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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ Curso de Direito O DIREITO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA E OS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA RESERVA DO POSSÍVEL: Um diálogo necessário e urgente JESSÉ RODRIGUES MAGALHÃES Niterói 2017.2 JESSÉ RODRIGUES MAGALHÃES O DIREITO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA E OS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA RESERVA DO POSSÍVEL: Um diálogo necessário e urgente Artigo Científico Jurídico apresentado à Universidade Estácio de Sá, Curso de Direito, como requisito parcial para conclusão da disciplina Trabalho de Conclusão de Curso. Orientador: Prof. Marcos Vicente Pereira da Silva Niterói Campus Oscar Niemeyer 2017.2 RESUMO: O texto constitucional em seu artigo 5º apresenta direitos e garantias estendidos a todos os cidadãos, sem distinção, com o objetivo maior de tratá-los de maneira isonômica e justa. No entanto, a pessoa com deficiência, no decorrer da história, vem sendo excluída de muitos de seus direitos, inclusive, daqueles mínimos à sua sobrevivência sob o argumento do princípio da reserva do possível por parte do poder estatal, que o utilizada como forma de justificar sua não-atuação. Este artigo pretende estabelecer uma relação dialógica e crítica a este princípio, muitas vezes apropriado pelo poder estatal, e contrapor a um dos princípios basilares da Constituição Brasileira de 1988: o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Palavras-chaves: pessoa com deficiência, reserva do possível, dignidade da pessoa humana. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 2 2. DESENVOLVIMENTO ................................................................................... 3 2.1. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ......................................... 3 2.2. A pessoa com deficiência ......................................................................... 6 2.3. Os Direitos Humanos e as pessoas com deficiência ............................... 8 2.4. A pessoa com deficiência e a Constituição Federal de 1988 ................... 9 2.5. A efetividade das normas direcionadas à pessoa com deficiência .......... 12 2.6. O Estado e o descumprimento dos direitos da pessoa com deficiência .. 15 3. CONCLUSÃO .................................................................................................. 16 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 19 2 1. INTRODUÇÃO Este artigo apresenta uma reflexão sucinta sobre o sistema jurídico- constitucional de proteção às pessoas com deficiência tendo por base a aplicabilidade dos Princípios da Dignidade da Pessoa Humana e o Mínimo Existencial contrapondo-se ao Princípio Reserva do Possível. Estes princípios, em inúmeras situações, para serem efetivados, necessitam da ação intervencionista do Poder Judiciário uma vez que como justificativa ao não cumprimento nota-se, reiteradamente, a apelação ao Princípio da Reserva do Possível pelo poder estatal. A temática aqui apresentada, considerada sobre o prisma dos direitos da pessoa com deficiência, enseja, desde os tempos mais remotos, tratamento diferenciado, tendo em vista as diferentes formas de manifestação do caráter da deficiência; a saber, física, auditiva, de fala, mental, dentre outras. Em nosso ordenamento jurídico há legislação suficiente que visa assegurar qualidade de vida a este contingente; no entanto, mediante a apropriação pelo Estado do argumento do Princípio da Reserva do Possível, inúmeras barreiras e impedimentos têm sido colocados. O tema possui grande relevância social se considerar que lidamos com um quantitativo que atinge algo próximo a 15% de nossa população brasileira. Esta estimativa corresponde a um quantitativo de deficientes de 24,5 milhões de pessoas, segundo levantamentos estatísticos do Censo Demográfico Brasileiro. (IBGE, 2000) A abordagem constitucional a respeito das pessoas com deficiência ganha destaque quando o texto da lei faz menção, em seu artigo 1º, inciso III, ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Cabe ressaltar que este eixo se apresenta enquanto fundamento da República Federativa do Brasil que, ainda em seu artigo 5º proclama o direito à igualdade e sustenta uma variada gama de direitos infraconstitucionais elaborados à luz da Constituição de 1988. Sendo assim, a relevância jurídica e também social do tema, encontra- se no fato de que são poucos os estudos sobre as pessoas com deficiência, suas condições de vida, as barreiras que surgem cotidianamente para terem acesso e manifestarem a sua condição de cidadãos. A despeito de caber ao Poder Judiciário assegurar a aplicação dos dispositivos legais mediante 3 provocação daqueles que se sentirem lesados, os deficientes ainda estão à mercê de ações de solidariedade e de filantropia, muitas vezes marginalizados e esquecidos nas gavetas daqueles responsáveis pela aprovação de leis. Assim, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência se manifesta positivamente, no sentido de dar amplo atendimento às necessidades considerando as inúmeras barreiras atitudinais, procedimentais e conceituais a respeito do tema. 2. DESENVOLVIMENTO 2.1. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana A cada dia cresce a necessidade de se assegurar os direitos sociais e individuais, bem como a liberdade e a segurança, pressupostos esses que se configuram como pilares da compreensão do que se estabeleceu na Carta Magna. (MENDES, 2008; MORAES, 2008) A Carta Magna de 1988 garante, em seu artigo 5º, direitos tidos como fundamentais tais como a dignidade da pessoa humana, o tratamento isonômico (considerando a medida das igualdades de desigualdades de cada indivíduo) dentre outros sem os quais não haveria o pleno desenvolvimento pleno e eficaz destes comprometendo o próprio conceito de cidadania. Nesse sentido, cabe ao poder público observar tais direitos constitucionalmente estabelecidos a fim de que suas ações sejam no sentido de dirimir além das diferenças sociais proporcionar, efetivamente, a plena inserção do indivíduo na sociedade garantindo o acesso e condições mínimas de permanência deste nos diversos espaços sejam eles de convívio social, privado e até mesmo em ambientes de trabalho dignos. Plácido e Silva ensina que: “dignidade é a palavra derivada do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa serve de base ao próprio respeito em que é tida: compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa pelo qual se faz merecedor do conceito público; em sentido jurídico, 4 também se estende como a dignidade a distinção ou a honraria conferida a uma pessoa, consistente em cargo ou título de alta graduação; no Direito Canônico, indica-se o benefício ou prerrogativa de um cargo eclesiástico. Esta base moral referenciada pelo autor é que norteará e dará a pessoa o devido encaminhamento a ser seguido, a fim de se buscar o respeito e o reconhecimento a que todo ser humano almeja. O Princípio da Dignidade daPessoa Humana tem sido elemento de inúmeras formulações doutrinárias e jurisprudenciais, principalmente com o objetivo de se definir sua abrangência conceitual de dignidade quando referida à única condição de existir. Procura-se, portanto, definir um mínimo existencial razoável que assegure a qualquer indivíduo a condição de integralidade. Vale ressaltar que, historicamente, este Princípio vem sendo referido em diversos documentos como na Carta das Nações Unidas (1945) onde considera: “NÓS, OS POVOS DAS NAÇÕES UNIDAS, RESOLVIDOS a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direito dos homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade ampla.” Vemos, ainda, no Estatuto da UNESCO (1945) a dignidade humana sendo abordada como dever sagrado que todas as nações devem cumprir com espírito de assistência mútua, dever este que surge corroborado na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) em seu artigo 1º onde “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. O próprio preâmbulo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966) considera e reconhece a importância da dignidade humana em seu texto e, inclusive, ressalta que tal dignidade é inerente a todos os membros da família humana, constituindo o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. Estes textos, todos marcados pela violação desse direito no período pós Segunda Guerra Mundial, trazem à tona diversos acontecimentos os quais, 5 ao longo da história, foram sendo considerados de tamanha atrocidade. Apontam, portanto, após superação de tais atrocidades para a construção de um modelo paradigmático que considera a dignidade da pessoa como bem maior. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, assinala o princípio da humanidade e da dignidade já no seu preâmbulo: Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo (…). Considerando que as Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e valor da pessoa humana (…). A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 1969, estabelece, em seu art. 11, § 1º, que “Toda pessoa humana tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”. Neste contexto, há de se destacar a valoração da dignidade humana que deve ser tratada sob uma ótica premente e de extrema importância. Portanto, este termo “dignidade humana” é reconhecido como detentor de um valor sui generis porque intangível a quaisquer outros questionamentos. Em contrapartida, o intento do Princípio é frustrado na medida em que faltam recursos e interesse de agir por parte dos gestores públicos que, apesar de conhecedores das leis que amparam as pessoas com deficiência, atuam de forma imediatista e não com políticas públicas que de fato possam garantir a inclusão destes na sociedade. Ainda, em relação ao aspecto das pessoas com deficiência, a proteção à dignidade pressupõe também a acessibilidade, pois retirada sua autodeterminação através de um não investimento em solucionar suas dificuldades de locomoção, por exemplo, são violados diretamente o arbítrio e a liberdade, o direito de ir e vir, valores intrínsecos ao ser humano. Diante disso, é salutar ressaltar que o paradigma da preservação da dignidade foi preceituado no texto Constitucional de 1988 e mantido como condição sine qua non do ser humano. Assim, o ser humano, independentemente de idade, gênero, classe social e/ou de quaisquer deficiências que o acometa é amparado e protegido legalmente, pois este valor 6 é tomado como característica distintiva do que representa ser homem na sociedade atualmente. Sendo assim, é de suma importância destacar que a pessoa com deficiência deve ter sua dignidade preservada. Esta visão, apesar de óbvia, ainda nos dias atuais não é tratada como prioridade. 2.2. A pessoa com deficiência O conceito de “pessoa com deficiência” emerge para substituir o termo jurídico (até então utilizado) “portadores de deficiência”. Esta mudança fundamenta-se a partir da quebra de paradigma, neste caso, marcada pela visão anterior de destaque a doença enquanto substância portada, passível de ser carregada e deixada em quaisquer outros momentos, em contraposição a visão atual onde o foco está na pessoa que possui a deficiência como condição de vida. Nestes termos, atualmente, cabe ao deficiente aprender a lidar com sua deficiência, mas a partir da perspectiva de que esta não dever ser um limite a sua interação social. Diante disso, a julgada “escolha” não se refere ao tipo ou aspecto de deficiência (auditiva, de fala, mental, física), mas em relação às formas de transposição das barreiras que suas limitações físicas possam provocar. (RIBEIRO, 2010) Ao longo do tempo, o tratamento dado às pessoas com deficiência beirava a total falta de humanidade e respeito. Hoje em dia vemos uma notável mudança no tratamento dado a essas pessoas e isto revela que os direitos, que até então vem sendo assegurados, não estão dissociados dos fatos históricos, demonstrados na forma como a sociedade percebe seus cidadãos, bem como a existência de leis específicas dirigidas a este contingente. Essas mudanças revelam a grande necessidade de adaptação da sociedade a fim de incluir essas pessoas ao cotidiano, considerando as especificidades que cada deficiência exige associada ao indivíduo deficiente. Concomitantemente, nota-se o processo de preparação da pessoa com deficiência para o desempenho de funções de maior grau de relevância para sociedade, anteriormente não permitidas, como é o caso dos deficientes que 7 ocupam cargos políticos, de direção e gestão administrativa, dentre outros. (CORRÊA, 2007) Ao longo do tempo, a despeito da perspectiva inclusiva em relação às pessoas com deficiência, o tratamento dado não fora o do pleno desenvolvimento. O que se via eram tratamentos preconceituosos e segregacionistas que mantinhas tais pessoas fora do contexto da sociedade, muitas vezes aprisionados em suas casas pois não tinham atendimento especializado nem mesmo eram tidas como pessoas possuidoras de alguma capacidade que fosse. O que se via era apenas a deficiência em si desconsiderando quaisquer outros atributos do indivíduo. Ao caso dos deficientes, acrescenta-se o dos negros, dos indígenas, dos mutilados de guerra de demais categorias minoritárias. A estes cabem o ostracismo porque considerados incapazes de integrarem redes sociais, mediante o desempenho de funções laborativas, mas também de convívio social. (ELIAS, 2000) A partir dos anos 1980, a Organização das Nações Unidas fomenta um movimento por um tratamento equitativo para as pessoas com deficiência, despertando a sociedade no sentido de uma reivindicação mais efetiva em relação ao papel que estes marginalizados sociais desempenham enquanto cidadãos. A partir desta nova perspectiva,novas leis e tratados internacionais são elaborados versando sobre os direitos das pessoas com deficiência em vários países. Em 2015 foi instituída no Ordenamento Jurídico Brasileiro a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência1 visando assegurar direitos e garantias às pessoas com deficiência: Art. 1 o É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania. A referida lei traz em seu texto legal um conceito moderno no que tange ao entendimento de quem seria essa pessoa com deficiência: 1 Lei Nº 13.146, de 6 de julho de 2015. 8 Art. 2 o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Tal dispositivo legal se apresenta como importante meio de efetivar direitos que possibilitem, de fato, a inclusão da pessoa com deficiência aos diversos espaços de convívio social garantindo, assim, o tratamento isonômico e contribuindo para o pleno desenvolvimento do ser humano, observando que a deficiência deve ser superada não apenas por aquele se apresenta nessa condição e sim por toda a sociedade que deve primar pelo melhor convívio de todos independentemente das deficiências, sejam elas físicas, mentais, auditivas, de fala dentre tantas outras. Vale ressaltar que se trata de um conceito mais amplo que considera não apenas fatores genéticos, fisiológicos para caracterizar a deficiência, mas, também, associados a questões sociais e culturais onde esta pessoa está inserida. 2.3. Os Direitos Humanos e as pessoas com deficiência Sobres os direitos assegurados ao deficiente, como anteriormente visto, estes só foram possíveis em função de acontecimentos internacionais que nortearam suas conquistas em diferentes campos, como foi o caso da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989) e da Declaração de Salamanca (1994). A Declaração Universal dos Direitos do Homem, embora não seja uma lei, possui grande força moral e, em regra, norteia as decisões tomadas pela comunidade internacional. Seu texto versa sobre os direitos naturais do homem, sem distinção de cor, sexo ou orientação sexual e compreende o homem enquanto sujeito de direito pelo simples fato de ser considerado homem. O documento foi elaborado após o mundo ter vivenciado os horrores da guerra, em 1948, onde milhões de pessoas morreram em combate e aproximadamente seis milhões de judeus foram exterminados em campos nazistas e muitos guerreiros retornavam para seus países mutilados. Diante 9 disso, há uma união entre os governos com o objetivo de criar mecanismos capazes de proteger os homens de se tornarem objeto da própria violência humana e de garantir a eficácia dos direitos dos cidadãos. Outro documento de suma importância para a proteção do deficiente foi a Convenção sobre os Direitos das Crianças, de 1989, foi ratificada pelo Brasil em 1990. O documento inclui os direitos da criança com deficiência colocando referindo as necessidades especiais físicas e de quaisquer gêneros. Este documento preconiza que: “Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na presente Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita à sua jurisdição, sem distinção alguma, independentemente de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional, étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais.” (Art. 2 §1º Convenção sobre os Direitos da Criança) A partir deste trecho é possível observar referências diretas a criança deficiente e o desejo de protegê-la, assegurando-lhe tratamento para que suas necessidades especiais sejam supridas. O texto é conduzido sobre um enfoque de inclusão, principalmente quando regulamenta que as crianças com deficiência deverão ter sua dignidade garantida na perspectiva de favorecer sua autonomia para uma participação mais efetiva na sociedade. Outrossim, outro documento que assegurou os direitos ao deficiente foi a Declaração de Salamanca que é resultado da Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais que aconteceu no período de 07 a 10 de junho de 1994, na cidade de Salamanca na Espanha. Esta declaração consubstancia os princípios, a política e as práticas da integração da pessoa com necessidades educacionais especiais. O objetivo desta Conferência foi promover a educação para todos, atentando que são necessárias mudanças fundamentais para favorecer uma educação na perspectiva de inclusão. Parte das orientações deste documento se destina as escolas, no sentido de capacitá-las para que atendam as crianças, principalmente aquelas com necessidades especiais. A Declaração de Salamanca é específica e clara com relação à inclusão de crianças com deficiência em escolas regulares e quanto ao papel das instituições no oferecimento de condições de aprendizagem condizentes 10 com a deficiência apresentada pelo aluno. O desafio para escola então é o de desenvolver uma pedagogia centrada na criança, para que a educação ali promovida tenha como alvo todos os alunos, ainda que tenham algum tipo de deficiência. O documento apresenta, portanto, um modelo de escola capaz de acolher e de respeitar as diferenças a despeito das múltiplas diferenças e situações educacionais apresentadas pelo seu alunado. 2.4. A pessoa com deficiência e a Constituição Federal de 1988 A Constituição da República Federativa do Brasil declara, em seu Parágrafo Único, art. 1º que “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. No entanto, a este poder tem se imputado uma variada gama de limitações, ainda que existam previsões de direitos e garantias individuais e coletivas sob o status de fundamentais, na mesma medida em que objetivam proteção da dignidade da pessoa contra agressões lesivas ao indivíduo em sua esfera de convivência e existência. A Carta Magna de 88 estabelece de forma explicita garantias aos deficientes. E, além dos direitos assegurados a todos, encontram-se alguns dispositivos dirigidos especificamente a este segmento da população brasileira. Estes dispositivos estão distribuídos em três capítulos: (II) Da Seguridade Social; (III) Da Educação, da Cultura e do Desporto; e (VIII) Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso; todos incluídos no Título VIII, Da Ordem Social. Entretanto não houve por parte do constituinte a preocupação em elaborar um conceito que definisse o que seria pessoa com deficiência.2 Como pondera Ribeiro (2010), a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, ao ser ratificada pelo Congresso Nacional com quorum qualificado, ganha o status de Emenda Constitucional (art. 5º, § 3º da 2 “Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condiçõescom as demais pessoas.” (Convenção da Pessoa com Deficiência art. 1º). 11 CRFB/88), sendo promulgada através do decerto legislativo nº 186/08 e decreto presidencial nº 6.949/09; o que indica que o conceito passa a ser considerado como direito constitucional amplo É preciso ter clareza que, por mais que invista na definição do conceito, este ainda encontra-se vago, em função da multiplicidade de situações que ele abarca. Além deste, inúmeros obstáculos são emergidos, no sentido de limitar a participação dos deficientes, em condição de igualdade, em relação a todas as pessoas, configurando a existência do preconceito social. Complementando, o Decreto nº 3.298 de 1999 apresenta o que seria considerada deficiência a partir desse olhar a partir da pessoa.3 Neste sentido, sendo o conceito incapaz de dar conta da diversidade existente nesta área, caberá ao intérprete da lei e ao legislador originário o dever de definição e a tarefa de fazer com que os preceitos destinados ao deficiente se cumpram. Contudo, vários dispositivos na Constituição Federal fazem referência aos direitos que devem ser assegurados a pessoa com deficiência. Pode-se então afirmar que é vontade da Constituição tutelar os direitos das pessoas com deficiência, admitindo que este contingente possui necessidades especiais que precisam ser asseguradas. Nesta perspectiva, o artigo 23, II da CRFB, atribui a União, Estados, Distrito Federal e aos Municípios a competência para zelar pela saúde e assistência pública, garantindo ao deficiente atendimento prioritário apropriado, na perspectiva de promover a integração social. Frente a isso, o legislador, visando garantir a proteção e a integração social das pessoas com deficiência, em seu artigo 24, XIV da CRFB, imputa à competência concorrente à União, Estados e Distrito Federal para legislar sobre a proteção e integração do deficiente no sentido de possibilitar maior eficácia aos seus direitos. 3 Art. 3º Para os efeitos deste Decreto, considera-se: I - deficiência - toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita o adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções. (Decreto nº 3.298 de 1999) 12 Outrossim, tendo por objetivo a inserção do deficiente no mercado de trabalho e sua inclusão na sociedade, a Constituição dispõe, ao tratar da Administração Pública no artigo 37, VIII da CRFB, que a lei deverá reservar um percentual dos cargos públicos para pessoa com deficiência e definirá os critérios de admissão. Cabe destacar que a Lei 8112/90 complementa o disposto em seu artigo 5°, §2º. Vale a pena considerar que a administração pública cabe oferecer condições de trabalho compatíveis com a deficiência de seu funcionário, bem como garantir a acessibilidade, não apenas de funcionários, mas também do público deficiente em geral. De igual modo, o artigo 203 da CRFB assegura como direito do deficiente menos favorecido a reabilitação e habilitação, garantindo-lhes um salário-mínimo mensal a título de benefício, quando comprovada sua hipossuficiência a título de assistência social. Em seguida, o artigo 208 também da CRFB concebe a necessidade de atendimento especializado às pessoas com deficiência e estabelece como preferência que ocorra na rede regular de ensino, o que ratifica a vontade do legislador em promover a inclusão, reconhecendo as especificidades de tratamento, não a utilizando como pretexto para segregação. Observa-se que o constituinte igualmente responsabiliza a família, a sociedade e o Estado pelo cumprimento dos diretos fundamentais da criança, do adolescente e do idoso no que se refere às condições necessárias ao pleno desenvolvimento e vida social. Destaca-se que o artigo 227, II, §1º, estabelece para o Estado o dever de promover a assistência integral à saúde do deficiente com tratamento especializado, garantindo a integração social por meio do treinamento para o trabalho. Além disso, considera a obrigatoriedade de facilitar o acesso aos bens e serviços coletivos com eliminação de obstáculos arquitetônicos. Com este fim, versa o artigo 244 que, ao remeter a lei complementar, regulamenta a adaptação de locais e edifícios públicos, veículos de transporte coletivo, a fim de assegurar ao deficiente o direito constitucional de ir e vir. Portanto, fica claro no escopo da Constituição de 88 a tentativa do constituinte em implementar um estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade e a segurança. Valores 13 que se estabelecem enquanto fundamento ético, jurídico e político, sustentáculos da compreensão e abordagem próprios da Constituição enquanto norma superior emanada do poder originário. 2.5. A efetividade das normas direcionadas à pessoa com deficiência Observa-se no Brasil histórias recorrentes de indiferença com relação à distância entre o texto legal e a realidade. Desde as primeiras Constituições, o desinteresse em tornar a vontade constitucional em políticas que promovessem a mobilidade social e inclusão das categorias menos favorecidas são sentimentos comuns em nossa sociedade. Pelo contrário, como exemplo, observa-se que a Carta de 1824 que estabelecia que a lei seria igual para todos, conviveu a luz de um regime escravocrata, permitindo privilégios a nobreza e o voto censitário, sem o menor constrangimento. (BARROSO, 2010) Um grande desafio para Constituição de 88 estava em romper com a “insinceridade constitucional”, objetivando marcar a lei originária com um sentido normativo, sem a ingenuidade de supor que a realidade haveria de se transformar com o simples registro em lei. Era preciso, de forma incisiva, atribuir à norma constitucional o status de norma jurídica e não somente considerá-la enquanto instrumento essencialmente político, como revela o histórico das demais constituições brasileiras. O aspecto histórico da norma constitucional revela que, muito embora tenha o condão de ser hierarquicamente superior às demais, durante longo período manteve-se como mero ideário sem eficácia jurídica, justamente por ter se apresentado desprovida de sanção. Neste contexto, a pretensão de efetividade das normas constitucionais desemboca no binômio possibilidade/limites do direito constitucional como forma de atuação social. Ao tratar do tema da cidadania e relacioná-lo à deficiência, é inevitável resgatar o Princípio da Igualdade, enquanto cláusula pétrea, bem como o Princípio da Não Discriminação, trazido pela Convenção da Guatemala, na adoção da máxima de “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”. 14 O artigo 4º da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência preceitua que: ”Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação. § 1o Considera-se discriminação em razão da deficiência toda forma de distinção,restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas.” Desta forma, fica clara a necessidade de promover diferenciações com base na deficiência com o propósito de permitir o acesso ao direito e não de negar o seu exercício. (SCHIMER ET AL., 2007: 22) Assim, o Princípio da Igualdade inspirou a Constituição no tratamento das pessoas com deficiência e despertou para necessidade e urgência de criação de programas de educação especial com o objetivo de integração do deficiente. No entanto, a realidade está muito longe dos ideais de igualdade preconizados pela lei. Observa-se que diante de todo histórico que envolve os direitos da pessoa com deficiência, basta caminharmos pelos centros urbanos para notar que, não obstante os direitos inerentes assegurados pela carta magna, ainda há muito o que conquistar no campo da implementação de meios que assegurem a realização da vontade constituinte; ou seja, temos as leis registradas, mas sua efetividade ainda se faz precária. A despeito de todo empecilho, é notória a força normativa e a efetividade conquistadas ao decorrer de 22 anos a partir da implementação da Constituição Federal. Basta observar as medidas que podem ser tomadas para assegurar sua aplicabilidade, também conhecidas como “remédios constitucionais”, que mascaram aspectos que ainda não foram contemplados pelo legislador ou que, se tratados, ainda não efetivamente implementados. Com relação aos direitos que contemplam as pessoas com deficiência, estes adquiriram o patamar de direitos subjetivos, pois que comportam tutela judicial específica. Barroso (2010) reforça esta visão quando diz que “A doutrina na efetividade consolidou-se no Brasil como um mecanismo eficiente de enfrentamento da insinceridade normativa e de superação da supremacia política exercida fora e acima da Constituição”. 15 Cabe destacar que antes de se estabelecer a doutrina da efetividade, a colocação em prática dos preceitos constitucionais ficaram a cargo do legislador e da discricionariedade do administrador. Assim, segundo o autor, o Poder Judiciário encontrava-se afastado do conteúdo referente à existência e à aplicabilidade da Constituição. (BARROSO, 2010) No que tange aos direitos e às garantias referentes ao tratamento com o deficiente disposto na Constituição, é preciso ter clareza que, embora se possa somar muitas conquistas no campo legal, na realidade fática, é preciso iniciativas de cunho político para que sejam garantidos direitos fundamentais como, por exemplo, o de ir e vir. Deve ser abandonada a ideia de que o simples registro em dispositivo legal refletirá em implementação de meios para que se alcance o cumprimento. Entende-se que o disposto na Constituição não está limitado a descrição de uma realidade, pelo contrário, sua função normativa que deve assegurar a satisfação da pretensão, no entanto, em outra face da mesma moeda, é preciso reconhecer que a própria essência do Direito apresenta limites que lhes são próprios, em especial de ordem prática, não se pode ter a pretensão de normatizar o inalcançável. (BARROSO 2010) Sendo assim, fica claro que a norma Constitucional deve ser preservada e cumprida em toda sua extensão possível; contudo, em casos não raros observa-se a impossibilidade fática ou jurídica de sua aplicação, lançando mão de conceitos como a reserva do possível e outros que acabam por mitigar não sua normatividade, mas sua eficácia. Por outro lado, no que tange à pessoa com deficiência, a simples justificativa do não cumprimento fundamentado em insuficiência orçamentária confronta diretamente princípios constitucionais instituídos em cláusulas pétreas. Sendo assim, faz-se necessária a fundamentação da não aplicabilidade, mesmo que acompanhada de um plano de ação, no sentido da implementação de políticas públicas de inclusão, pois se pode afirmar que o deficiente fica condenado à reclusão, tolindo-se o direito de ir e vir. Antes, é preciso tratar do assunto no plano diretor e propor maneiras que garantam a aplicabilidade das normas constitucionais relacionadas à inclusão do deficiente. Essas ações permitirão que anos de militância não fiquem restritos ao plano de 16 existência legal, da pacificação de consciência, mas galguem a eficácia necessária a efetividade do plano concreto. O plano da efetividade se coaduna aos tratados pela doutrina tradicionalmente elaborada. Dentre estes, destacam-se o da existência, da eficácia e da validade. (REALE, 1973) No campo prático, observa-se o cumprimento da norma, o que representa a realização do Direito, a concretização na realidade fática à aproximação entre o dever-ser e o ser da realidade social, conceito preconizado por Barroso (2007). 2.6. O Estado e o descumprimento dos direitos do deficiente O desrespeito a Constituição Federal é marcado tanto pela via da ação estatal quanto pela via da inércia do Estado em cumprir ato que fora exigido. A realização dos preceitos constitucionais é de responsabilidade governamental e deve oferecer condições de tornar o disposto pelo Poder Constituinte exequível e, caso abstenha-se de cumprir, configura-se enquanto violação negativa ao texto constitucional. Do mesmo modo, o Poder Legislativo, que tem como incumbência legislar, vem se abstendo de cumprir com sua função. Com relação a criação de normas referentes à citada matéria não recai a obrigatoriedade. No entanto, quando a Constituição determina a criação de norma reguladora da atuação de tal preceito constitucional e este não se realiza, configura-se uma inconstitucionalidade por omissão. Como pode ser exemplificado a partir do artigo 227§2º da Constituição Federal. Inúmeros casos têm emergido em que o Supremo Tribunal produz decisões integrativas. Esta forma de atuação institucional manifesta a função atípica do Poder Judiciário que desperta a controvertida questão da manifestação deste como legislador positivo. Com relação aos direitos fundamentais inerentes ao deficiente, nota-se um crescimento considerável com relação à atuação no campo legal por iniciativa do legislador. Muitos avanços são oriundos do tratamento jurídico atribuído à pessoa com deficiência onde inúmeros direitos se fizeram tutelados nesta esfera. Tal é o caso dos direitos aventados na Lei nº 8.213, de 1991 que 17 assegura um percentual de vagas nas empresas particulares e concursos públicos. Assim, objetiva-se a inclusão desta categoria de excluídos no mercado de trabalho. No entanto, com relação ao tratamento da pessoa com deficiência, a questão emergencial que se apresenta vincula-se ao cumprimento do disposto na legislação constitucional e infra. 3. CONCLUSÃO A Constituição de 1988, ao ser elaborada à luz de princípios que visam tutelar direitos individuais, sociais e os difusos, confere destaque aos sociais, também chamados de direitos de segunda geração. Estes, principalmente por possuírem o condão de assegurar condições de dignidade aos grupos minoritários, dentre estes os deficientes. À Carta Magna, incorporam-se uma série de conquistas que legitimam os direitos direcionados à pessoa com deficiência enquanto Direito Subjetivo, que objetiva a proteção do indivíduo em suas múltiplas dimensões. Se a efetividade dos direitos de segunda geração tem encontrado inúmeras barreiras, principalmente por serem com frequência tolidos pela escassezde recursos de ordem orçamentária estatal, muito ainda temos que esperar por parte das autoridades públicas. Muitas delas mascarando sua ineficiência e desinteresse mediante incorporação do argumento da reserva do possível enquanto limite fático para sua não realização. Tal questão torna-se polêmica e passível de ser caracterizada pela via da inconstitucionalidade das ações oriundas dos órgãos administrativos, posto que a Constituição determina conduta positiva com a finalidade de garantir a aplicabilidade e a eficácia ao preceito constitucional manifestado em cláusula pétrea, que postula a garantia de todos a condições igualitárias de vida. Sendo assim, no que tange às pessoas com deficiência, a proteção à dignidade abarca também a acessibilidade, pois retiradas sua autodeterminação por meio de descumprimento de ações que viabilizem as dificuldades de locomoção, são violados diretamente o arbítrio, a liberdade e demais valores intrínsecos ao ser humano, como é o caso da não adaptação 18 de locais públicos aos deficientes; aspecto que viola o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Mínimo Existencial. Assim, fica claro que a deficiência de qualquer ordem, dentre outros segmentos sociais diferenciados, não pode deixar de ser atendida sob argumento de oferta de tratamento igualitário, pelo simples fato de que são diferentes. Outrossim, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana também apresenta enquanto argumento inquestionável a racionalização na utilização de verbas públicas e parte da ideia de que determinados gastos, de menor premência social, podem ser diferidos em favor de outros reputados indispensáveis e urgentes por se tratarem de necessidades essenciais do homem, como é o caso da integridade moral e física do indivíduo. Neste contexto, a não aplicabilidade de normas dirigidas a este contingente se vincula à questão cultural de desrespeito, manifestada mormente no tratamento histórico dirigido à pessoa com deficiência. Antes, o deficiente era visto como desprovido de dignidade, e termos como abominação, monstruosidade eram frequentemente utilizados em textos de leis. Considerados tal e qual, o deficiente era motivo de vergonha para família e para o grupo social do qual fazia parte. Não obstante, com a evolução do pensamento e as mudanças no texto da lei, os deficientes ainda precisam lutar pela sua aplicação. Há de se destacar, ainda, que, além da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência de 2015, há vasta legislação a respeito da temática, como por exemplo a legislação pertinente a cada estado e município que visa assegurar a peculiaridade pertinente a cada região. Este aspecto tem contribuído para melhoria das condições de vida do deficiente nos últimos anos; no entanto, observa-se que a efetividade ainda é precária com relação aos instrumentos legais já existentes. Ao analisarmos o histórico das leis que visam contemplar a pessoa com deficiência, observa-se que muitas conquistas já se efetivaram no campo legal, no entanto, basta um olhar mais cuidadoso ao caminhar nos centros urbanos para concluir que para que haja aplicabilidade da lei é preciso a superação de inúmeros empecilhos. Destaca-se que atualmente a situação da pessoa com deficiência esbarra, em fato notório, na ausência de políticas públicas para implementação 19 de uma rede de infraestrutura urbana que permita a integração do indivíduo deficiente no convívio social, que minimize as barreiras arquitetônicas e atue ativamente na eliminação das disparidades culturais uníssonas em relação a consideração dessas pessoas como dotadas de menor capacidade intelectual e de convívio social. Sendo assim, no que tange à aplicabilidade das leis que garantem a acessibilidade, bem como a inclusão do deficiente em um contexto social, fazem-se necessárias uma série de adaptações que não passam apenas pelo campo subjetivo da tolerância e consciência voltada para o bem coletivo. É preciso adequação dos ambientes e meios transportes públicos. Por fim, conclui-se que, a despeito de o direito de ir e vir ser uma garantia constitucional, vastos são os casos de não cumprimento desta norma, o que dificulta, e por vezes impede, o exercício pleno deste direito. Faz-se mister o rompimento destas barreiras preconceituosas, ensejada a partir da mudança de hábito e comportamentos que preterem ou ignoram a pessoa com deficiência impedindo o exercício de sua cidadania. Além disso, o cumprimento das condições que permitam a acessibilidade dos deficientes aos diferentes espaços públicos requer a derrubada da utilização do argumento da reserva do possível e a construção de uma visão política de que se fará o possível para aplicação efetiva e honesta dos direitos fundamentais preconizados na Constituição Federal brasileira. 20 4. REFERÊNCIAS BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 2 ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2010. BRASIL, Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre necessidades educativas especiais. Ministério da Justiça/Secretaria Nacional de Direitos Humanos, 2 ed., Brasília, 1997a. BRASIL, Congresso Nacional. Decreto nº 99.710. Convenção sobre os Direitos da Criança, 1990. BRASIL, Congresso Nacional. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. BRASIL, Congresso Nacional. Decreto nº 19.841. Carta das Nações Unidas, 1945. BRASIL, Congresso Nacional. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. BRASIL, Congresso Nacional. Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), 1969. BRASIL, Congresso Nacional. Lei nº 13.146 de 6 de julho de 2015. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), 2015. CORRÊA, Maria Ângela Monteiro. Educação especial. Rio de Janeiro: CECIERJ, 2007. ELIAS, Norbert e SCOTSON, J. L. Os estabelecidos e os outsiders. Rio de Janeiro: Zahar, 2000. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico Brasileiro. Brasília: IBGE, 2000. 21 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Direitos Socais. In: Curso de Direto Constitucional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2008: 709-713. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 23 ed. São Paulo: Atlas, 2008. REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. Local: Editora, 1973. RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes. Manual de diretos da pessoa com deficiência. 1 ed. São Paulo: Editora Verbatim, 2010. SCHIMER, Carolina R. et al. Deficiência Física. São Paulo: MEC/SEESP, 2007. SILVA, Adilson Florentino da. A inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais: deficiência física. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2006.
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