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Capítulo 13 A ilusáo biográfica* Pierre Bourdieu A história de vida é urna dessasno<;oesdo senso comum que entraramcomo contrabandono universocientífico; inicialmente,sem muito alarde, entre os etnólogos,depcis, mais recentemente, com estar- dalha<;o,entre os sociólo8os.F;¡];nOf' históri;¡de vid<1é pelo menospres- supor - e isso nao é pouco - que a vida é urna história e que, como no título de Maupassant,Urna vida, urna vida é inseparavehnenteo con- junto dos acontecimentosde urna existencia individual concebidacomo urna história e o relato dessahistória. É exatamenteo que diz o sensoco- mum, isto é, a linguagemsimples,que descrevea vida como um caminho, uma estrada,urnacarreira,com suas encruzilhadas(Hérculesentre o vicio e a virtude), seus ardis, até mesmosuas emboscadas(Jules Romains fala das Usucessivasemboscadasdos concursose dos exames"),ou como um encaminhamento,isto é, um caminho que perconemose qlle deve ser percorrido, um trajeto, lima corrida, Ull1CllrSllS,lima passagem,urna via- gem, lIm percurso orientado, lIm deslocamentolinear, unidirecional (a umobilidade"),que tem um come<;o(Uumaestréiana vida"), etapase um fim, no duplo sentido,de término e de finalidade (UelefaréÍseu caminho" significa ele terá exito, fará urna bela carreira), um fim da história. Isto é aceitar tacitamentea filosofia da história no sentido de sucessaode * Bourdieu, Pierre. L' iIIusion biogmphique. ACles de la. Rechercheen ScíellcesSocíales (62/ 63):69-72, juin 1986. 184 Usos & ABUSOS DA HISTORIA ORAL A IlUSAO BIOGRAFICA 185 acontecimentoshistóricos,Geschichte,que está implícita numa filosofia da história no sentidode relato histórico,Historie, em suma,numa teoria do relato, relato de historiadorou romancista,indiscerníveissob esseaspecto, notadamentebiografia ou autobiografia. Sem pretenderser exaustivo,pode-setentarextrair algunspres- supostosdessateoria. Primeiramente,o fato de que a vida constitui um todo, um conjunto coerentee orientado,que pode e deve ser apreendido como expressaounitária de urna "inten<;ao"subjetiv2e objetiva,de um projeto: a no<;aosartrianade "projeto original" somentecoloca de modo explícitoo que estáimplícito nos ')á", "desdeentao","desdepequeno"etc. das biografiascomuns ou nos "sempre"("sempregostei de música") das "históriasde vida". Essa vida organizadacomo urnahistória transcorre,se- gundo urna ordem cronológicaque tambémé urna ordem lógica, desde um come<;o,urna origem,no duplo sentidode ponto de partida,de inicio, mas tambémde principio, de razao de ser,de causaprimeira,até seu tér- mino, que tambémé um objetivo.O relato, seja ele biográficoou auto- biográfico, como o do investigadoque "se entrega"a um investigador, propoe acontecimentosque, sem teremse desenroladosempreem sua es- trita sucessaocronológica(quemjá coligiu histórias de vida sabe que os investigadosperdem constantementeo fio da estrita sucessaodo calen- dário), tendem ou pretendemorganizar-seem seqüenciasordenadasse- gundo rela<;oesinteligÍveis. O sujeito e o objeto da biografia (o investigadore o investigado)tem de certa forma o mesmointeresseem aceitaro postuladodo sentidoda existencianarrada (e, implicitamente,de qualquerexistencia).Sem dúvida, cabe supor que o relato aUtobiográfico se baseiasempre,ou pelo menos em parte, na preocupa<;aode dar sen- tido, de tornar razoável,de extrair urna lógica ao mesmo tempo retros- pectiva e prospectiva,urna consistenciae urna constancia,estabelecendo rela<;oesinteligíveis,como a do efeito a causa eficienteou final, entre os estadossucessivos,assim constituidosem etapasde um desenvolvimento necessário.(E é provávelque esseganno de coerenciae de necessidade esteja na origem do interesse,variável segundo a posi<;aoe a trajetória, que os investigadostem pelo empreendimentobiográfico.1Essa propensao a tornar-se o ideólogo de sua própi"iavida, selecionando,em fun<;aode urna inten<;aoglobal, certos acontecimentossignificativose estabelecendo entre eles conexoespara lhes dar coerencia, como as que implica a sua institui<;aocomocausasou, com mais freqüencia,como fins, Contacom a cumplicidadenatural do biógrafo, que, a come<;:arpor suas disposi<;oesde profissionalda interpreta<;ao,só pode ser levado a aceitaressacria<;aoar- tificial de sentido. É significativoque o abandono da estruturado romancecomo relato linear tenhacoincididocom o questionamentoda visao da vida co- mo existenciadotadade sentido,no duplo sentidode significa<;aoe de di- re<;ao.Essa dupla ruptura, simbolizada pelo romancede FaulknerO som e a Júria, exprime-secomtoda a clareza na defini<;aoda vida como anti- história propostapor Shakespeareno fim de Macbeth: "É urna história contadapor um idiota, urna história cheia de som e de fúria, mas des- provida de significa<;ao".Produzir uma história de vida, tratara vida como urna história, isto é, como o relato coerentede urna seqüenciade acon- tecimentoscom significadoe dire<;ao,talvez seja conformar-secom urna ilusao retórica,urna representa<;aocomumda existenciaque toda urnatra- di<;aoliterária nao deixou e nao deixa de refor<;ar.Eis por que é lógico pedir auxilio aquelesque tiveram que romper com essatradi<;¿.¡ono pró- prio terrenode sua realiza<;aoexemplar.Como diz Allain Robbe-Grillet,"o adventodo romancemodernoestá ligado precisamentea estadescoberta: o real é desconrínuo,formadode elementosjustapostossem razao, todos eles únicos e tanto mais difíceis de seremapreendidosporquesurgemde modo incessantementeimprevisto,fora de propósito,aleatório".2 A inven<;aode um novo modo de expressaoliterária faz surgir a contrario o arbitrário da representa<;:aotradicional do discurso roma- nescocomohistória coerentee totalizante, e tambémda filosofiada exis- tencia que essaconven<;aoretórica implica. Nada nos obriga a adotar a filosofia da existenciaque, para algunsdos seus iniciadores,é indissociá- vel dessarevolu<;aoretórica;3mas; em todo caso, nao podemosnos fur- tar a questao dos mecanismossociais que favorecemou autorizam a experienciacomum da vida como unidade e corno totalidade.De fato, como responder,sem sair dos limites da sociologia, a velha indaga<;ao empirista sobre a existenciade um eu irredutivel a rapsódia das sensa- ¡ Ver Muel-Dreyfus, E Le métierd'éducatew:Paris, Minuit, 1983. 2 Robbe-Grillet,A. Le miroir qui reviel1l.Paris, Minuit, 1984. p. 208. 3 "Tudo ¡sto é o real, isto é, o fragmentario,o fugaz, o inútil, tao acidental mesmoe tiio particular que todo acontecimentoali aparece,a todo instante,como gratuito, e toda exis- tencia, afinal, como privada da menor significa<;iiounificadora" (Robbe-Grillet, 1984.). 186 Usos & ABUSOS DA HISTORIA ORAL A IluSAO BIOGRÁFICA 187 <;oessingulares?Sem dúvida, podemosencontrar no habitus o princípio ativo, irredutível as percep<;oespassivas,da unifica<;aodas práticase das representa<;oes(isto é, o equivalente,historicamenteconstituído e por- tanto historicamentesituado,desseeu cuja existencia,segundoKant, de- vemospostularpara justificar a síntesedo diversosensíveloperadana in- tui<;aoe a liga<;aodas representa<;oesnuma consciencia).Mas essa iden- tidade prática somentese entregaa intui<;aona inesgotávelsérie de suas manifesta<;oessucessivas,de modo que a única maneira de apreende-Ia como tal consistetalvez em tentar recuperá-Iana unidade de um relato totalizante (como autorizam a faze-Io as diferentesformas, mais ou me- nos institucionalizadas,do "falar de si", confidencia etc.). O mundo social, que tende a identificar a normalidadecom a identidade entendidacomo constanciaem si mesmode um ser respon- sável, isto é, previsívelou, no mínimo, inteligível,a maneirade urna his- tória bem construída (por oposi<;aoa história contada por um idiota), dispoe de todo tipo de institui<;oesde totaliza<;aoe de unifica<;aodo eu. A mais evidenteé, obviamente,o nomepróprio, que, como"designadorrí-gido", segundoa expressaode Kripke, "designao mesmoobjeto em qual- quer universopossível",isto é, concretamente,seja em estadosdiferentes do mesmocamposocial (constanciadiacr6nica),seja em camposdiferen- tes no mesmomomento (unidade sincr6nicaalém da multiplicidadedas posi<;oesocupadas).4E Ziff, que define o nome próprio como "um ponto fixo num mundo que se move" tem razao em ver nos "ritos batismais"a maneiranecessáriade determinarurna identidade.s Por essa forma intei- ramente singular de nominafao que é o nome próprio, institui-se urna identidadesocial constantee durável, que garante a identidadedo indi- víduo biológico em todos os campospossíveisande ele intervém como agente,isto é, em todas as suas históriasde vida possíveis.É o nomepró- prio "Marcel Dassault",com a individualidadebiológica da qual ele re- presentaa forma socialmenteinstituída,que asseguraa constanciaatravés do tempo e a unidade atravésdos espa<;ossociais dos diferentesagentes sociaisque sao a manifesta<;aodessa individualidadenos diferentescam- pos, o dono de empresa,o dono de jornal, o deputado,o produtor de fil- mes etc.; e nao é por acaso que a assinatura,signum authenticumque autenticaessa identidade,é a condi<;aojurídica das transferenciasde um campoa outro, isto é, de um agentea outro, das propriedadesligadas ao mesmoindivíduo instituído.Como institui<;ao,o nome próprio é arrancado do tempoe do espa<;oe das varia<;oessegundoos lugarese os momentos: assim ele asseguraaos indivíduos designados,para além de todas as mu- dan<;ase todas as flutua<;oesbiológicase sociais,a constancianominal, a identidade no sentido de identidade consigo mesmo,de constantiasibi, que a ordem social demanda.E é compreensívelque, em numerososuni- versossociais,os deveresmais sagradospara consigomesmotomema for- ma de deverespara com o nome próprio (que também,por um lado, é sempreum nome comum,enquantonomedefamília, especificadopor um prenome).O nome próprio é o atestadovisível da identidadedo seu por- tador atravésdos tempose dos espa<;ossociais,o fundamentoda unidade de suas sucessivasmanifesta<;oese da possibiJidadesocialmentereconhe- cida de totalizaressasmanifesta<;oesem registrosoficiais,curriculumvitae, cursushonorum,ficha judicial, necrologiaou biografia, que constituema vida na totalidadefinita, pelo veredictodado sobreum balan<;oprovisório ou definitivo. "Designador rígido", o nome próprio é él forma por ex- celencia da imposi<;aoarbitrária que operam os ritos de institui<;ao:a nomina<;aoe a classifica<;aointroduzem divisoesnítidas, absolutas, indi- ferentesas particularidadescircunstanciaise aos acidentesindividuais, no fluxo das realidadesbiológicase sociais.Eis por que o nome próprio nao pode descreverpropriedades nem veicular nenhuma informa<;aosobre aquiJo quenomeia:como o que ele designanao é senaourna rapsódiahe- terogeneae disparatadade propriedadesbiológicase sociaisem constante muta<;ao,todasas descri<;oesseriamválidassomentenos limitesde um es- tágio ou de um espa<;o.Em outras palavras,ele só pode atestara iden- tidade da personalidade,como individualidadesocialmenteconstituída, a custa de uma formidávelabstra<;ao.Eis o que evoca o uso inabitual que Proust faz do nome próprio precedidodo artigo definido ("o Swann de BuckinghamPalace","a Albertina de entao", "a Albertina encapotadados dias de chuva"),rodeio complexopelo qual se enunciam ao mesmotempo a "súbita revela<;aode um sujeito fracionado,mÚltiplo" é a permanencia para além da pluralidade dos mundos da identidadesocialmentedeter- minada pelo nome próprio.6 4 Ver Kripke, S. La logiquedesnomspropres.Paris, Minuit, 1982; e tambémEngel, P Identité et référence.Paris, Pens, 1985. 5 Ver Ziff, P Semanticanalysis. lthaca, Cornell University Press, 1960. p. 102-4. 6 Nicole, E. Personnageet réthoriqlle dll nam. Paétíque,46:200-16, 1981. 188 Usos & ABUSOS DA HISTORIA ORAL AssimO nomepróprioé O suporte(somostentadosa dizera substancia)daquiloquechamamosde estadocivil,isto é, desseconjunto de propriedades(nacionalidade, sexo,idadeetc.) ligadasa pessoasas quaisa lei civil associaefeitosjurídicose que instituem,soba aparencia de constatá-las,as certidoesde estadocivil. Produtodo rito de institui- c;aoinauguralquemarcao acessoa existenciasocial,ele é o verdadeiro objetode todosos sucessivosritosde instituic;aoou de nominac;aoatra- vésdosquaisé construídaa identidadesocial:essascertidoes(emgeral públicase solenes)de atribuiftlO,produzidassobo controlee coma ga- rantiado Estado,tambémsaodesignac;oesrígidas,istoé, válidasparato- dos os mundospossíveis,que desenvolvemurna verdadeiradestriftlO oficialdessaespéciede essenciasocial,transcendenteas flutuac;oeshis- tóricas,quea ordemsocialinstituiatravésdo nomepróprio;de fato,to- das repousamsobre o postuladoda constanciado nominal que pressupoemtodosos atestadcsde nominac;ao,bemcomo,maisgeneri- camente,todosos atestadosjurídicosque envolvemum futuroa longo prazo,querse tratede certificadosque garantemde formairreversível urnacapacidade(ou urnaincapacidade), de contratosque envolvcmum futurolongínquo,comoos contratosde créditoou de seguro,querde sanc;oespenais,todacondenac;aopressupondoa afirmac;aoda identidade paraalémdo tempodaquelequecometeuo crimee daquelequesofre o castigo.7 Tudolevaa crerqueo relatode vidatendea aproximar-sedo modelooficialda apresentac;aooficialde si, carteirade identidade,ficha de estadocivil,curriculumvitae,biografiaoficial,bemcomoda filosofia da identidadequeo sustenta,quantomaisnosaproximamosdos inter- rogatóriosoficiaisdasinvestigac;oesoficiais- cujolimiteé a investigac;ao judiciáriaou policial-, afas~ando-seao mesmotempodastrocasíntimas entrefamiliarese da lógicada confidenciaqueprevalecenessesmercados protegidos.As leis queregema produ<;iiodosdiscursosna relac;aoentre 7 A dimensaopropriamentebiológica da individualidade - que o estado civil apreendesob a forma de descri~aoe fotografia de identidade - está sujeita a varia~oessegundo o tempo e o lugar, isto é, os espa~ossociais que lhe dao urna base muito menos segura do que a mera defini~aonominal. (Sobre as varia~oesda hexis corporal segundo os espa<;ossociais, ver Maresca, S. La réprésentationde la paysannerie; remarquesethnographiquessur le tra- vail de réprésentationdes dirigeants agricoles. Actes de la Rechercheen SciencesSociales, 38:3-18, mai 1981.) A IlUSAO BIOGRÁFICA 189 um habituse um mercadose aplicama essaformaparticularGeexpressao que é o discursosobre si; e o relato de vida varia, tanto em sua forma quantoem seu conteúdo,segundoa qualidadesocial do mercadono qual é oferecido- a própria situac;aoda investigac;aocontribui inevitavelmente para determinaro discursocoligid'). Mas o objeto desse discurso, isto é, a apresentac;aopública e, logo, a oficializac;aode urna representac;aopri- vada de sua própria vida, pública ou privada, implica um aumento de coac;oese de censurasespecíficas(das quaisas sanc;oesjurídicas contraas usurpac;oesde identidadeou o porte ilegal de condecorac;oesrepresentam o limite). E tudo leva a crer que as leis da biografiaoficial tenderaoa se impor muito além das situac;oesoficiais, atravésdos pressupostosincons- cientesda interrogac;ao(como a preocupac;aocom a cronologia e tudo o que é inerentea representac;aoda vida como história) e tambématravés da situac;aode investigac;ao,que, segundoa distanciaobjetiva entre o in- terrogadore o interrogadoe segundoa capacidadedo primeiro para "ma- nipular"essarelac;ao,poderávariar desdeessaformadocede interrogatório oficial que é, geralmentesem que o saiba o sociólogo,a investigac;aoso- riológic<!até a confidencia- através,enfim, da rcprcscntac;aomais ou menosconscienteque o investigadofará da situa<;aode investigac;ao,em func;aode sua experienciadireta ou mediata de situac;oesequivalentes (entrevistade escritorcélebreou de político,situac;aodeexameete.), e que orientará todo o seu esfon;o de apresenta<;aode si, ou melhor,de produc;aode si. A análise crítica dos processossociaismal analisadose mal do- minados que atuam, sem o conhecimentodo pesquisador e com sua cumplicidade,na construc;aodessa espéciede artefato socialmenteirre- preensíveJque é a "história de vida" e, em particular,no privilégio con- cedido a sucessaolongitudinaJ dos acontccimcntosconstitutivosda vida consideradacomo história cm reJaC;ao<10CSp<lC;Osocial no qual eles se realizam nao é em si mesmaum fimoEla conduz á construc;aoda noc;ao de trajetóriacomo série de posi¡:oessucessivamcnteocupadaspor um mesmoagente (ou um mesmogrupo) num espac;oque é eje próprio um devir, estando sujeito a incessantestransformac;oes.Tentar compreender urna vida como uma série única e por si suficientede acontecimentossu- cessivos,sem outro vínculo que nao a associac;aoa um "sujeito" cuja constanciacertamentenao é senaoaquelade um nome próprio, é quase tao absurdo quanto tentar explicar a razao de um trajera no metro sem levar em canta a estrutura da rede, isto é, a matriz das relac;oesobje- 190 usos & ABUSOS DA HISTORIA ORAL tivasentreas diferentesesta<;:6es.Os acontecimentosbiográficosse de- finemcomocoloca(:oese deslocamentosno espa<;osocial,isto é, mais precisamentenosdiferentesestadossucessivosda estruturada distribui- <;aodasdiferentesespéciesde capitalqueestaoemjogo no campocon- siderado.O sentidodos movimentosque conduzemde urnaposi<;aoa outra(deumpastoprofissionala outro,deurnaeditoraa outra,de urna diocesea outraetc.)evidentementese definena rela<;aoobjetivaentre o sentidoe o valor,no momentoconsiderado,dessasposi<;6esnumes- pa<;:oorientado.O que equivalea dizer quenaopodemoscompreender urnatrajetória(istoé, o envelhecimentosocialque,emborao acompanhe de formainevitável,é independentedo envelhecimentobiológico)sem quetenhamospreviamenteconstruídoos estadossucessivosdo campono qualelasedesenroloue, logo,o conjuntodasrela<;6esobjetivasqueuni- ramo agenteconsiderado- pelomenosemcenonúmerode estados pertinentes- ao conjuntodosoutrosagentesenvolvidosno mesmocam- po e confrontadoscom o mesmo espa<;odos possíveis.Essa constru<;ao prévia tambémé a condi<;aode qualquer avalia<;aorigorosa do que po- demos chamar de supe¡fíciesocial, como descri<;aorigorosa da persona- lidade designada pelo nome próprio, isto é, o conjunto das posi<;6es simultaneamenteocupadasnum dado momentopor uma individualidade biológicasocialmenteinstituída e que age como supone de um conjunto de atributos e atribui<;6esque lhe permitem intervir como agente efici- ente em diferentescampos.8 A necessidadedessedesvio pela constru<;aodo espa<;oparecetao evidentequando é enunciada- quem pensariaem evocar urna viagem semter urna idéia da paisagemna qual ela se realiza?- que seria difícil 8 A distin~iioentre () individuo concreto e o individuo construido, o agente eficiente,é du. plicada pela distin<;aoentre o agente, eficiente num campo, e a pcrsollalidade,como indi- vidualidade biológica socialmente instituida pela nomina~aoe dotada de propriedadese de poderesque lhe asscguram(em certos casos) uma superficiesocial, isto é, a capacidadede existir como agente em diferentes campos. 15s0suscita numerososproblemas normalmente ignorados,notadamenteno traramentoe5tatístico;assim, por exemplo,as investiga~6essobre as "elites" escamoteiama quesraoda superficie social ao caracterizar05 individuos em po- si~6esmúlriplas por urna de suas propriedadesconsideradadominanteou determinante,in- cluindo o dono de indÚstria que é também dono de jornal na categoriados donos etc. (o que implica, entre ourras coisas, eliminar dos campos de produ~aoculrural todos os pro- dutores cuja atividade principal se situa em ourros campos, deixando escapar assim cenas propriedadesdo campo). A !lUSAO BIOGRAFICA 191 compreenderque nao se tenhaimpostode imediatoa todosos pesqui- sadores,se naosoubéssemosqueo indivíduo,a pessoa,o eu,"o maisin- substituíveldos seres",como dizia Gide, para o qual nos conduz irresistivelmenteurnapulsaonarcísicasocialmenterefor<;ada,é tambéma maisreal,emaparencia,dasrealidades,o ensrealissimum,imediatamente entreguea nossaintui<;aofascinada,intuituspersonae.
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