.
Em processo que apure a suposta prática de crime sexual contra adolescente absolutamente incapaz, é admissível a utilização de prova extraída de gravação telefônica efetivada a pedido da genitora da vítima, em seu terminal telefônico, mesmo que solicitado auxílio técnico de detetive particular para a captação das conversas. Consoante dispõe o art. 3°, I, do CC, são absolutamente incapazes os menores de dezesseis anos, não podendo praticar ato algum por si, de modo que são representados por seus pais. Assim, é válido o consentimento do genitor para gravar as conversas do filho menor. De fato, a gravação da conversa, em situações como a ora em análise, não configura prova ilícita, visto que não ocorre, a rigor, uma interceptação da comunicação por terceiro, mas mera gravação, com auxílio técnico de terceiro, pelo proprietário do terminal telefônico, objetivando a proteção da liberdade sexual de absolutamente incapaz, seu filho, na perspectiva do poder familiar, vale dizer, do poder-dever de que são investidos os pais em relação aos filhos menores, de proteção e vigilância. A presente hipótese se assemelha, em verdade, à gravação de conversa telefônica feita com a autorização de um dos interlocutores, sem ciência do outro, quando há cometimento de crime por este último, situação já reconhecida como válida pelo STF (HC 75.338, Tribunal Pleno, DJ 25/9/1998). Destaque-se que a proteção integral à criança, em especial no que se refere às agressões sexuais, é preocupação constante de nosso Estado, constitucionalmente garantida em caráter prioritário (art. 227, caput, c/c o § 4º, da CF), e de instrumentos internacionais. Com efeito, preceitua o art. 34, "b", da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Resolução 44/25 da ONU, em 20/11/1989, e internalizada no ordenamento jurídico nacional mediante o DL 28/1990, verbis: “Os Estados-partes se comprometem a proteger a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexual. Nesse sentido, os Estados-parte tomarão, em especial, todas as medidas de caráter nacional, bilateral e multilateral que sejam necessárias para impedir: (...) b) a exploração da criança na prostituição ou outras práticas sexuais ilegais; (...)”. Assim, é inviável inquinar de ilicitude a prova assim obtida, prestigiando o direito à intimidade e privacidade do acusado em detrimento da própria liberdade sexual da vítima absolutamente incapaz e em face de toda uma política estatal de proteção à criança e ao adolescente, enquanto ser em desenvolvimento. REsp 1.026.605-ES, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 13/5/2014.
Informativo nº 0541
Período: 11 de junho de 2014.
Segunda Seção
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA AJUIZAR AÇÃO DE ALIMENTOS EM PROVEITO DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
O Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar ação de alimentos em proveito de criança ou adolescente, independentemente do exercício do poder familiar dos pais, ou de o infante se encontrar nas situações de risco descritas no art. 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ou de quaisquer outros questionamentos acerca da existência ou eficiência da Defensoria Pública na comarca. De fato, o art. 127 da CF traz, em seu caput, a identidade do MP, seu núcleo axiológico, sua vocação primeira, que é ser “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. Ademais, nos incisos I a VIII do mesmo dispositivo, a CF indica, de forma meramente exemplificativa, as funções institucionais mínimas do MP, trazendo, no inciso IX, cláusula de abertura que permite à legislação infraconstitucional o incremento de outras atribuições, desde que compatíveis com a vocação constitucional do MP. Diante disso, já se deduz um vetor interpretativo invencível: a legislação infraconstitucional que se propuser a disciplinar funções institucionais do MP poderá apenas elastecer seu campo de atuação, mas nunca subtrair atribuições já existentes no próprio texto constitucional ou mesmo sufocar ou criar embaraços à realização de suas incumbências centrais, como a defesa dos “interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 127 da CF) ou do respeito “aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia” (art. 129, II, da CF). No ponto, não há dúvida de que a defesa dos interesses de crianças e adolescentes, sobretudo no que concerne à sua subsistência e integridade, insere-se nas atribuições centrais do MP, como órgão que recebeu a incumbência constitucional de defesa dos interesses individuais indisponíveis. Nesse particular, ao se examinar os principais direitos da infância e juventude (art. 227, caput, da CF), percebe-se haver, conforme entendimento doutrinário, duas linhas principiológicas básicas bem identificadas: de um lado, vige o princípio da absoluta prioridade desses direitos; e, de outro lado, a indisponibilidade é sua nota predominante, o que torna o MP naturalmente legitimado à sua defesa. Além disso, é da própria letra da CF que se extrai esse dever que transcende a pessoa do familiar envolvido, mostrando-se eloquente que não é só da família, mas da sociedade e do Estado, o dever de assegurar à criança e ao adolescente, “com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação” (art. 227, caput), donde se extrai o interesse público e indisponível envolvido em ações direcionadas à tutela de direitos de criança e adolescente, das quais a ação de alimentos é apenas um exemplo. No mesmo sentido, a CF consagra como direitos sociais a “alimentação” e “a proteção à maternidade e à infância” (art. 6º), o que reforça entendimento doutrinário segundo o qual, em se tratando de interesses indisponíveis de crianças ou adolescentes (ainda que individuais), e mesmo de interesses coletivos ou difusos relacionados com a infância e a juventude, suadefesa sempre convirá à coletividade como um todo. Além do mais, o STF (ADI 3.463, Tribunal Pleno, DJe 6/6/2012) acolheu expressamente entendimento segundo o qual norma infraconstitucional que, por força do inciso IX do art. 129 da CF, acresça atribuições ao MP local relacionadas à defesa da criança e do adolescente, é consentânea com a vocação constitucional do Parquet. Na mesma linha, é a jurisprudência do STJ em assegurar ao MP, dada a qualidade dos interesses envolvidos, a defesa dos direitos da criança e do adolescente, independentemente de se tratar de pessoa individualizada (AgRg no REsp 1.016.847-SC, Segunda Turma, DJe 7/10/2013; e EREsp 488.427-SP, Primeira Seção, DJe 29/9/2008). Ademais, não há como diferenciar os interesses envolvidos para que apenas alguns possam ser tutelados pela atuação do MP, atribuindo-lhe legitimidade, por exemplo, em ações que busquem tratamento médico de criança e subtraindo dele a legitimidade para ações de alimentos, haja vista que tanto o direito à saúde quanto o direito à alimentação são garantidos diretamente pela CF com prioridade absoluta (art. 227, caput), de modo que o MP detém legitimidade para buscar, identicamente, a concretização, pela via judicial, de ambos. Além disso, não haveria lógica em reconhecer ao MP legitimidade para ajuizamento de ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos, ou mesmo a legitimidade recursal em ações nas quais intervém – como reiteradamente vem decidindo a jurisprudência do STJ (REsp 208.429-MG, Terceira Turma, DJ 1/10/2001; REsp 226.686-DF, Quarta Turma, DJ 10/4/2000) –, subtraindo-lhe essa legitimação para o ajuizamento de ação unicamente de alimentos, o que contrasta com o senso segundo o qual quem pode mais pode menos. De mais a mais, se corretamente compreendida a ideologia jurídica sobre a qual o ECA, a CF e demais diplomas internacionais foram erguidos, que é a doutrina da proteção integral, não se afigura acertado inferir que o art. 201, III, do ECA – segundo o qual compete ao MP promover e acompanhar as ações de alimentos e os procedimentos de suspensão e destituição do poder familiar, nomeação e remoção de tutores, curadores e guardiães, bem como oficiar em todos os demais procedimentos da competência da Justiça da Infância e da Juventude – só tenha aplicação nas hipóteses previstas no art. 98 do mesmo diploma, ou seja, quando houver violação de direitos por parte do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou em razão da conduta da criança ou adolescente, ou ainda quando não houver exercício do poder familiar. Isso porque essa solução implicaria ressurgimento do antigo paradigma superado pela doutrina da proteção integral, vigente durante o Código de Menores, que é a doutrina do menor em situação irregular. Nesse contexto, é decorrência lógica da doutrina da proteção integral o princípio da intervenção precoce, expressamente consagrado no art. 100, parágrafo único, VI, do ECA, tendo em vista que há que se antecipar a atuação do Estado exatamente para que o infante não caia no que o Código de Menores chamava situação irregular, como nas hipóteses de maus-tratos, violação extrema de direitos por parte dos pais e demais familiares. Além do mais, adotando-se a solução contrária, chegar-se-ia em um círculo vicioso: só se franqueia ao MP a legitimidade ativa se houver ofensa ou ameaça a direitos da criança ou do adolescente, conforme previsão do art. 98 do ECA. Ocorre que é exatamente mediante a ação manejada pelo MP que se investigaria a existência de ofensa ou ameaça a direitos. Vale dizer, sem ofensa não há ação, mas sem ação não se descortina eventual ofensa. Por fim, não se pode confundir a substituição processual do MP – em razão da qualidade dos direitos envolvidos, mediante a qual se pleiteia, em nome próprio, direito alheio –, com a representação processual da Defensoria Pública. Realmente, o fato de existir Defensoria Pública relativamente eficiente na comarca não se relaciona com a situação que, no mais das vezes, justifica a legitimidade do MP, que é a omissão dos pais ou responsáveis na satisfação dos direitos mínimos da criança e do adolescente, notadamente o direito à alimentação. É bem de ver que – diferentemente da substituição processual do MP – a assistência judiciária prestada pela Defensoria Pública não dispensa a manifestação de vontade do assistido ou de quem lhe faça as vezes, além de se restringir, mesmo no cenário da Justiça da Infância, aos necessitados, no termos do art. 141, § 1º, do ECA. Nessas situações, o ajuizamento da ação de alimentos continua ao alvedrio dos responsáveis pela criança ou adolescente, ficando condicionada, portanto, aos inúmeros interesses rasteiros que, frequentemente, subjazem ao relacionamento desfeito dos pais. Ademais, sabe-se que, em não raras vezes, os alimentos são pleiteados com o exclusivo propósito de atingir o ex-cônjuge, na mesma frequência em que a pessoa detentora da guarda do filho se omite no ajuizamento da demanda quando ainda remanescer esperança no restabelecimento da relação. Enquanto isso, a criança aguarda a acomodação dos interesses dos pais, que nem sempre coincidem com os seus. REsp 1.265.821-BA e REsp 1.327.471-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgados em 14/5/2014.
Informativo nº 0540
Período: 28 de maio de 2014.
Sexta Turma
DIREITO PENAL. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA NO CRIME DE FURTO.
Aplica-se o princípio da insignificância à conduta formalmente tipificada como furto consistente na subtração, por réu primário, de bijuterias avaliadas em R$ 40 pertencentes a estabelecimento comercial e restituídas posteriormente à vítima. De início, há possibilidade de, a despeito da subsunção formal de um tipo penal a uma conduta humana, concluir-se pela atipicidade material da conduta, por diversos motivos, entre os quais a ausência de ofensividade penal do comportamento verificado. Vale lembrar que, em atenção aos princípios da fragmentariedade e da subsidiariedade, o Direito Penal apenas deve ser utilizado contra ofensas intoleráveis a determinados bens jurídicos e nos casos em que os demais ramos do Direito não se mostrem suficientes para protegê-los. Dessa forma, entende-se que o Direito penal não deve ocupar-se de bagatelas. Nesse contexto, para que o magistrado possa decidir sobre a aplicação do princípio da insignificância, faz-se necessária a ponderação do conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação do agente para verificar se a conduta formalmente descrita no tipo penal afeta substancialmente o bem jurídico tutelado. Nessa análise, no crime de furto, avalia-se notadamente: a) o valor do bem ou dos bens furtados; b) a situação econômica da vítima; c) as circunstâncias em que o crime foi perpetrado, é dizer, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima etc.; e d) a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou estilo de vida, com sucessivas ocorrências (reincidente ou não). Assim, caso seja verificada a inexpressividade do comportamento do agente, fica afastada a intervenção do Direito Penal. Precedentes citados do STJ: AgRg no REsp 1.400.317-MG, Sexta Turma, DJe 13/12/2013; HC 208.770-RJ, Sexta Turma, DJe 12/12/2013. Precedentes citados do STF: HC 115.246-MG, Segunda Turma, DJe 26/6/2013; HC 109.134-RS, Segunda Turma, DJe 1º/3/2012. HC 208.569-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/4/2014.
Informativo nº 0536
Período: 26 de março de 2014.
Quinta Turma
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. REITERAÇÃO NA PRÁTICA DE ATOS INFRACIONAIS GRAVES PARA APLICAÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO.
Para se configurar a “reiteração na prática de atos infracionais graves” (art. 122, II, do ECA) – uma das taxativas hipóteses de aplicação da medida socioeducativa de internação –, não se exige a prática de, no mínimo, três infrações dessa natureza. Com efeito, de acordo com a jurisprudênciado STF, não existe fundamento legal para essa exigência. O aplicador da lei deve analisar e levar em consideração as peculiaridades de cada caso concreto para uma melhor aplicação do direito. O magistrado deve apreciar as condições específicas do adolescente – meio social onde vive, grau de escolaridade, família – dentre outros elementos que permitam uma maior análise subjetiva do menor. Precedente citado do STJ: HC 231.170-SP, Quinta Turma, DJe 19/4/2013. Precedente citado do STF: HC 84.218-SP, Primeira Turma, DJe 18/4/2008. HC 280.478-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 18/2/2014.
Informativo nº 0535
Período: 12 de março de 2014.
Quarta Turma
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MEDIDAS PROTETIVAS ACAUTELATÓRIAS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.
As medidas protetivas de urgência da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) podem ser aplicadas em ação cautelar cível satisfativa, independentemente da existência de inquérito policial ou processo criminal contra o suposto agressor. O primeiro dado a ser considerado para compreensão da exata posição assumida pela Lei Maria da Penha no ordenamento jurídico pátrio é observar que o mencionado diploma veio com o objetivo de ampliar os mecanismos jurídicos e estatais de proteção da mulher. Por outra ótica de análise acerca da incidência dessa lei, mostra-se sintomático o fato de que a Convenção de Belém do Pará – no que foi seguida pela norma doméstica de 2006 – preocupou-se sobremaneira com a especial proteção da mulher submetida a violência, mas não somente pelo viés da punição penal do agressor, mas também pelo ângulo da prevenção por instrumentos de qualquer natureza, civil ou administrativa. Ora, parece claro que o intento de prevenção da violência doméstica contra a mulher pode ser perseguido com medidas judiciais de natureza não criminal, mesmo porque a resposta penal estatal só é desencadeada depois que, concretamente, o ilícito penal é cometido, muitas vezes com consequências irreversíveis, como no caso de homicídio ou de lesões corporais graves ou gravíssimas. Na verdade, a Lei Maria da Penha, ao definir violência doméstica contra a mulher e suas diversas formas, enumera, exemplificativamente, espécies de danos que nem sempre se acomodam na categoria de bem jurídico tutelável pelo direito penal, como o sofrimento psicológico, o dano moral, a diminuição da autoestima, a manipulação, a vigilância constante, a retenção de objetos pessoais, entre outras formas de violência. Ademais, fica clara a inexistência de exclusividade de aplicação penal da Lei Maria da Penha quando a própria lei busca a incidência de outros diplomas para a realização de seus propósitos, como no art. 22, § 4º, a autorização de aplicação do art. 461, §§ 5º e 6º, do CPC; ou no art. 13, ao afirmar que "ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais [...] aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitem com o estabelecido nesta Lei". Analisada de outra forma a controvérsia, se é certo que a Lei Maria da Penha permite a incidência do art. 461, § 5º, do CPC para a concretização das medidas protetivas nela previstas, não é menos verdade que, como pacificamente reconhecido pela doutrina, o mencionado dispositivo do diploma processual não estabelece rol exauriente de medidas de apoio, o que permite, de forma recíproca e observados os específicos requisitos, a aplicação das medidas previstas na Lei Maria da Penha no âmbito do processo civil. REsp 1.419.421-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2014.
Informativo nº 0533
Período: 12 de fevereiro de 2014.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL. PROVA EM AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE.
Em ação negatória de paternidade, não é possível ao juiz declarar a nulidade do registro de nascimento com base, exclusivamente, na alegação de dúvida acerca do vínculo biológico do pai com o registrado, sem provas robustas da ocorrência de erro escusável quando do reconhecimento voluntário da paternidade. O art. 1.604 do CC dispõe que “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.” Desse modo, o registro de nascimento tem valor absoluto, independentemente de a filiação ter se verificado no âmbito do casamento ou fora dele, não se permitindo negar a paternidade, salvo se consistentes as provas do erro ou falsidade. Devido ao valor absoluto do registro, o erro apto a caracterizar o vício de consentimento deve ser escusável, não se admitindo, para esse fim, que o erro decorra de simples negligência de quem registrou. Assim, em processos relacionados ao direito de filiação, é necessário que o julgador aprecie as controvérsias com prudência para que o Poder Judiciário não venha a prejudicar a criança pelo mero capricho de um adulto que, livremente, a tenha reconhecido como filho em ato público e, posteriormente, por motivo vil, pretenda “livrar-se do peso da paternidade”. Portanto, o mero arrependimento não pode aniquilar o vínculo de filiação estabelecido, e a presunção de veracidade e autenticidade do registro de nascimento não pode ceder diante da falta de provas insofismáveis do vício de consentimento para a desconstituição do reconhecimento voluntário da paternidade. REsp 1.272.691-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 5/11/2013.
Informativo nº 0533
Período: 12 de fevereiro de 2014.
Terceira Turma
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EFEITOS DO NÃO COMPARECIMENTO DO FILHO MENOR DE IDADE PARA SUBMETER-SE A EXAME DE DNA.
Em ação negatória de paternidade, o não comparecimento do filho menor de idade para submeter-se ao exame de DNA não induz presunção de inexistência de paternidade. De fato, é crucial que haja uma ponderação mínima para que se evite o uso imoderado de ações judiciais que têm aptidão para expor a intimidade das pessoas envolvidas e causar danos irreparáveis nas relações interpessoais. Nesse contexto, não é ético admitir que essas ações sejam propostas de maneira impensada ou por motivos espúrios, como as movidas por sentimentos de revanchismo, por relacionamentos extraconjugais ou outras espécies de vinganças processuais injustificadas. Portanto, impende cotejar, de um lado, o direito à identidade, como direito da personalidade, e, do outro, o direito à honra e à intimidade das pessoas afetadas, todos alçados à condição de direitos fundamentais. Além disso, o sistema de provas no processo civil brasileiro permite que sejam utilizados todos os meios legais e moralmente legítimos para comprovar a verdade dos fatos. Assim, o exame genético, embora de grande proveito, não pode ser considerado o único meio de prova da paternidade, em um verdadeiro processo de sacralização do DNA. Com efeito, no intuito de mitigar esse status de prova única, a Lei 12.004/2009, acrescentando o art. 2º-A da Lei 8.560/1992, positivou o entendimento constante da Súmula 301 do STJ, segundo a qual, em “ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”, posicionamento aplicável também ao não comparecimento injustificado daquele para a realização do exame. Nesses casos, a recusa, por si só, não pode resultar na procedência do pedido formulado em investigação ou negação de paternidade, pois a prova genética não gera presunção absoluta, cabendo ao autor comprovar a possibilidade de procedência do pedido por meio de outras provas. Nesse contexto, a interpretação a contrario sensu da Súmula 301 do STJ, de forma a desconstituir a paternidade devido ao não comparecimento do menor ao exame genético, atenta contra a diretriz constitucional e preceitos do CC e do ECA, tendo em vista que o ordenamento jurídico brasileiro protege, com absoluta prioridade, a dignidade e a liberdade da criança e do adolescente, instituindo o princípio do melhor interesse do menor e seu direito à identidade e desenvolvimento da personalidade. Vale ressaltar, ainda, que o não comparecimento do menor ao exame há

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